sábado, 4 de dezembro de 2010

Da tragédia das chuvas à resistência organizada de um povo







  “VIVER VIVENDO E, NÃO, VIVER MORRENDO!”  (citação de H. Chávez)

Helena Iono
Direto de Caracas
 



O que está ocorrendo nos últimos dias na Venezuela, fortemente vitimada por temporais e chuvas intermitentes merece uma atenção especial do mundo como indicador do altíssimo nível de desequilíbrio eco-ambiental atingido no nosso planeta, e por outro lado, de surpreendente resistência social organizada para reverter tamanha tragédia humana.

Antes de iniciar, para abrir a mente dos que querem uma informação objetiva e verdadeira, é preciso partir da premissa de que o povo e o governo venezuelano não são apenas vítimas dessa catástrofe natural, mas de uma constante guerra dos grandes meios de comunicação que não dão trégua, mesmo diante da dor humana, como abutres contando friamente o número de mortos, inventando e atacando sistematicamente o governo revolucionário.

Nos últimos 10 dias, choveu na Venezuela, particularmente nos estados próximo ao Caribe como nunca nos últimos 40 anos, um volume de água equivalente a 1 ano de chuvas, após meses de intensa e anormal seca, parte do efeito El Niño, dentro desse trágico panorama global de destruição ecológica, que tem levado ao banco dos réus, desde Cancun aos protestos mundiais de rua: o sistema industrial das grandes potências capitalistas, o interesse privado e a ambição do lucro.

Somam-se a tal desajuste climático, as estruturas empíricas de cidades como Caracas edificadas pela exploração burguesa, oligárquica dos terrenos urbanos, por contínuos 40 anos de gestão conservadora de partidos como COPEI e AD, antes da revolução bolivariana;  naquelas décadas, a migração do campo à cidade não encontrou outro lugar para construir barracos, e casas, que sobre terras deslizantes, desprovidas de pedras de apoio ou árvores, saqueadas por construtoras que reservaram o leste da cidade para as mansões e os edifícios da burguesia. Quem esteve em Caracas já viu. Nas encostas dos morros que a circundam, há centenas de áreas de risco, reproduções dos Bumbas de Niterói e das favelas do Rio. Contando com o aval de governos locais corruptos anteriores, do período de Perez Jimenez a Andrés Peres e outros, os pobres tiveram a permissão de arriscar suas vidas, em terrenos fofos sem infraestrutura, canalizações, nem esgoto. Que importava aos burgueses que um dia todo esse povo pudesse morrer, sob temporais ou bombas de napalm? Mas, o presidente H. Chávez decidiu dizer um basta a isto! “Viver vivendo e, não, Viver morrendo!”, essa tem sido uma frase de um filósofo que ele tem reiterado todos os dias, não como retórica, mas como um sincero projeto político transformador. E é onde queremos chegar com este relato. Porque catástrofe por catástrofe, existem outras piores como a que está assolando o pobre povo haitiano. Mas, o governo venezuelano aqui tem atuado energicamente em medidas de prevenção contra maiores perdas humanas e à reconstrução garantida de uma vida digna para os afetados pelas chuva.

Da catástrofe à resistência organizada do Estado e da população

A grande diferença diante de catástrofes climáticas que têm ocorrido no mundo, e o que se tem presenciado nestes dias na Venezuela, é uma política de estado de prevenção e gigantesca mobilização social de salvamento e reconstrução.

Em 1999, no estado Vargas, houve um aluvião que vitimou 50 mil pessoas. O governo revolucionário de Hugo Chávez, recém empossado naquele momento, herdando a inoperância do regime anterior, decidiu construir um sistema de defesa e de contenção. As recentes chuvas, criaram muitos danos, a ponto de ser decretado estado de emergência, mas a prevenção acarretou agora menos mortes. Houve somente 2: infelizmente, um vereador do PSUV e um policial, que agiam em socorro à população.

A proporção das vítimas fatais em relação aos danos – até hoje 60 mil (*) afetados no pais, com o estado Falcón quase submerso, e Miranda e Vargas sob emergência, dezenas de milhares de casas pobres desabadas – tem sido relativamente reduzida: conta-se até o momento com apenas 32 mortos em todo o país. A rapidez das medidas preventivas para salvar vidas, conduzindo em refúgios de urgência, tem sido determinante para evitar maior tragédia humana. Sob o comando direto do presidente Chávez, o vice-presidente e todos os ministros arregaçaram as mangas e vestiram as botas junto a governadores, prefeitos, conselhos comunais, forças armadas, soldados da reserva, milícias, estudantes, operários, funcionários públicos, militantes do PSUV e milhares de voluntários, que estão atuando direta e incansavelmente em ações de salvamento. As 60 mil pessoas estão abrigadas em mais de 310 refúgios civis e 9 militares, sem contar que várias outras instituições ministeriais, Telesur, hotéis privados, ofereceram refúgio às famílias.

Há três fatos de destaque histórico que os grandes meios da oposição ocultam e que é preciso divulgar ao mundo. O presidente Chávez decidiu entre outras, hospedar 26 famílias que perderam suas casas nas dependências do Palácio Presidencial de Miraflores e lhes prometeu que de lá só sairão para seus novos apartamentos e nunca mais voltarão a viver como antes: terão casa, emprego, escola e saúde. Da mesma forma, abriu as acomodações do Forte Militar Tiuna aos desabrigados. Foi há 2 dias, à favela de La Pedrera, zona de alto risco e desabamento, e acolhido por multidões de famílias convenceu-as a evacuar para refúgios, assegurando guarda militar dos pertences. Isso não é populismo, como divulga a grande mídia. É a qualidade natural humana que somente o ideal socialista pode emanar nos dirigentes, presidentes e governantes: o amor verdadeiro para com o povo oprimido e à nação. Mais que águas e chuvas, a Venezuela está inundada de solidariedade e desejo de mudar para sempre essa dependência ao capitalismo e à burocracia.

O governo bolivariano decidiu criar através de votação inicial na Assembléia Nacional uma “Lei de Emergência para terrenos urbanos e habitações”, que priorize a atribuição de casas às pessoas de risco vital como velhos e desabrigados; depois, aos novos casais. A nova lei também definirá o valor dos terrenos urbanos, até hoje sob critério capitalista. Designaram-se vários fundos estatais e projetos de construção urgente de casas populares: em 2011 deverão ser construídas 12.775 casas para os refugiados. Vários terrenos baldios em desuso, ou fins sociais não prioritários como campo de golf, serão expropriados para dar passo a edifícios residenciais. O presidente Chávez convocou os ministros e comitês de desabrigados a controlar o ritmo de construção e o critério social de atribuição das casas, para evitar o desvio burocrático. As inundações na Venezuela estão “radicalizando o processo democrático” e empurrando a correnteza revolucionaria.

Dois aspectos notáveis neste processo venezuelano. O poder popular, o controle social diretamente estimulado pelo Presidente da República que abriu literalmente a casa de governo ao povo; e a participação do exército e do soldado defensor do povo, salvando gente, obstruindo estradas, carregando comida, remédios, reconstruindo estradas. Todos os estudantes da UNEFA (Universidade Experimental das Forças Armadas) estão atuando no reconhecimento dos terrenos, das casas desmoronadas, das medicinas necessárias, das atenções às crianças nos refúgios.  A América Latina já presenciou exemplos como este, em 1973 na Argentina, na época de Héctor J. Cámpora que criou a Operação Dorrego, onde se estabeleceram ações conjuntas entre soldados e a juventude peronista em ajuda a populações inundadas. Na Venezuela, esse processo de solidariedade e exercício de atuação unificada entre governo, exército, o partido (PSUV), milícias, estudantes, comunas se solidificou com as chuvas, e será irreversível. Soma-se a isso a enorme ajuda internacional, dos médicos cubanos espalhados em todos os bairro afetados, e a ajuda governamental de paises como Bolívia, Cuba, China e tantos outros.

Seria muito oportuno e necessário que o governo brasileiro, e os movimentos sociais, o PT, MST, a CUT, a UNE, as TVs e rádios comunitárias, estudantes e trabalhadores do Brasil afora, enviassem além da ajuda material, e a sua solidariedade ao povo e ao governo venezuelano, o seu apoio moral e a sua saudação pelo seu exemplo de conduta de resistência e de luta frente às catástrofes. Transformar as dificuldades em um programa de luta e saltos revolucionários é o que a Venezuela nos ensina.

Helena Iono
Correspondente da TV Cidade Livre, o Canal Comunitário de Brasília

Desde Caracas – Venezuela
3/12/2010

(*) Dados baseados em informações do quotidiano “Correio do Orinoco” da Venezuela

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