França: A explosão do antisarkosismo
Editado por Cristieni Castilhos
PARIS, França – Um enigma paira sobre o primeiro turno das eleições
regionais de domingo [14 de março]. Se as previsões das pesquisas de
opinião se confirmarem, a França amanhecerá na segunda-feira coberta
pelo véu rosa dos socialistas, e pelo verde, dos ecologistas, e o que
será dessa vasta e mal-humorada corrente que é o Antisarkosismo? A
parcela da população que reprova a ação e o estilo do presidente francês
e sua equipe é grande, mas carece de líderes que agrupem os
descontentes.
O chefe de Estado cristaliza em torno de si um poderoso sentimento de
insatisfação que se manifesta nos baixos níveis de popularidade com que
ele governa. Nicolas Sarkozy tem apenas 37 por cento de opiniões
favoráveis e as pesquisas prevêem para este domingo [12 de março] uma
derrota significativa do partido que ele mesmo promoveu, a UMP [União
por um Movimento Popular, sigla em francês]. Operários, Universitários,
professores, estudantes, advogados, médicos, executivos, trabalhadores,
funcionários e desempregados formam o corpo desse movimento sem
liderança, mas que se expressa com solidez nas redes sociais e cujos
argumentos podem ser ouvidos nas filas de supermercado ou nos balcões de
bares.
Por paradoxal que pareça, o antisarkosismo não tem realmente quem o
represente de forma coesa. Seus exércitos estão espalhados por todo o
espectro político francês e em diversos movimentos que vão desde os
grupos que defendem os imigrantes, passando pelos psicólogos e os
médicos, os ecologistas, os militantes antiglobalização, os contrários a
organismos geneticamente modificados, os desgostos com as multas de
trânsito, os ativistas que denunciam a “geração precária”, os membros da
“Quinta-feira Negra”- que clama por uma política alternativa para a
habitação, até mesmo a última versão do Antisarkosismo, inspirada no
caso italiano, o “No Sarkozy Day” [Dia do Não ao Sarkozy]. Esses
movimentos de contestação política surgem em grade parte pela Internet.
Os meios de comunicação franceses, sobretudo a imprensa, mantêm uma
distância ainda mais abismal do que os políticos com relação aos
problemas da sociedade.
Por outro lado, não existe hoje uma linha editorial de oposição. Há
certas temáticas em que há oposição na imprensa, mas essas carecem de
continuidade e, por conseguinte, de consistência. O jornal semanal
Marianne, leva a cabo uma campanha sistemática contra Sarkozy, mas não
representa toda a complexidade do antisarkosismo. O que faz o resto da
imprensa parece uma brincadeira inconseqüente que deve fazer rir o
presidente francês. Diante dessa ausência de base e de análise, o
antisarkosismo se estendeu por um espectro hiperfragmentado, mas não por
isso menos real.
O rancor social é profundo. Nicolas Sarkozy herdou também as
desavenças das administrações passadas e coloca-se com certa
responsabilidade global, como se essa sociedade desencontrada e que vem
perdendo suas conquistas e benefícios tivesse inventado tal
responsabilidade sozinha.
Há quem deseje fervorosamente que a seleção francesa de futebol faça
um papel vergonhoso no Mundial africano, porque associam a política de
Nicolas Sarkozy ao treinador da seleção, o impopular Raymond Domenech.
Os bares são palco para um teatro de protestos múltiplos e revelam a
polifonia do desencanto, assim como a solidão eleitoral da sociedade. Em
meio a piadas e críticas, o povo admite que nenhuma figura de oposição
política reflete um projeto alternativo ou inspira suficiente seriedade
para voltarem suas expectativas para ele.
O antisarkosismo aparece hoje como o modelo de uma sociedade
policiada e controlada, desumanizada e centralizada em diversos
arquivos, em que o dinheiro é rei, quem tem amigos influentes é
privilegiado, a indiferença e a vontade de controlar a tudo são
princípios orientadores e que a cobertura política pelos meios de
comunicação já é um recurso desgastado. Até agora, o grande desejo de se
fazer uma convergência entre as diversas demandas setoriais não se fez
realidade. As eleições deste mês talvez marquem uma mudança na maneira
com a qual a oposição assume seu papel, na forma como governa o
Executivo e no perfil que adquire o antisarkosismo. A dimensão do
movimento é mais uma sensação do que o reflexo de idéias políticas
organizadas, especialmente porque os antisarkozy desconfiam dos partidos
políticos como o diabo foge da cruz.
Os antisarkosistas sonham em sair das redes da Internet e levar às
ruas os descontentos com o presidente. Uma viagem do virtual ao real.
Seguindo o exemplo italiano, os criadores do “No Sarkozy Day” convocaram
uma manifestação para o próximo 27 de março para dizer não à política
do presidente. A iniciativa teve origem pelo Facebook sob o
lema de “Um milhão de pessoas contra Nicolas Sarkozy” e agregou muitas
vozes transversais que não se sentem representadas pelo sistema de
partidos políticos e os meios de comunicação, mas simpatizam com o
antisarkosismo.
Segundo Sebastian Ball, um dos fundadores do grupo, o movimento “Um
milhão de pessoas contra Nicolas Sarkozy” conta hoje com 380 mil
membros. Ball afirma que o “No Sarkozy Day” de 27 de março é apenas uma
etapa, que não se trata apenas “de um encontro único entre todos os
descontentes e irritados com Sarkozy”. O que buscam é unir-se e
consolidar-se para mudar o estado das coisas.
Traduzido por: Cristieni Castilhos
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Imagem retirada daqui
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