segunda-feira, 1 de março de 2010

Sobre os "impérios e imperialismo"...

O que fazem os impérios?

por Michael Parenti [*]
Cartoon de Latuff. Quando em 1995 escrevi o livro Against Empire alguns dos meus compatriotas estado-unidenses, tal como seria de esperar, consideraram que era um erro chamar os Estados Unidos de império. Acreditava-se generalizadamente que os governantes dos EUA não buscavam o império; intervenham lá foram só como auto-defesa ou para operações de resgate humanitário ou para derrubar a tirania, combater o terrorismo e difundir a democracia.

Mas por alturas do ano 2000 toda a gente começou a falar dos Estados Unidos como um império e a escrever livros com títulos como Sorrows of Empire, Follies of Empire, Twilight of Empire, ou Empire of Illusions – todos referindo-se aos Estados Unidos quando falam de império.

Mesmo conservadores começaram a utilizar a palavra. Admirável. Podia-se ouvir sabichões da extrema-direita a anunciaram na televisão estado-unidense: "Somos um império, com todas as responsabilidades e oportunidades do império e é melhor acostumar-nos a isso", e "Somos o país mais forte do mundo e temos todo o direito a actuar como tal" – como se ter o poder desse aos líderes dos EUA um direito inerente a exercitá-lo sobre outros como quisessem.

"O que está a acontecer?", perguntei-me na altura. Como é que tantas pessoas sentem-se livres para conversarem acerca de império querendo dizer que os Estados Unidos são um império? A ortodoxia ideológica sempre foi que, ao contrário de outros países, os EUA não se entregavam à colonização e à conquista.

A resposta, percebi, é que a palavra havia sido despida do seu pleno significado. "Império" parecia agora significar apenas domínio e controle. O império – para a maior parte destes críticos de fresca data – preocupa-se quase exclusivamente com poder e prestígio. O que está habitualmente a faltar deste discurso público é o processo do império e o seu conteúdo político-militar. Por outras palavras, enquanto ouvimos um bocado acerca do império, ouvimos muito pouco acerca do imperialismo.

Mas isto é estranho, pois imperialismo e o que os impérios exercem. Imperialismo é o que o império faz. E por imperialismo não quero dizer o processo de estender poder e domínio sem considerar interesses materiais e financeiros. Na verdade "imperialismo" tem sido utilizado por alguns autores do mesmo modo oco com que utilizam a palavra "império", simplesmente para assinalar domínio e controle dando pouco atenção às realidades político-económicas.

Mas eu defino imperialismo como se segue: o processo pelo qual os interesses dos investidores dominantes num país fazem valer o seu poder económico e militar sobre outro país ou região a fim de expropriar a sua terra, trabalho, recursos naturais, capital e mercados de modo a enriquecer os interesses investidores. Numa palavra, impérios não buscam apenas "poder pelo objectivo do poder". Há interesses materiais reais e enormes em causa, fortunas a serem feitas muitas vezes repetidamente.

Assim, durante séculos os interesses dominantes da Europa Ocidental e depois da América do Norte e do Japão avançaram com os seus financeiros – e quando necessário os seus exércitos – para exigir direitos sobre a maior parte do planeta Terra, incluindo o trabalho de povos indígenas, seus mercados, seus rendimentos (através da tributação colonial ou controle da dívida ou outros meios) e os tesouros abundantes das suas terras: o seu ouro, prata, diamantes, cobre, rum, melaço, cânhamo, linho, ébano, madeira, açúcar, tabaco, marfim, ferro, estanho, níquel, carvão, algodão, milho e, mais recentemente: urânio, manganês, titânio, bauxita, petróleo e – digamos isto outro vez – petróleo. (ver em Hardly uma listagem completa)

Os império são enormemente lucrativos para os interesses económicos dominantes do país imperial mas enormemente custosos para o povo do país colonizado. Além de sofrerem a pilhagem das suas terras e recursos naturais, os povos destes países alvo são frequentemente morto em grande quantidade pelos intrusos.

Isto é outra coisa que os impérios fazem a qual muito frequentemente não é mencionada na literatura histórica e política de países como os Estados Unidos, Grã-Bretanha e França. Os impérios empobrecem populações inteiras e matam grandes quantidades de pessoas inocentes. Quando escrevo isto, o presidente Obama e o estado de segurança nacional para o qual ele trabalha estão a travar duas guerras e meia (Iraque, Afeganistão e norte do Paquistão) e a acenar ameaças militares contra o Iémen, o Irão e, num dia tranquilo, a Coreia do Norte. Ao invés de enviar ajuda médica e de resgate ao Haiti, o Nosso Bombardeiro envia-lhe os Fuzileiros Navais, os mesmos fuzileiros navais envolvidos em anos de assassínios em massa no Haiti décadas atrás e que apoiaram massacres mais recentes de forças por procuração.

O objectivo de toda esta matança é impedir países alternativos, independentes e auto-definidos de emergirem. De modo que o império utiliza o seu poder de estado para acumular riqueza privada para a sua classe de investidores. E utiliza a sua riqueza pública para sustentar o seu poder de estado e impedir outros países de se auto-desenvolverem.

Mas cedo ou mais tarde este esquema começa a enfraquecer sob o peso das suas próprias contradições. À medida que o império se torna mais ameaçados e mais assassino em relação a outros, ele se torna mais doentio e empobrecido dentro de si próprio.

Desde tempos antigos até os dias de hoje, os impérios sempre estiveram envolvidos na acumulação sangrenta de riqueza. Se não pensa que isto é verdadeiro em relação aos Estados Unidos então pare de chamá-lo "Império". E quando escrever um livro acerca de como ele dispõe as suas armas por todo o planeta, intitule-o "Tirano global" ("Global Bully") ou o "Mandão intrometido ("Bossy Busybody"), mas esteja certo de que não nos está a contar muito acerca de imperialismo.


[*] Obras de Michael Parenti e seu sítio web: www.michaelparenti.org .

O original encontra-se em http://www.countercurrents.org/parenti140210.htm

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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