E
quem foi eleito para proteger a dignidade do cidadão, acaba sendo
exatamente seu algoz. Dessa vez, com o agravante dos nobres políticos
também explorarem adolescentes em suas terras, jogando uma pá de cal no
futuro do país. E eu fico me perguntando por que ainda me surpreendo
com isso…
O deputado federal Urzeni Rocha (PSDB-RR) e o prefeito de Toledo
(MG), Vicente Pereira De Souza Neto (PSDB) foram flagrados explorando
mão-de-obra escrava em Roraima e Goiás, respectivamente. Ao todo, 47
pessoas foram libertadas de condições análogas à escravidão das
propriedades dos políticos no último mês. A apuração foi de Bianca Pyl, aqui da Repórter Brasil, da qual reproduzo alguns trechos:
A primeira fiscalização aconteceu na Fazenda Santana, propriedade do
prefeito do município mineiro localizada em Vianópolis (GO), região
sudeste do Estado. A operação teve início no dia 13 de novembro e
libertou 21 trabalhadores, incluindo dois adolescentes de 16 e 17 anos
de idade. Os trabalhadores foram aliciados no Maranhão pelos “gatos”
(intermediários de mão-de-obra) Ésio de Jesus Rocha e Walter Moreira da
Silva, há cerca de um mês. Os gatos recebiam 4% de toda a produção
realizada pelos trabalhadores. Os empregados colhiam batatas.
A jornada de trabalho era exaustiva e os empregados não tinham
descanso semanal. A colheita não era suspensa nem nos domingos e
feriados. “A pausa para as refeições durava alguns minutos porque, após
colhidas, as batatas não podem ficar expostas ao sol por muito tempo”,
detalha Roberto.
Os trabalhadores afirmaram que dormiam no chão e tinham que dividir
as despesas com alimentação. Eles declararam ter passado fome. O
alojamento era uma casa velha sem camas, colchões ou roupas de cama. Os
trabalhadores dormiam em redes ou colchonetes velhos e sujos. A cozinha
tinha apenas um fogão de duas chamas e uma mesa improvisada, sendo que
os alimentos e panelas eram colocados no chão. Havia apenas um banheiro
e um chuveiro para todos os trabalhadores.
Durante o dia, os empregados consumiam a água captada das torneiras
do alojamento. Nas frentes de trabalho, Não havia água potável nem
instalações sanitárias. O mato era usado como banheiro. O empregador
não fornecia equipamentos de proteção individual (EPIs) e a maioria
trabalhava descalço ou de chinelos, sem luvas ou chapéus. O ônibus que
transportava os trabalhadores não possuía certificado de inspeção e não
tinha sequer carteira de habilitação para dirigir.
Após a fiscalização, foram emitidas Guias de Seguro-Desemprego do
Trabalhador Resgatado para as vítimas. O pagamento das verbas da
rescisão do contrato de trabalho foi efetuado. A Repórter Brasil não
conseguiu localizar o prefeito Vicente Pereira De Souza Neto (PSDB-MG).
A fiscalização na Fazenda Paraíso, do deputado federal Urzeni Rocha
(PSDB-RR), no município de Cantá (RR), foi motivada por uma denúncia de
um trabalhador à Polícia Federal (PF). A operação ocorreu em 23 de
novembro e contou com a participação da Superintendência Regional do
Trabalho de Roraima (SRTE/RR), Ministério Público do Trabalho (MPT) e
agentes da PF. Foram libertados 26 trabalhadores, incluindo quatro
adolescentes, com idades entre 16 e 18 anos. A propriedade tem mais de
3,5 mil cabeças de gado.
Os empregados dividiam a água de um igarapé com os animais. “A mesma
água era utilizada para beber, preparar as refeições e tomar banho”,
explica Gilberto Souza dos Santos, procurador do trabalho. De acordo
com Mário Rocha, auditora fiscal do trabalho, a comida fornecida era de
péssima qualidade e quando a fiscalização chegou ao local estava quase
acabando. Os trabalhadores eram responsáveis pelo roço de juquira –
limpeza de terreno para a formação de pastagem para pecuária.
O empregador assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) em que
se compromete a pagar R$ 100 mil por danos morais coletivos. “O valor
será revertido para programas de alfabetização na região, já que os
trabalhadores eram analfabetos. Foi o maior acordo realizado pela nossa
Procuradoria [Regional do Trabalho da 11ª Região (PRT-11)] e tem um
cunho pedagógico para o fazendeiro”, explica Gilberto, do MPT.
A Repórter Brasil entrou em contato com a assessoria de imprensa do
deputado na Câmara e foi informada que ele ficará fora até terça-feira
(8) e não havia possibilidades de entrevistá-lo. Detalhe: o deputado
federal votou a favor da chamada “Emenda 3″, incluída no projeto de lei
da “Super Receita”, que impedia que auditores fiscais do trabalho
apontassem vínculos entre patrões e empregados quando de
irregularidades. Graças ao veto à emenda, a fiscalização realizou com
plenitude a sua atribuição na fazenda do político.
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