MARCELINO MELEU
Há
poucos dias, nossa cidade chamou à atenção da mídia (local, estadual e
nacional), por conta de um evento envolvendo um professor e uma aluna,
ambos vinculados a rede de ensino público estadual.
Naquele
episódio, o professor Valdecir Norberto Corteze foi filmado por suposta
agressão a uma aluna de 11 anos, durante a aula de ciências para alunos
da 5ª série na Escola Estadual Anna Luísa Ferrão Teixeira, de Passo
Fundo/RS. As imagens de celular foram feitas por um colega na sala de
aula. Os pais da menina registraram boletim de ocorrência na delegacia.
Além
da 7ª Coordenadoria Regional de Educação - CRE (que acabou afastando o
professor das suas funções), a Polícia Civil e o Ministério Público
abriram investigação sobre o caso.
Em
entrevista veiculada na mídia, o professor reconheceu que "perdeu as
estribeiras", mas frisou que vinha sendo provocado pela menina há dias e
que a atitude teve a intenção de discipliná-la: "Ela fazia coisas para
levantar da cadeira e desconcentrar a turma. É uma líder negativa na
sala de aula. Eu dizia para ela sentar e ela dizia que eu não mandava
nela. Então, peguei e a levei até a cadeira".
Antes
de iniciar uma reflexão, gostaria de me solidarizar com o professor e
com a aluna, uma vez que, ambos são vítimas neste episódio. Vítimas da
precarização do ensino neste país.
Evidente
que ninguém defende um ato de agressão e/ou violência, mas o debate a
ser enfrentado por todos (pais; professores; alunos; escola; secretaria
da educação e demais órgãos do poder público, etc...) diz respeito à
educação e as condições para que o ensino-aprendizagem ocorra.
Nesse contexto, constatamos a falência do ensino público de base. Aliás, como ocorre em alguns outros serviços públicos.
Mas tal falência tem origem em que?
Vários
são os aspectos que contribuem para esse cenário, todavia, quero
enfocar a profissão professor e os direitos trabalhistas deste.
Os
direitos trabalhistas dos professores estão previstos na Convenção
Coletiva de Trabalho - norma coletiva que regulamenta todas as questões
das relações de trabalho entre professores e escolas; CLT e Constituição
Federal de 1988 (CF/88) - que normatizam todos os assuntos relacionados
ao Contrato de Trabalho que não estejam previstos na Convenção
Coletiva.
Entre
as fontes de direito do trabalhador, podemos invocar para uma análise
da situação, as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e
Emprego, em especial:
a)
NR7 - estabelece e obrigatoriedade de elaboração do Programa de
Controle Médico de Saúde Ocupacional - PCMSO, por parte dos empregadores
e instituições que admitam trabalhadores como empregados, com objetivo
de promoção e preservação da saúde do conjunto dos trabalhadores;
b)
NR9 - estabelece e obrigatoriedade de elaboração e implementação do
Programa de Prevenção de Riscos Ambientais - PPRA, por parte dos
empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados,
com objetivo de preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores,
através da antecipação, reconhecimento, avaliação e conseqüente
controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a
existir no ambiente de trabalho, tendo em consideração a proteção do
meio ambiente e dos recursos naturais;
c)
NR17 - Visa estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das
condições às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de
modo a proporcionar um máximo conforto, segurança e desempenho
eficiente.
No
que tange a saúde destes trabalhadores, no ensino privado, o SINPRO/RS
vem notificando o SINEPE/RS sobre o (des) cumprimento de tais normas (em
novembro/2010, o Sinpro/RS notificou 331 instituições de ensino da
Educação Básica de todo o Estado para que comprovem, até o final de
dezembro, o cumprimento de três NR’s acima mencionadas). Se a saúde do
trabalhador esta sendo questionada no âmbito da iniciativa privada, o
que dizer das condições deste trabalhador, no âmbito público?
Importante
destacar que o trabalho humano possui um duplo caráter, por um lado é
fonte de realização, satisfação e prazer, estruturando e conformando o
processo de identidade dos sujeitos; por outro, pode também
transformar-se em elemento patogênico, tornando-se nocivo à saúde
(Seligmann-Silva, 1987, Dejours, 1987).
O
episódio na Escola Estadual Anna Luísa Ferrão Teixeira de Passo
Fundo/RS demonstra que professor pertence a uma categoria que agoniza. A
saúde deste profissional vai mal.
Preocupados
com esta situação, os sindicatos que defendem essa categoria
profissional estão propondo aprofundar as discussões relativas à saúde
docente. Um exemplo destas evidencia-se na ação do Sinpro/RS, que está
orientada pelo resultado da pesquisa “Condições de Trabalho e de Saúde
do Professor do Ensino Privado do Rio Grande do Sul”, realizada pelo
Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos
Ambientes de Trabalho (Diesat). A pesquisa está na íntegra no site do
Sinpro/RS (http://www.sinprors.org.br/).
Diante deste contexto, será que a atividade do professor poderia ser enquadrada como penosa, para fins de direito do trabalho?
O
Dicionário Aurélio (3ª Ed. Nova Fronteira, 1999, p. 1537), conceitua
penoso como o que: 1. Que causa pena ou sofrimento; 2. Que incomoda; 3.
Que produz dor; doloroso; 4. Difícil, complicado.
A
nossa Constituição Federal estabelece em seu art. 7º, XXIII que “são
direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: adicional de remuneração para as
atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei”. Desta
forma, entende-se por adicional de penosidade, aquele pago ao
trabalhador a título de indenização, devido à realização de uma
atividade penosa “que causa pena, trabalho árduo”, que embora não cause
efetivo dano à saúde do trabalhador, possa tornar sua atividade
profissional mais sofrida.
Em
que pese à inexistência de regulamentação do adicional de penosidade,
ao contrário do que ocorre com a insalubridade e com a periculosidade,
já esta na hora, dos sindicatos estabelecerem, em acordos ou convenções
coletivas, essa previsão.
Como
se sabe normas sindicais – cuja natureza jurídica é contratual – é de
cumprimento obrigatório entre as partes, quais sejam empregados e
empregadores da respectiva categoria, profissional e econômica, que
estabeleceu normas coletivas.
Desse
modo, a par da inexistência de norma estatal, é sempre necessário
avaliar se há, na categoria sindical, previsão em acordo ou convenção
coletiva sobre o adicional em questão. Caso inexista, cabe iniciar o
debate.
Importante
destacar que a Convenção 155 da OIT – Organização Internacional do
Trabalho, em seu art. 4º reforça a preocupação com a saúde do
trabalhador e meio ambiente de trabalho, além de propor a redução ao
mínimo, as causas dos riscos inerentes ao meio ambiente de trabalho.
Diante
deste cenário (de ausência de regulamentação do adicional de
penosidade), o pensamento majoritário, doutrinário e jurisprudencial, é
pela impossibilidade jurídica do adicional de penosidade. Dessa maneira,
uma alternativa para remunerar o trabalho nessas condições (penosas)
reside na indenização nos termos e condições da responsabilidade civil,
seja pela teoria da culpa, seja pela teoria do risco, como já referimos,
principalmente após a edição da EC 45/2004.
MARCELINO MELEU é advogado e professor universitário. Doutorando em Direito pela Unisinos. Mestre em Direito pela URI. Especialista em Direito do Trabalho; Processo do Trabalho e Previdenciário pela UNISC.
MARCELINO MELEU é advogado e professor universitário. Doutorando em Direito pela Unisinos. Mestre em Direito pela URI. Especialista em Direito do Trabalho; Processo do Trabalho e Previdenciário pela UNISC.
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