Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
sexta-feira, 14 de agosto de 2009
Ainda sobre o virus A(H1N1)....
Educar população e quebrar patentes são os autênticos remédios contra a gripe suína | | | |
Escrito por Gabriel Brito | |
| |
Iniciado no México, o surto da gripe suína (ou A H1N1) acabou de fato chegando ao Brasil, registrando 275 mortes até o dia 12 de agosto. Em matéria veiculada à época inicial do surto, o Correio já havia apurado com servidores da ANVISA a insuficiência da fiscalização sobre as entradas de pessoas e mercadorias no país. Nesta entrevista, a servidora da ANVISA Sueli Dias concorda que uma maior ação preventiva do Ministério da Saúde poderia atenuar os efeitos do surto.
Para ela, a saída para o governo no controle da gripe é de educar em massa a população, de forma acessível, e também equipar hospitais e funcionários de material nesse sentido. Com relação às vacinas, Sueli é taxativa: "O caminho para o governo é buscar a quebra de patentes". Dessa forma, evitar-se-ia que a população saísse em busca desesperada pelo remédio contra a gripe e se automedicasse, o que também é altamente prejudicial. Segundo a servidora, já há muitos brasileiros em busca do genérico La Porcina, vendido no Paraguai.
Em resumo, as soluções passariam por práticas há muito abandonadas pelo governo, no caso, investimentos em saúde pública. E por outras nunca sequer cogitadas, como o seria a quebra de patente de uma gigante da indústria farmacêutica – a Roche, ‘dona’ do Tamiflu, anti-viral mais recomendado contra a gripe. Uma gripe, cuja mudança de nome, aliás, deve-se acima de tudo às empresas criadoras de porcos, em cujos terrenos se disseminou o vírus.
Correio da Cidadania: Como podemos avaliar o atual quadro brasileiro da gripe A ou suína?
Sueli Dias: Eu acho que acontece o que de certa forma era inevitável. Inicialmente, verificava-se que o surto atingia a população de maior poder aquisitivo que viajava ao exterior; hoje, já atinge também as camadas mais carentes da população.
Ainda que tenha um protocolo determinado no qual, teoricamente, o médico, em caso de suspeita e vendo que a pessoa se enquadra em um critério específico, indicará medicação, a questão é quanto tempo demora a se chegar ao médico. É óbvio que aqueles que possuem um maior poder aquisitivo chegam mais rápido ao atendimento, o que acaba reproduzindo alguns processos da sociedade como um todo.
Diz-se que doenças são democráticas, pois podem atingir qualquer pessoa, mas o atendimento, na minha avaliação, não é democrático. Nos convênios, esse atendimento também é ruim, mas o contingente de pessoas que procuram assistência nesse âmbito é menor. As pessoas que usam a rede do SUS estão em número maior, e aí prevalecem as más condições, poucos médicos, atendimento mais demorado...
Dessa forma, temos de torcer para que o calor chegue o mais rapidamente possível, para diminuir as possibilidades de as pessoas em ambientes fechados transmitirem ainda mais o vírus.
Tenho certeza de que o problema começará mesmo quando forem atingidas as camadas mais pobres da população, como já estamos vendo.
CC: Tendo em vista essa nossa estrutura de saúde pública e lembrando o exemplo da dengue em 2008, o que vislumbra para os próximos meses? Podemos esperar por hospitais lotados, carência de atendimento, em suma, um quadro realmente alarmante caso o vírus continue se disseminando por um tempo?
SD: É uma incógnita. O comportamento do vírus é semelhante ao do vírus sazonal. Todo vírus influenza atinge um número maior de pessoas nas épocas mais frias do ano. Acho que, com o tempo esquentando, poderemos respirar mais aliviados. É diferente da dengue, cujo mosquito se desenvolve mais depois das chuvas.
Se não fosse uma doença sazonal, acho que teríamos de nos preocupar com uma quantidade muito maior de casos, pois sabemos que o acesso e a assistência de saúde são ruins aqui.
CC: Especificamente em São Paulo, o que se pode dizer da situação? O clima e a poluição da cidade podem exercer alguma influência negativa?
SD: Vou falar mais ou menos em cima do que aprendi na escola, pois, se dissesse que tenho clareza para tratar disso, seria besteira. Na minha época de faculdade, tive um professor que era diferente, pois não era homeopata, e sim um patologista. E ele dizia que quem mora nas cidades poluídas tem uma doença no pulmão que se chama antracose (quando se vê o pulmão, podem-se notar vários risquinhos pretos por conta da poluição) e ele achava que isso até servia de proteção contra outras patologias. Mas essa é uma visão muito particular dele, e sinceramente não sei te responder intuitivamente. É óbvio que, se a pessoa vive num lugar mais poluído, com más condições de vida, estará mais enfraquecida e predisposta a contrair outras doenças. Mas não sei se nesses casos de morte houve uma pneumonia pelo fato de o vírus atingir as vias respiratórias baixas.
CC: Pensa que a mídia vem fazendo muito alarmismo em torno do surto? Como analisa o viés da cobertura e da abordagem da doença?
SD: Acho que a mídia burguesa não se importa sinceramente com a população e não tem a preocupação de informar bem acima de tudo. Tivemos casos que não se enquadravam como suspeitos e a mídia saía alardeando como se fossem.
Acho que não se pode chamar de alarmismo, mas de oportunismo. De tudo que possa dar ibope, vender, eles se apropriam.
No entanto, tenho a impressão de que há muitos fatos dos quais a mídia não tem nem conhecimento. Creio que estejam ocorrendo casos por aí que me deixam em dúvida sobre a precisão desses números...
CC: Até porque, com as dificuldades de acesso à saúde, muitos casos podem ficar sem sequer ser contabilizados, não?
SD: Sim, até porque neste momento, quando se tem uma epidemia já instalada, a própria orientação do Ministério da Saúde é para não se fazer mais busca ativa. Por exemplo, se há alguém na família que teve influenza A, já não se pesquisará mais casos na mesma família. Isso porque a vigilância epidemiológica não acredita muito que funcione tal expediente.
Portanto, o que, teoricamente, deve ser feito? Educação em massa – não vi nenhuma propaganda na televisão -, pois, apesar de o Ministério da Saúde disponibilizar um panfleto em seu site, creio que é um material extremamente elitista; muitas figuras, coisas escritas, sem que haja campanhas – se ocorrem, desconheço – de visita de porta em porta, não para buscar casos, e sim para educar.
A medida de afastar as crianças da escola pode até ser eficiente, mas assim não se educam as crianças que poderiam levar informações para casa. E em muitas famílias, os pais não lêem e as crianças têm um nível maior de informação.
Não dá para se comunicar usando a mesma linguagem com a pessoa que viaja para os EUA e com o caminhoneiro. Falo deles, pois agora nosso foco são os caminhoneiros. Fizemos discussões com técnicos, pessoas que trabalham nos terminais... É lógico que nada se esgota, mas esse é um trabalhador que dorme mal, come mal, viaja o país todo, tem de ficar acordado por longos períodos, e, sendo assim, é uma população que, tal como outras, merecia das autoridades um material específico.
Até mesmo a questão de se denominar o surto de influenza A. Será que ficará tão fácil de as pessoas entenderem? Tenho minhas dúvidas, creio que não. Não que se deva usar uma linguagem rebaixada com o povo, mas deve ser ao menos acessível.
CC: Aliás, qual seria a denominação mais apropriada para o surto?
SD: Veja bem, começou como gripe suína. Acho que tinha de ser gripe suína, gripe do porco. Foram os criadores de porcos que fizeram toda uma pressão pela mudança de denominação, de modo a retirar a associação com o animal. Mas fica muito difícil para a população entender neste momento que gripe agora é influenza.
Penso, ademais, que o caminho para o governo é buscar a quebra de patentes, porque estão falando para as pessoas não comprarem nada, mas há várias pessoas indo para o Paraguai buscar um remédio chamado ‘La Porcina’, um genérico do medicamento recomendado contra a gripe, feito por lá. E tem muito brasileiro indo para o Paraguai comprá-lo.
É lógico que é complicado colocar tal tipo de medicação para vender em qualquer farmácia da esquina. Quem tem poder aquisitivo ia comprar. Ou até quem não tem ia dar um jeito também. E a automedicação também é perigosa. Se nossa assistência à saúde é ruim, a automedicação, no meu entender, é pior, pois a pessoa não sabe se realmente é aquilo que se deve tomar.
Portanto, o Brasil e os países subdesenvolvidos deveriam fazer um esforço pela quebra de patentes.
CC: É possível reverter o crescente quadro de contágios ou se trata de uma contingência que vai além do que podem fazer as autoridades? Quais os melhores caminhos para controlar o surto até sua superação total?
SD: O ideal para ser feito neste momento, sob a ótica do mundo em que vivemos, seria campanhas educativas massivas, fazendo de cada indivíduo um autêntico cidadão. Que ele pudesse se responsabilizar (óbvio que não pelas condições de saúde do país), ter material específico e que pelo menos os hospitais públicos fossem equipados e todos os seus profissionais treinados, com medicamentos.
Não adianta ter remédio para todos e a pessoa não saber quando procurar o médico. É nesse sentido que se deve educar. Porque o pessoal se desespera, faz filas longas e, com o contato de tanta gente aglomerada, aumentam-se as chances de contágio. Não adianta ter o medicamento sem a população educada e um profissional que saiba tratar e encaminhar cada paciente.
O que se precisa é de investimento. Para conter esse surto, ter saúde de qualidade, precisa de grana, não tem jeito! Para ter material educativo suficiente, medicamento, treinamento, criar vagas nos hospitais.
Em um encontro da saúde, o economista Aquilas Mendes desmistificou completamente os investimentos da saúde, mostrando que se investe muito menos do que se diz. Eu trabalho na vigilância sanitária e é a ANVISA que dá registro para tudo. E ele colocou o seguinte: muita gente diz que não usa a saúde pública. Mas e a pasta de dente, quem fiscaliza, dá o registro? É o serviço de saúde pública. Ou seja, mesmo aqueles que entendem que não precisam, usam e necessitam da estrutura da saúde pública.
E para melhorar isso só com mais verba, concurso público, campanhas educativas adequadas, atendimento, medicamento, porque uma coisa é certa: uma gripe é diferente da dengue. Nessa gripe, o vírus é passado entre humanos, ao contrário da gripe do frango, na qual o vírus não passou por essa mutação – ainda bem, pois era muito mais grave. Portanto, fica muito difícil de controlar, mas o que precisa mesmo é de investimentos. CC: Quer dizer, para ao menos amenizar o surto e também garantir um tratamento adequado e educativo à população, o governo teria de fazer exatamente o oposto do que vem realizando na área de saúde pública, seguindo uma lógica de desmonte do setor, e até mesmo o que nunca faz, no caso enfrentar um peixe grande da indústria farmacêutica.
SD: Venho refletindo há um tempo sobre um outro problema. Estamos numa região em que praticamente só há faculdades privadas. Acontece no país todo, mas creio que no estado de São Paulo existam mais faculdades privadas de medicina. Seus alunos pagam 3,5 mil, 4 mil reais por mês de faculdade, logo, são pessoas de poder aquisitivo super alto, filhos da burguesia mesmo, que não trabalham. E o que acontece? Durante seus estágios, cria-se uma ilusão para a população de que ela é bem atendida, mas na verdade essas pessoas são usadas e têm seus corpos apropriados. Aí, quando os alunos se formam, não devem nada a essas pessoas, pois já pagaram a faculdade.
Sem falar das más condições de ensino que não formam bem os profissionais. Os serviços públicos aqui da minha região (Baixada Santista) têm dificuldade de fazer concurso para médicos. Já li algumas coisas sobre isso, e nos locais mais afastados também há essa dificuldade.
Enfim, temos também a questão da indústria das faculdades de medicina, da indústria farmacêutica. A Roche, detentora do Tamiflu, é uma patente muito difícil de quebrar. Mas o governo e os movimentos populares deveriam buscar a quebra de patente, fazer algo contra essas escolas de medicina, que não educam nem ensinam o sujeito a ser um bom profissional da saúde e que usam as pessoas, descartando-as quando não servem mais. Posso estar misturando muito, pois creio ser uma coisa muito complicada, um ciclo vicioso.
A população vive mal, em más condições, se alimenta mal... A menina que trabalha na minha casa mora na palafita do Guarujá. Agora até conseguiu comprar madeirite para tapar os buracos do barraco. Mas é um frio terrível, com muita umidade e sujeira que vem do mangue. Uma noite ela acordou com um caranguejo na barriga de cada filhinho dela. Ou seja, saúde não é só remédio, um médico, é todo um conjunto.
CC: Nos primeiros dias da gripe, um servidor da ANVISA por nós entrevistado disse que o país não estava preparado em sua fiscalização de portos, aeroportos e fronteiras, o que poderia facilitar a entrada do vírus. Com o desenrolar dos fatos, essa tese pode ser considerada verdadeira? Faltaram pessoas para compor equipes de fiscalização e assim aumentar o rigor sobre as entradas no país?
SD: Tenho uma posição um pouco diferente dessa. Acho, sim, que o país não estava preparado, que temos poucos funcionários e deveríamos melhorar. Mas, além dos portos, aeroportos e fronteiras, temos poucos servidores no posto de saúde, no programa de saúde da família, nos hospitais públicos e privados. Eu enxergo a saúde como um todo.
No entanto, o que ocorreu na China na época da gripe aviária? Contiveram as pessoas e pronto. Aqui não temos poder para isso, podemos apenas intensificar as campanhas educativas. E aí depende também do material que o ministério e a ANVISA produzem, que a meu ver não é para um trabalhador de fronteira. Pode até ser para quem passa pelo aeroporto, mas, para o trabalhador de porto, de fronteira, possui uma linguagem difícil. Acho que falar em coisas como ‘etiqueta respiratória’ não pega bem. Por mais trabalhadores treinados e preparados que tivéssemos, precisaríamos ter um material muito adequado.
Além do mais, vivemos numa sociedade que não iria interferir ou atrapalhar seu comércio em nome da saúde. Não iria fechar fronteira. Tanto que houve uma mudança no atual regulamento sanitário internacional, que ficou diferente. Quando vemos, por exemplo, casos de febre amarela pelo mundo, eles aumentam. A legislação em relação à febre amarela ficou mais flexível. O servidor da ANVISA executa a fiscalização amparado na legislação. Temos, ademais, pessoas experientes, no entanto, somos poucos servidores. São capacitados, treinados e alguns buscaram seu próprio treinamento sem necessariamente precisar da instituição, mas existe a dificuldade do contexto.
Não vamos fechar fronteiras. No sistema capitalista não se fecham fronteiras, não vamos impedir que as pessoas entrem e saiam. Os pacotes das agências de turismo já estão vendidos, funcionamos sob esta lógica. O sujeito não vai impedir o filho de viajar para uma área de incidência da doença porque já pagou a viagem. A gente pensa e vive com essa ótica. Nossos caminhoneiros tiveram um atendimento ruim, sem dúvida, mas, pela pressão do trabalho, vejo que eles têm muito desespero em entregar a carga a tempo. Quer dizer, a pressão do trabalho faz a pessoa expor sua saúde.
Está muito fácil para o governo dizer que ninguém vai à aula até dia 17. E os pais que não podem deixar de trabalhar e não têm com quem deixar os filhos? Para o governo, está se evitando novos casos com as crianças fora da escola, mas onde ficam essas crianças? A qual risco estão expostas nos lugares em que moram? Algumas não morrem de gripe, mas ficam entregues à violência.
CC: E há quem diga que as vítimas mais propícias são as pessoas de idade adulta.
SD: Isso. Crianças até dois anos e o adulto jovem. Vi uma explicação de um infectologista que entende que as crianças maiores e os mais velhos são mais imunes. Quanto mais velha, mais contatos com microorganismos semelhantes a este vírus a pessoa já teve, e isso poderia ser uma explicação. Tanto que a vacina é dada prioritariamente nos mais velhos, que sofrem mais de diabetes, hipertensão, enfisema...
CC: E como você analisa a atuação do Ministério da Saúde neste período do surto?
SD: Acho que o Ministério começou com um discurso muito de pano quente, batendo na tecla de que estava preparado. Foi este o discurso. Deveria ter se preparado de fato, ter buscado quebrar patentes de medicamentos... Não sei como anda a questão da vacina, somente que sairá em 2010, mas não tenho idéia de quantas doses o Instituto Butantan poderá fazer. Pois é óbvio que, com a vacina sendo produzida lá fora, os grandes irão comprar tudo, se já não o fizeram, pois, pelo que me informei, já tinham comprado grande parte.
De toda forma, o Ministério da Saúde, num primeiro momento, achou que não seria tudo isso, desvalorizou uma possível pandemia e até a capacidade do vírus da doença, e em minha opinião não tomou as medidas que poderia ter adotado. Não penso que evitaria, mas poderia estar em outro patamar. Não sei se algumas mortes não poderiam ter sido evitadas.
Gabriel Brito é jornalista.
|
A podridão da mídia corporativa de esgoto...
Veja as demais partes no youtube,mas o que fica evidente nessa discussão "midiática" é que a midia corporativa brasileira está em mãos de mafiosos e quadrilheiros e se utilizam de práticas obscuras e manipuladoras para enganar e esconder na população os fatos da realidade, buscando sempre a favorecer aqueles que as sustentam, ou melhor, as grande corporações que dominam economicamente o mundo globalizado.
CPERS em marcha rumo ao Piratini...
Marco Aurélio Weissheimer participa, hoje, na Rádio Guaíba, do programa Espaço Aberto, capitaneado pelo jornalista Gustavo Motta. O entrevistado será Fábio Medina Osório, advogado da governadora Yeda Crusius (PSDB).
O programa inicia às 13h15min e vai até às 14h30min. Ouça aqui.
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
Massacre em Gaza...
Este relatório elaborado por Ahmad Jaradat para o Centro de Informação alternativa é um detalhado documento sobre os métodos israelenses na prática continuada do holocausto do povo palestino, às mãos dos israelenses, perante o silêncio cúmplice dos governos, nomeadamente dos EUA, da UE.
Maio/Junho 2009 Hebron e Sul da Cisjordânia
Na noite de primeiro de maio, aproximadamente 20 colonos do assentamento de Bat Ayin, norte de Hebron, abriram fogo contra casas na vila Palestina de Safa. Os colonos queimaram um campo de plantação de trigo de propriedade do fazendeiro Mohammed Husain Musleh Adi. Moradores da vila de Safa e de outras vilas próximas reuniram-se após os alto-falantes da mesquita emitirem a notificação da violência. Moradores atiraram pedras nos colonos com o intuito de proteger suas vidas e casas. Após chegar ao local, o exército Israelense anunciou o fechamento da área como zona militar. Em seguida, soldados Israelenses permaneceram nos check points (áreas de controle) nas vias que conduzem à vila, sem tomar qualquer atitude a fim de frear a atitudes dos colonos. Há duas semanas atrás colonos de Bat Ayin também arrancaram dezenas de pés de oliva em uma área próxima ao assentamento.
Também em primeiro de maio, escavadeiras Israelenses, sob proteção militar, nivelaram 1 hectare de terra próxima ao assentamento de Ale’azer, localizado ao sul da vila palestinesa de al-Khader. O local é chamado Abu Bakeer e fica no distrito de Bethlehem. A área afetada, contendo plantação de uvas, pertence à família de Salah. O prefeito de al-Khader, Ramzi Salah, comentou que a destruição objetiva expandir os assentamentos vizinhos.
Em sete de maio, colonos armados do assentamento Bat Avin obstaculizaram agricultores de Bait Omar de chegar às suas terras. Colonos atiraram no ar quando os fazendeiros tentaram chegar às terras localizadas em Ain al-Baida, fazendo com que estes deixassem o local.
No dia 12 de maio, colonos dos assentamentos de Giv’at e Kiryat Arba atacaram um grupo de palestineses e internacionais que se encontravam em Buwaira, a leste de Hebron. Os manifestantes uniram-se para protestar o confiscamento de terras na área. Hashem al-Azza, ativista de 45 anos, foi agredido na cabeça após os colonos terem chego e atirado pedras no grupo. O exército repetidamente auxilia os colonos no ataque aos manifestantes.
Em 17 (dezessete) de maio, dezenas de colonos em cooperação com membros extremistas Knesset do Partido Nacional Israelense (Israelli National Party) manifestaram pelas ruas de cidade antiga de Hebron. O encontro foi realizado sob direção de um membro do parlamento Israelense (Knesset), Yakov Katz, do Partido Ichud Leumi. O ministro da Defesa Ehud Barak concedeu a permissão ao grupo para visitar a cidade. Novas fontes descreveram a visita como um ato de encorajamento aos assentamentos na Cidade Velha (Hebron) e reforço aos postos já existentes. Desde o começo da manhã, o exército Israeliense fechou as lojas e as ruas na área afetada e intensificou as atividades relativas aos check points. Em algumas áreas da cidade, organizações locais Palestinesas, internacionais, e membros árabes do parlamento (Knesset) juntaram-se em protesto à visita.
Em 19 de junho, oficiais da Administração Civil Israelense emitiram ordens de demolição das casas de cinco famílias em Hebron, as quais estão localizadas em Hejra, no sul da cidade e dois kilometros a leste do assentamento Bait Hagai. Referidas casas estão próximas à Rodovia Número 60, que serve aos assentamentos. Segundo o Comitê pela Defesa de Terras tais ordens foram emitidas a palestineses que não podem construir ou expandir suas casas por residirem na Área C, na qual é quase impossível obter permissões para construção. No entanto, assentamentos e rodovias para os assentamentos continuam nesta área. O Comissário Abed al-Hadi Hantash disse que desde o começo deste ano, aproximadamente 90 ordens de demolição de casas foram entregues a palestineses, particularmente na área ao sul de Hebron, onde o projeto de assentamentos é ativo.
Ainda em 19 de maio, uma colona do assentamento de Kiryat Arba atropelou uma criança de três anos de idade. O incidente ocorreu em uma das principais vias da área de al-Ra, lado leste do assentamento. A mesma tentou escapar mas locais a impediram, sendo que o exército, ao final, permitiu que esta deixasse o local. A criança, Jalela Mus’ab al-Ja’bari, foi levada ao Hospital de Hebron para ser tratada, sendo diagnosticada como caso de média gravidade.
Em 24 de maio, quatro agricultores das vilas de Om El-Muqfera e Om Toba, sudeste de Yatta, restaram machucados quando foram atacados por aproximadamente 20 colonos, usando pedras e estacas, enquanto os agricultores pastoreavam suas cabras na terra a oeste do assentamento. Os mesmos, Ismael Abu Qubaita, Issa Jebreel Makhamreh, Ibraheem ali El-Zain e Ali Mohammed Makhamreh foram levados a centros médico em Yatta para receber tratamento.
Em 30 de maio, colonos do assentamento de Bat Ayin atacaram agricultores que vinham trabalhar em uma área sul do assentamento. Jamla Mohammed Husain Adi, 45, e sua filha Mai Ibraheem Thaljee, 3, restaram machucadas quando os colonos as atiraram por terra e tentaram expulsá-las da propriedade. Internacionais também foram atacados, no referido evento, por colonos que atiravam pedras. Mohammed Ayyad Awad, ativista do Movimento Solidário Internacional (International Solidarity Movement – ISM), disse que os ataques ocorreram com a presença do exército, não tendo feito nada para acabar com os ataques. Ademais, o exército declarou a área como zona militar, forçando os fazendeiros e internacionais, who came to pick crops alongside the farmers, a deixar o local. Alguns fazendeiros e ativistas Israelenses foram detidos por horas pelo exército.
No dia 8 de junho, escavadeiras do exército danificaram e nivelaram 4 hectares de terra na área de Baq’a, nordeste de hebron, e danificaram sete lagos artificiais. Referida terra, de propriedade de Yahya Saeed Jaber, Mohammed Nader Jaber, Azmi Abed El-Azeez Jaber, Abedel Wahhab Jaber, Jawad Abed El-Jawwad Rajabi e Ziyad Hammouda Jaber, vinha sendo usada para o cultivo de uvas. Os 4 hectares serão confiscados para os assentamentos de Kiryat Arba e Giv’at Harsina.
Em 13 de junho, colonos de Kiryat Arba e outros assentamentos repetiram os ataques contra residentes de Wadi Husain, que fica a oeste do assentamento. Segundo um dos residentes de Wadi Husain, Fahd Ja’bari, os colonos hostilizam os moradores das vilas jogando pedras em suas casas e perseguindo crianças na rua principal.
No dia 17 de junho, uma nova onda de ataques teve início na vila de Om al-Khair, ao sul de Hebron. Colonos provindos das vizinhanças do assentamento de Karmiel atiraram pedras em pastores para forçá-los a deixar a área vizinha ao assentamento. Tareq Salem Hadaleen, 16, foi ferido na cabeça por uma pedra. Soldados Israelenses chegaram ao local proclamando a área zona militar fechada e auxiliando os colonos a manter os agricultores fora da mesma. Em um pronunciamento (statement) para AIC, Yasser Hadaleen disse que tais ataques tem como objetivo forçar os moradores a deixar suas terras, especialmente as que estão localizadas a leste do assentamento de Karmeal, a fim de tornar mais fácil o confisco das terras. No entanto, embora tais ataques sejam realizados em cooperação com o exército, Hadaleen disse que os moradores da vila não pretendem deixá-la. Também comentou que ao invés de tentar impedir os ataques dos colonos, o exército diz não querer problemas – e simplesmente declara a área uma zona militar fechada.
Em 19 de junho, um grupo de colonos do assentamento de Beit’Ain queimaram uma área arborizada pertencente às famílias das vilas de Bait Omar e Soreef; cerca de 120 árvores foram destruídas pelo fogo. Mohammed Ayyad Awad, um ativista do movimento solidário, disse que a cada dia o movimento solidário é informado de agressões similares e a queimada de árvores ocorre constantemente.
No dia 20 de junho, vários internacionais e residentes de Beit Omar foram feridos quando colonos, com o auxílio do exército, atacaram dezenas de agricultores e membros de grupos solidários que os ajudavam a trabalhar em suas terras, adjacentes à Bait Omar. Os colonos chegaram do assentamento vizinho de Beit’Ain e atiraram pedras. Por meses, colonos deste assentamento tem atacado agricultores; segundo o Comitê de Defesa de Terras 11 ataques foram registrados desde Abril, entre eles queimada de árvores e agressões físicas aos agricultores.
Em 21 de junho, três moradores da vila Palestinesa de Sosya, sudoeste de Yatta, foram lesados quando colonos do assentamento vizinho de Susiya atearam fogo às tendas nas primeiras horas da manhã, quando estes ainda dormiam. Abed El-Rahman Mohammed Jawaj’a, 22, Yahya Khaled Nawaj’a, 21, e Ibrahim Mohammed Khaleel Nawaj’a, 22 anos, foram feridos durante o ataque. Em um ataque análogo, dois meses atrás, colonos do mesmo assentamento tentaram queimar outra tenda, mas uma multidão conseguiu evitar o episódio. Dezembro passado colonos incendiaram duas tendas pertencentes à Sara Salamah Nawaj’a e Mohammed Jaber Nawaj’a.
Em 22 de junho, colonos de Bait’Ain executaram novos ataques contra a propriedade que fica ao sul do assentamento. Desta vez, os mesmos cortaram 200 pés de uva e oliveiras pertencentes à Hammad Jaber Sulaibi e Fahd Jaber Slaibi. No mesmo ataque, estes também queimaram cerca de um hectare de terra.
Ainda em 22 de junho, em cooperação com o exército, colonos da área de Bethlehem, assentamentos de Juv’ot, Navi Danial e Bettar, nivelaram cerca de 4 hectares de área plantada ao sul da cidade de Nahhalen, a qual pertence às famílias de Fannon, Shakarneh and Al-Shaikh. A destruição da propriedade tem como objetivo a construção de redes de água e eletricidade que servirão aos assentamentos na área. O Conselheiro Municipal Chairman Mohammed Ghayada relatou que referido projeto de construção de infra-estrutura para o assentamento implicará na perda ou isolamento de mais de 330 hectares da área pertencente à vila. Segundo o mesmo, desde 1967, sua cidade perdeu 1500 hectares para os projetos de assentamento, acrescentando que grande parte das terras foram confiscadas. A vila já está cercada por todos os lados por assentamentos, os quais se encontram muito perto aos prédios locais e afetam negativamente seu desenvolvimento.
Nablus e Norte da Cisjordânia
Em primeiro de maio, colonos da fronteira do assentamento de Gi’ad, leste de Qalqilya, atacaram o agricultor Mohammed Ahmed Abu Baker, 20 anos de idade, da vila de Jet. O jovem trabalhava em sua terra vizinha a fronteira quando cinco colonos chegaram, o agrediram e borrifaram material que provoca queimaduras em sua face. O mesmo sofreu ferimentos na cabeça e nas costas quando soldados o jogaram por terra e o espancaram com pedras, tendo ainda danificado seu trator. Mohammed foi levado ao Hospital Darweesh Nazzal em Nablus.
Em 13 de maio, no distrito de Jenin, aproximadamente 40 colonos ergueram tendas nas ruínas do assentamento Homish, que foi desmontado em 2005. Os colonos organizam protestos periodicamente contra o desmantelamento do assentamento e às vezes empreendem ataques contra residentes da vila de al-Daher. Na referida ocasião, colonos arremessaram pedras contra carros Palestineses na estrada principal da vila.
O exército fechou a área através de check points.
No dia 21 de maio, dezenas de colonos provenientes do assentamento de Itsehar, sul de Nablus, destruíram 1 hectar de terra destinada ao cultivo de trigo. A mesma localiza-se em Khallet as-Sewar e é de propriedade do agricultor Mohammed Reda. Fontes Palestinesas em Nablus dizem que esta não é a primeira vez que a área tem sido alvo de ataques por colonos de Itsehar.
Em 22 de maio, a Autoridade Israelense emitiu ordem de confisco de 30 hectares de terra em El-Qatayen, distrito de Jenin. Referidos hectares pertencem às famílias da vila de Ya’bad e Tora El-Gharbiyya. Segundo a ordem de confisco, agricultores devem retirar o que precisam no prazo de 45 dias.
Mohammed Qabaha, que detém 6 hectares de terra junto à area afetada, disse à AIC que “Oficiais da Adminstração Civil chegaram ao local trazendo as ordens de confisco e mapas que demonstram as fronteiras da terra”. O terreno é cultivado por árvores e de propriedade de Mohammed Eid Qabaha, Anees Hasan Qabaha, Mohammed Shareef Zaid, Adnan Ismael Zaid, Husni Zaid, Mohammed Othman Abbadi, Saleh Azeez Zaid, Mohammed Ismael Qabaha e Awwad Rafeeq Deeb. Qabaha acrescentou que cada agricultor possui os documentos atestando o direito de propriedade da terra. Referido confisco causará a perda da principal fonte de renda para cerca de 13 famílias. Palestineses suspeitam que o objetivo por trás desta ação será a construção de um novo assentamento no local.
Em 22 de maio, colonos do assentamento de Itsehar queimaram um campo de trigo de propriedade de uma família da vila de Boreen, na parte sul do distrito. O proprietário Mohammed Raja disse que 2 hectares de terra plantados com trigo foram queimados pelos colonos. A terra está localizada em Khallet Iswar. Brigadas de Incêndio de cidades vizinhas deteram o fogo enquanto oficiais Israelenses do DCO (Escritório de Coordenação e Ligação em assuntos de segurança) documentavam a agressão.
No mesmo dia, outro grupo de colonos de assentamentos ao sul de Nablus atacaram agricultores da vila de Oreef enquanto estes colhiam trigo. Agressões físicas ocorreram entre colonos e agricultores até a chegada do exército para conter o incidente.
Em sete de junho, dezenas de organizações locais e agricultores encontraram-se na Câmara Municipal de Aneen, leste de Jenin, com o intuito de discutir os ataques diários dos colonos às terras. O prefeito de Aneen, Rabah Yaseen, disse que 1.150 hectares de terra, a maioria com plantações, atualmente estão do outro lado do “Muro” (Separation Wall) e, em consequência, difícil de serem alcançadas pelos agricultores. Por diversos meses colonos tem danificado as terras, permitindo também suas cabras de se alimentarem junto as árvores. O problema chamou a atenção de oficiais Israelenses, mas nada tem sido feito para prevenir que a terra, do lado de fora do Muro, sejam danificadas pelos colonos. Moradores da área agrícola dos assentamentos e pessoas de Israel continuam a portar suas vacas e cabras para a área. Entretanto, fazendeiros não podem acessar suas terras para o cultivo pois a permissão é geralmente garantida somente durante a época de colheita.
No dia 8 de junho, colonos do assentamento de Itamar, leste de Nablus, queimaram 2 hectares de área plantada com oliveiras. A terra tem como proprietário Amjad Sulaiman Qawareeq, da vila de Awarta. Segundo Ghassan Duglas, interlocutor para atividades dos assentamentos no norte da Cisjordânia, os ataques pelos colonos no Distrito de Nablus tem sido intensos nas últimas duas semans, particularmente involvendo colonos do assentamentos de Itsehar e Itamar.
Em 26 de junho, aproximadamente 50 colonos dos assentamentos do Distrito de Tulkarem ergueram tendas nas terras pertencentes a Ibrahim Kayed, da vila de kufer Labad, leste de Nablus, tendo tambem levantado uma bandeira Israelense na àrea. Os colonos levantaram uma bandeira na área. Kayed comentou que quando ele e seus filhos juntaram-se ao protesto, os colonos atiraram pedras e bateram nele e em seus filhos Samer, 30, e Jamal, 20. Ambos foram levados a uma clínica em função das lesões na cabeça e braços. Fontes em Nablus dizem que os colonos pretendem construir um novo posto no local, especialmente em razão de que esta não é a primeira vez que os mesmos encenaram uma manifestação nesta terra.
Créditos: www.odiario.info
Tradução de Maria Theresa Reginatto
Cidades de tendas nos EUA
Cidades de tendas brotando por todos os EUA estão enchendo-se com os desempregados e sem-abrigo resultantes da pior crise econômica desde os anos 30. Enquanto os norte-americanos vivem em tendas, o governo Obama embarca num programa de construção de uma mega-embaixada de um bilhão de dólares em Islamabad, no Paquistão, para rivalizar com aquela construída pelo governo Bush em Bagdá.
[*] Ex-assistente do secretário do Tesouro na administração Reagan, co-autor de The Tyranny of Good Intentions .
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Os caminhos da direita:
Trocar seis por meia dúzia
Por Leonardo Gomes,A cada dia, a cada acontecimento, ou melhor, a cada ação política a direita vai mostrando concretamente a sua força. Durante algum tempo, após os episódios dos golpes militares e, por conseguinte, as torturas, a direita manteve-se à espreita na política. Revestida por um verniz típico da sociedade pequeno-burguesa, ela se reorganizou e tentou adotar um discurso light para uma volta triunfal. Mas que reorganização a direita está pondo em prática? Quais são seus novos interesses? São novos ou são os mesmos?
A burguesia ascendeu quando o renascimento comercial e urbano fixou-se. Logo, a classe social que emergiu na Europa, no século XI, fora a burguesia que dedicava-se às atividades financeiras, e acima de tudo, ao comércio. O que pouca gente sabe é que os burgueses eram moradores dos burgos, ou seja, cidades revestidas por muros, e ainda, que eram preteridos pelos nobres e pelos artesãos. A partir desta organização, mesmo sem saber, a burguesia seria a mãe do capitalismo, responsável pela transformação do mundo nesta grande fazenda de poucos donos e muitos empregados-escravos.
Pois bem, para adentrar nos meandros da política estimulando o comércio, a burguesia também precisou se reinventar. Ou, ainda, mascarar-se de popular. Afastada do centro do poder, pela nobreza, começou a apoiar revoluções onde o proletariado surgia. Muitas revoluções, principalmente a americana, tiveram o apoio da burguesia, para a perpetuação do comércio e a fixação da burguesia na política.
Séculos mais tarde, viu-se uma inversão nos papéis. Aquela classe social alta que ficava à margem da discussão política, agora tornava-se a principal responsável pela organização da direita. A burguesia, com o lucro do comércio, leia-se exploração do proletariado, pôde financiar governos e golpes, que puseram fim às monarquias e introduziam repúblicas que atuavam sob a égide do retorno financeiro. Patrocinar a troca da monarquia pela democracia republicana fora a ação mais lucrativa da dominação da direita.
Para tanto, os séculos se passaram e a direita se perdeu no afã do lucro. Instituíram governos que foram apedrejados pela organização popular, dividiram o mundo entre ricos e pobres e viram as enormes periferias criadas. Insuflaram o capitalismo com o liberalismo, e depois o neoliberalismo, e viram a China, um país comunista, ser a maior economia do mundo capitalista. Empreenderam tanto a lógica do lucro, da economia globalizada, dos amplos avanços tecnológicos, das commodities, e se esqueceram que viviam da especulação e quebraram. Aliás, tentaram quebrar o mundo.
Ao arquitetarem a sua glória na política, esqueceram de combinar com a massa e tiveram mais uma vez que se reinventar. Primeiro disseram que o estigma de direita e esquerda não existia mais, falaram que todos nós éramos liberais, mas não colou. Depois tentaram empurrar, via “mídia abaixo”, que a crise era mundial, e viram os países do BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China), com governos seja na base, seja na atualidade, de centro-esquerda, entrarem e saírem da tal crise com muita segurança. Aliás, países que formam um bloco que será o maior do planeta dentro de alguns anos. Sem conseguir o apoio necessário para se reestruturar, a direita dispôs dois exemplos mais duros.
Para os latinoamericanos, mostrou toda a sua crueldade ao tomar um governo democrático por um golpe militar em Honduras. E, para o mundo, colocou na agenda da mídia a famosa gripe do porco. De um lado mostraram-se vivos contra quaisquer insurgências populares, e de outro lado comprovaram o apoio do seu principal partido, a mídia, que propagou a gripe como novo temor mundial. Ou seja, a pauta não é mais a crise, mas a gripe. Esquecem de dizer que meio milhão de pessoas morrem no Brasil vítima da gripe “comum”. E quantas morrem de dengue? De fome? Até hoje morrem do impaludismo.
Logo, com um discurso convicto e se reabastecendo financeiramente a direita se prepara para recuperar o espaço que perderam para o seu próprio ego. E como estão se reorganizando? Proibindo os bailes funk, como se todo funkeiro fosse marginal. Proibindo com veemência os camelôs e deixando livres grandes lojas sonegadoras de impostos. Cercando as favelas com muros. Construindo presídios em detrimento das escolas. Tratando a maconha como uma droga destruídora de lares, mas permitindo “padres-cantores”, que destilam o seu bálsamo, ou melhor, a sua onda da bitolação. Tantos são os novos caminhos de reagrupamento da direita… Entretanto, um vem chamando mais a atenção, um “novo-velho” caminho é a nova base da direita.
Com o valoroso apoio da mídia, a direita que teve que engolir um torneiro mecânico e um negro presidente. E a tática escolhida é atacar onde estes triunfam. Onde o povo tem mais acesso e possibilidade de transformação, na política. Agora, mais do que nunca, todo político é corrupto. Existe uma grande campanha para a população definitivamente achar que não precisa do político para nada. E assim sendo, a lacuna para a grande festa da direita está aberta. Portanto, o grande caminho da direita é a descaracterização total da classe política para agir novamente de acordo com a sua conveniência. Mas, se não bastasse a campanha de descaracterização da classe política, a direita já dá o seu toque para o grandioso retorno. Imprime na sociedade um modelo do novo político. Oriundo dos partidos comprometidos com a direita, da sociedade organizada, o novo político é centrado, sério, coeso e altamente distante das camadas menos abastadas. O novo político é técnico, frio e, acima de tudo, sem qualquer formação política. Ele só fala por números. Ele é cercado por um grupo de burgueses. Ou seja, ele é o produto da necessidade da direita. E como ele fica popular? Com a necessidade da população em moralizar a política.
Tudo é milimetricamente controlado e orquestrado, nada foge à sua alçada. Tudo deve ser controlado e observado. Números, resultados, a política é norteada como uma empresa. As campanhas são totalmente profissionalizadas. Ele deve estar afastado dos políticos de carreira. Aliás, político de carreira para eles é um grande temor. São tratados como vagabundos, invariavelmente. O novo político que nasce do berço da burguesia é tão velho quando o surgimento da própria burguesia. Este é um modelo obsoleto e totalmente reacionário. Este modelo de político tenta voltar à cena em vários países do mundo e não é possível que não percebamos uma manobra tão velha como esta.
Por fim, sabemos dos erros que muitos políticos cometem. Muitos se perpetuam anos a fio com a corrupção desenfreada. Outros ficam pelo caminho. Porém, sabemos que o país vive uma crise de identidade da classe política muito mais pela necessidade de lucro da direita que da melhoria do povo. Devemos acreditar em políticos sérios, íntegros, honestos? Não, isso é um comportamento comum de qualquer ser humano. A necessidade da política é para a transformação da realidade de um povo sofrido, retirante, e muitas vezes, “criminalizado”. E somente um político pautado nesta transformação poderá mudar qualquer realidade. Mudar não é trocar, mudar é transformar. E colocar um novo nome viciado pela direita, arrebatado pelo novo espectro político “buguês-midiático”, significa atraso e não mudança.
O povo deve, além de observar a história do político, quem o acompanha. Quem são seus pares? O que eles já fizeram pela melhoria dos menos favorecidos? De onde vieram? Quais são seus interesses na política? E não me venham com apoios a orfanatos e outras ações se o povo continua à margem do poder decisório. O verdadeiro político tem na sua base a representação popular, as vozes dos guetos e os sons mais ouvidos de seus pares são sonoros “nãos”, capazes de tirar-lhe qualquer tentação déspota que as urnas podem dar. O verdadeiro político é tomado pela indignação que ferve o sangue das suas veias. O verdadeiro político é de carne e osso. Adotar o pensamento da burguesia de que os políticos devem ser somente técnicos é mais uma vez compactuar com a transição da monarquia à república, é seguir os passos preconceituosos e distantes dos mais abastados e, acima de tudo, trocar políticos corruptos por políticos técnicos (tecnocratas) é dar novo rótulo às mesmas práticas, ou melhor, trocar seis por meia dúzia. Pois a finalidade será a mesma, manter o caminho do mundo à direita.
(*) Leonardo Gomes é jornalista e publicitário.
‘Igreja é aliada da oligarquia para dominar o povo’
‘Igreja é aliada da oligarquia para dominar o povo’, afirma Evo Morales
O presidente boliviano Evo Morales disse nesse final de semana que a Igreja é "aliada da oligarquia para dominar o povo" e que, "nos últimos tempos, se juntaram nobreza, clero e oligarquia" para dominar e minar "o poder e a força do povo".
(A reportagem é da Agência Gaudium Press, 11-08-2009.)
Foi assim que o mandatário boliviano reagiu às declarações do secretário-geral da Conferência Episcopal da Bolívia, monsenhor Jesús Juárez, que na quarta-feira passada afirmou que ao imitar "a democracia à la Venezuela... vamos pelo mau caminho e vamos nos encontrar de frente a um muro que poderá trazer mais confrontação que avanços". O religioso se referia à importância da reflexão interna. "Bolívia ter que buscar seus próprios caminhos de soberania, unidade e democracia", havia dito na ocasião o bispo.
Desde que assumiu o governo em 2006, Evo Morales em diversas ocasiões atacou, criticou, questionou a Igreja Católica, que a seu ver representa uma instituição que o incomoda e incomoda a seu governo porque teria sido aliada da coroa espanhola no processo de colonização e "submissão" dos povos originários da América.
Para Morales, a Igreja Católica está incursionando em terrenos proibidos quando opina e se pronuncia sobre a situação política no país, a polarização e os problemas mais graves ainda não resolvidos: pobreza, corrupção ou violência, entre outros. "Rezar ou fazer política", referiu-se Morales certa vez à Igreja.
As declarações de Morales sobre o agir da Igreja Católica são inúmeras e passam pela diversidade de temas importantes e de conjuntura que preocupam aos bolivianos. Não somente políticos, mas também temas educacionais e fiscais, que vieram à tona na primeira semana de agosto, inclusive na sua sugestão de que a Igreja "deveria desaparecer", e que "a Igreja apoia ditaduras militares".
"Quando não podem nos dominar com orações, vêm com o fuzil", disse Morales recentemente, ao referir-se à crítica situação política que vive Honduras, país que, segundo ele, "teve um arcebispo apoiando uma ditadura". "Defender os latifundiários, apoiar ditaduras ou estar no golpe de Estado não é orar nem trabalhar por justiça e igualdade".
Para o presidente Boliviano, a Igreja está atuando contra as "transformações políticas" que impulsionam o seu governo e "reflete" que "outro mundo é possível,... outra fé, outra religião, outra Igreja também é possível irmãos e irmãs". Segundo os dados mais recentes, a Bolívia é um país com quase 90% de católicos declarados."
Link da matéria:
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=24741
Ruína de Yeda e omissão da imprensa
Ruína de Yeda e omissão da imprensa | | | |
Escrito por Luiz Antonio Magalhães | |
| |
Os leitores dos jornalões editados em São Paulo e Rio de Janeiro já conhecem com muitos detalhes cada falcatrua cometida no Senado Federal. Até os pecadilhos dos parlamentares, coisas consideraras (por eles próprios) "menores", como ceder passagens aéreas para familiares, vão logo parar nas manchetes – o último desses casos envolve o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). Se alguém perguntar aos leitores o que está acontecendo no Rio Grande do Sul, porém, é provável que a resposta seja evasiva. De fato, a gestão Yeda Crusius (PSDB) à frente do governo gaúcho é uma tragédia de graves proporções e não está merecendo dos grandes jornais uma cobertura à altura do desastre – político e gerencial – em curso nos pampas.
É bem verdade que nos últimos dias, especialmente depois que o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul (MPF-RS) protocolou, em 5 de agosto, uma ação de improbidade administrativa na Justiça Federal de Santa Maria contra a governadora e outros oito réus, os jornalões do Rio e São Paulo decidiram dar uma colher de chá e publicaram reportagens sobre o assunto. Tudo muito insuficiente.
Sim, insuficiente, porque o descalabro começou antes mesmo de Yeda Crusius botar os pés no Palácio Piratini, em janeiro de 2007. Durante a campanha, a então candidata se indispôs com seu vice, Paulo Afonso Feijó (DEM), porque ele defendia as privatizações como saída para resolver os problemas financeiros do estado. Desautorizado, Feijó permaneceu na chapa, foi eleito e depois rompeu politicamente com Yeda. Ainda durante a campanha, o marqueteiro Chico Santa Rita abandonou o comando da estratégia de marketing acusando a governadora de deixar de pagar os salários da sua equipe. Em seguida, já eleita, mas antes de tomar posse, Yeda pediu ao então governador Germano Rigotto (PMDB) que enviasse à Assembléia Legislativa um projeto para cortar despesas e aumentar o ICMS. Tal projeto foi derrubado em 29 de dezembro de 2006, em uma votação que teve como articulador político o vice-governador. Só que contra, e não a favor do projeto de Yeda...
Consequências eleitorais
A crise, permanente, se arrasta desde a campanha eleitoral de 2006. De lá para cá, Yeda jamais conseguiu momentos de tranqüilidade política no Piratini. A grande imprensa do Sudeste vem noticiando tudo com muita discrição e sem contextualizar o problema. Aliás, um problemão. O ruinoso governo de Yeda de certa forma quebra a espinha dorsal do discurso tucano da "excelência da gestão", que deveria ser o diferencial da candidatura presidencial do partido em 2010. Pior ainda, no campo político a governadora conseguiu se isolar de tal maneira que DEM e PMDB, tradicionais aliados do PSDB no estado, já pularam da canoa de Yeda. Se ela insistir em se candidatar à reeleição, qual será o palanque do presidenciável tucano em terras gaúchas? José Serra (ou Aécio Neves) estarão ao lado de Yeda, única governadora brasileira que tem taxa de rejeição superior à de aprovação? Difícil, a julgar pela defesa tímida que os próceres tucanos vêm fazendo do governo da correligionária gaúcha. E alguém leu análises sobre isto nos jornalões?
Boa parte das matérias, aliás, conseguiram inverter a questão, atribuindo ao PSOL uma importância que nem mesmo a deputada federal Luciana Genro (RS) poderia almejar. Sim, porque o desastre político do governo Yeda tem como protagonista a própria governadora, que em um raro espetáculo de inabilidade política conseguiu perder apoio de aliados tidos como muito fiéis, a exemplo do DEM e do PMDB. Definitivamente, não foram as denúncias da filha do ministro Tarso Genro que colocaram Yeda nas cordas, foi a própria governadora que preferiu se postar no corner. E isto também ficou de fora da cobertura dos jornalões sobre o caso.
Cobertura descontextualizada
A falta de contextualização vai além dos aspectos político-partidários. O Rio Grande do Sul vive uma crise estrutural há muito tempo, com problemas especialmente nas finanças do estado e na sua economia. O PIB gaúcho, que representava em 2008 quase 7% do nacional, permanece neste patamar há pelo menos 10 anos. Ao contrário da região Nordeste, altamente beneficiada pelo crescimento dos últimos anos, a economia do Rio Grande vive uma situação que já antes da crise econômica mundial beirava à estagnação.
A situação econômica do Estado deveria necessariamente aparecer nas matérias e reportagem sobre a crise do governo Yeda porque é parte explicativa dos problemas enfrentados pela governadora. De fato, a tentativa, talvez um tanto açodada, de zerar o déficit do Rio Grande em quatro anos foi uma das causas de boa parte dos problemas da governadora. Em casa que falta pão, como se sabe, todos gritam e ninguém tem razão.
Com a cobertura fragmentada e direcionada para os momentos mais espetaculares – as denúncias, o anúncio do processo, os rompimentos com os aliados –, a imprensa do eixo Rio-São Paulo acaba prestando um desserviço aos seus leitores, que ficam com a impressão de que Yeda Crusius é apenas uma vítima do radicalismo do PSOL ou da fúria do Ministério Público. Há uma ótima história para ser contada por trás de um governo ruinoso, mas a mídia parece não querer contar. Por preguiça ou por motivos obscuros. Em ambos os casos, perde o leitor.
Luiz Antonio Magalhães é jornalista e Editor Executivo do Observatório da Imprensa, onde este texto foi originalmente publicado. Contato: laccm@terra.com.br |
Entrevista com Boaventura Santos na NovaE...
Passados cinco séculos do início da colonização portuguesa no Brasil, o filho de um cozinheiro português quer ajudar a resolver um dos maiores problemas criados pelos próprios ibéricos: a escravatura e as perversas formas de dominação de raça e classes após a Lei Áurea, que ficou devendo muito aos negros – aceitou a liberdade física, mas negou a econômica e a social, dentre tantas outras. Quem está se propondo a ajudar na questão é o sociólogo e escritor Boaventura de Sousa Santos, que frequentemente vem ao país e até se intitula um “brasileiro adotado”.
Ferrenho defensor das ecologias de saberes populares, Boaventura esteve em Brasília, em julho, e encontrou com a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, que, juntamente com outros dez ministros, compõe o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Pois é justamente lá, no STF, que está em curso um dos processos mais importantes para os negros no Brasil.
Vale lembrar que outro ministro que compõe o elenco de magistrados é o presidente do tribunal, Gilmar Mendes. Mas Gilmar não deve estar muito feliz com a ida de Boaventura em seu plenário. Isso porque o professor português o definiu como "uma figura patética", destacando sua publicidade excessiva na imprensa. "Nos Estados Unidos, o presidente do Tribunal não aparece na mídia como o Gilmar. No máximo, ele vai dar uma palestra em uma universidade, de vez em quando", criticou.
E deverá ser Gilmar que presidirá uma sessão que poderá ter seu resultado influenciado por Boaventura. Desde que, em 2003, o
presidente Luís Inácio Lula da Silva assinou o decreto 4.847, em 25 de setembro, a vida dos quilombolas poderia ter ganhado outros vieses, com a agilização da demarcação de suas terras. Entretanto, o então PFL, atual Democratas, tradicionalmente ligado à bancada ruralista, não gostou da proposta, e resolveu entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, contra o projeto.
Aí entra o professor Boaventura. Ele se dispôs, um pouco incomodado, a ir ao STF dar uma aula sobre a história da colonização portuguesa no Brasil, seus efeitos e injustiças históricos, para sensibilizar os ministros para a causa. Entretanto, não entende bem porque isso é necessário. “Falei com ela (Cármem Lúcia) que posso vir, mas há muito material produzido no Brasil. É só ler, é só querer ler”, questionou o professor, em palestra realizada em Belo Horizonte, dia 4 de agosto, em Belo Horizonte, a convite do Sinpro Minas.
E não é à toa que Boaventura se arrisca nessa intentona. Para ele, que lutou contra o imperialismo português que persistiu até 1975 em colônias africanas e no Timor Leste, a maior herança do colonialismo é a pífia distribuição fundiária e o racismo. Olhe um pouco à sua volta e verá que o professor tem razão.
A data da audiência pública em que Boaventura irá participar no STF ainda não está marcada. Mas parte do recado já foi dado. Quem sabe, agora, os brasileiros não estudam um pouco mais o tema em vez de rejeitá-lo?
Em entrevista exclusiva à NovaE, Boaventura detalhou seus argumentos, e também falou do governo Lula, de suas políticas ambiental e social, do agronegócio e da crise econômica mundial do capitalismo. Além disso, afirmou que o Brasil está pronto para ter uma mulher na presidência. Entretanto, ele prefere o ministro da Justiça, Tarso Genro. Confira abaixo.
Qual é a participação do senhor na defesa da demarcação das terras dos quilombolas?
Como trabalho bastante com os advogados populares, que trabalham com os quilombolas, tive notícia de que eles iriam pedir à ministra Carmem Lúcia uma Audiência Pública em face daquela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que foi impretada pelo antigo PFL, os Demos.
Essa ADI visa fundamentalmente considerar inconstitucional muitos dos processos de regulamentação dos territórios de remanescentes de quilombos – que ultimamente têm sido uma grande transformação, digamos assim, na vida do campo do Brasil devido ao reconhecimento e à organização dos afrodecendentes para reaverem as terras que foram desapropriados, onde viveram muitos anos. Essa é uma luta muito importante, uma vez que sou conhecido e os ministros conhecem as minhas posições.
Eu quis sensibilizar, basicamente, o Supremo Tribunal Federal, para a importância da questão quilombola, sobre a qual existe tanto desconhecimento no Brasil, o que é uma coisa que me surpreende. Uma vez que há muita informação disponível sobre esse movimento, e as razões históricas, fundamentalmente justiça histórica, que está por trás dele. Mas a verdade é que há muita ignorância a respeito disso. A ignorância, no meu entender, pode ser altamente prejudicial ao movimento, e à reivindicação dos quilombolas. Porque pode mudar os critérios dos códigos livrais, que atravessam toda uma parte de direito civil que tem uma concessão privatística da propriedade, e são muito renitentes a reconhecer os direitos históricos sobre a terra. Nesse caso dos remanescentes e também no caso dos indígenas.
Como o senhor vê a questão de um português vir ao Brasil para ter que falar sobre esse tema, já que (a escravidão no Brasil) foi uma criação de Portugal?
É uma pergunta interessante. Obviamente, não me sinto responsável pelo colonialismo. Por contrário, ainda tive a oportunidade de lutar contra o colonialismo, porque ele durou até tão tarde. Desde os anos 1960 lutei contra ainda as colônias que existiam no império e que só se libertaram em 1975. Mas é verdade que a minha ligação a eles e com outras causas que tenho abraçado no Brasil não tem muito a ver com essa responsabilidade, porque não a reconheço.
É fundamentalmente porque eu tenho trabalhado no Brasil. Há muita gente que pensa, nos círculos internacionais, que sou brasileiro. Sou um brasileiro adotado. Fiz aqui meu trabalho de campo, meu doutoramento foi feito numa favela do Rio de Janeiro. E participo da vida social, acadêmica e também política, com os movimentos sociais. Num processo que se intensificou muito depois do Fórum Social Mundial. Para mim, é na decorrência disso que eu me dispus a tomar essa ação e vou fazer mais. Também fui o primeiro signatário de um abaixo assinado em defesa da Reserva Raposa Serra do Sol. Também trabalho bastante com o movimento indígena no Brasil, no Equador e na Bolívia, porque também é um caso de justiça histórica que deve ser resolvido.
Mudando o foco da conversa, o senhor acha que o capitalismo, se conseguir passar bem por esta crise, sairá mais forte ou mais fraco?
É muito difícil responder a essa questão. As crises do capitalismo são sempre multifacetadas porque têm diferentes temporalidades. Esta crise financeira, por exemplo, é de uma temporalidade curta. Ela explodiu em agosto de 2008. Obviamente que essa crise não é de agora. Ela já vem de meados da década de 1980 e depois de 1990. Rússia, Brasil, Indonésia e Tailândia foram vítimas disso. A especificidade desta é que ela aconteceu no coração do sistema. E esta é uma crise de curta duração, que é sinal de outras, provavelmente mais profundas, mas que pode ser resolvida a curto prazo, sem em grandes transformações sistêmicas. Mas há outras crises que são muito mais de longa duração. Essa tem a ver com os limites ambientais e esse tipo de desenvolvimento. Eu penso que essa é a grande crise do capitalismo. Ela vai surgir duma ou doutra forma. É aquela que vejo que vai haver mais dificuldades para sua resolução. Não só porque ela toca nos fundamentos do capitalismo, enquanto nesta crise financeira não estamos a por em causa um certo tipo de capitalismo, o neoliberal, que se propôs desvencilhar do Estado, e que em momentos de crise volta ao útero do Estado.
Temos outra crise mais profunda, que atinge a todos nós, na medida em que ela, como no aquecimento global, como em todas as crises que decorrem dos limites ambientais desse tipo de desenvolvimento, vem de nossos próprios hábitos do cotidiano. São os nossos carros, o nosso conforto, daqueles privilegiados no mundo que têm acesso a esses bens.
Eu penso que o capitalismo vai entrar numa crise civilizacional. E essa vai se manifestar de diversas formas, algumas das quais estamos a ver. É muito difícil de ver qual o tipo de crie. Já muitas vezes foram anunciadas as crises finais de capitalismo, que afinal não foram. A questão ambiental tem tantos prolongamentos. Ao nível da questão social, das pandemias, da fome, da seca, das mudanças climáticas. Eu prevejo que aqui haja uma maior turbulência porque a articulação sistêmica que pode impedir que isso ocorra é muito mais complicada.
Com a crise, o governo Lula isentou os carros do IPI, e também produtos da construção civil, como o chuveiro elétrico. Se houvesse uma mudança de viés de desenvolvimento, haveria um estímulo à produção de aquecedores solares para as residências, por exemplo. Como o senhor vê a questão ambiental no governo Lula? Ele está perdendo a chance de mostrar ao mundo que o Brasil poderia ser uma potência ambiental?
A política ambiental deste governo é um desastre. Isso nota-se pela sucessão dos ministros do Ambiente. Este que está agora (Carlos Minc), também já em dificuldades, e sendo uma pessoa muito mais tolerante para o tipo de desenvolvimento atento na idéia do agronegócio, com todas as suas consequências ambientais. Ele próprio sente dificuldades. Obviamente que a ministra Marina Silva teve muito mais dificuldades. Portanto, eu penso que tem sido realmente um desastre. E isso se intensificou ao longo dos anos.
O governo Lula ficou preso a um desenvolvimentismo que já não é o do século XXI. Por exemplo, poderia ter apostado nas energias renováveis. Ao invés disso, aposta no agrofuel, que não é biofuel. Não tem nada a ver com biologia, com a preservação do meio ambiente, ao contrário. É uma outra cultura de plantação. E entrou dentro da cultura genética dos líderes que neste momento governam o país. Num país com essa dimensão, com esta riqueza e com essa diversidade biológica, que tem uma responsabilidade mundial, eu penso que isso é um desastre.
O que está a passar na Amazônia é de proporções inadmissíveis. Nós estamos a assistir, ao contrário do que se diz, uma destruição da Amazônia, com crimes ambientais a ponto de criar a destruição do encontro das águas. Há realmente uma cultura desenvolvimentista, que no meu entender está a minar toda aquela potencialidade de esperança que o Brasil veio trazer ao mundo, no momento em que resolveu ter uma liderança regional, e eventualmente global, ao lado de Rússia, China e Índia (BRIC). É bem que o sistema se torne policêntrico, é mal se esses países, ao entrar, venham a reproduzir o pior do sistema
Apesar da questão ambiental, Lula está fazendo um bom governo?
É um bom governo porque tem um alto nível de aceitação. Beneficiou-se obviamente do carisma de Lula, que desfez todas aquelas idéias estereotipadas que havia no tempo do Fernando Henrique Cardoso, de que a esquerda é burra, que um metalúrgico não pode governar o país. Ele pôde governar o país, atrás de uma conjunção de razões externas e internas que foram muito favoráveis. Foi muito favorável o desenvolvimento da China.
Ao nível interno houve algumas políticas que tiveram um efeito redistributivo. Não só sistemas de ação afirmativa, obviamente foram criadas formas de acesso à universidade pública, mas principalmente o Bolsa-Família. Foi ele que alimentou o mercado interno que veio acabar por ser uma almofada de proteção contra a crise financeira. Este governo tem coisas muito positivas do ponto de vista social. Soube distribuir uma migalha a populações que estavam muito desprovidas. Mas permitiu que o capital financeiro, sobretudo o capital agrário, tivesse as possibilidade de lucro como nunca tinha tido no passado.
O Brasil está pronto para ter uma mulher na presidência?
Eu penso que a Dilma está obviamente. Não sei se a Dilma é realmente a candidata ideal da esquerda. Se estivesse no Brasil eu teria outros candidatos. Mas é a candidata que vamos ter, aparentemente. É uma incógnita para todos saber em que medida o peso e a aceitação que o presidente Lula tem hoje se pode transferir para o apoio à candidata Dilma. É problemático, é uma grande jogada de grande risco da parte do presidente Lula. Mas acho que seria muito bom para o Brasil ter uma mulher como presidente.
Quem seria o melhor candidato para o senhor?
Obviamente, Tarso Genro.