quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O calote agropecuário: o lucro é deles, o prejuízo de todos

Sakamoto

Dá paúra no estômago ver o governo federal discutindo a renegociação da dívidas dos produtores rurais. Entra ano, sai ano, é sempre a mesma lenga-lenga. Produtores agropecuários colocam o governo contra a parede para postergar o pagamento das dívidas com as agências públicas de financiamento (só o Banco do Brasil é responsável por 70% dos R$ 140 bilhões de dívidas). Enquanto isso, o governo procura a melhor moeda de troca possível com a bancada ruralista no Congresso Nacional. Aprovação de emendas, de leis, desobstrução de pautas. Tudo está à venda.

Emprestar para produzir a juros baixos é função do Banco do Brasil (aliás, eles deveriam baixar os juros ainda mais, forçando o restante do mercado de crédito e facilitar o acesso a crédito dos pequenos produtores, mas isso é outra história). É por essa razão que ele é público, para fomentar o desenvolvimento. O problema não é emprestar e sim não devolver o empréstimo ou devolvê-lo muito tempo depois. Considerando o fato do banco ser estatal, o calote é em cima de todos nós.

Problemas acontecem, quebras de safra, catástrofes, enfim. Porém, essas desgraças não somam R$ 140 bi – conseqüência de péssimas gestões, financiamentos fantasmas, entre outras causas menos naturais.

Sobra óleo de peroba na dispensa dos grandes produtores rurais. Durante o período de bonança, fazem gastos pessoais e investimentos empresariais além de suas possibilidades. Quando vem uma fase difícil – a queda do preço da soja no mercado internacional, por exemplo - eles pedem para dividir os prejuízos.

É um capitalismo de brincadeira. Eles são capitalistas selvagens quando superexploram trabalhadores, retalham terra pública, roubam os recursos naturais. Mas tornam-se bastante "socialistas" quando nuvens negras se aproximam no horizonte. Não querem nem ouvir dizer de participação mínima do Estado.

Afinal de contas, no discurso, critica-se o Estado e sua ingerência. Na prática, mama-se nas tetas públicas quando as coisas não saem como o planejado. O lucro é depositado. O prejuízo repartido.

Mas os grandes produtores brasileiros têm bons exemplos. O mercado dos Estados Unidos, lar do neoliberalismo e do discurso do Estado mínimo, recebeu a notícia de que o governo iria fazer uma injeção de dezenas de bilhões de dólares nos últimos dias para frear o pânico de uma recessão. Jogam o jogo, perdem e chamam a mamãe para dar um jeito. Lá como aqui, a mãe é o resto da população que não tem fazenda, indústria ou ações. Na hora de cobrir rombos, o Estado é útil.

Não estou esquecendo que endividados estão todos os produtores rurais e não só os latifundiários. Mas os grandes (em menor número, com dívidas gigantes) juntam-se aos pequenos (em maior número, mas com dívidas pequenas) para engrossar o caldo, dizer que o problema é de todo um setor (ou seja, dividir os ônus) e aumentar a pressão. Quando essa ação termina, tudo volta ao normal. Com os grandes bem de vida e os pequenos lutando pela sobrevivência.

Deixo uma sugestão: que tal vetar renegociação de empréstimos com propriedades que desmataram além do limite permitido por lei? Vamos começar pelos 36 municípios sob embargo do governo. Que fique claro a esses proprietários rurais: paguem a dívida ou sejam acionados pelo calote. Garanto que teria muita gente perdendo terra e tomando vergonha na cara.
enviada por Sakamoto

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