sábado, 8 de maio de 2010

O Pig ataca novamente com análises descontextualizadas...

Os muquiranas voltaram

 Miguel do Rosario no blog Oleo do Diabo

Os urubus sentiram cheiro de carniça. A quebradeira na Grécia trouxe alegria aos agourentos. Miriam Leitão voltou a ser feliz, porque pode apontar os dedos para o berço da civilização ocidental e vaticinar as mesmas desgraças para nós.

A boa vontade oficial para com reajustes acima da inflação na previdência, por exemplo, é mostrada como erro terrível que nos conduzirá ao abismo.

Acontece que o Brasil não tem nada a ver com a Grécia. Nem jamais terá. Sem contar que a crise grega está muito mal explicada. O culpado não é o funcionário público grego ou a previdência. Ou pelo menos não só isso.

Os países ricos possuem vastos e generosos programas de previdência social, com níveis de salário muito superiores aos praticados no Brasil. Esse é um dos fatores que fazem deles ricos e desenvolvidos. Há mais dinheiro circulando internamente. A política da muquiranagem que alguns círculos economicos defendem para o Brasil tem um fundamento ideológico reacionário, colonizado, injusto.

Explico. Primeiro porque ainda falta muito para o peso do funcionalismo no Brasil atingir o patamar dos países europeus mais liberais. Quanto mais a Grécia, que supostamente exagerou no estatismo. Em segundo lugar porque o Brasil, ao contrário da Grécia, tem uma população jovem e um potencial econômico extraordinário. A Grécia, país de topografia acidentada, com suas ilhas minúsculas, não tem agricultura, não tem minérios, não tem petróleo. Suas indústrias foram sugadas pelo ultra-moderno aspirador alemão, de um lado, e pelos modelos populares da Ásia, de outro.

Provado está que a previdência é uma das âncoras sociais mais importantes do país, e que o aposentado colabora fortemente para a estabilidade econômica. A aposentadoria, contudo, é baixa. Há espaço para ampliar os salários. Os urubus esquecem que esse dinheiro não é totalmente um gasto, porque ele volta para o governo multiplicado na forma de impostos e desenvolvimento. O aposentado compra, se diverte, ajuda a família.

O trabalhador brasileiro é sofrido, ganha pouco, sem falar nas terríveis privações por que passou na história recente. Se há perspectivas positivas para a economia brasileira, é justo que os aposentados, que viram seu poder aquisitivo despencar vergonhosamente nas últimas décadas, ganhem um pouquinho mais.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Ode aos professores....

Ode aos professores

Juremir Machado da Silva

 
Recebi esta pergunta: "Por que o senhor defende tanto os professores?". Achei, inicialmente, a pergunta estranha. Afinal, a resposta sempre me parecera óbvia. Depois, comecei a responder para mim mesmo. Embora seja impossível estabelecer objetivamente um ranking de profissões, eu acho o trabalho de professor o mais importante que existe, especialmente o de professor de ensino fundamental e médio, função que nunca exerci, embora tenha chegado a passar num concurso. Sei da importância dos médicos, dos engenheiros, dos padeiros, dos lixeiros e de tantos outros profissionais. Mesmo assim, considero que o professor é a base de tudo.

Por pensar assim, sempre vejo como injustos e até mesmo absurdos os salários pagos aos professores do ensino público. Não consigo aceitar que qualquer jogador de futebol ruim ganhe mais do que um professor. Esperamos dos professores que eles eduquem os nossos filhos, dando-lhes conhecimentos e valores. Depositamos enormes esperanças na atividade desses mestres de poucos recursos e muita perseverança. Cobramos muito. Pagamos pouco. A desculpa é sempre a mesma: os cofres públicos não comportam salários maiores para uma categoria tão numerosa. Essa explicação sempre me parece fácil, simplória, hipócrita e até canalha. É uma maneira de lavar as mãos. A culpa não é só dos governantes. É da sociedade. Por que não nos organizamos para pagar melhor os professores? Outro dia, na Rádio Guaíba, o senador Paulo Paim nos garantiu que não existe o rombo da Previdência Social. Autorizou-me a chamar de mentiroso quem afirme o contrário. Não perderei a oportunidade.

De minha parte, farei uma afirmação categórica: a sociedade brasileira pode pagar melhor seus professores. Não o faz por não os valorizar suficientemente. Volta e meia, ouço alguém atacar os professores dizendo algo assim: "Se não estão satisfeitos que mudem de profissão". Nunca ouço argumento semelhante aplicado aos grandes proprietários que pedem subsídios aos governos. Os professores viraram saco de pancada. Os governantes empurram com a barriga o eterno problema dos baixos salários. Por toda parte, vejo professores trabalhando duro e ganhando pouco. Ser professor é cada vez mais difícil e bonito. Hoje, além de saber passar informações, é preciso saber educar num ambiente de liberdade. Muita gente tem saudades dos castigos corporais e dos métodos medievais nas escolas. São os mesmos que sentem saudade da ditadura militar e que fecham os olhos para a tortura.

Imagino um leitor conservador dizendo-se que estou empilhando clichês ou fazendo demagogia. Num ano eleitoral, eu espero que algum candidato apresente um plano consistente para a educação. Teria meu voto. Toda hora alguém diz que só a educação muda um país. Para que a educação mude um país, no entanto, o país precisa mudar a sua educação. Um bom começo seria pagar melhor os professores. Eu não me importaria de pagar mais impostos para isso. Pagar impostos pode ser muito bom. Faz bem para a sociedade. Não há serviços sem impostos. Jamais.

Juremir Machado da Silva é jornalista e professor

* Artigo publicado no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre/RS, edição do dia 4 de maio de 2010

Política economica de Serra, para o Brasil...

O anti-Lula de Serra: sua verdadeira política econômica

Emir Sader no carta maior
 
Serra ficou furioso. Sua equipe econômica deu entrevista à agência Reuters e abriu o jogo, revelando o plano econômico real que, caso ganhasse o tucano, colocaria em prática, confirmando os principais neoliberais de Serra – os mesmos que orientaram seu governo em São Paulo. Serra esbravejou, esperneou, distribuiu broncas, ordenou que ninguém repercutisse nos partidos da imprensa. Mas já era tarde.

A primeira medida econômica de Serra seria um duro ajuste fiscal – como é típico dos governos neoliberais. Segundo revelado por dois membros da equipe econômica tucana, se promoveria a renegociação de contratos e o corte de despesas públicas – conforme o modelo do FMI. Esse seria o começo do “choque de gestão”, típico das gestões tucanas.
“Ele vai entrar com medidas fiscais e até renegociação de alguns contratos”, disse a fonte tucana.”As despesas da máquina pública estão sob um controle muito frouxo...”

Critica-se o aumento das despesas públicas, uma suposta queda na arrecadação e as desonerações feitas para resistir aos efeitos da crise mundial. Anuncia que estão vigilantes sobre a cotação do real frente ao dólar. O papel dos bancos públicos seria “relativizado”, de forma coerente com a privatização do Banespa, vendido ao banco espanhol Santander, assim como a colocação à venda da Nossa Caixa que, felizmente, foi resgatada pelo Banco do Brasil. Assim, São Paulo, o estado mais rico do país, não tem mais nenhum banco público, o candidato tucano preferiu liquidar o patrimônio para fazer estradas, que aparecem muito mais do que financiamentos subsidiados para casa própria, por exemplo, como faz o governo federal. “Relativizado” significa baixo perfil, Estado mínimo, conforme o receituário neoliberal, para que os bancos privados possam ser absolutizados, possam ocupar mais espaço ainda.

Diz o tucano, na entrevista a Reuters, que o fortalecimento dos bancos públicos contribuiria para “aumentar a pressão inflacionária, ao aquecer em demasia a atividade” (sic), preocupação prioritária dos neoliberais, que não aprendem com o governo Lula que se pode – e se deve – aumentar os salários e diminuir as taxas de juros que, em um marco de crescimento com distribuição de renda, não apresentam riscos inflacionários. “Não acho que os bancos públicos precisam ter uma política tão protagonista (sic) neste pós-crise”, afirma a fonte, de forma coerente.

“Uma atuação menos arrojada, inclusive, poderia ser um dos caminhos para evitar a alta das taxas de juros a fim de controlar a inflação e as expectativas de preços”, comenta Reuters, a partir da conversa com membros da equipe econômica tucana.

A equipe serrista considera exagerados os estímulos fiscais dados pelo governo Lula durante a crise. “Não precisava dar para toda a linha branca e depois para móveis...” Parece que seguem acreditando que o próprio mercado tem mecanismos próprios de reativação econômica.

Apostam pouco na concretização de reformas como a tributária, em que o interesse seria apenas o de desonerar investimentos e folha de pagamento, sem nada que apontasse para uma estrutura tributária em que “quem ganha mais, paga mais”, como seria socialmente justo.

Então, a surpresa que Serra esconde é similar à de Carlos Menem e à de Carlos Andrés Perez: um grande pacote de ajuste, escondido sob o disfarce de um “choque de gestão”, tão a gosto do neoliberalismo tucano.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

A piada marketeira de Serra...

Serra como o "pós-Lula", ou o cinismo como marketing eleitoral

Mauricio Caleiro em seu Blog Cinema & outras Artes


A tentativa de José Serra de “vender-se” como o pós-Lula, elogiando publicamente e com frequência o atual presidente, embora não deixe de apresentar aspectos risíveis, põe em prática uma das operações de marketing político mais cínicas da história das eleições brasileiras.

Ofensiva ao eleitorado brasileiro - ao qual trata como um ignorante político e um desmemoriado - o oportunismo de Serra no episódio, demeritório para si próprio e para seu passado, equivale a uma desautorização pública de seu partido - que vive, há 8 anos, às turras com Lula.

Se tivéssemos uma imprensa de fato, com um mínimo de vergonha na cara, ela estaria hoje desmascarando essa farsa, com a arma do sarcasmo que tal fanfarrice demanda e com o amplo apoio dos arquivos e dos fatos, sejam estes bem recentes (quando o candidado tucano era governador de São Paulo) ou distantes (referentes ao longo antagonismo não só entre PT e PSDB, mas, incluindo embates eleitorais, entre as figuras de Lula e de Serra).

Porém, em relação a tamanha hipocrisia, os colunistas de política da “grande imprensa”, sempre tão moralistas, fiscalizadores das mínimas derrapadas verbais dos políticos com os quais seus patrões antipatizam – notadamente o presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff -, ostentam um silêncio tão sepulcral quanto epifânico.
Dois pesos, duas medidas

Compara-se a reação desses mercenários do jornalismo com a que tiveram quando o PT passou a flexibilizar suas alianças e orientação política - rumo a um neoliberalismo menos ortodoxo do que o então praticado pelo PSDB – para se ter uma idéia dos reais valores (ou dos valores em reais, como queiram) que regem suas opiniões. Não que a “lulilação de Serra” e a “neoliberalização do PT” sejam equivalentes: esta, sem deixar de ser eventualmente criticável, representa um processo de correção de rumo face às condições históricas vivenciado por um número significativo de partidos políticos (como as sociais-democracias européias e o trabalhismo inglês, para ficar em dois exemplos óbvios), enquanto a metamorfose de Serra em admirador de Lula pertence a outra ordem de coisas: a das farsas grotescas.

E não basta invocar a estratégia “Lulinha paz e amor”, proposta por Duda Mendonça e posta em prática pelo candidato petista em 2002, para autorizar a estratégia serrista de marketing, não só porque até isso o candidato tucano copia – por meio da tal da campanha da “meiguice” -, mas porque suavizar o discurso, como o hoje presidente fez, é bem diferente de negar não apenas o próprio passado mas o do partido ao qual é filiado, e passar a forçar a barra para uma identificação com o líder do partido opositor. Seria como se Lula tentasse fingir concordar com Fernando Henrique Cardoso em 2002 – o que nunca fez, até porque, com a popularidade que o ex-presidente tinha, seria um péssimo negócio.


"Última esperança branca"
Se quer ganhar a eleição, Serra não tem mesmo outra alternativa: identificar-se como o tucano que é significa evidenciar sua filiação ao legado de FHC, a quem o povo brasileiro detesta, por conta de seu governo anti-povo, privatista, recessivo, no qual o desemprego bateu recordes (atualmente continua a batê-los, mas em sentido inverso: o de março foi o menor da história desde que o índice começou a ser medido).

Não ter alternativas não é, no entanto, justificativa para a manutenção dessa pantomima ofensiva à democracia. A decência pede, com mais ênfase aos homens públicos, que assumam o seu passado e suas posições político-ideológicas, mesmo que à custa de eventuais sacrifícios eleitorais.


Olho vivo
Denunciar a farsa grotesca do Serra lulista deve ser a prioridade número um da candidatura de Dilma. Isso se também esta não se vir vítima do “tapetão” judiciário ao qual o PSDB tem sistematicamente apelado – e o qual pede redobrada atenção da sociedade civil quanto aos procedimentos da Justiça Eleitoral.

Pois, segundo os jornais de hoje, o programa de TV do PT pode, se o TSE acatar o entendimento da procuradora Sandra Cureau, não ir ao ar devido às acusações que fez ao governo FHC de “só ter governado para os ricos” (ué, cadê os defensores histéricos da liberdade de imprensa agora? sumiram?). Ora, se isso for suficiente para vetar o horário petista, a transformação de Serra em lulista desde criancinha serve com folga ao impedimento do horário tucano. Basta acessar os arquivos e rodar o VT.

As contradições do mundo capitalista...


A Cancún que ninguém vê fala 50 línguas 'proibidas' e não pode ir à praia

Indispensáveis para o funcionamento do turismo no balneário mexicano, centenas de milhares de pessoas vivem e trabalham em condições precárias, além de sofrerem discriminação racial
As águas azuladas de Cancún, cidade conhecida como a “pérola do Caribe”, permeiam o sonho de turistas do mundo todo. Principal destino do México, o município de cerca de 700 mil habitantes recebe mais de três milhões de turistas a cada ano – a grande maioria vinda dos Estados Unidos, seguidos por canadenses e espanhóis. A matéria foi feita pela jornalista Natalia Viana para o Opera Mundi

Os turistas são como a norte-americana Beverly Alston, de Nova Jersey, que vêm todo ano com a família para se hospedar em luxuosos resorts na região. “Amamos o México. Vamos voltar mais vezes”, diz ela ao embarcar em um cruzeiro acompanhada da filha e do marido. 
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Até a década de 1970, Cancún não passava de um vilarejo de pescadores com cerca de dois mil habitantes. Apostando no potencial do turismo internacional (70% dos turistas são estrangeiros), o governo implantou uma urbanização voltada para o turismo de luxo.


Não tão longe das praias paradisíacas vivem os habitantes - quase invisíveis - de Cancún


Abriram-se largas avenidas, seguindo o modelo norte-americano, abrindo espaço para as cadeias de hotéis – inicialmente o plano inicial era construir não mais do que 200, oferecendo cerca de 17 mil quartos. Hoje em dia, há mais de 32 mil quartos de hotel em Cancún, segundo dados da Prefeitura.

“Isso aqui é a Pequena Miami”, brinca o ativista Alejandro Eguiá Liz, diretor da ONG Tzol K’in, que trabalha com mexicanos que sofrem com os impactos do turismo. Ele aponta para a zona hoteleira: uma faixa de 17 quilômetros que margeia a praia com hotéis como Mariott e Hilton, além de resorts como “Casa de los Sueños Resort”, “Crown Paradise” e “Moon Palac”, cujos valores de diária podem chegar até cinco mil dólares. A zona hoteleira também oferece bares consagradas nos EUA, como Hard Rock Café e Hooters, boates e lojas de luxo como Armani, Cartier e Dolce & Gabanna. 
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Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Geografia do México, 67% dos turistas que chegaram à região em 2008 se hospedaram em hotéis cinco estrelas, e outros 14% em hotéis de quatro estrelas.

“Nós vivemos muito longe de Deus e muito perto dos EUA”, brinca Alejandro com a citação do ditador mexicano Porfirio Díaz, ao explicar que os habitantes não têm acesso às praias da cidade. “Cada hotel tem sua faixa de areia com serviço de bar e restaurante. As entradas, obrigatórias por lei, são de difícil acesso”.

O pedreiro Daniel Paz Gómez, de 27 anos, conta que, embora trabalhe construindo hotéis na beira da praia, raramente visita a orla. “Se entramos, os seguranças vêm atrás da gente”, conta ele, que é do interior da região de Chiapas, no sul.

Cancún é uma cidade de migrantes como Daniel. Atraídos pela promessa de melhor remuneração e gorjetas em dólar, pessoas de vários lugares ajudaram a formar o mais vertiginoso fluxo migratório interno do México. Estima-se que nada menos que 50 línguas nativas sejam faladas na cidade. Até hoje, Cancún ostenta um dos mais altos índices de crescimento urbano do país - 9% ao ano, segundo a prefeitura.

Mas essa diversidade cultural é escondida pelos hotéis, segundo Alejandro, que, antes de se dedicar ao terceiro setor, trabalhou como treinador de equipes em redes hoteleiras. “Os trabalhadores não podem falar espanhol entre eles, imagine suas línguas nativas”.

Passeando pela praia, os turistas canadenses Alana e Donny Smith confirmam que não tiveram que falar uma só palavra em espanhol desde que chegaram. “Os funcionários sempre se esforçam para falar inglês”, diz Donny. 
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Mas, para o carregador de malas Arturo Ek Rodríguez, o maior problema é mesmo o preconceito contra os indígenas, que habitam a região desde tempos pré-colombianos. “Tive de procurar muitos hotéis antes de conseguir este trabalho”, diz ele. “Disseram-me várias vezes que eu não tinha a altura adequada e que não tinha o perfil. Tinha de ter a pele mais branca e um biotipo mais europeu”, explica.

“Os funcionários são ensinados a ser servis e nunca reclamar”, diz Alejandro Eiguá. Uma terapeuta corporal que não quis se identificar contou à reportagem do Opera Mundi que foi demitida do resort onde trabalhava por tentar organizar as colegas de trabalho para reivindicar melhores condições. O sindicalista Salvador Reyes Trinidad, dirigente da Federação Revolucionária de Empregados e Trabalhadores, diz que muitos têm medo de se filiar aos sindicatos. “A pressão é muito forte porque os gerentes dizem que há muitos outros como você querendo o emprego”, conta.

Segundo ele, um dos grande problemas é o uso frequente de contratos temporários de 28 dias que, na prática, retiram quaisquer direitos do trabalhador. Segundo ele, grande parte dos trabalhadores como construtores, faxineiros e encanadores trabalham com esses contratos, renovados infinitas vezes. “No caso do setor gastronômico, os hotéis costumam contratar empresas terceirizadas, que não pagam a previdência e ficam mudando o empregado de hotel, evitando qualquer relação duradoura com os colegas e patrões”, diz.

Outro problema é relatado pela imigrante Rubí Argaez, que mora em uma das 300 favelas que se espalham pela periferia de Cancún – quase sempre escondidas atrás de grandes avenidas e terrenos baldios. “Eu vim com minhas duas filhas procurando uma vida melhor, mas o sonho não se realizou”, conta. Segundo ela, o trabalho em hotéis era desgastante demais porque frequentemente era obrigada a cumprir jornadas duplas ou triplas sem poder voltar para casa, nem reclamar. “Ficava com medo de deixar as meninas sozinhas”. 

Rubí Argaez, ao lado de uma das filhas, faz bicos na construção civil e como babá


A favela Colonia Maracuya, onde Rubí mora, fica a cerca de 20 minutos da zona hoteleira – mas parece um mundo à parte. Situada atrás de uma enorme loja de departamentos no extremo norte da cidade, a favela abriga cerca de 200 habitantes em precárias casas de madeira, sem abastecimento oficial de eletricidade, água ou esgoto.

Rubí, que ganha algum dinheiro fazendo bicos na indústria da construção ou como babá, conta que teve muitas dificuldades para que as filhas fossem admitidas em uma escola pública. “Não aceitavam minha declaração de que eu moro aqui na Colonia, já que eu não tenho um comprovante oficial”, diz ela.

A crise

A crise mundial chegou a Cancún de maneira violenta. Em 2008, o nível de desemprego subiu de 3% para 8%. Além do impacto na economia por conta da dependência econômica dos EUA – que levou o PIB mexicano a uma queda de 6,5% em 2009 – a gripe suína afastou ainda mais os turistas, deixando milhares de quartos de hotéis desocupados. Os mais afetados foram os trabalhadores do setor.

No município de Playa del Carmen, em uma praia ao lado da agitada rua Benito Juárez, dezenas de pedreiros ficam sentados desde as seis da manhã à espera de um possível empregador que ofereça trabalho por pelo menos um dia. Muitos carregam mochilas com ferramentas de trabalho. Normalmente, o pagamento é de 150 pesos (cerca de 20 reais) mas, nos últimos anos as condições têm sido cada vez piores.

“Tem pouco trabalho agora,” diz o pedreiro José Louis Bolaños. Nascido no interior, mas morando em Cancún há oito anos, ele comenta que muitos dos empregadores não pagam o dinheiro devido. “Esse cara aí não é de confiança”, explica, apontando para um homem que estaciona um furgão ao lado da praça e logo é cercado por uma dezena de candidatos ao trabalho. “Trabalhei com eles uma semana e depois ele desapareceu. Fiquei sem o dinheiro”. 
Para amenizar o impacto da crise, uma das estratégias usadas por agências de turismo e redes hoteleiras no balneário mexicano de Cancún tem sido apostar ainda mais nos pacotes com “tudo incluído” no preço. O visitante paga bem menos pelo voo, incluindo todas as refeições, estadia e diversão no próprio hotel. Dentro dos resorts, há restaurantes, boates, clínicas de massagem, salão de jogos e até shows exclusivos para os hóspedes.

“Parecem verdadeiras mini-cidades”, diz Astrid Cavazos, gerente do hotel Porto Royal. Ela admite que os comerciantes locais não podem competir, já que os preços oferecidos pelos pacotes são muito mais baixos.

O comerciante Rubén Cahán, dono de uma lojinha de lembranças a oito quarteirões dos resorts de Playa del Carmen, diz que muitos turistas nem chegam a sair do hotel, o que tem um sério impacto nos negócios. “Está cada vez mais difícil”, diz ele. “Alguns turistas falam que as lojinhas de nativos ficam muito longe”.
*Texto e fotos

Vazamento de petróleo do Golfo do México....

Catástrofe no Golfo do México serve de alerta

Por Matthew Berger, da IPS


 Enquanto uma enorme mancha de petróleo continua afetando a riqueza do Golfo do México, após a explosão há duas semanas de uma plataforma de extração, ambientalistas insistem em dizer que a catástrofe deveria servir de alerta para acabar com as perfurações no mar e para se afastar dos combustíveis fósseis. Alguns em Washington começam. Os Estados Unidos deveriam começar a dar passos para uma economia verde, afirmou o senador Robert Menendez, do governante Partido Democrata. “Agora todos deveríamos ter claro que a perfuração no mar não é muito segura, e nunca foi”, acrescentou.

Por sua vez, o diretor-executivo da organização ambientalista norte-americana Sierra Club, Michael Brune, comparou o vazamento de petróleo com uma “boca de fogo decapitada”. O “que não sei é quantas vezes precisamos ter esta conversa” sobre vazamento de petróleo em lugares como o Golfo do México, o Oceano Ártico e o Rio Amazonas, disse aos jornalistas. No dia 30 de abril, Brune afirmou que o vazamento marcou “o limite de nossa atração pelos combustíveis fósseis”.

Por sua vez, a diretora-executiva do grupo Environment America, Margie Alt, afirmou: “Temos de tomar isto como uma lição para passar a uma economia de energias limpas”. O petróleo começou a se espalhar quando a plataforma Deepwater Horizon, que a British Petroleum (BP) arrendou da firma Transocean, com sede na Suíça, explodiu no dia 20 de abril e afundou. Estima-se que agora o poço vaze cinco mil barris (de 159 litros) por dia nas águas do Golfo do México.

Até agora, os esforços para deter o vazamento têm sido em vão e é incerto se vai parar. É considerado o pior desastre ambiental e econômico para os Estados Unidos desde que o petroleiro Exxon Valdez sofreu um vazamento, em 1989, de quase 50 milhões de litros na Baía de Prince William Sound, no Alasca. Enquanto se redobra o esforço para deter a mancha de óleo, em Washington predomina um sentimento de traição.

“Há tempos a indústria petroleira nos disse que nada aconteceria, mas, lamentavelmente, aconteceu, e antes também, não apenas em nosso país, mas em todo o mundo”, disse Menendez. O senador se referiu repetidas vezes ao vazamento da plataforma de Montara, no Mar de Timor, entre Austrália e Timor Leste, que durou dez semanas no ano passado. O diretor-executivo da BP, Tony Hayward, disse à norte-americana National Public Radio que considera improvável que o desastre no Golfo do México chegue à mesma magnitude.

O vazamento tem impacto no debate público norte-americano. As perfurações petroleiras marítimas já eram um tema quente na política do país há alguns anos. Desde o aumento dos preços do gás no verão de 2008, crescem os apelos por uma economia verde, com maior uso de fontes renováveis de energia, como solar e eólica. Entretanto, líderes do opositor Partido Republicano, incluindo o ex-candidato presidencial John McCain, fizeram uma campanha a favor da extração de combustíveis fósseis sob o lema “Drill, baby, drill” (perfure, querida, perfure), disse o legislador. O que se tem agora é uma “bomba atômica ambiental”, ressaltou.

Ao menos um destacado político tirou uma lição do ocorrido no Golfo. O governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, decidiu suspender um plano com o qual pensava cobrir o déficit orçamentário de sua administração, vendendo autorizações para realizar extrações marítimas na costa da cidade de Santa Bárbara. O governador disse que as imagens do vazamento no Golfo foram um fator fundamental em sua decisão. Em 1969, Santa Bárbara já sofreu um vazamento, após a explosão de uma plataforma. Essa catástrofe originou um amplo movimento ambiental, o mesmo que agora se vê fortalecido pelo ocorrido no Golfo do México.

Impacto na legislação

O vazamento também pode afetar os atuais esforços para que o Senado aprove uma lei contra o aquecimento global. Esses esforços se baseavam em concessões a políticos conservadores mais inclinados a aceitar a nova lei. Uma dessas concessões foi ao anúncio feito pelo presidente Barack Obama no mês passado de que se levantaria a proibição de novas perfurações petroleiras em algumas áreas marítimas dos Estados Unidos.

Mas o anúncio não teve o efeito esperado. Pelo contrário, agora alguns senadores progressistas dizem que não aprovarão a lei se forem permitidas novas extrações. “A proposta do presidente já estava morta ao chegar”, disse o democrata Bill Nelson, do Estado da Flórida. “Se a perfuração marítima é parte da legislação sobre mudança climática, essa legislação não irá a parte alguma”, acrescentou.

Por sua vez, Menendez disse que havia outro tipo de concessão que poderia interessar aos conservadores sem apelar para perfurações, como construir novas usinas atômicas e incentivar pesquisas com “carvão limpo”.

(IPS/Envolverde)
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A democratização da internet.....

Plano de banda larga vai democratizar acesso à internet

A ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, disse nesta quarta-feira (5) que a Telebrás – a estatal de telecomunicações privatizada em 1998– receberá investimento de R$ 3,22 bilhões entre 2010 e 2014, dentro do PNBL (Plano Nacional de Banda Larga), que tem como objetivo baixar os preços de acesso à internet.

Roosewelt Pinheiro/ABr
Banda Larga
A ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, anunciam as principais diretrizes do Plano Nacional de Banda Larga.

De acordo com a ministra, o objetivo principal do PNBL é expandir o acesso para as classes C e D. "O desenvolvimento do país só será efetivo com o acesso à banda larga sendo utilizado como ferramenta de inclusão social".

Apontada nos anos 90 pelos neoliberais como um dos símbolos do atraso das empresas estatais, o governo Lula inverteu a lógica e agora apresenta a Telebrás como a solução de viés estatal para o futuro do acesso amplo à internet no país.

"Efetivamente, a Telebrás está sendo reativada. É claro que dentro de uma modelagem própria, voltada e focada na questão da gestão da banda larga para fazer a gestão dessa rede física", disse Erenice.

Ela afirmou que o papel da estatal não é substituir ou limitar a iniciativa privada, mas sim usar a infraestrutura de que a União já dispõe para incentivar empresas particulares.

A ministra destacou que a meta do governo é triplicar o acesso à internet por banda larga no país e quadruplicar o número de domicílios com o serviço disponível numa velocidade igual ou superior a 512 kbps. A ideia é atingir até 40 milhões de domicílios, baixando o preço do serviço para apenas R$ 15, nos casos em que sejam adotados incentivos fiscais.

Nos casos em que os incentivos não sejam adotados, a expectativa do governo é de que o preço fique entre R$ 29 e R$ 35, valor que varia em função da cobrança ou não de ICMS. Com esse perfil, a expectativa é de que 35,2 milhões de domicílios tenham acesso à banda larga. Atualmente, o país tem apenas 12 milhões de domicílios com acesso, na velocidade máxima de 256kbps, a preços que variam de R$ 49 e R$ 96.

O presidente Lula quer que a Telebrás seja a gestora da rede de fibras óticas para o PNBL. Parte dessa rede atualmente está sob domínio da Eletronet - prestadora de serviços de telecomunicações criada em 1999 por empresas de energia elétrica, que entrou em falência em 2003.

O professor licenciado da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) Márcio Wohlers de Almeida diz que a reativação da Telebrás será parte de um esforço para que o governo atinja regiões que ainda não têm acesso à rede em alta velocidade.

Áreas beneficiadas

Conforme já havia sido anunciado na terça (4) – em comunicado enviado pelo governo à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) –, a empresa estatal Telebras será a gestora do Programa Nacional de Banda Larga. Segundo o ministro do Planejamento, o plano como um todo vai facilitar também o desenvolvimento de pequenas e médias empresas, inclusive na área de comércio externo, buscando novos mercados.

O total previsto de desonerações (abatimento de impostos e facilidades) é de cerca de R$ 785 milhões, dos quais R$ 11,36 milhões do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) para pequenas e médias prestadoras e R$ 770 milhões de abatimento dos descontos para o Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para equipamentos usado para conexão à internet (modem).

Além disso, R$ 3,75 milhões correspondem à isenção da alíquota de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para equipamentos de telecomunicações com tecnologia nacional. Atualmente, esses aparelhos têm redução de 95% do IPI. A capitalização da Telebras será de R$ 3,22 bilhões.

Segundo o coordenador do Programa de Inclusão Digital da Presidência da República, Cezar Alvarez, a linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não tem limite, mas a estimativa é de que chegue a R$ 6,5 bilhões para financiamento e compra de equipamentos de telecomunicações de tecnologia nacional, e de R$ 1 bilhão de financiamento para micro, pequenos e médios prestadores de serviços de telecomunicações e lan houses, por meio do cartão BNDES.

Também serão destinados R$ 1,75 bilhões do Fundo de Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel) para investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Os investimentos foram estimados para período de 2010 a 2014.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Exploração dos trabalhadores nos grandes magazines.....


Ligadas a grandes redes, oficinas tratam imigrantes como escravos

No merchandising na novela das oito ou numa propaganda no horário nobre, atores consagrados cumprem o script ignorando a cadeia de produção dos grandes magazines. No mesmo horário, diversos trabalhadores – em geral latino-americanos – terminam sua jornada, iniciada muitas vezes há 12 horas, para dar conta das demandas dos mesmos anunciantes. A cada peça costurada, chegam a ganhar míseros R$0,10 e precisam ignorar seus próprios limites por um salário que supra minimamente as suas necessidades.


Por Priscila Lobregatte no Portal Vermelho
A rotina desses milhares de trabalhadores estrangeiros que buscam uma nova vida no Brasil não tem nada de sombra e água fresca. Passando por graves problemas financeiros ou refugiando-se de guerras civis, eles chegam com poucos recursos e topam qualquer trabalho. Os que estão em situação mais delicada, procuram albergues ou instituições de assistência até conseguirem recursos para se manter. O caldo criado pela miséria, o desconhecimento, o medo e mesmo a promessa de tempos melhores faz de muitos deles reféns de um sistema espúrio de exploração.

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- Especial completo sobre migração estrangeira

Quase escravos

As ruas do Bom Retiro, espécie de paraíso das sacoleiras, é a Meca de quem quer comprar roupas por preços abaixo da média. Mas, o custo dessa pechincha é alto para os trabalhadores que fornecem essas mercadorias tanto para as lojas do bairro da capital paulista quanto para grandes redes de vestuário.

 
MTE flagra trabalhadora em oficina do Bom Retiro  
Em pequenas oficinas, que por vezes também servem de moradia, amontoam-se vários homens, mulheres e mesmo crianças que trabalham e vivem num ambiente insalubre e desumano. Fiscais do Ministério do Trabalho estimam que existam entre oito mil e 10 mil oficinas na Grande São Paulo que empregam cerca de 80 mil a 100 mil sul-americanos. Dos 50 mil estrangeiros anistiados em 2009, cerca de 32% (16 mil) são bolivianos que vivem em São Paulo. E uma fatia considerável deles se espalha por essas fabriquetas que prestam serviços terceirizados a grandes lojas, como a Marisa.


A rede, autuada em março, foi a primeira em que os fiscais comprovaram casos análogos à escravidão em ambiente urbano. Por isso, foi multada em R$ 634 mil e os fiscais recomendaram sua inclusão na “lista suja”, que divulga os nomes de ruralistas e empresas que exploram esse tipo de trabalho.

“Há indícios de outras situações idênticas à constatada na Marisa nas redes C&A, Renner e Riachuelo”, disse ao jornal Folha de S.Paulo (18/03/2010) Renato Bignami, chefe da Seção de Fiscalização do Trabalho Substituto do Ministério do Trabalho e Emprego. Ações como essa fazem parte do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, incluído no Plano Nacional de Direitos Humanos.

Além das ações nacionais, Paulo Sérgio de Almeida, presidente do Conselho Nacional de Imigração do MTE, diz que a superintendência do ministério em São Paulo lançou projetos próprios como o Pacto pelo Trabalho Decente de Imigrantes. “Para isso, foi criada uma rede de entidades que assumiram responsabilidades na erradicação do trabalho escravo de imigrantes. As grandes cadeias de comércio do setor de vestiário foram convidadas a participar, já que de fato estas grandes redes devem monitorar suas cadeias produtivas de forma a não permitir a ocorrência de graves problemas como o uso de trabalhadores imigrantes em condições degradantes entre seus fornecedores”, declarou ao Vermelho.

Apesar do ineditismo do caso, a realidade da exploração dessa mão de obra não é novidade. “Temos denunciado essa situação desde 1990”, explicou ao Vermelho a presidente do Sindicato das Costureiras de São Paulo e Osasco, Eunice Cabral. E, para se ter uma ideia de como a exploração e a informalidade aumentaram, ela completa: “naquele ano, éramos em nossa base, 180 mil trabalhadores no mercado formal. Hoje somos 80 mil. E no mesmo período, a produtividade do setor cresceu assustadoramente, da mesma forma como diminuiu o número de pessoas empregadas formalmente. Para piorar, vale lembrar que nosso setor não usa tecnologia de ponta em sua totalidade; 50% são maquinários mais modernos, mas a outra metade é formada por máquinas obsoletas”.

 
  Eunice: Não queremos um trabalhador mendigo (por Sindicato das Costureiras)
O sindicato vem trabalhando junto a órgãos de fiscalização – como o MTE, o Ministério Público a Polícia Federal, entre outros – a fim de coibir essa prática. “É muito comum haver casos como o da Marisa, que alegou não ter conhecimento de tal situação pelo fato de o trabalho ser terceirizado várias vezes na cadeia produtiva. Mas, como não sabia? Os documentos levantados pelo Ministério mostram isso claramente. Outra coisa: a empresa nunca desconfiou de uma peça ser feita por um valor tão baixo?”, questiona.


“Em geral, o trabalhador recebe R$ 0,10 por peça, valor que pode chegar ao máximo de R$ 0,40 e pode ser vendida, por exemplo, a R$ 40,00 na loja, ou seja, um lucro altíssimo. Além da questão humana, existe também o problema da concorrência desleal que prejudica as empresas que procuram agir corretamente. É um dumping social e econômico e é contra isso que temos lutado”, esclarece Eunice.

Para os trabalhadores formais, o piso da categoria varia entre R$ 766,12 e R$ 850,65, dependendo da função exercida. Se quiser ganhar o menor salário tendo como referência o valor mais baixo (e comumente adotado) por peça (R$ 0,10), o trabalhador informal terá de produzir mais de 7.600 roupas. A fim de alcançar um valor como esse para sua sobrevivência, eles chegam a trabalhar 16 horas por dia, especialmente em épocas de maior demanda, como Natal ou Dia das Mães.

No estilo dos piores coronéis do interior do país, muitos desses patrões retêm os passaportes para garantir a manutenção dos empregados. Não bastasse toda essa situação degradante, há ainda os problemas de saúde, como a bissinose, uma reação fibrosa crônica dos pulmões à inalação de poeira de algodão que os tecidos soltam durante a fabricação das roupas. A doença, comum a quem trabalha no ramo sem proteção, pode ser confundida com a tuberculose e a falta de tratamento rápido e adequado pode levar à morte. “Além da questão respiratória, nossos trabalhadores podem sofrer de tendinite, varizes e há até mesmo casos de câncer vaginal. As mulheres pegam restos de tecidos e fazem almofadinhas para melhorar o conforto na cadeira, o que por vezes acaba levando à doença. Tudo isso advém das péssimas condições de trabalho”, alerta Eunice.

O meio em que se dá a exploração da mão de obra estrangeira é também ameaçador. Na feira da Kantuta, realizada pela comunidade boliviana no bairro do Pari, em São Paulo, carros de luxo têm em seus vidros e capô placas onde se lê, em espanhol e português, “admitem-se costureiros”. Tentar falar com eles é quase impossível. Ninguém quer assumir fazer parte desse submundo.

Entre os trabalhadores, a situação é ainda mais delicada. Mariela, nome fictício de uma boliviana de 24 anos, embora seja um desses trabalhadores, prefere não falar. “Ganho menos do que o piso, mas meu patrão é bom. Não tenho problema”, hesita. “Mas, minha prima trabalhava demais e ganhava muito pouco”, contorna, tentando fugir do assunto. Porém, reconhece: “emagreci muito desde que estou nisso porque trabalho bastante e acabo comendo pouco”.

Eunice vai além: “já recebi ameaças anônimas por telefone”, mas “não me preocupo porque quando topei estar à frente do sindicato, sabia que minha vida não seria normal. Ainda assim, enquanto eu cumprir esta função – e este é o pensamento de nossa diretoria – vou trabalhar para mudar essa situação. Não queremos um trabalhador mendigo, nem que os estrangeiros deixem o país, mas que tenham uma vida e um trabalho dignos e seus direitos assegurados”.

As garras do império se voltam para o Brasil...

O império retoma o ataque
Escrito por Wladimir Pomar - no Correio da Cidadania
 
Segundo notícias recentes, porta-vozes do sistema financeiro internacional estão alertando seus acionistas de que o mercado de ações brasileiro estaria formando uma bolha, a economia do Brasil estaria aquecida e o real supervalorizado. Em outras palavras, parece estar findando a lua de mel entre o sistema financeiro internacional e a política de crescimento do governo brasileiro, embora tal sistema tenha sido um dos que mais lucraram nos últimos anos.
 
O desconfiômetro deve nos conduzir a uma análise mais cuidadosa do assunto, de modo a descobrir se há razões reais para o alerta, ou se se trata de jogada política, tendo em vista possíveis mudanças na política monetária brasileira. O Banco Central se apressou a tranqüilizar o sistema financeiro internacional, afirmando que o Brasil pode adotar medidas que impeçam um crescimento superior a 2% ao ano, desde que retire os incentivos fiscais e aumente a taxa Selic, a taxa básica de juros.
 
Ou seja, o Banco Central, numa penada, mudou toda a perspectiva de crescimento do país. Por um lado, avisou ao governo que a política monetária deve manter tranqüilos os acionistas dos bancos internacionais. Por outro, informou aos empresários que não devem investir na ampliação de sua capacidade produtiva. Primeiro, porque isso pode causar fricções com o sistema financeiro internacional. E depois porque vale mais a pena aplicar no jogo de ações da bolsa de valores, que lhe garante um rentismo certo.
 
Estranhamente, essa encenação entre o sistema financeiro internacional e o Banco Central brasileiro ocorre no momento em que o PT acena para a possibilidade, com a continuidade do governo democrático e popular, de adotar medidas para reduzir de forma mais consistente os juros e a especulação financeira, estimular os investimentos produtivos para aumentar a oferta e continuar estimulando a demanda através do crédito.
 
Em outras palavras, o sistema financeiro e o Banco Central comunicaram à candidatura Serra que podem dizer publicamente que os planos de crescimento da candidatura Dilma não passam de euforia sem base na realidade. Algo, aliás, que já vem fazendo parte da campanha da oposição e da grande imprensa a respeito da implementação do PAC. Portanto, as notícias parecem ter mais motivação política do que econômica e financeira.
 
É evidente que a redução do ritmo de crescimento e a elevação das taxas de juros podem ter um efeito perverso sobre o emprego, a renda dos trabalhadores, o endividamento das famílias, o mercado interno. Ou seja, tudo que já se conhece da política levada a cabo, por vários anos, pelos governos Collor e FHC. A posição a adotar, num caso como esse, seria pressionar o governo para manter firmeza em sua política de crescimento, rebaixamento dos juros e enquadramento do sistema financeiro em seu papel de financiador da produção.
 
Apesar disso, intelectuais às voltas com a crise de ideais preferem atacar a política de crédito do governo, concordando com o sistema financeiro internacional quanto à possibilidade de uma bolha na venda a longo prazo. Além de a admitirem, para demonstrá-la utilizam o famoso método do absurdo, argumentando que ela pode estourar, se o emprego e a renda dos endividados não crescerem e se os investimentos produtivos voltados para o mercado interno não ocorrerem. Em outras palavras, se o pára-quedas não abrir, o saltador se esborrachará; se o freio não funcionar, o caminhão baterá; se o trilho abrir, o trem descarrilará. O absurdo pode ir ao infinito.
 
A política de crédito tem por base justamente as políticas de investimentos produtivos, rebaixamento dos juros, crescimento do produto interno, crescimento dos empregos, ampliação da renda e do mercado interno, configurando um novo projeto nacional que combine o desenvolvimento das forças produtivas, com distribuição de renda e ampliação dos direitos democráticos. Nesse processo, a disputa entre os interesses populares e os interesses capitalistas se manterá em tensão permanente, sendo difícil prever por quanto tempo tais interesses poderão ser harmonizados num projeto comum.
 
De qualquer modo, a intelectualidade tem um papel fundamental na análise do desenvolvimento desse processo, colocando-se firmemente ao lado dos interesses populares e buscando as táticas que os ajudem a evitar as armadilhas que o capital financeiro, em especial, vai antepor para tentar romper o projeto comum. Se algum dia o projeto se romper, a única forma de conservar a razão e ganhar a maioria do povo será fazer com que a responsabilidade por tal rompimento seja clara e totalmente dos interesses capitalistas.
 
Para tanto, a intelectualidade de esquerda necessita voltar a enxergar sua existência como uma expressão da divisão social, da divisão de sociedade em classes. Procurar se referenciar à classe ou às classes que representa, consciente ou inconscientemente. Ela não pode intervir nos rumos da História sem compreender e representar interesses e necessidades históricas de classe, sem aderir a tais interesses, nem ligar-se organicamente a eles.
 
Pela ausência de uma análise de classe mais acurada da sociedade brasileira, e pela ação da síndrome do manual, há entre nós uma miríade de intelectuais que não conseguem enxergar a realidade como ela é, nem os desvios que ela impõe à política para alcançar os objetivos estratégicos. Com isso, como vimos, podem negar-se a si próprios e a seus interesses de classe, e argumentar como os liberais e os neoliberais. O que pode ser dramático, nos momentos em que o império contra-ataca.
 
Wladimir Pomar é escritor e analista político.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

EZLN - Exército Zapatista de libertação Nacional e seu novo jornal na web...

“Desinformar-se e enfrentar a investida dos meios de comunicação capitalistas”


Jornalista que acompanha os zapatistas fala sobre a importância do trabalho de contra-informação para as batalhas que se passam “abajo y a la izquierda”
 Das periferias para o centro, a comunicação alternativa vai buscando brechas para transferir o poder da palavra dos maiores aos pequenos. Modificando a ordem dos caminhos da comunicação, o movimento zapatista, do México, experimentou, na década de 1990, a possibilidade de, por meio da internet, ser ouvido no mundo desde sua realidade local.

Uma das protagonistas dessa ação foi Gloria Muñoz Ramírez, jornalista que acompanha o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN)desde seu levante em 1994, no estado de Chiapas. Gloria segue militando na contra-informação. Seu mais novo projeto é dirigir a revista mensal  Desinformémonos.

Em janeiro deste ano, o Brasil de Fato iniciou um intercâmbio de conteúdo com a publicação. Com versão na web (http://desinformemonos.org), a iniciativa envolve colaboradores de inúmeras partes do planeta e é traduzida para o português, grego, italiano, inglês, francês, alemão, e a língua indígena tseltal, bastante falada no sul do México.

A seguir, a diretora de Desinformémonos fala sobre esse projeto internacional e a experiência acumulada em anos junto aos zapatistas.


Brasil de Fato – Pode nos falar um pouco de como nasceu o projeto Desinformémonos?

Gloria Muñõz – Consideramo-nos uma ferramenta de luta por um mundo melhor, ou seja, por um mundo justo, livre e democrático. Aderimos às batalhas que se passam “abajo y a la izquierda”, à margem do poder e dos poderosos. Estamos do lado da autonomia dos povos, pelo direito a decidir sobre nossos próprios destinos. Somos, sem ambiguidades, fruto de uma luta que, desde 1º de janeiro de 1994, nos transformou: o levantamento do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN). E é no terreno da “desinformação” que atuaremos.
 

Por que “Desinformémonos”?


Pegamos o nome emprestado de Mario Benedetti [poeta e escritor uruguaio morto em maio do ano passado]. Estávamos preparando esse projeto quando fomos surpreendidos pela triste notícia de sua morte. Pusemos pra tocar um CD com seus poemas, gravado para La Casa de las Américas, como uma singela homenagem a esse grande poeta e lutador das causas justas. De repente, no meio da incipiente edição dessa revista, lá estava o poema: desinformémonos hermanos/ hasta que el cuerpo aguante/ y cuando ya no aguante/ entonces decidámonos/ carajo decidámonos/ y revolucionémonos.

Depois, veio o jogo de palavras. Desinformar-se e enfrentar a investida dos grandes meios de comunicação capitalistas, aqueles que nos dizem o que, como, quando, onde e por que, do ponto de vista – e para benefício – dos poderes políticos e econômicos, dirigido àqueles que se creem os donos do mundo. “Desinformémonos”: desfazer-nos do que nos oferecem e munirmo-nos de Outra Informação, geralmente invisível, na qual os depoimentos dos “ninguéns”, como diz Eduardo Galeano [jornalista e escritor uruguaio] são o que nos dá sentido e corpo, horizonte e destino. Os povos têm suas próprias vozes e eles mesmos se encarregam de que os demais as escutem. O que nos propusemos em Desinformémonos é ser olhado e ouvido... caixinhas de ressonância. Escutar, como diria o estimado escritor [inglês] John Berger, “as vozes da terra... sempre em baixo”. Sem confundir, como ele mesmo nos alerta, “a intenção deliberada de desinformar com o estar desinformado”. A resistência, nos disse no processo de inauguração desse espaço, “está em saber escutar a terra. A liberdade é descoberta pouco a pouco, não do lado de fora, mas nas profundidades da prisão”.   

Quem são os colaboradores do projeto?

Bom, somos pessoas de muitas partes do mundo. Nosso ponto de vista pretende ser global e abarcar lutas e resistências dos cinco continentes. Atualmente, tocam esse projeto homens e mulheres do México, Argentina, Brasil, Estados Unidos, Alemanha, França, Espanha e Itália, com colaboradores na Grécia, Palestina, Turquia, Irã, Bélgica, Chile, Grã Bretanha, República Árabe Saaráui e Honduras.
 
Em sua experiência junto aos zapatistas, foi possível acompanhar como eles utilizaram de maneira muito hábil a internet para comunicar suas posições para todo planeta. Como isso se deu?

A ideia do uso da internet pelos zapatistas nasceu como um mito que, em muitos sentidos, persiste ainda hoje. Em 1994, a internet ainda era algo muito incipiente e os primeiros comunicados do EZLN eram xerox distribuídos a nós jornalistas na cidade de San Cristóbal de las Casas, em Chiapas. Com o tempo, um exército de mulheres e homens anônimos se incumbiu de difundir as palavras zapatistas pela internet. Na selva em que vivem os zapatistas, não havia sequer luz, que dirá um computador. Assim, o mérito da difusão da palavra zapatista no ciberespaço não é propriamente zapatista, mas de todos que acreditaram nesse movimento e fizeram circular seus comunicados e pronunciamentos. Atualmente, algumas comunidades em resistência têm acesso à internet, mas isso é algo relativamente novo e não pode ser generalizado.
 
De que maneira a internet pode fazer frente aos meios de comunicação tradicionais em favor dos movimentos sociais?
Esse ciberespaço, ainda que criado pela elite, tem servido de ferramenta, vínculo e ponte para os setores da base nos últimos quinze anos. As lutas e a resistência dos povos campesinos e indígenas, dos migrantes, trabalhadores, estudantes, jovens e um longo etcétera, transitam pela rede produzindo identificações onde menos se esperava, isso apesar do acesso à internet ainda estar longe de ser uma realidade, ao menos nos países do chamado Terceiro Mundo. Mas isso não é necessariamente uma carência. Provavelmente não necessitam dessa “conexão”. O que desejamos com Desinformémonos é aproveitar esse espaço virtual, não apenas por falta de recursos para nascer em papel, como gostaríamos, mas porque reconhecemos nesse meio uma alternativa para conhecer o outro, a outra, suas histórias e tragédias, de um lado ao outro do planeta. Desejamos, como diria o mestre do jornalismo [bielo-russo] Ryszard Kapuscinski, “converter-nos imediatamente, desde o primeiro momento, em parte de seus destinos”. Afinal, somos os mesmos, as mesmas. E estamos na mesma situação. Entretanto, a internet, ao menos no México e em muitos países da América Latina, não é um meio acessível para toda a população. Nas áreas rurais e nos bairros de periferia, as pessoas não estão conectadas à rede. Essa é a razão, creio, de que o principal meio de comunicação popular, por excelência, continua sendo o rádio e de que, até agora, não haja espaço para se substituir a comunicação alternativa em papel. Insisto que estou falando do mundo dos de baixo.

É por isso que na Desinformémonos criamos uma revista de bairro e comunitária em PDF, com o objetivo de que seja distribuída em comunidades que não têm acesso à internet. Essa singela revista pode ser distribuída como “folhas soltas” ou pregada em algum muro como jornal-mural.

Com a dificuldade de transmitir mensagens ao grande público, como os movimentos sociais são mostrados hoje nos grandes meios de comunicação mexicanos?

Os movimentos sociais não aparecem nos grandes meios de comunicação do México e, quando aparecem, são satanizados e desprestigiados. Poderia dizer que apenas o jornal La Jornada (considerando os meios de comunicação massiva, não os marginais nem alternativos) dá espaço para as lutas sociais do país. É por isso que, cada vez mais, os movimentos vêm criando seus próprios meios, para que sua palavra seja conhecida. Ao mesmo tempo, crescem os meios alternativos, livres e independentes, ainda que com muitas limitações.
 
Nas revoltas de Oaxaca, a tomada das rádios foi a primeira ação dos movimentos mobilizados. O que isso pode significar?
A Assembleia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO) não apenas tomou as rádios e até mesmo a televisão comercial; ela criou uma rede de meios de comunicação. Essa rede serviu não só para difundir suas causas, mas para convocar, organizar as barricadas e as marchas e, sobretudo, a defesa da ocupação que mantiveram no centro da cidade. Tomar as rádios e a televisão foi muito significativo para mostrar a força popular do movimento, mas foi ainda mais relevante a forma como conseguiram conduzir a relação com as rádios alternativas, principalmente com a Radio Plantón, que é hoje um exemplo do grande poder que um meio dessa natureza pode significar, de “abajo y a la izquierda”, de dentro do próprio movimento.

Você acredita que os movimentos de esquerda conhecem a importância da comunicação em um processo de mudança?

Acredito que os movimentos de esquerda estão cada vez mais conscientes da importância de uma comunicação do e para o movimento. Entretanto, acredito que enfrentamos grandes desafios, pois muitas vezes não comunicamos entre nós mesmos o que está acontecendo, não fazemos grande esforço para ultrapassar as barreiras impostas e fazer com que nossa palavra chegue “a outros como nós”. Na minha opinião, esse é um grande desafio, e devemos nos preocupar em não estar à margem, mas em atingir cada vez mais gente, sem preconceitos nem esteriotipização. Nunca sabemos onde ou quando haverá ressonância, temos que procurar por isso permanentemente. Ao mesmo tempo, acredito que outro desafio é a manipulação da linguagem feita pelos movimentos sociais de esquerda. Acho que devemos nos arriscar mais, jogar com as palavras e com as imagens, não ser tão sérios, mas ter a capacidade de rirmos, de sermos irônicos, de dar espaço ao jogo e à palavra lúdica. Esse, finalmente, foi outro dos ensinamentos dos zapatistas que, desde o princípio, comunicam-se com uma linguagem diferente, que incluem desde um conto, até uma piada ou uma canção.