Estudo de caso mostra como vivem os xavantes da terra indígena mais devastada da Amazônia
As empresas
Bunge, Multigrain, Company e Cargill.
Perfis
Empresa
de origem holandesa, a Bunge é a maior exportadora do agronegócio no
Brasil, país onde possui cerca de 150 unidades – indústrias, centros de
distribuição, silos e instalações portuárias – distribuídas por 16
estados.
A Multigrain, cujas operações
brasileiras estão sediadas em São Paulo (SP), é outro importante grupo
internacional que opera no comércio internacional de soja, algodão,
trigo, açúcar, fertilizantes e etanol.
Já a
Company Comércio e Representações Ltda. é uma empresa regional sediada
em Primavera do Leste (MT), com atuação no comércio atacadista de soja.
Por
fim, a Cargill – de matriz norte-americana – opera no Brasil desde 1965
e é uma das principais exportadoras de soja do país, mantendo
escritórios e unidades industriais espalhadas por 120 municípios.
O problema
Bunge,
Multigrain e Company (fornecedora da Cargill) mantiveram relações
comerciais com fazendas do grupo Capim Fino, possuidor de áreas
embargadas pelo Ibama no Mato Grosso e dono de uma propriedade instalada
irregularmente na Terra Indígena Maraiwatsede.
O caso
A
Terra Indígena Maraiwatsede, da etnia Xavante, foi homologada em 1998
pelo governo federal. No entanto, ainda hoje possui a maior parte de sua
área ocupada de forma irregular por fazendeiros. Entre os ocupantes
está Antônio Penasso, que cultiva soja na Fazenda Colombo, localizada na
porção sul da Terra Indígena. Ela é apenas uma das propriedades
mato-grossenses do grupo Capim Fino, pertencente à família Penasso, e
que computa mais de R$ 58 milhões em multas por crimes ambientais.
Em
2008, a Fazenda Colombo teve milhares de hectares embargados pelo Ibama
após a constatação no local de queimadas ilegais e do impedimento da
regeneração natural de florestas nativas. Apesar do embargo, o Instituto
flagrou tais áreas em plena colheita de soja durante a Operação Soja
Pirata, em março de 2010 – ou seja, produzindo de forma irregular. Na
ocasião, a Company Comércio e Representações Ltda. foi notificada pela
receptação da soja ilegal. Em 2009 e 2010, a Company manteve
relacionamento comercial com importantes traders do setor, como a
Cargill.
Também possuidoras de áreas embargadas,
duas outras propriedades do grupo Capim Fino – as fazendas Mata Azul e
Capim Fino – foram objeto de contrato de venda de soja firmado com a
Multigrain para a safra 2009/2010. Durante a Operação Soja Pirata, foi
constatado nestes locais o plantio em terras objeto de embargo, e
apreendida a matéria-prima que seria destinada à empresa.
Apesar
de Antônio Penasso figurar na lista de áreas embargadas do Ibama desde
2008, a unidade de Bom Jesus do Araguaia (MT) da Bunge adquiriu soja do
produtor no ano passado, proveniente de suas terras localizadas em Alto
da Boa Vista (MT).
Relação com o consumidor paulistano
A
Bunge fabrica, entre outros produtos, óleos de soja, margarinas e
azeites, que chegam às principais redes de supermercados de São Paulo
(SP) – Carrrefour, Pão de Açúcar, Sonda e Walmart – através de marcas
conhecidas do mercado, como Delícia, Primor, Soya, Cyclus e Salada. Além
disso, é responsável pela produção do óleo de soja das marcas Carrefour
e Qualitá (grupo Pão de Açúcar).
A Cargill
também abastece as maiores redes varejistas da capital paulista com
óleos, azeites, maioneses e molhos para salada, dentre outros produtos.
Possui marcas bastante conhecidas do público consumidor como os óleos
Liza, Maria, Mazola, a maionese Gourmet e o azeite Gallo.
O que dizem as empresas
Por
meio de sua assessoria de imprensa, a Bunge informou que tem como
política a não aquisição de produtos cultivados em áreas embargadas e
que a soja comprada de Antônio Penasso não teria sido produzida em
terrenos interditados pelo Ibama por problemas ambientais. “Existe um
criterioso acompanhamento da origem dos grãos para este fim”, sustenta a
nota da empresa.
Vale ressaltar que, de acordo
com os critérios da articulação Conexões Sustentáveis São Paulo –
Amazônia, as restrições comerciais devem ser aplicadas não apenas à área
objeto de embargo, mas a todos os empreendimentos de um produtor cujo
nome figura da lista do Ibama. Nenhuma das principais empresas
compradoras do grão no Brasil aderiu ao Pacto da Soja proposto pela
articulação em 2008.
A Multigrain alega que houve
uma falha de informação no site do Ibama, o que induziu a empresa a
firmar um contrato de compra de soja produzida em área embargada. “O
incidente levou a própria Multigrain a ser vitimada, pois toda a soja
produzida pelos referidos senhores foi apreendida pelo Ibama. Fique
claro que tais produtores contendem com o Ibama na esfera da Justiça
Federal e, recentemente, foi liberada, através de alvará judicial, a
comercialização da soja apreendida. Todavia, a Multigrain, mesmo com a
liberação judicial, cuidou de se abster de adquirir a soja, que veio a
ser comercializada com outras empresas do ramo”, diz nota emitida pela
direção da empresa.
Procurada pelo Conexões
Sustentáveis, a Company Comércio e Representações Ltda. não se
manifestou. Já a Cargill, que tem a Company como fornecedora, afirma que
não realizou negócios com a companhia na região onde se localiza a
Terra Indígena. De qualquer maneira, a Cargill informa que “suspendeu o
relacionamento com a referida empresa, em todas as regiões”.
Em
nota, o Grupo Pão de Açúcar afirma que “solicitou imediatamente
esclarecimento por parte dos fornecedores envolvidos”. Além disso, a
resposta da companhia diz ainda que “confirmadas as evidências, tomará
medidas cabíveis, como a suspensão dos contratos de fornecimento, até
que a situação esteja resolvida”.
O Walmart
declarou que, nos últimos anos, vem desenvolvendo diversas ações visando
adequar os produtos que comercializa aos critérios do Pacto Nacional
pela Erradicação do Trabalho Escravo e dos pactos setoriais do Conexões
Sustentáveis. A empresa reconhece, no entanto, que os resultados ainda
não são suficientes. “Temos mantido discussões constantes com os
fornecedores indicados no estudo para buscar as soluções necessárias”,
atesta nota emitida pela Vice Presidência de Assuntos Corporativos e
Sustentabilidade.
O Carrefour informou, através
de nota, que tem um rígido controle para evitar, em todas as linhas de
produto que comercializa, compras de áreas que violam as legislações
ambientais e trabalhistas. Em relação aos seus fornecedores listados no
estudo, a empresa afirma ter entrado em contato solicitando
esclarecimentos sobre os fatos relatados. “Foi informado que as compras
de matéria-prima ou insumos não foram realizadas em áreas embargadas ou
constantes da lista suja”, diz o Carrefour.
Mais
uma vez, é importante esclarecer que, de acordo os pactos do Conexões
Sustentáveis – que têm o Carrefour como signatário –, as empresas não
devem adquirir insumos de quaisquer empreendimentos pertencentes a
fornecedores incluídos na lista de embargos do Ibama ou na “lista suja”
do trabalho escravo, divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE).
Procurado, o grupo Sonda não se manifestou.
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