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por Silvio Caccia Bava no DIPLO-BRASIL | ||
As classes médias são algo difícil de entender. Talvez até porque sob
essa classificação convivam tribos muito diferentes. E são elas, no
entanto, que terão um papel decisivo nas próximas eleições, seja nos
Estados Unidos, seja na cidade de São Paulo. A disputa de significados não é sem razão. O conceito de classe média que for adotado vai abrir campos de identidades e de alianças. O conceito que se impõe, pela força que tem a lógica do mercado, é o da capacidade de consumo. A classe média, nesse caso, se define por sua capacidade de consumo. E como o aumento da capacidade de consumo do brasileiro mais pobre tem se elevado, isso abre espaço para uma operação ideológica, que é chamá-lo de classe média e reforçar a ideia de ascensão social, de que ele está melhorando de vida. Essa visão pretende que o povão apoie o governo e busque, nas eleições, a continuidade dessas políticas que o favorecem. No plano do imaginário social, essa operação é um sucesso, e o apoio ao governo da presidente Dilma demonstra isso. Um Brasil que cresce, que melhora a vida dos mais pobres. Esse é um sentimento compartilhado por uma grande maioria. Mas, no plano material, a realidade é outra. As melhorias são bastante limitadas, e o piso do qual partimos é muito baixo. Não estamos falando de uma sociedade de bem-estar. Acima de uma renda de R$ 530 por mês aqui no Brasil, você é classe média. Explico-me: o governo define que a classe média parte de R$ 1.740 e vai até quase R$ 8.000 de renda familiar mensal. O IBGE diz que uma família é composta em média de 3,3 pessoas. Então, façamos a conta: R$ 1.740 dividido por 3,3 pessoas é igual a R$ 527,27. Aí começa a classe média baixa, com uma capacidade de consumo de R$ 17,57 por dia. Esses brasileiros não são classe média, são pobres que melhoraram um pouco de vida. Seus valores, suas referências, são distintos dos da classe média. Mas há um esforço midiático para trazê-los à condição de classe média, para afirmar que mudaram de condição de vida, ascenderam socialmente. A aposta política é que eles vão lutar para manter as melhorias em sua condição de vida. O jogo é com o medo de perderem o que conquistaram. Nessa linha, terão de votar no governo, na continuidade das políticas públicas. Outra leitura parte de situações de crise, como na Grécia, onde as mobilizações de protesto contra os cortes nas políticas sociais ganharam a adesão das classes médias. Nesse caso, são outras forças políticas e sociais – trabalhadores, jovens, desempregados, aposentados – que puxam as mobilizações. E a classe média adere, atraída pela força do movimento. O recorte não se dá pela capacidade de consumo, mas pela luta para garantir direitos, para mudar as políticas de governo. Mas aí vem o paradoxo: ainda que tenham participado das mobilizações, essas classes médias reafirmaram seu apoio, nas eleições, aos setores conservadores. Provavelmente o conceito de classe média como ator político não se sustenta. Não conseguimos explicar com a mesma lógica os distintos comportamentos dos grupos sociais que a integram. Esse conceito tenta pasteurizar diferenças importantes e pode ter sido criado justamente para isso. A grande maioria dos participantes das manifestações que ocuparam as praças da Europa e dos Estados Unidos nos últimos meses é de jovens de classe média. Estariam eles influenciados pela Primavera Árabe, um amplo movimento popular? Há todo um conjunto de referências culturais que dão identidade às classes médias. Não é só a capacidade de consumo que as define. Afinal, se temos um torneiro mecânico e um advogado que ganham R$ 6 mil por mês, os dois são classe média? A classe média tem acesso à educação, vai ao cinema e à academia, frequenta bares e restaurantes, tem carro, vive em um mundo distinto do popular. E como podemos entender o movimento dos estudantes no Chile pela democratização do acesso à educação? É um movimento de juventude? É um movimento de classe média? Ou é os dois? Eles conquistaram a adesão de professores e sindicatos de trabalhadores para sua luta por uma educação pública, gratuita e de qualidade. Provavelmente o que chamamos de classe média também tenha outras identidades – jovem, mulher, gay, estudante etc. –, e talvez sejam essas outras identidades que irão buscar os melhores candidatos para a defesa de seus direitos. A trama eleitoral fica mais complexa.
Silvio Caccia Bava é editor de Le Monde Diplomatique Brasil e coordenador geral do Instituto Pólis.
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quarta-feira, 9 de maio de 2012
Classes médias?
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