A
escalada de violência na Faixa de Gaza em março confirmou o caráter
instável do status quo e o impasse da estratégia israelense
|
por Jean-Pierre Filiu no LeMondeBrasil |
(Garoto palestino agita a bandeira de seu país durante protesto na Faixa de Gaza)
A Faixa de Gaza, como entidade autônoma, foi moldada pela guerra de 1948-1949. Durante o conflito, muitos
palestinos expulsos afluíram para lá. O primeiro-ministro israelense,
David ben Gurion, sempre visionário, compreendeu imediatamente o risco
de tal concentração de refugiados no noroeste do Neguev. Isso porque a
barreira natural do Deserto do Sinai impedia que ocorresse em Gaza um
fenômeno de dispersão, como se deu nos países vizinhos, com o surgimento
de campos de refugiados ao redor de Amã, Beirute e Damasco. Assim, para
pelo menos dois terços de sua população, o território se transformou
num enorme campo de refugiados. Ben Gurion pensou em resolver o problema
com a oferta de anexação de Gaza, mas ela foi enterrada em 1949, na
Conferência de Lausanne. O território tornou-se então o abscesso da
frente meridional, campo de teste para incursões de intimidação e
bombardeios indiscriminados.
A invasão israelense de 1956, durante a crise de Suez, foi acompanhada
por uma sangrenta repressão, mas Gaza teve de ser evacuada, sob pressão
internacional. Ben Gurion então achou que devia fazer uma aposta-padrão
na mão de ferro do presidente egípcio, Gamal Abdel Nasser, o qual
garantiu uma efetiva paz no território até 1967. Para Israel, a ocupação
da Faixa de Gaza, desde a abertura da guerra de junho, era acima de
tudo um desafio em termos de contrainsurreição, diante da uma guerrilha
palestina de tenacidade inigualável. O general Moshe Dayan, tendo
esmagado brutalmente os insurgentes, decidiu dissolver Gaza nas “portas
abertas” (livre circulação) com Israel e Cisjordânia. Essa política deu
frutos por duas décadas. Em 1993, o primeiro-ministro Yitzhak Rabin
decidiu ao mesmo tempo sistematizar as “barreiras” do território e abrir
um diálogo com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP).
Livrar-se de Gaza tornou-se a obsessão das autoridades israelenses, que
buscavam transferir a manutenção da ordem a uma força palestina, mesmo
reservando-se um direito de intervenção permanente em caso de ameaça. É
evidente a continuidade estratégica entre a retirada parcial de 1994 e o
desengajamento unilateral de 2005. Porém, enquanto Rabin desencadeou um
processo de paz, o primeiro-ministro Ariel Sharon colocou Gaza diante
do fato consumado.
CUSTO EXORBITANTE
Desde 2005, Israel enfrenta o impasse de sua abordagem exclusivamente
securitária, que alimenta, com sua brutalidade, uma mobilização
internacional pontuada por crises. As “missões civis”, nascidas da
urgência humanitária, atingiram seu limite, pois não são capazes de dar
uma perspectiva à população de Gaza. Esta continua suspensa no braço de
ferro entre o Fatah, que nunca aceitou a vitória islâmica nas eleições
de janeiro de 2006, e o Hamas, que assumiu o controle do território em
junho de 2007. Assim, o impasse da estratégia israelense acentua o
impasse humanitário, que por sua vez é agravado pelo impasse político
que perdura na cena palestina. O 1,5 milhão de habitantes do território,
já submetidos a um isolamento físico de rigor excepcional, são também
prisioneiros desse triplo impasse.
O desengajamento israelense e o desmantelamento das colônias da Faixa
de Gaza, no final do verão [do Hemisfério Norte] de 2005, foram
seguidos, um mês depois, pelo início de uma ofensiva de nome
premonitório: “Eterno Recomeço”. Sucederam-se as incursões e os
bombardeios israelenses, o mais recente deles em março de 2012. A
captura do soldado Gilad Shalit, no dia 25 de junho de 2006, inaugurou
uma nova escalada militar. A quebra da trégua entre o Hamas e Israel, de
junho a dezembro de 2008, levou à onda de violência da operação “Chumbo
Grosso”, cujas vítimas se contam na proporção de um israelense para
cada cem palestinos, ainda que, apesar da ação, os ataques de foguetes
contra Israel não tenham cessado em 2009. Durante os seis primeiros
meses de 2010, o ocupante matou 34 palestinos na Faixa de Gaza
(incluindo onze civis), ao passo que os três israelenses mortos eram
todos militares.1 O segundo semestre de 2010 terminou com um saldo de 37
palestinos mortos (incluindo doze civis) e nenhuma vítima israelense.2
Israel acredita ter encontrado a fórmula de gestão de sua fronteira
meridional, a um custo sem dúvida exorbitante para os habitantes de
Gaza, mas perfeitamente aceitável para a opinião pública.
A revolução egípcia, que eclodiu em 25 de janeiro de 2011 e em dezoito
dias obrigou o presidente Hosni Mubarak a renunciar, logo dissipou essa
ilusão estratégica. Numa inversão de papéis, é a Faixa de Gaza que
alimenta, por meio de túneis, a cidade egípcia de Rafah, isolada do
mundo – isto é, do Cairo – pelos motins do Canal de Suez. Israel, que
insistiu para que o tratado de paz de 1979 com o Egito proibisse
qualquer implantação militar no Sinai, autorizou uma presença sem
precedentes das forças armadas egípcias a leste de Suez, a fim de conter
a agitação revolucionária...
No dia 11 de outubro de 2011, por meio da mediação do Cairo e do
serviço de inteligência alemão (BND), Hamas e Israel conseguiram chegar a
um acordo de troca de prisioneiros. A libertação do soldado Gilad
Shalit, uma semana depois, foi condicionada à libertação de 1.027 presos
palestinos: 477 de uma lista aprovada pelo Hamas e Israel, mais 550
soltos a critério de Israel em um prazo de dois meses. É verdade que o
Hamas não conseguiu a libertação das figuras emblemáticas do Fatah –
Marwan Barghouti – e da Frente Popular para a Libertação da Palestina
(FPLP) – Ahmed Saadat. Mas garantiu a de muitos militantes do Fatah, dos
Comitês de Resistência Popular e da Jihad Islâmica. Principalmente,
assegurou o retorno de dezenas de quadros e membros históricos, alguns
condenados a várias penas de prisão perpétua por envolvimento em ataques
contra Israel.
Foram necessários quase 2 mil dias para que Israel aceitasse as
exigências básicas transmitidas pelo Hamas após a captura de Shalit.
Durante cinco anos e meio, seu Exército encadeou ofensivas para quebrar
ou pelo menos dobrar o Hamas. O governo de Benjamin Netanyahu, no
entanto, não sofreu nenhuma consequência do fracasso dessa opção
estritamente militar, já que nunca foi capaz de ameaçar o controle do
Hamas sobre a Faixa de Gaza. Pelo contrário, é o movimento islâmico que
mantém a intensidade do conflito no nível mais baixo, contornando o
bloqueio por meio de seus túneis, estimados em seiscentos pela ONU.
“FIM DA DIVISÃO”
No inverno [do Hemisfério Norte] de 2011, uma militância inédita em
Gaza revelou-se sincronizada com as reivindicações populares em Túnis e
no Cairo. Uma manifestação de apoio à revolução egípcia foi proibida no
dia 31 de janeiro de 2011. A derrubada do presidente Mubarak, em 11 de
fevereiro, animou os manifestantes palestinos. O grito “O povo quer
derrubar o regime” foi adaptado em Gaza para “O povo quer o fim da
divisão”, colocando Hamas e Fatah lado a lado em nome dos interesses do
povo palestino. No dia 14 de março de 2011, milhares de jovens
manifestavam-se em favor dessa causa. No dia seguinte, eles já eram dez
vezes mais numerosos, enquanto os protestos eram muito mais limitados na
Cisjordânia. A manifestação degenerou, pois militantes do Hamas
quiseram impor o emblema do partido aos manifestantes, que só permitiam a
bandeira palestina.
Apesar desses incidentes, a dinâmica unitária preparou o terreno para
uma reconciliação, pelo menos formal, entre Hamas e Fatah. A queda do
regime de Mubarak, menos preocupado em mediar do que em conter o
movimento islâmico, também contribuiu para isso. E o enfraquecimento da
Síria de Bashar al-Assad forçou a liderança exilada do Hamas a dar mais
valor às reivindicações de Gaza. Em 4 de maio de 2011, os dois
dirigentes, Khaled Meshaal e Mahmoud Abbas, que não se encontravam desde
a efêmera “união nacional” concluída em Meca quatro anos antes,
reuniram-se no Cairo para assinar um acordo. Um quadro de cooperação
entre os serviços de segurança de Ramallah e de Gaza foi aceito. O
princípio do acompanhamento pela OLP das negociações com Israel foi
apoiado pelo Hamas, que não se considera ligado a essas conversações,
mas está disposto a aceitar suas consequências.
Depois de tanto sangue derramado e tantas oportunidades perdidas, os
habitantes de Gaza lutam para acreditar que a página das batalhas de uma
Palestina contra a outra foi de uma vez por todas virada. Uma real
reconciliação continua sendo condição indispensável para tirar o
território do limbo em que ele foi relegado desde junho de 2007. A
decisão última está nas mãos de Abbas e Meshaal, que vivem
respectivamente em Ramallah e no Catar (desde que saiu de Damasco), bem
longe de Gaza e suas preocupações. As vinganças de milícias rivais e a
duplicação de grandes burocracias3 representam um sério desafio a
qualquer forma de aproximação duradoura. Mas como imaginar um futuro
decente e um destino coletivo para a população de Gaza enquanto os dois
principais movimentos palestinos continuarem a se destruir mutuamente?
Três gerações cresceram nessa faixa de terra moldada pela história. A
geração do luto, de 1947 a 1967, preparou o caminho para a do
arrasamento, de 1967 a 1987, e em seguida para a das intifadas, de 1987 a
2007. Porém ali, como em todo o resto da Palestina, o caminho para sair
desse pesadelo coletivo é simples e conhecido. Ele se desdobra num
tríptico virtuoso: desenclave, desenvolvimento e desmilitarização. Tal
dinâmica inverteria as tendências consistentemente seguidas há duas
décadas. A juventude de Gaza já demonstrou, na mobilização de março de
2011, determinação em reverter uma ordem tão sinistra. Para conjurar
essa fatalidade, seria preciso retornar ao pressuposto mais promissor
dos acordos de Oslo: Gaza em primeiro lugar.
Jean-Pierre Filiu
Professor na Sciences Po Paris e autor, entre outros livros, de Histoire de Gaza, publicado pela Fayard.
Ilustração: Ibraheem Ab Mustafa / Reuters 1 Relatório semanal do Gabinete de Coordenação de Assuntos Humanitários das Nações Unidas, 2 jul. 2010. 2 Relatório semanal do Gabinete de Coordenação de Assuntos Humanitários das Nações Unidas, 7 jan. 2011. 3 O Hamas controla o salário de 31 mil funcionários na Faixa de Gaza, onde a Autoridade Palestina mantém cerca de 70 mil agentes remunerados. |
Neste
momento se mostra mineira – nasceu no estado de Minas Gerais, onde os
políticos têm fama de dissimulados –, mas qualquer um sabe que por trás
de todo esse aparato existe ou uma tentativa de desmonte de quadrilhas
de todos os naipes que impedem projetos de seu governo, ou vontades
políticas que tenha, um processo de auto-afirmação – até agora nas
pequenas crises corria a tomar a bênção de Lula. Nem importa que o
formigueiro não tenha sido detectado antes. Agora está aí.
Tem uma batata quente nas mãos. O Código Florestal aprovado pelo
Congresso e que praticamente transforma o Brasil num futuro deserto.
O que vai fazer ou deixar de fazer é uma incógnita.
Para além de Dilma o seu partido tem a oportunidade de reencontrar
seu caminho histórico, mesmo que isso provoque um furacão político e
possa, segundo alguns golpistas de eterno plantão, levar o Brasil a um
beco sem saída.
Carlos Cachoeira é uma peça numa monstruosa engrenagem que ganhou uma impressionante estrutura e por conta
dela uma eficiente atuação desde as privatizações e as políticas
neoliberais de FHC e o "capitalismo a brasileira" inventado por Lula.
Se vai correr numa faixa paralela à cachoeira corre também riscos de ser tragada no curso do processo e não ter condições, mais à frente, de reverter o jogo sórdido dos controladores do Estado brasileiro.
Está, literalmente, assentada em cima de um formigueiro. E foi um
presidente – Washington Luís – que afirmou em seu governo que "ou o
Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil". A saúva é uma
espécie de formiga que como gafanhotos devora tudo e pode devotar todos
também.
Dilma sabe que a mídia de mercado – atolada até a ponta do dedo
mindinho na corrupção, é corrupta em si – não vai tolerar ser desafiada e
já deu mostras que a reação se isso acontecer vai ser devastadora.
É impossível que não saiba que tem que enfrentá-la. De nada valeram
os esforços de ensinar a fazer panquecas, ou omeletes, no programa de
Ana Maria Braga. A mídia permanece como a esfinge – "decifra-me, ou te
devoro". O caminho é "Enfrenta-me, ou te devoro".
Falou-se em "usina de popularidade" em relação à crítica da
presidente aos altos juros dos bancos privados, na contramão dos bancos
públicos. Até que ponto vai ser suficiente para enfrentar os desafios
que virão não se pode avaliar.
Com certeza o desmonte do modelo político e econômico gerado desde o
governo FHC e intocado por Lula, é fundamental para que se possa pensar o
Brasil potência mundial de fato e nunca potência de ocasião, exportador
de matérias primas, sob controle dos barões do agronegócio.
Trabalhadores espanhóis saíram às ruas no Primeiro de Maio para
protestar contra as medidas tomadas pelo governo daquele país diante da
crise que afeta a União Europeia.
"Querem acabar com tudo, trabalho, dignidade e direitos". Era o que
estampavam as faixas. Um quarto da população desempregada e entre os
jovens metade deles.
Dilma tem ignorado a política de integração latino-americana e optado
por negociar as divergências diretamente com os Estados Unidos. Os
norte-americanos sabem que por pior que isso possa ser, é bem melhor que
a presidente do Brasil colada a líderes como Chávez, Cristina Kirchner,
Evo Morales e outros. E negociar divergências diretamente não é ruim
para os EUA, pelo contrário.
Existe uma cunha nesse trem todo. O tratado de livre comércio com
Israel firmado por Lula e que abriu as portas do País ao controle de
setores estratégicos e essenciais da economia por grupos sionistas.
Isso, por si só, inclui o Brasil no projeto GRANDE COLÔMBIA.
Quem vai ter que decifrar-se para não ser devorada é a própria Dilma.
Sua formação de economista lhe permite prever tempestades futuras no
caminho. Seja por conta do naufrágio da União Europeia, do ano eleitoral
nos Estados Unidos e do envolvimento do Brasil em assuntos que escapam a
mínima compreensão de qualquer um que raciocine com lógica.
A entrada da Colômbia no antigo projeto SIVAM – Sistema de
Monitoramento da Amazônia –, primeira grande fraude do governo FHC e que
inclui os EUA. As forças brasileiras no Haiti para uma reconstrução que
não existe. Uma fragata numa "força de paz" no Oriente Médio sem o
menor sentido e as negociações que correm por baixo dos panos para o
envio de tropas brasileiras à Síria com o objetivo de "pacificar".
Uma faísca da crise europeia que atinja o País vai diretamente a tal
"usina de popularidade" que Dilma teria aberto ao criticar os juros
altos de bancos privados.
As chamadas grandes potências – hoje na verdade apenas três, EUA,
China e Israel – costumam ser solidárias nos saques, nas extorsões e nos
golpes quando se trata de salvar a própria pele, ou de implementar
projetos e planos de controle e domínio dos "negócios".
Por enquanto as formigas do formigueiro em que Dilma está assentada
não deram sinais que partiram para o ataque. Só avisos e ameaças. Estão
esperando a definição da presidente. Se de fato é ataque, ou se no meio
do caminho tudo acaba virando atração turística, falo de cachoeiras.
De qualquer forma é a primeira vez desde que assumiu o governo que a
presidente do Brasil dá mostras que vai voar com suas próprias asas. Se
são de cera e irão se derreter no calor da crise é outra história.
Em meio a isso tudo as forças populares. A luta não é contra a
corrupção exclusivamente. A corrupção é parte intrínseca do capitalismo.
A luta é contra o modelo, o sistema. É por ai que se pode pulverizar as
forças despejadas pelo monte de cachoeiras a jorrar milhões
lubrificando um poder podre.
De repente, não mais que de repente, as formigas podem até ser
devoradoras de sapatos de dez mil reais o par nos pés da sorridente
senhora Sérgio Cabral, nas farras de Paris