sábado, 26 de fevereiro de 2011

Oriente Médio em ebulição, acompanhe país por país


No Bahrein, este sábado foi o décimo-terceiro dia seguido de protestos

Igor Natusch *no Sul21


As atenções do mundo seguem voltadas para a Líbia, onde os protestos contra o governo ditatorial de Muammar Kadafi ganham contornos de guerra civil. Mas vários países árabes continuam em ebulição. Iêmen e Bahrein são os países em que as coisas estão mais complicadas para o poder estabelecido e onde os protestos ganham mais força. Mas mesmo na Tunísia e no Egito, que já derrubaram seus ditadores, os protestos continuam. Manifestantes pedem que as transformações ocorram de fato, e pedem a saída de membros dos regimes derrubados que permanecem no poder durante a transição.
Acompanhe os últimos acontecimentos, país por país:

Manifestantes concentram-se na Praça da Pérola, no Bahrein

Neste sábado (26) ocorreu o 13º dia de protestos no país, que é governado desde 1999 pelo rei Hamad Ben Isa al-Khalifa. As manifestações se concentram na Praça da Pérola, região central de Manama. Paralelamente aos protestos, religiosos da maioria xiita decretaram luto no país, em memória de sete manifestantes mortos nos primeiros dias dos acontecimentos. Os protestos ocasionaram tímidas mudanças anunciadas neste sábado pelo rei. Ele apenas trocou de função cinco ministros, mantendo-os no governo.
Embora parte dos manifestantes exija a mudança completa do regime, as lideranças xiitas parecem não querer a queda de al-Khalifa, pedindo apenas “reformas profundas” no sistema político do país. A posição xiita coincide com sinalizações do governo dos EUA, que defende a permanência de al-Khalifa e o estabelecimento de um diálogo com a oposição. O chefe de Estado-maior das Forças Armadas dos Estados Unidos, almirante Mike Mullen, desembarcou no Bahrein nesta quinta-feira (24) para reunir-se com representantes do governo do país. O rei al-Khalifa garante que está disposto a negociar com “todas as partes”, permitindo inclusive o retorno de Hassan Mushaimaa, líder do movimento xiita Haq, que desembarcou em Manama nesta sábado, sem sofrer restrições por parte do governo do Bahrein.

Líderes tribais aderem a protestos no Iêmen

A pressão sobre o presidente do Iêmen aumentou depois que líderes de duas das principais tribos do país (Hashid e Baqil) passaram a apoiar os manifestantes. Especialistas apontam que o apoio dos Hashid, tribo mais importante do país, aos manifestantes deve ser uma pressão insuportável para Ali Abdallah Saleh, que se mantém há trinta anos no poder.
No Iêmen, a concentração de manifestantes alcançou na sexta-feira o número mais alto desde o começo dos protestos contra o regime de Ali Abdallah Saleh. As estimativas são de que mais de 150 mil pessoas participaram de protestos em todo o Iêmen, na que já é a maior manifestação pública da história do país. Segundo agências internacionais, cerca de 30 mil pessoas estão acampadas na frente de uma universidade da capital Sanaa, em uma manifestação pacífica e sem confrontos com forças governamentais. “Olhe ao redor. Não são apenas jovens, apenas estudantes que estão protestando”, disse o ativista iemenita Khaled Anesi, em entrevista para o Los Angeles Times. “Todos estão aqui. Juntos, nós derrubaremos o regime”.
Em resposta aos protestos contra Ali Abdallah Saleh, que ocupa o poder há 32 anos, o governo iemenita incentiva apoiadores a irem às ruas para defender o regime. Os manifestantes pró-Saleh teriam recebido material diretamente do governo, como cartazes com o rosto do governante iemenita, e entoam cânticos nos quais dizem que Ali Abdallah Saleh trouxe paz e prosperidade ao país. Vinte e quatro mortes ocorreram nos últimos nove dias de protestos no Iêmen.

Governo de transição não cumpre promessas, dizem manifestantes do Egito

O Egito, que recentemente testemunhou a queda do ditador Hosni Mubarak, continua às voltas com protestos. Manifestantes voltaram a se reunir na praça Tahrir, no Cairo, pedindo a formação de um novo governo e que Hosni Mubarak seja levado a julgamento. Mesmo que o regime tenha dado sinais de abertura após a queda de Mubarak, o gabinete de transição é formado, em sua maioria, por nomes que participaram em algum momento do antigo governo. Neste sábado (26), manifestantes que pediam a saída do governo de integrantes leais a Mubarak foram retirados à força da Praça Tahrir.
Segundo pessoas que participaram dos protestos que derrubaram Mubarak, o governo de transição não está cumprindo várias de suas promessas, como a libertação de presos políticos. Os manifestantes exigem também o fim do estado de emergência, que limita a circulação de pessoas no país, além de uma anistia geral. Parte da população pede a renúncia do atual primeiro-ministro Ahmed Shafiq e a criação de um novo gabinete, com representantes escolhidos por critérios técnicos e não por indicações.

Opositores do rei criticam “lentidão” das reformas na Jordânia

Na Jordânia, milhares de pessoas foram às ruas da capital Amã, nesta sexta-feira (25), na maior manifestação popular registrada nos últimos dois meses no país. A concentração aconteceu logo após as preces do meio dia, e coincide com declarações de Hamza Mansour, líder do grupo de oposição Frente de Ação Islâmica, dizendo que o povo está “impaciente” com a “lentidão” das reformas propostas pelo rei Abdullah II. “O povo quer democracia de verdade, mudanças reais. Andem logo com isso”, discursou Mansour em Amã, diante de cerca de 4 mil pessoas.
Os manifestantes pedem o congelamento de preços, a adoção de reformas políticas e um novo parlamento – já que, segundo eles, o atual foi formado a partir de uma fraude eleitoral. No regime de governo da Jordânia, apenas os parlamentares são eleitos por voto direto, cabendo ao rei indicar os ocupantes do executivo. Parte dos revoltosos pede uma mudança constitucional, que permita eleições diretas também para o cargo de primeiro-ministro.

Depois de 19 anos, governo da Argélia suspende regime de emergência

O governo da Argélia confirmou na quinta-feira (24) o fim do regime de emergência no país, que já durava 19 anos. A medida, que vinha sendo sinalizada há semanas, atende uma das principais exigências dos opositores de Abdelaziz Bouteflika, no poder desde 1999. No entanto, as manifestações populares devem ser submetidas a uma série de exigências e aprovadas pelo governo com três dias de antecedência – o que, na prática, faz com que as concentrações populares sejam ilegais no país.
“A suspensão do estado de emergência é positiva, mas não é o suficiente”, disse o líder oposicionista Mustafa Bouchachi, que dirige a Liga Argelina pelos Direitos Humanos. O governo dos EUA, por sua vez, considerou a decisão de Bouteflika como um “sinal positivo”, que mostra que o atual governo argelino está disposto a “escutar as preocupações e responder às aspirações do seu povo”. O regime de Abdelaziz Bouteflika é tratado como “corrupto” pela oposição, que alega que as eleições que reelegeram o presidente em 2009 foram fraudadas. Além disso, os protestos pedem medidas para conter a miséria, o aumento de preços e o desemprego.

Sexta-feira foi “dia de fúria” no Iraque

Na sexta-feira (25), milhares de iraquianos protestaram contra o governo, em manifestações que tomaram conta de vários pontos do país. Os manifestantes chamaram os protestos de “dia de fúria”. Os relatos são de que a repressão está cada vez mais violenta, em especial na praça Tahrir em Bagdá, onde cerca de 5 mil revoltosos se reuniram. A repressão aos revoltosos teria provocado ao menos 14 mortes, segundo agências internacionais. Em cidades como Hawija e Mosul, há relatos de que forças policiais dispararam munição letal contra manifestantes, que tentavam invadir prédios governamentais. No momento, está em vigor decreto que proíbe a circulação de veículos e a concentração de grupos de pessoas nas ruas das principais áreas do país.
O primeiro-ministro ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, garante que não ignorará os pedidos dos manifestantes, mas advertiu que militantes do grupo Al-Qaeda podem tentar “interromper” alguns protestos. Em declarações anteriores, Maliki foi mais explícito, associando os manifestantes com terroristas e com partidários do ex-ditador Saddam Hussein. Os manifestantes, que de modo geral dizem não querer a queda do regime, pedem controle de preços e profundas mudanças no corpo político, como forma de diminuir a corrupção estatal.
Neste sábado, a maior refinaria de petróleo do Iraque parou suas operações, depois de ser atacada. Homens detonaram bombas que provocaram incêndio na refinaria.
Tunísia terá eleições em julho, diz governo provisório
A Tunísia, primeiro país árabe a registrar protestos contra o governo, deve ser também o primeiro país a concretizar os objetivos de sua revolução. Em comunicado divulgado pela rede oficial de notícias TAP, o governo provisório anunciou que as eleições no país devem ocorrer até a metade do mês de julho. Segundo o gabinete de transição, que comanda o país desde a queda de Zine El Abidine Ben Ali, o período de diálogo com os diferentes grupos políticos irá até março, quando deve ser definida a data exata das eleições.
Ainda que a maior parte dos protestos tenha diminuído na Tunísia, numerosos grupos seguem nas ruas, insatisfeitos com a presença de Mohamed Ghannouchi como primeiro ministro do país. Ghannouchi atuou durante mais de uma década no governo de Zine El Abidine Ben Ali, o que leva manifestantes a pedirem sua saída e a instauração de um governo totalmente desligado do antigo regime. Além disso, muitos julgam que a situação de vida da população melhorou pouco depois da queda de Ben Ali
Protestos ocorridos durante a semana chegaram a concentrar 4.000 pessoas nas ruas da capital Túnis. “Revolução até o fim”, gritam os revoltosos, que teriam entrado em confronto com forças de segurança e até mesmo ateado fogo a prédios públicos, segundo testemunhas. Se o antigo governante foi deposto, parece que isso não é suficiente para boa parte do povo tunisiano – e o novo aumento na intensidade das manifestações dá a entender que o processo que varre o mundo árabe está bem longe do final.

* Colaborou Felipe Prestes

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