quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Violações aos direitos humanos não revogam concessões no Brasil

Pedro Caribé - Observatório do Direito à Comunicação
Relacionar o controle público dos meios de comunicação a regulação de conteúdo se consolidou como um dos maiores tabus do Brasil nos últimos oito anos. O pavor que a pauta se aproximasse da censura foi instaurado pelos grandes empresários, esparramou-se pela classe política, até chegar no cidadão comum. Assim, setores do governo e organizações sociais foram transformados em algozes por defender a permanência do termo.

Sem os mesmos espaços para se explicar, qualquer reivindicação associada ao conteúdo se confrontou com reações desprorporcionais, quando o teor, na maioria das vezes, solicitava apenas o cumprimento da legislação ou enquadramento do país a acordos internacionais.

O resultado é que pouca coisa avançou no Brasil em termos de regulação de conteúdo e o pior, esse tema se tornou um dos maiores obstáculos para a sociedade compreender a natureza pública da comunicação e o porque de se realizar reformas imediatas no Marco Regulatório.

Laurindo Leal Filho, apresentador do Ver Tv na Tv Brasil, narra que nos últimos 15 anos a sociedade civil aumentou seu senso crítico, enquanto a televisão buscou formatos apelativos para disputar a audiência. Para ele os caminhos das reivindicações de conteúdo sempre foram democráticos tornando importantes sua manutenção: "O que aconteceu é que houve confusão deliberada para caracterizar regulação de conteúdo com censura, proibição. Isso ajuda desqualificar discussões mais amplas como propriedade cruzada".

Professor aposentado da USP, Laurindo explana que resumir a questão ao controle remoto é argumento dos concessionários, sem sustentação na realidade nacional: "O que é oferecido ao público é via interesse comercial. Colocam no ar programação semelhante. Qual a consequência? Ao telespectador não sobra alternativa na programação", defende o professor.

Violações sem punições

Ao final do Governo Lula nenhuma concessão de rádio e televisão foi revogada por violar os direitos humanos, em contrapartida iniciativas para acabar com a sensação de impunidade dos radiodifusores se ploriferaram na sociedade civil. Pouco a pouco observatórios e campanhas se estabeleceram em busca do cumprimento a legislação federal e dos tratados internacionais nos quais o país é signatário.

O governo federal tentou corresponder a essas reivindicações e teve como principal ato o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Porém o bombardeio dos setores conservadores foi intenso, tendo resoluções e ações modificadas na calada da noite , para felicidade dos radiodifusores.

Laurindo acha que o Brasil está na "idade da pedra" em termos de regulação da mídia e relaciona o PNDH com a necessidade de um caderno de encargos, inexistente no país: "É preciso assumir uma série de compromissos com o concedente, um destes seria o de respeito aos DH, dentro da Lei brasileira e acordos internacionais".

Para Bia Barbosa, associada do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social, a Classificação Indicativa foi o único trunfo do Governo Lula e no recuou do PNDH-3: "Ficou explício que o governo não pretendia mesmo comprar nenhum enfrentameno neste sentido com os donos da mídia", e continua: "Somente nos últimos meses o discurso mudou, com a realização de um seminário internacional no país, promovido pela Secom, que apresentou inúmeros exemplos de regulação democrática de conteúdo em diferentes nações".

Ministério Público

Sem ter acolhimento no executivo e legislativo em Brasília, o Ministério Público, seja estadual ou federal, se tornou o principal aliado das entidades. O caso de maior êxito da parceria foi com o Ministério Público Federal, quando o programa Tardes Quentes da RedeTV!, apresentado por João Kléber, esnobou dos convites da justiça para adequar sua programação e teve a transmissão suspendida por 30 dias em 2005. No lugar foi exibido o programa Direitos de Respostas, realizado por um conjunto de de organizações.

A campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, iniciada em 2002, chegou ao seu 18º ranking no fim de 2010 e programas como o Pânico na TV (Rede TV), Big Brother Brasil (Rede Globo) e Brasil Urgente (Band) são costumeiros frequentadores dos primeiros lugares, mas até o momento nenhuma medida contundente foi tomada.

Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal é responsável direta pela criação e continuidade da campanha e tem como presidente Janete Pietá, única deputada federal mulher pelo PT paulista. Pietá adianta que o tema levantará discussões profundas no Congresso, mas por enquanto a única estratégia a seguir é "mudar de canal": "A medida que a população começar a rejeitar, mudando de canal, fazendo críticas, isso vai mostrar que não são alguns grupos, mas grande parte da população".

Nahr Al-Bared : a nova face dos campos palestinos do Líbano?


“Não é permitido entrar ou sair sem mostrar licenças concedidas por um dia, três semanas ou permanentemente, e que podem ser suspensas ou retiradas a qualquer momento. Também ocorre de passarmos o dia na prisão, sem motivo aparente”
por Marina da Silva no LeMonde-Brasil
“A situação no campo de Nahr al-Bared é um desastre.” Quantas vezes já ouvimos essa afirmação categórica? Nós mesmos precisamos de oito dias só para conseguir permissão para entrar – e, mesmo assim, sob escolta militar – nesse campo palestino localizado dez milhas ao Norte de Trípoli, onde o grupo Fatah al-Islam e o exército libanês se enfrentaram, de 20 maio a 2 setembro de 20071. Após o combate, os saques continuaram, 95 % do antigo campo foram destruídos e os arredores completamente devastados. Fechados em uma área dita temporária (e de confinamento), assustadora, protegida de todos os olhares, dois terços dos seus 30 mil refugiados voltaram para o campo.
Nahr al-Bared era o segundo campo de refugiados palestino em número de habitantes. E era também um dos mais tranquilos e dos menos cercados. Criado em 1949 em uma área de mero 0,2 km2, primeiramente com barracas, e em seguida com um emaranhado de estruturas mais sólidas (feitas de pedra, alvenaria e concreto), ele é limitado a Noroeste pelo mar que os habitantes chamavam de “o mar de pobres”, porque trazia com ele toda a poluição da cidade industrial. Com o crescimento contínuo da população, o campo se estendeu a duas cidades vizinhas, Bhanin e Muhmarra, em uma área quatro vezes maior, mas menos povoada, comumente chamada de “novo campo”.
“Ele era um verdadeiro centro de atividade, o único campo onde havia muitas joalherias”, conta Hodda, que chegou a trabalhar ali regularmente, com a associação de mulheres Najdeh. “Os libaneses também iam até lá para fazer compras, algumas vezes comprar mercadorias contrabandeadas da Síria.” Isso agora é passado. Os habitantes se sentem traídos. “Eles evacuaram o campo a pedido do exército e de organizações palestinas, mas para eles a rendição de cerca de 400 jihadistas não pode justificar uma destruição dessa dimensão”.
A primeira onda de refugiados a voltar, em outubro de 2007, sofreu um choque terrível: “O campo tinha sido completamente arrasado por tratores. Nossas casas foram saqueadas, roubadas, nossos locais de culto profanados. Nós havíamos deixado tudo nelas. Eu não tenho uma única foto. Perdemos tudo! Até mesmo nossa memória”, lamenta-se Abu Ghassan, que encontramos em Chatila, em Beirute, onde 200 famílias estão instaladas. Mas grande parte da população, cerca de oito mil pessoas, foi obrigada a se instalar em Badaoui, um outro campo de refugiados palestino ao lado de Trípoli, que viu sua população dobrar em 2007. Foi preciso mais de um ano para resolver os problemas ligados ao acolhimento desses refugiados, graças ao Escritório de Socorro e de Trabalhos das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina no Oriente Médio (UNRWA, em inglês), e ao conjunto das organizações palestinas do campo. Foram abertas mais duas outras escolas, feitas de material pré-moldado. Algumas famílias ainda estão dormindo nas garagens transformadas em casas, mas a maior pobreza fica mesmo no lado do chamado “novo campo”.
"Não é permitido entrar ou sair sem mostrar licenças concedidas por um dia, três semanas ou permanentemente, e que podem ser suspensas ou retiradas a qualquer momento. Também ocorre de passarmos o dia na prisão, sem motivo aparente", declara Khaled. Toda a área se transformou em zona militar, proibida aos estrangeiros. Somente os palestinos que viviam ou trabalhavam ali e os funcionários da UNRWA ou de outras organizações não-governamentais (ONGs) podem entrar.
No antigo campo, os trabalhos acabaram de começar. “Precisamos de mais de um ano e meio para limpar o terreno, sendo que após a guerra israelense de 2006 as pessoas voltaram imediatamente para casa, apesar das milhares de bombas lançadas sobre o Sul”, explica Khaled. No “novo campo”, as famílias são obrigadas a viver entre ruínas e escombros. Eles reconstruíram suas casas com as próprias mãos – nuas! Corredores de pré-fabricados abandonados são utilizados como abrigos temporários. Uns poucos pontos de comércio foram reabertos, mas raros são os clientes que conseguem cruzar as barragens impostas pelo exército.
“Para os palestinos, haverá um antes e um depois de Nahr Al-Bared”,diz Ali Hassan. Eles acreditaram por muito tempo que seu futuro estaria ligado a Ain El-Heloueh, o grande campo de Sidom, que sempre foi o foco das atenções. Ali, a presença de grupos jihadistas já é antiga2, e os incidentes frequentes. Mas as organizações palestinas continuam fortes o bastante para manter a segurança. E, sobretudo, “os extremistas são eles próprios oriundos do campo. Ali eles têm suas famílias e não estão dispostos ao enfrentamento. Em Nahr al-Bared, eles foram introduzidos em 2006 e na maioria das vezes nem eram palestinos, mas libaneses, sauditas, iemenitas, iraquianos etc. De onde eles vinham ? A quais interesses serviam ?”Essas são questões importantes3,mas que acabam por ocultar a questão central : os direitos dos refugiados palestinos no Líbano.
 “A recusa de sua instalação definitiva (tawtin) é afirmada tanto na Constituição quanto lembrada nos Acordos de Taif4. Mas essa recusa é um disfarce para o tratamento discriminatório”, resume Sari Hanafi, professor de sociologia da universidade americana de Beirute5.Ele vê uma melhora na recente alteração da legislação trabalhista, que permite que os palestinos exerçam certo número de atividades até então proibidas – apesar de as profissões liberais continuarem proibidas. Mas ele lembra que a lei proibindo a eles o acesso à propriedade, promulgada em 2001, [também] ainda está em vigor e foi um dos principais obstáculos à reconstrução de Nahr al-Bared, o que obrigou o Estado a comprar o terreno.
Membro da Comissão de Reconstrução de Nahr al-Bared, ele observa: “Muitos campos de refugiados palestinos já foram destruídos no Líbano, mas essa é a primeira vez que um deles é reconstruído. Esse é um projeto piloto, bastante incomum, realizado em coordenação com os refugiados, as organizações palestinas, o Comitê de Diálogo Líbano-palestino, as autoridades libanesas e a UNRWA.”
Para UNRWA, esse é o projeto mais importante de sua história, onde aposta toda sua credibilidade. Há dois anos, Salvatore Lombardo é o seu responsável, se lançando de corpo e a alma. “Se nós falharmos, causaremos com toda certeza grandes desilusões e convulsões sociais que poderiam afetar a estabilidade do Norte do Líbano. Espero que os libaneses não sejam acometidos de cegueira política”.
Foi necessário um ano e meio para desenvolver os planos: “Primeiro tivemos de reconstruir cada lugar, cada rua, chegar a um acordo sobre sua localização, superfície e, posteriormente, sobre sua transformação, além de obter o consentimento das famílias. Você pode imaginar os recursos necessários para desenvolver todo esse trabalho!” Os arquitetos levaram em conta o tecido sociológico de Nahr al-Bared, organizado, como na maioria dos campos, em função de relações da vizinhança de locais de origem na Palestina antes de 1948. Foram feitas reuniões com os moradores, muitos dos quais são originários dos vilarejos de Safouri e Saf-Saf, na Galileia.
A situação ficou complicada quando foi preciso submeter o master plan ao governo, que fez uma série de restrições: não mais de quatro andares para os prédios (regra usual para os campos), com possibilidade de ter um balcão ou um terraço só no terceiro e quarto andares, de modo a proibir o acesso da rua, em caso de agitações. Nenhuma construção no subsolo. Estradas mais largas: de pelo menos quatro metros e meio, dimensão que permite a passagem de um tanque. No final, uma perda estimada de pelo menos 15 % da superfície de ocupação, para cada família.
Finalmente aprovado o master plan ainda precisa ser executado. Ele foi dividido em oito zonas de reconstrução (chamadas de packages), cada uma das quais precisa, por sua vez, ser validada pelo ministério do Planejamento. Outros obstáculos têm surgido, como a descoberta, em março-abril de 2009, dos restos arqueológicos de Orthosia, o que bloqueou o trabalho por sete meses, forçando a UNRWA a indenizar o departamento de Antiguidades. Ou, em meados de 2009, a moratória pedida pelo general Michel Aoun, líder cristão do Movimento Patriótico Livre, o que levou a uma nova interrupção. O medo da instalação dos palestinos6, o que alteraria o equilíbrio religioso no Líbano e visto como uma desistência do direito de regresso, por parte dos refugiados, é compartilhado por todos os partidos políticos libaneses.
O montante necessário para reconstruir o velho campo foi estimado em 328 milhões de dólares. Foi pago apenas um terço, ou seja, 119 milhões de dólares, e ainda faltam 46 milhões para finalizar as packages 3 e 4 – o que equivale apenas à metade do antigo campo. A agência sempre divulga o andamento dos trabalhos, a fim de convencer os doadores (até agora, essencialmente a Comissão Europeia, os Estados Unidos e Arábia Saudita), que haviam se comprometido, já por ocasião do final confrontos e da conferência de Viena, em junho de 20087.
Quanto ao novo campo, sua reabilitação foi deixada por conta dos próprios habitantes, uma vez que a agência não dispõe de recursos para reconstruí-lo. Ela tem apenas um orçamento de ajuda emergencial que permite que ele funcione.
“Restam ainda cerca de 300 unidades pré-fabricadas. A UNRWA sugeriu à população que elas fossem fechadas, em especial neste verão, quando a temperatura chegou a 45 graus, mas as pessoas se recusam a ir embora, por terem demasiado medo, e por quererem marcar com sua presença a determinação de voltar para casa.”As famílias que estão fora do campo recebem assistência habitacional. No começo de 200 dólares, esse auxílio foi reduzido a 150 dólares no segundo semestre de 2009. Enquanto o aluguel médio na região aumentou de 75 para 250 dólares.
Para as organizações palestinas, a reconstrução do campo é um consenso. “Perdemos a batalha de Nahr al-Bared”, reconhece Jemal Chehabi, líder político do Hamas no norte do Líbano. “Nós não conseguimos evitar sua destruição e agora somos responsáveis por sua reconstrução”. Já o representante do Fatah em Badaoui, Abou Jihad Fayad, considera que “o campo de Nahr al-Bared foi um incidente que atingiu tanto os palestinos quanto o exército”,mas lembra: “Prioritariamente, as pessoas estão esperando para voltar à para a Palestina.”
Esse é o primeiro dossiê no qual a Fatah e o Hamas cooperam, um passo importante ressaltado por Abdallah Abdallah, o novo embaixador da Organização pela Libertação da Palestina (OLP) em Beirute: “Estamos trabalhando para criar uma delegação unificada. Não queremos que a questão seja tratada meramente sob o ângulo da segurança, é necessário levar em consideração nossos direitos políticos e melhorar a situação humanitária. Queremos desconstruir os estereótipos ligados à imagem dos campos. Temos necessidade de segurança e as autoridades libanesas também. Precisamos trabalhar juntos. Os tratamentos discriminatórios podem levar a uma situação de explosão8. Para nós, o importante é manter contacto com a população, e a confiança em nossa própria força.”
Responsável pelo dossiê para a OLP e diretor da Comissão Superior de Nahr al-Bared, Marwan Abdelall, conhece bem o campo, onde ficou sitiado por três meses. Segundo ele, os vários obstáculos para a reconstrução foram vencidos, mas o problema da liberdade de acesso persiste: “Os postos de controle arbitrários, o arame farpado, o controle de deslocamentos dentro e fora do campo, com a exigência de autorizações a todos os moradores – tudo isso não pode continuar.” Ele acrescenta: “Em fevereiro de 2009, o ministério da Defesa tentou instalar uma base naval na orla do antigo campo. Acabou desistindo, mas estamos preocupados com o projeto de uma delegacia de polícia dentro do campo.” Na verdade, cinco milhões de dólares estariam destinados para a segurança no interior do campo, despesas até agora assumidas pelas organizações palestinas, obedecendo a uma disposição do documento de Viena.
Esse dispositivo assusta a população, que vê nele uma ameaça para todo o Líbano. “Será como uma colônia israelense. Um teste que conduzirá à expansão do controle do exército aos outros campos de refugiados”, lamenta Oum Tarek.

1 Os confrontos resultaram na morte de 47 civis e 163 militares, 220 membros do grupo e na detenção de centenas de outros ainda aguardam julgamento, enquanto alguns conseguiram escapar.
2 Ver Bernard Rougier, Le djihad au quotidien, PUF, Paris, 2004.
3 LerFidaa Itani, “Enquête sur l’implantation d’Al-Qaida au Liban, e Vicken Cheterian, “Désarroi des militants au Liban », Le Monde diplomatique, respectivamente fevereiro e dezembrode  2008.
4 Acordos assinados em 22 de outubro de 1989, e que puseram fim à guerra civil.
5 State of Exception and Resistance in The Arab World, Center for Arab Unity Studies, Beirute, 2010.
6 A recusa de sua implantação foi lembrada pelo presidente Michel Sleimane na assembleia geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 26 de setembro de 2010.
7 Por iniciativa dos governos do Líbano e da Áustria, da Liga Árabe e da União Europeia (UE), e com a participação de delegações de vários países do mundo árabe, Europa, Estados Unidos, China, Japão e representantes das instituições financeiras envolvidas na cooperação e apoio aos refugiados palestinos. O documento de Viena prevê ainda o reforço da segurança no interior do campo de Nahr al-Bared.
8 Sobre a situação do conjunto dos campos do Líbano, ver também o relatório do International Crisis Group, “Nurturing instability : Lebanon’s Palestinian refugees camps”, Bruxelas, fevereiro de 2009.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Cooperativismo dos trabalhadores em fábrica...

Funcionários se unem para comandar empresa em SP. A fábrica localizada no interior de São Paulo é comandada pelos funcionários desde 2003.

Parabéns pra voce, Tom Jobim...

Por que formar universitários pobres?


Editorial do Estadão é sempre peça cômica. Ontem bradavam o "Colapso do ENEM", o exame nacional que agora, com o SISU, se tornou a ponte direta do estudante pobre à universidade. Na Folha, com seus truques de estilo, usaram o mesmo trocadilho que o Boris Casói (aquele!) para acusar de "Inépcia" o INEP, órgão responsável pelo exame; pro Casói, é "Uma verrrrgonha" o anúncio de que seria criado um órgão para cuidar apenas do ENEM, não vendo nisso o reconhecimento de sua importância e provável crescimento ao longo dos próximos anos.

Tenho folheado esses dois jornalões diariamente durante todo o último ano e não me lembro de neles ter lido qualquer análise sobre o significado do ENEM, o que ele representa para a educação no país. Não apenas porque agora, com o SISU, integra a rede universitária federal, que cresceu enormemente nos anos Lula, com a rede pública de ensino médio, dando materialidade ao discurso do excelente Fernando Haddad de que educação tem que ser pensada de forma sistêmica, envolvendo a valorização de todas as idades e todos os atores do processo (alunos e professores; gestores e financiadores; acesso e qualidade). Mas também pela qualidade mesma do sistema de avaliação, que é o maior exame de ensino médio do mundo, com 4 milhões de estudantes avaliados em 1.700 cidades.

Ao contrário, só se veem críticas, e pesadas, à aplicação dos testes ou ao sistema eletrônico de inscrições. O site do SISU ficou lento por três dias (mas o número de servidores foram dobrados e o problema solucionado), os candidatos podiam ver as notas de outros durante vinte minutos (vinte minutos!!!, e o problema foi solucionado), houve erro na prova do ENEM (em 0,25% das provas!!!!) e pedem que o exame inteiro seja refeito. Hoje, com a divulgação da lista de aprovados no SISU, a manchete focava nas 176 vagas (de um total de 83.125!!!!) que não despertaram interesse dos mais de 2 milhões de inscritos.

Tudo parece um grande fracasso quando numa geladeira cheia de Serra Malte o míope investigador só vê as três latinhas de Belco batendo nelas com o nariz. A educação no Brasil está, de fato, e os números mostram isso, encontrando um caminho de crescimento consistente, ampliando e democratizando o acesso e focando em qualidade, com valorização do professor e da infraestrutura.
Fernando Haddad, esse é o cara.

Nada a ver com o que ocorreu mais ou menos uma década atrás, quando o MEC, para turbinar índices de aumento de vagas no ensino superior, tornou-se um balcão de licenciamento de armadilhas universitárias privadas, muitas das quais fecharam as portas pouco depois (por não ter qualidade para cumprir exigências acadêmicas) deixando alunos a ver navios, sem diploma e com um débito considerável pelas mensalidades pagas durante alguns anos.

Tem que melhorar o site do SISU? Sim, mas esse é o menor dos problemas. O engraçado é que os jornalões não percebem que as consecutivas derrotas políticas que colecionam têm a ver, também, com essa incapacidade de enxergar a realidade. Conseguem, no máximo, e a custo de muito ódio, manter fiéis aqueles que só sabem do mundo por meio desses mesmos jornais, sem qualquer contato com a realidade vivida por outras classes sociais, ou em outros lugares do país. Outro dia, na Folha disseram que o Haddad estava "sob observação", pois Dilma teria se reunido com ele para que explicasse os tais problemas do SISU. Uma interpretação no mínimo exótica de um fato totalmente dentro da normalidade, mas que denota o teor das notícias: a virtualidade que gostariam que existisse, não a realidade. Ainda mais lembrando que a Dilma, logo que foi eleita, declarou que concentraria a atenção em saúde e segurança pública, pois a educação, segundo ela, "estava encaminhada".

Mas o mundo não está de todo perdido, ainda existe sinceridade e pureza de coração. O filósofo Luiz Felipe Pondé, em sua coluna na "Ilustrada", declara peremptoriamente: "Para alguns, universidade é coisa de elite e pronto, e só assim realiza bem sua função. Sou um desses.". Aí desfila um discurso confuso, que eu não sei bem o que quer dizer, sobre o fato de que a democratização do ensino vem com o "barateamento do produto", referindo-se às más faculdades privadas, ou "a abertura de universidades às centenas e em quase toda esquina, quase sempre com qualidade duvidosa. 'Universidades a R$ 399,90 por mês'". Não que todas essas instituições tenham deixado de existir, mas não é mais o boom de outros tempos. E, não custa lembrar, o investimento em pesquisa (a elite da universidade, por assim dizer) cresceu mais de dez vezes no governo Lula, com resultados comprovados.

O colunista não leva em conta que o Brasil já dá sinais de que para um desenvolvimento sustentável precisa formar milhares de engenheiros, médicos, etc. etc. Por que não ter médicos e engenheiros (e outros profissionais de nível superior) de "origem humilde"? Desconfio que essa resposta não leremos nem na Folha nem no Estado.

E se os EUA acabassem com o consumo de drogas

Emir Sader no Carta Maior

O aumento exacerbado da violência em países como a Guatemala, El Salvador, Honduras, Jamaica e a Venezuela, tem a ver com mudanças nos roteiros de circulação do tráfico de drogas. O índice de violência nos dois primeiros países é maior do que o registrado quando viviam situações de guerra civil.

O crime organizado, segundo a revista The Economist, é o responsável principal por esse aumento vertiginoso da criminalidade. A América Central é uma ponte entre a Colômbia e o México, os dois eixos fundamentais do narcotráfico no continente, que desembocam no maior mercado consumidor de drogas do mundo – os EUA. Este, a razão de fundo, o verdadeiro indutor do narcotráfico, com todas as tragédias que implica.

Conforme a pressão aumentou, primeiro na Colômbia e depois no México, a América Central foi erigida em rota alternativa do tráfico. Os cartéis mexicanos estão contratando bandos centroamericanos para articulá-los diretamente com o circuito geral. São recrutados ex-soldados, liberados dos exércitos. Só a Guatemala diminuiu em 2/3 o contingente das suas forças armadas, cujos contingentes foram em grande parte recrutados pelas máfias. Calcula The Economist em cerca de 70 mil os membros da mara – violenta versão centroamericana das gangues. A tendência dos cartéis mexicanos de pagar em droga os serviços prestados, multiplica o consumo e a criminalidade correspondentes.

A região centroamericana é a mais pobre do continente, com um PIB per capita de 2.700 dólares, menos de um terço do mexicano. O montante de drogas e armamentos apreendidos na Guatemala nos primeiros 6 meses de 2010 equivalem a 5% do PIB nacional – para se ter uma ideia do peso e da atração que os recursos provenientes do tráfico representam nesses países. Mas na repartição dos recursos para o combate ao narcotráfico, conforme o programa Iniciativa Médida, dos EUA, o México recebe 84% do total.

Como os norteamericanos imaginaram um país sem os mexicanos – em uma atitude de incitação ainda maior à discriminação – poderíamos imaginar o mundo sem o consumo de drogas por parte dos EUA. O golpe assentado no tráfico de drogas seria decisivo, mesmo que outros itinerários já tenham peso significativo, especialmente a Europa. Um país como o México e toda a América Central, seriam afetados de maneira muito positiva, com o enfraquecimento dos carteis da droga e das gangues que proliferam a partir deles.

Mas os EUA, o gigantesco indutor mundial da produção e do tráfico de drogas, como sempre fez, deriva as raízes do problema para outros países, buscando na extradição de traficantes e na erradicação por meio de venenos químicos de extensas zonas onde se produz folha de coca para o consumo da sua população, a falsa solução do problema.

Se os EUA atacassem sistematicamente a entrada das drogas no seu território, impedissem o envio de armamento sofisticado aos cartéis mexicanos, golpeassem profundamente a milionária rede que aufere lucros gigantescos com o tráfico, prendessem os traficantes e desarticulassem suas redes – o mundo viveria melhor. Mas a sociedade que mais consome drogas no mundo, tornando-se o seu maior mercado consumidor, é uma sociedade essencialmente dependente das drogas para sobreviver, pelo estilo de vida que leva e espalha sua doença para os outros países.

Morreu Samuel Ruiz, o bispo dos pobres


Morreu um dos principais atores nas negociações entre os zapatistas e o governo do México. Como bispo da diocese de Chiapas, Samuel Ruiz ganhou fama mundial em 1991 por ocasião do levante do Exército Zapatista de Libertação Nacional. Sua intervenção impediu um massacre que poderia levar a um genocídio. Samuel Ruiz foi participante e protagonista da Teologia da Libertação e da opção preferencial pelos pobres que impôs em sua diocese desde 1975, em uma época dominada por golpes de Estado e por ditaduras militares na América Latina.
 
“Eu vim para evangelizar os índios, mas terminei sendo evangelizado por eles”, disse certa vez Samuel Ruiz García, a quem as comunidades chamavam de “bispo dos pobres e dos povos originários”. Ele morreu segunda-feira (24) e muitos choram a ausência de quem dava voz aos sem voz.

Tatik Samuel – como era chamado nas comunidades indígenas – seria objeto de uma celebração hoje (25), preparada há meses em San Cristóbal de las Casas, para marcar os 51 anos de sua posse como bispo da diocese de Chiapas, da qual se aposentou em 1999, ao completar 75 anos. Em lugar da celebração, seus restos são velados desde a noite de ontem na catedral de San Cristóbal, onde será sepultado quarta-feira (26).

Imerso nos debates teológicos e canônicos do Concílio Vaticano II e dos subsequentes concílios de Medelin, Puebla e Santo Domingo, Samuel Ruiz foi participante e protagonista da Teologia da Libertação e da opção preferencial pelos pobres que impôs em sua diocese desde 1975, em uma época dominada por golpes de Estado e por ditaduras militares na América Latina. Mas foi a partir de sua adesão à corrente da antropologia cultural que chegou ao que seria o axioma de sua pastoral: “a dualidade opressão-liberdade e a proposta de um ser cultural próprio, culminando com a igreja autóctone” que provocou fortes reações dentro e fora da Igreja Católica, segundo o historiador mexicano Jean Meyer, que certa vez o comparou com os bispos Helder Câmara, do Brasil, e Arnulfo Romero, de El Salvador, “arraigados na tradição e flexíveis na ação”, que reagiram “de maneira complicada diante de situações complicadas”.

Mas não era marxista, como o rotulavam seus detratores. Nem de longe. Católico tradicional e ortodoxo, Samuel Ruiz chegou a Chiapas em 1959 como bispo da diocese de San Cristóbal, apenas 12 anos depois de ter sido ordenado sacerdote, ao término de seus estudos de Teologia na Universidade Gregoriana de Roma. A realidade o esbofeteou: algumas regiões de Chiapas viviam com estruturas sociais tão atrasadas que se assemelhavam ao período medieval, e sua alma ficou perturbada pelo tratamento dado aos índios escravos que eram comprados e vendidos como ovelhas. Samuel Ruiz substituiu um Estado ausente e se converteu em defensor dos pobres e advogado dos índios, promoveu o respeito à mulher e às crianças, a tomada de consciência dos atores sociais e a “revolução das expectativas crescentes”. Em 1988, fundou o Centro de Direitos Humanos Frei Bartolomeu de las Casas, um dos mais importantes e reconhecidos no México até hoje.

Figura central na Conferência Episcopal Latinoamericana e em Roma, ganhou fama mundial em 1991, durante o levante do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN). Sua intervenção impediu um massacre que poderia ter se tornado um genocídio, e ele se converteu em um ator fundamental nas negociações de paz entre o EZLN e o governo mexicano ao qual havia declarado guerra, ainda que Jean Meyer tenha documentado a condenação de Tatik Samuel à luta armada e seu distanciamento do mítico Subcomandante Marcos, que nunca tornou público. Apesar disso, em maio de 1998, o então presidente Ernesto Zedillo acusou o bispo de encabeçar a “pastoral da divisão” e a “teologia da violência”, devido à decisão de Tatik de dedicar sua vida a formar comunidades eclesiais de base em cada uma das comunidades indígenas de Chiapas.

O papel conciliador de Samuel Ruiz também fez com que participasse de uma comissão de negociação entre outra guerrilha mexicana, o Exército Popular Revolucionário (EPR) e o governo federal. Também participava dessa comissão o escritor Carlos Montemayor, falecido no ano passado.

Samuel Ruiz vivia há vários anos em Querétaro, 200 quilômetros ao norte da capital do país, e realizava apenas visitas esporádicas à diocese da qual foi nomeado bispo emérito. A distância que manteve obedecia a sua intenção de não interferir no trabalho de seu sucessor, mas seus 40 anos de trabalho nesse estado mexicano deixou uma marca que o novo bispo Felipe Arizmendi não pode alterar, particularmente o que o próprio Tatik chamava “a autonomia participativa” de clero e laicos, sob o risco de provocar “uma verdadeira sangria”, como advertiu o historiador Jean Meyer.

Como bispo da diocese de Chiapas, Samuel Ruiz desenvolveu uma intensa ação através do Comitê de Solidariedade com os Povos da América Latina, viajando a diversos países, com grupos, movimentos sociais cristãos e não cristãos. Uma de suas intervenções mais conhecidas foi em favor dos milhares de guatemaltecos que fugiram para o México no final dos anos 80 e início dos 90 para não serem massacrados pelo exército daquele país e seus esquadrões da morte, conhecidos como kaibiles.

Seu ativismo vinha de longe. Em agosto de 1976, apenas alguns dias após o assassinato do bispo de Rioja, monsenhor Enrique Angelelli, pela ditadura militar argentina, participa do Encontro de Bispos Latinoamericanos, realizado em Riobamba, Equador, e é preso pela ditadura militar desse país junto com outros 20 bispos, sacerdotes, teólogos e assessores, entre eles Adolfo Pérez Esquivel. Vinte e cinco anos depois desse episódio, o Nobel da Paz argentino apresentou a candidatura do bispo mexicano ao mesmo prêmio.

Em 16 de setembro de 2001, por ocasião de um aniversário da independência do México, Pérez Esquivel fez um discurso laudatório sobre Samuel Ruiz no Centro de Direitos Humanos de Nuremberg, que lhe outorgou naquele ano o Prêmio Internacional de Direitos Humanos, um dos tantos que o bispo emérito de Chiapas recebeu. Pérez Esquivel disse então que Samuel Ruiz era uma das “vozes proféticas que anunciam e denunciam a situação de violência e injustiças que vive a maioria dos povos latino-americanos. São as vozes dos despossuídos, dos sem voz que vão recuperando seu protagonismo histórico, o sentido da vida, da dignidade e esperança, na base do qual é possível construir um mundo mais justo e humano para todos”.

Tradução: Katarina Peixoto

Polícia enfrenta manifestantes em ‘dia da revolta’ no Egito

Do sitio da BBC-Brasil

Manifestantes no Cairo
A polícia usou canhões de água contra a multidão no Cairo

Tropas de choque na capital egípcia, Cairo, entraram em confronto nesta terça-feira com milhares de manifestantes que exigem reformas políticas no país em um evento batizado na internet pelos participantes de “dia da revolta”.
A manifestação foi inspiradada pela onda de protestos populares que vem sacudindo a Tunísia desde dezembro e que levaram neste mês à renúncia do presidente Zine Al-Abidine Ben Ali.
A polícia usou canhões de água e bombas de gás de efeito moral para dispersar a multidão que se reuniu no centro do Cairo.
Aglomerações e manifestações populares são proibidas há décadas no Egito, governado desde 1981 por Hosni Mubarak.
Oposição dividida
Um correspondente da BBC na cidade diz que ocorrem manifestações em diversos pontos do Cairo e que o alto comparecimento parece ter surpreendido até os organizadores.
Os protestos começaram pacíficos, mas à medida em que cresciam, surgiram os primeiros episódios de violência.
Ocorreram protestos também em outras cidades, como Alexandria, no norte do país.
Os protestos reuniram milhares de pessoas no Cairo

Os manifestantes têm três reivindicações principais: a suspensão da lei de emergência que vigora permanentemente no país (e que restringe liberdades civis), a saída do ministro do Interior e a adoção de um limite de tempo ao mandato presidencial – o que poderia levar ao fim do governo de Mubarak.
O Egito compartilha muitos dos problemas que geraram os problemas na vizinha Tunísia, como o aumento de preços de alimentos, alto índice de desemprego e revolta contra o que percebem ser a corrupção do governo.
Protesto em Túnis
Manifestações de Túnis inspiraram os protestos egípcios

Mas a oposição egípcia se dividiu em relação ao protesto.
Um de seus líderes, Mohamed El Baradei, pediu para que a população participasse, mas o maior movimento oposicionista do país, a Irmandade Muçulmana, assumiu uma posição mais ambivalente.
A organização disse que não iria aderir oficialmente aos protestos, mas também não iria pedir que seus membros não participassem deles.
A população egípcia tem um nível educacional muito mais baixo do que a tunisiana, com alta taxa de analfabetismo e pouco acesso à internet.

Hoje é o aniversário de Tom Jobim, Dia Nacional da Bossa Nova

Jorge Seadi e Milton Ribeiro no Sul21


A Bossa Nova, um jeito de cantar e tocar samba surgido no Brasil ao final da década de 50, tornou-se um dos gêneros musicais brasileiros mais populares, levada pelas vozes de João Gilberto, Luiz Bonfá, Vinicius de Morais, Tom Jobim e, atualmente, por uma série de artistas jovens. Tom, seu principal compositor, autor de Águas de Março, Chega de Saudade, Garota de Ipanema e tantas obras-primas, estaria comemorando hoje 83 anos de vida. Por isso, em 25 de janeiro, é comemorado o Dia Nacional da Bossa Nova.

(Até o Google curvou-se a Jobim e à Bossa, alterando seu logotipo).

A palavra “bossa” surgiu pela primeira vez na música popular brasileira num samba de Noel Rosa ainda na década de 30. “O samba, a prontidão e outras bossas…”. Nos anos seguintes, a bossa apareceu nos sambas de breque. O breque era o espaço que o cantor usava para dizer livremente alguma coisa (com bossa, com jeito). A “bossa nova” como seria conhecida mais tarde, teve a influência da música americana do pós-guerra — principalmente o jazz — e começou a ser criada através do sucesso de cantores como Dick Farney e Lúcio Alves, que cantavam com um maneira mais tranquila e sussurrada, sem empostar a voz.
O movimento da bossa nova começou com um compacto simples do baiano João Gilberto. No lado A estava “Chega de Saudade”, de autoria de Tom Jobim e Vinicius de Morais; no lado B estava “Bim Bom”, do próprio João Gilberto. Era agosto de 1958.  O escritor Ruy Castro, autor do livro “Chega de Saudade”, diz que a batida do violão de João Gilberto e as letras de abordagem leve e descompromissada de Vinicius, Tom, Carlos Lyra e outros foram as primeiras características da Bossa Nova.
Garota de Ipanema, sucesso mundial na voz de João Gilberto e depois nas de Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan e de centenas de artistas, foi uma das canções mais gravadas de todos os tempos, rivalizando com algumas dos Beatles.
Em 1965, com Arrastão, de Edu Lobo e, curiosamente, Vinícius de Moraes, a Bossa Nova foi equivocadamente declarada extinta. Em verdade, o que ocorreu foi a cisão de viés ideológico que criou a MPB. Um grupo formado por Marcos Valle, Dori Caymmi, Edu Lobo e Francis Hime e estimulado pelo Centro Popular de Cultura da UNE, tinha uma visão mais popular e nacionalista, criticando a influência do jazz norte-americano na bossa nova. Propunha uma reaproximação com compositores de morro, como o sambista Zé Keti. Um dos pilares da Bossa Nova, Carlos Lyra, aderiu a esta corrente, assim como Nara Leão, que promoveu parcerias com artistas do samba como Cartola e Nelson Cavaquinho e baião e xote nordestinos como João do Vale. Nesta fase de releituras da Bossa Nova, foi lançado em 1966 o antológico LP “Os Afro-sambas”, de Vinicius de Moraes e Baden Powell. Porém, uma revisão da produção desta época deixa claro que, se houve uma mudança no conteúdo das letras, a música e o modo de interpretar da Bossa Nova tinha invadido tudo de tal forma que hoje poucos identificam Edu Lobo — depois grande parceiro de Tom — , Carlos Lyra e Marcos Valle como uma reação a ela e sim como membros do movimento.
Entre os artistas que se destacaram nesta segunda geração (1962-1966) da bossa nova estão Paulo Sérgio Valle, Edu Lobo, Ruy Guerra, Dori Caymmi, Nelson Motta, Francis Hime, Wilson Simonal, entre outros.
E a MPB até hoje não quer saber deste negócio de você longe de mim, como deixa claro as palavras de Vinícius em Chega de Saudade.

Gandaia nacional


<br /><b>Crédito: </b> ARTE PEDRO LOBO

Crédito: ARTE PEDRO LOBO

Juremir Machado no Correio do Povo

Volto ao assunto. Estou obcecado. Quanto mais ouço os defensores de pensões vitalícias para ex-governadores, mais me convenço que se trata de conversa fiada, "enrolation", privilégio e teta. Ninguém pode receber aposentadoria por quatro anos de trabalho. Muito menos por noves meses ou míseros dez dias de interinidade. Pedro Simon justificou-se: não consegue sustentar a família só com seu salário de senador. Uau! Barbada é sustentar a família com o salário mínimo. Ou com salário de professor da rede estadual. Santa Catarina está na linha de frente da farra dos ex-governadores. Depois da farra do boi, a farra dos donos dos bois. Até a filha de um governador do século XIX, Hercílio Luz, recebe. O pobrezinho do Jorge Bornhausen também ganha sua bolsa-ex-governador. Ainda bem. Ou não conseguiria sobreviver.

Os políticos catarinenses são generosos. Com eles mesmos. Aumentaram em 300% o valor da bolsa-mamata de ex-governador e garantiram o benefício para herdeiros. Leonel Pavan ficou menos de um ano no governo de Santa Catarina. Embolsa R$ 22 mil mensais. Santa Catarina gasta R$ 3,1 milhões por ano sustentando nababos. Não seria a hora de o povo catarinense perder a compostura e gritar "vai trabalhar, vagabundo!"? Ninguém é obrigado a ser governador. As pessoas candidatam-se por vaidade, vontade de poder ou pura ambição, tudo isso embalado como desejo de trabalhar pelo bem comum. Durante o mandato, não há gasto. Comem, bebem e viajam por conta dos cofres públicos. Terminada a tarefa, só há uma coisa a fazer: procurar trabalho. Ir para o batente como todo mundo.

Não interessa a importância da função. O Estado não existe para distribuir honrarias com o dinheiro público. Também não interessa que o número de beneficiados seja limitado e que o impacto nas contas públicas seja reduzido. Só interessa isto: não está correto. A mídia precisa repetir isso diariamente. É a única maneira de pressionar essa turma que aprendeu a pensar assim para manter seus mimos: daqui a pouco passa. Que gandaia! Tem gente se fazendo de desentendido para mamar deitado. Em certos países europeus, vereador não recebe salário durante o mandato. Continua a trabalhar normalmente. Imaginem pensão vitalícia para quem deixou o cargo. Estou numa fase direta: os políticos não nos levam a sério, riem da nossa cara, debocham dos eleitores, fazem o que bem entendem e seguem em frente. Para a plebe, correção salarial pela inflação. Para eles, mais de dez vezes acima das perdas inflacionárias. No popular, pois somos amigos, eles estão de sacanagem com a gente, não é mesmo?

A prova de que isso é rapacidade está no fato de que vários acumulam ganhos, inclusive polpudas aposentadorias. Proponho um adesivo para uso em carros: xô, carrapato! Pensando bem, dá para entender. O sujeito passar quatro anos sem sequer estender a mão para abrir a porta. Quando termina, não sabe fazer mais coisa alguma no mundo real. Ainda bem que há exceções. Ou haverá. Infelizmente, não me ocorre um nome agora para citar. Vou sair no Carnaval fantasiado de vaca leiteira. Buuuuuu!

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br