Leonardo Boff
Teólogo, filósofo e escritor - Adital
As
grandes crises comportam grandes decisões. Há decisões que significam vida ou
morte para certas sociedades, para uma instituição ou para uma pessoa.
A
situação atual é a de um doente ao qual o médico diz: ou você controla suas
altas taxas de colesterol e sua pressão ou vai enfrentar o pior. Você escolhe.
A
humanidade como um todo está com febre e doente e deve decidir: ou continuar
com seu ritmo alucinado de produção e consumo, sempre garantindo a subida do
PIB nacional e mundial, ritmo altamente hostil à vida, ou enfrentar dentro de
pouco as reações do sistema-Terra que já deu sinais claros de estresse global.
Não tememos um cataclismo nuclear, não impossível mas improvável, o que
significaria o fim da espécie humana. Receamos isto sim, como muitos cientistas
advertem, por uma mudança repentina, abrupta e dramática do clima que,
rapidamente, dizimaria muitíssimas espécies e colocaria sob grande risco a
nossa civilização.
Isso
não é uma fantasia sinistra. Já o relatório do IPPC de 2001 acenava para esta
eventualidade. O relatório da U.S. National Academy of Sciences de 2002
afirmava "que recentes evidências científicas apontam para a presença de uma
acelerada e vasta mudança climática; o novo paradigma de uma abrupta mudança no
sistema climático está bem estabelecida pela pesquisa já há 10 anos, no
entanto, este conhecimento é pouco difundido e parcamente tomado em conta pelos
analistas sociais”. Richard Alley, presidente da U.S. National Academy of
Sciences Committee on Abrupt Climate Change com seu grupo comprovou que, ao
sair da última idade do gelo, há 11 mil anos, o clima da Terra subiu 9 graus em
apenas 10 anos (dados em R.W.Miller, Global Climate Disruption and Social
Justice, N.Y 2010). Se isso ocorrer conosco estaríamos enfrentando uma
hecatombe ambiental e social de conseqüências dramáticas.
O que
está, finalmente, em jogo com a questão climática? Estão em jogo duas práticas
em relação à Terra e a seus recursos limitados. Elas fundam duas eras de nossa
história: a tecnozóica e a ecozóica.
Na
tecnozóica se utiliza um potente instrumental, inventado nos últimos séculos, a
tecnociência, com a qual se explora de forma sistemática e com cada vez mais
rapidez todos os recursos, especialmente em benefício para as minorias
mundiais, deixando à margem grande parte da humanidade. Praticamente toda a
Terra foi ocupada e explorada. Ela ficou saturada de toxinas, elementos
químicos e gases de efeito estufa a ponto de perder sua capacidade de
metabolizá-los. O sintoma mais claro desta sua incapacidade é a febre que tomou
conta do Planeta.
Na
ecozóica se considera a Terra dentro da evolução. Por mais de 13,7 bilhões de
anos o universo existe e está em expansão, empurrado pela insondável energia de
fundo e pelas quatro interações que sustentam e alimentam cada coisa. Ele
constitui um processo unitário, diverso e complexo que produziu as grandes
estrelas vermelhas, as galáxias, o nosso Sol, os planetas e nossa Terra. Gerou
também as primeiras células vivas, os organismos multicelulares, a proliferação
da fauna e da flora, a autoconsciência humana pela qual nos sentimos parte do
Todo e responsáveis pelo Planeta. Todo este processo envolve a Terra até o
momento atual. Respeitado em sua dinâmica, ele permite a Terra manter sua
vitalidade e seu equilíbrio.
O
futuro se joga entre aqueles comprometidos com a era tecnozóica com os riscos
que encerra e aqueles que assumiram a ecozóica, lutam para manter os ritmos da
Terra, produzem e consomem dentro de seus limites e que colocam a perpetuidade
e o bem-estar humano e da comunidade terrestre como seu principal interesse.
Se
não fizermos esta passagem dificilmente escaparemos do abismo, já cavado lá na
frente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário