quarta-feira, 9 de junho de 2010

Sanções contra o Irã...

ONU aprova sanções ao Irã. Brasil e Turquia dizem não.


Acaba de sair a notícia de que o Conselho de Segurança da ONU aprovou novas sanções contra o Irã, com 12 votos favoráveis e dois contrários, o do Brasil e o da Turquia. O Líbano, que se opõe às sanções mas ocupa a presidência (rotativa) do Conselho,  se absteve.
Era um resultado esperado. Rússia e China fizeram os EUA diminuirem o peso das sanções, mantendo, pragmaticamente, seus negócios com aquele país. Mas evitaram explicitar o confronto que mantém com os Estados Unidos em matéria de influência externa.  Afinal, estão na “primeira divisão” do Mundo, com direito a veto a qualquer decisão da ONU. E a ambos também não interessa muito um vizinho mais desenvolvido, inclusive em termos de tecnologia.
Eu quero cumprimentar a postura do nosso Itamaraty. Foram muitas as pressões para que o Brasil se abstivesse, como forma de não criar “mal-estar” maior com as grandes potências. O Brasil e a Turquia conservaram estatura moral para continuarem a ser aceitos como interlocutores por teerã.
Seria uma desmoralização impensável que Brasil e Turquia, que apresentaram uma proposta efetiva para encontrar-se o caminho da paz, aceitassem uma dança hipócrita em torno de sanções que não resolvem coisa alguma e servem apenas para mostrar “quem manda aqui” e se abstivessem.
Não sou eu quem  diz que estas sanções não ajudam, senão, a agravar a crise. Quem o diz é o próprio premier russo, e homem-forte do governo daquele país.  Embora tenha votado pela sanção, o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, afirmou que a punição contra o Irã é ineficaz. “Você conhece um único exemplo de sanções eficazes? Em seu conjunto, são ineficazes”, declarou Putin.
As grandes potências – e seus aliados “de confiança” – não querem um mundo livre de armas atômicas. Querem, apenas, que ninguém, além deles, as possua.  Olhe o mapa, publicado pelo UOL, que ilustra este post. Procure o Irã. Não está lá. Mas é quem vai pagar o pato atômico.
 

terça-feira, 8 de junho de 2010

Marcha contra a Monsanto....

Camponeses marcham contra a Monsanto e pela soberania nacional

A marcha foi uma resposta à doação de 475 toneladas de milho híbrido que a multinacional Monsanto ofereceu ao governo do Haiti no último mês de maio

Thalles Gomes
Enche /Haiti

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Lanbi é o termo em kreyòl para designar uma espécie de concha marítima muito comum no litoral haitiano e que costuma servir de alimento para o povo dos litorais. Mas lanbi não é somente uma concha. É também um instrumento de guerra. Nos tempos da colônia, os escravos haitianos sopravam seus lanbis ao calar da noite e o som grave que saia deles era o sinal para convocar as reuniões que planejariam os passos da independência haitiana. Foi ao som dos lanbis que se levou a cabo a primeira revolução vitoriosa de escravos que se tem notícia na história da humanidade. O ruído grave e oco do lanbi foi o prenúncio da libertação das Américas.

Na última sexta-feira, 04 de Julho de 2010, o som do lanbi voltou a ser ouvido na pequena ilha do Caribe. Na região de Papay, no departamento Central do Haiti, milhares de camponeses e camponesas marcharam ao ritmo dos lanbis. Eles vinham de todos os confins do país e gritavam em uníssono: “Abaixo a Monsanto. Abaixo as sementes transgênicas e híbridas. Viva as Sementes Nativas Crioulas!”

A Marcha foi uma resposta à doação de 475 toneladas de milho híbrido que a multinacional Monsanto ofereceu ao governo do Haiti no último mês de maio. Esta doação está sendo encarada pelas famílias e movimentos camponeses como um verdadeiro presente mortal e representa um “ataque muito forte à agricultura camponesa, aos camponeses e às camponesas, à biodiversidade, às sementes crioulas que estamos defendendo, ao que resta de nosso meio ambiente no Haiti”, de acordo com Chavannes Jean-Baptiste, coordenador do MPP (Mouvman Peyizan Papay) e membro da Via Campesina haitiana, responsáveis pela convocação e coordenação da Marcha.

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Percorrendo uma distância de dez quilômetros desde a região de Papay rumo ao centro da capital departamental Enche, a marcha contou com a presença estimada de 8.000 a 12.000 pessoas, de acordo com seus organizadores. Além da Via Campesina Haiti, participaram também diversas articulações e movimentos camponeses como o FONDAMA, RENAHSSA, PLANOPA, KABA GRANGOU, VETERINAIRES SANS FRONTIÈRES, FRÈRES DES HOMMES, DÉVELOPPEMENT ET PAIX, FONDASYON MEN KONTRE AYITI e ACTIONAID.

A solidariedade internacional mostrou-se presente com lideranças camponesas oriundas da República Dominicana, Estados Unidos, França, Itália e Brasil. Os camponeses e camponesas que compõem a Via Campesina Brasil externaram sua “indignação e preocupação” com a entrada da Monsanto no Haiti, afirmando em carta pública que “não podemos concordar que a catástrofe de 12 de Janeiro seja utilizada como desculpa para abrir as portas do Haiti aos interesses e lucros de multinacionais delinqüentes como a Monsanto. Sob uma ilegítima e violenta ocupação militar levada a cabo há seis anos pelas tropas da MINUSTAH – vergonhosamente liderada pelo exército brasileiro - e tendo que lidar com os desafios da reconstrução do país, o povo do Haiti não pode sofrer esse novo terremoto social que a entrada de sementes transgênicas no país representaria.”

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Durante a Marcha, sementes de milho crioulo foram distribuídas e plantadas pelos camponeses de Papay para demonstrar sua firme posição em defesa das sementes nativas. Imbuídos dessa mesma convicção, ao final do ato os camponeses queimaram simbolicamente uma pequena porção do milho transgênico da Monsanto que começou a ser distribuído pelo Ministério de Agricultura do Haiti. "Temos de lutar por nossas sementes locais", afirmou Chavannes enquanto o milho transgênico ardia no chão. "Devemos defender a nossa soberania alimentar", concluiu.

Os manifestantes não esconderam sua indignação com o Presidente Rene Preval. As atitudes do presidente haitiano após o terremoto de 12 de Janeiro de 2010 – que vitimou mais de 300 mil pessoas e desabrigou milhões de famílias – vêm sendo bastante contestadas. A anuência com a permanência das tropas de ocupação da MINUSTAH, a aprovação de uma Lei de Emergência que prorroga seu mandato por mais 18 meses e que cria uma Comissão Provisória para a Reconstrução do Haiti sob o comando geral de Bill Clinton, somadas a este acordo com a multinacional Monsanto, vêm transformando o nome de Rene Preval em sinônimo de subserviência e corrupção nos meios populares. "Estou aqui porque estou com raiva do Preval", afirmou o marchante Pierre Charité, camponês de 61 anos que cultiva milho, banana e cana-de-açúcar no departamento Central do Haiti. "Ele aceitou esse milho ruim da Monsanto que vai matar o milho do Haiti. Eu não vou usá-lo", asseverou Pierre.

O terremoto de 12 de Janeiro derrubou casas e destruiu estradas, mas não abalou a força dos camponeses haitianos. O som do lanbi voltou a ecoar pelas montanhas da ilha.

Belissimo filme iraniano....

Tartarugas podem Voar
(Lakposhtha Hâm Parvaz Mikonand )

Crianças mutiladas ganham a vida desarmando minas terrestres que vendem a um intermediário, que, por sua vez, ganha a vida vendendo as minas à ONU. É essa a imagem da luta pela sobrevivência num campo de refugiados curdos pouco antes da invasão americana do Iraque, documentada no filme Tartarugas Podem Voar.

Um acampamento de refugiados curdos no limite entre Irã e Iraque é comandado pelo garoto Satélite. Em meio a muito sofrimento, descaso e uma situação precária, o grupo segue a liderança do menino e acompanha notícias da iminente ocupação das tropas norte-americanas no Iraque.

Neste cenário, surge a jovem Agrin, uma menina de 14 anos que chega acompanhada do irmão. Ariscos, eles não conseguem se relacionar com o restante das pessoas e passam por um momento muito difícil, pois tiveram os pais mortos. Quando resolvem sair do campo de refugiados, os soldados dos Estados Unidos chegam à fronteira. 

O longa-metragem foi vencedor do Hugo de Prata do Festival Internacional de Cinema de Chicago, além de ter sido premiado nos festivais de cinema de Berlim, San Sebastian e México. 

O filme pode atrair um público atento simplesmente por seu tema e pela maneira como reafirma a capacidade humana de sobreviver à crueldade extrema.

O campo de refugiados parece um lugar saído do inferno. Numa paisagem árida e rochosa, as barracas são montadas entre crateras, tanques de guerra destruídos e cartuchos de munição.

Mais estranho ainda é que em meio à imundície e à miséria geral, se vêem peças de equipamento de alta tecnologia. 


Quem desejar o Torrent do filme entre em contato por email...

Soran Ebrahim (Satellite)
Avaz Latif (Agrin)
Saddam Hossein Feysal (Pashow)
Hiresh Feysal Rahman (Hengov)
Abdol Rahman Karim (Riga)
Ajil Zibari (Shirkooh) 
Gênero: Drama
Diretor: Bahman Ghobadi
Duração: 95 minutos
Ano de Lançamento: 2004
País de Origem: Irã / Iraque
Idioma do Áudio: Árabe
IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0424227/
Qualidade de Vídeo: DVD Rip
Tamanho: 699 Mb
Legendas: No torrent

O Capitalismo carece de humanidade....

A Desumanidade do Sistema Capitalista

Atílio Borón*
ATILIO
 BORON 
Agora, os epígonos do capitalismo regressam ao lançamento de ilusões em torno do FMI da OMC, do BIRD que, “arrependidos dos erros do passado – irão efetivamente resolver os grandes problemas que afetam a humanidade. Todas essas instituições são incorrigíveis e irreformáveis e qualquer esperança de mudanças em seus comportamentos não é nada mais do que pura ilusão”.

O capitalismo tem legiões de apologistas. Muitos o fazem de boa fé, produto de sua ignorância e como dizia Marx porque «o sistema é opaco e sua natureza exploradora e predatória não fica evidente, perante os olhos de homens e mulheres do mundo». Outros o defendem porque são seus grandes beneficiários arregimentam enormes fortunas graças a suas injustiças e iniqüidades. Há também outros (gurus, financistas, opinólogos, jornalistas especializados, acadêmicos bem pensantes e diversos representantes do pensamento único) que conhecem perfeitamente o que o sistema impõe em termos de custos sociais, degradação humana e do meio ambiente, mas como estão muito bem remunerados procuram omitir essas questões em seus relatos. Eles sabem muito bem, que a «batalha de idéias» que foi convocada por Fidel Castro é algo que pode ser perigoso para as ideologias que, no intimo, defendem e por isso não se empenham em denunciar as mazelas do capitalismo.
Para contraditar a proliferação de versões idílicas sobre o capitalismo e de sua capacidade de promover o bem estar geral examinemos alguns dados obtidos de documentos oficiais das ONU. Eles são sumamente didáticos quando se lê, principalmente em relação à crise atual – indicando que a solução dos problemas do capitalismo se obtém com mais capitalismo; ou que o G20, o FMI, a OMC e o BIRD, arrependidos dos erros do passado – irão efetivamente resolver os grandes problemas que afetam a humanidade. Todas essas instituições são incorrigíveis e irreformáveis e qualquer esperança de mudanças em seus comportamentos não é nada mais do que pura ilusão. Seguem propondo o mesmo, somente que o discurso é diferente e adotando uma estratégia de «relações públicas» desenhada para ocultar suas verdadeiras intenções. Quem tenha dúvidas que constate o que estão propondo para «solucionar» a crise na Grécia: as mesmas receitas que aplicaram e seguem aplicando na América Latina e África desde os anos oitenta do século passado.
Em continuação, podemos citar alguns dados com suas respectivas fontes recentemente sistematizados pelo Programa Internacional de Estudos Comparativos sobre a Pobreza localizado na Universidade de Bergen, Noruega, que fez um grande esforço para, desde uma perspectiva crítica, combater o discurso oficial sobre a pobreza elaborado desde mais de trinta anos pelo Banco Mundial e reproduzido incansavelmente pelos meios de comunicação, autoridades governamentais, acadêmicos e “especialistas” variados.
População mundial: 6,8 bilhões [mil milhões] de habitantes em 2009.
1,02 [mil milhões] bilhão de pessoas são desnutridos crônicos (FAO,2009);
2 bilhões [mil milhões] de pessoas não tem acesso a medicamentos (www.fic.nih.gov);
884 milhões de pessoas não têm acesso à água potável (OMS/UNICEF 2008);
925 milhões de pessoas são “sem teto” ou residem em moradias precárias (ONU Habitat 2003);
1,6 bilhões [mil milhões] de pessoas não tem acesso à energia elétrica (ONU Habitat, Urban Energy);
2,5 bilhões [mil milhões] de pessoas não são beneficiados por sistemas de saneamento, drenagens ou instalações sanitárias domiciliares (OMS/UNICEF 2008);
774 milhões de adultos são analfabetos ( www.uis.unesco.org );
18 milhões de mortos por ano devido à pobreza, a maioria são crianças menores do que cinco anos de idade (OMS);
218 milhões de crianças entre 5 e 17 anos de idade, trabalham em condições de escravidão com tarefas perigosas ou humilhantes, como soldados da ativa atuando em guerras e/ou conflitos civis, na prostituição infantil, como serventes, em trabalhos insalubres na agricultura, na construção civil ou industria têxtil (OIT: “La eliminación Del trabajo infantil, un objetivo a nuestro alcance” 2006);
Entre 1988 e 2002, os 25% mais pobres da população mundial reduziram sua participação no produto interno bruto mundial (PIB mundial) de 1,16% para 0,92%; enquanto os opulentos 10% mais ricos acrescentaram fortunas em seus bens pessoais passando a dispor de 64% para 71,1% da riqueza mundial. O enriquecimento de uns poucos tem como seu reverso o empobrecimento de muitos;
Somente esses 6,4% de aumento da riqueza dos mais ricos seriam suficientes para duplicar a renda de 70% da população mundial, salvando muitas vidas e reduzindo os sofrimentos dos mais pobres. Entendam bem: tal coisa somente seria obtida se houvesse possibilidade de redistribuir o enriquecimento adicional produzido entre 1988 e 2002 dos 10% mais ricos da população mundial, deixando ainda intactas suas exorbitantes fortunas. Mas nem isso passa a ser aceitável pelas classes dominantes do capitalismo mundial.
CONCLUSÃO
Não se pode combater a pobreza (nem erradicá-la) adotando-se medidas capitalistas. Isso porque o sistema obedece a uma lógica implacável centrada na obtenção do lucro, o que concentra a riqueza e aumenta incessantemente a pobreza e as desigualdades sócio-econômicas a nível mundial.
Depois de cinco séculos de existência é isto e somente isto que o capitalismo tem para oferecer ao mundo! Que esperamos então para mudar o sistema? Se a humanidade tem futuro, esse será claramente socialista! Com o capitalismo, não haverá futuro para ninguém! Nem para os ricos, nem para os pobres! A sentença de Friedrich Engels e também de Rosa Luxemburg: «socialismo ou barbárie» é hoje mais atual do que nunca. Nenhuma sociedade sobrevive quando seu impulso vital reside na busca incessante do lucro e seu motor é a ganância, a usura. Mais cedo ou mais tarde provocará a desintegração da vida social, a destruição do meio ambiente, a decadência política e a crise moral.
Todavia estamos ainda em tempo para reverter esse quadro – então vamos à luta!

* Atilio Borón, doutor em Ciência Política pela Harvard University, é professor titular de Filosofia Política da Universidade de Buenos Aires, Argentina.

Tradução: Jacob David Blinder

Conflito em Gaza...

Israel não pode resolver conflito com palestinos pela força


Segundo autor Amos Oz, Israel deve chegar rapidamente a acordo com palestinos sobre estabelecimento de Estado independente na Cisjordânia e Faixa de Gaza, porque problemas de Israel não podem ser resolvidos pela força.

Deutsche Welle
Durante 2.000 anos os judeus conheceram somente o poder da força através de chicotadas em suas próprias costas. Agora, já há várias décadas, estamos em condições de fazer uso de força. No entanto, esse poder tem nos embriagado, muitas vezes. Frequentemente, achamos que podemos resolver todos os problemas através da força. Para um homem com um martelo grande, diz o provérbio, todos os problemas parecem um prego.

No período anterior à fundação de Israel, uma grande parcela da população judaica na Palestina não conhecia os limites da força e pensava que ela poderia ser usada para alcançar qualquer objetivo. Felizmente, durante os primeiros anos de Israel, líderes como David Ben-Gurion e Levi Eshkol conheciam muito bem os limites dessa força e tomaram cuidado para não ir além dessas fronteiras. Mas, desde a Guerra dos Seis Dias em 1967, Israel se fixou na força militar. O mantra é: o que não pode ser feito pela força pode ser realizado com uma força ainda maior.

A ocupação israelense da Faixa de Gaza é um dos produtos negativos desse ponto de vista. Ela teve origem na hipótese equivocada de que o Hamas pode ser derrotado pela força armada ou, em termos mais genéricos, de que o problema palestino pode ser reprimido em vez de resolvido.

Não se derrota uma ideia pela força

Mas o Hamas não é somente uma organização terrorista. O Hamas é uma ideia. Uma ideia desesperada e fanática que cresceu a partir da desolação e da frustração de muitos palestinos. Ideia alguma jamais foi derrotada pela força – nem por ocupação, nem por bombardeios, nem pelo peso dos tanques, nem por comandos navais. Para derrotar uma ideia é preciso apresentar uma ideia melhor, mais atraente e aceitável.

Para Israel, a única forma de derrotar o Hamas é conseguir o mais rápido possível um acordo com os palestinos para estabelecer um Estado independente na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, de acordo com as fronteiras de 1967, tendo sua capital em Jerusalém Oriental. Israel tem que assinar um acordo de paz com Mahmud Abbas e seu governo, e assim reduzir o conflito israelo-palestino a um conflito entre Israel e a Faixa de Gaza.

Este último conflito só pode ser resolvido, afinal, através da negociação com o Hamas ou, mais sensatamente, pela integração entre o Fatah (de Mahmud Abbas) e o Hamas. Mesmo que Israel intercepte mais uma centena de navios caminho de Gaza, mesmo que envie soldados para ocupar a Faixa de Gaza mais uma centena de vezes, e mobilize, não importa quantas vezes, suas forças militares, policiais e secretas – nada disso resolverá o problema.

Estado de ocupação permanente

O problema é que não estamos sozinhos neste país, e tampouco os palestinos. Não estamos sozinhos em Jerusalém, nem os palestinos. Até nós, israelenses e palestinos, reconhecermos as consequências lógicas desse simples fato, continuaremos a viver em um permanente estado de ocupação – Gaza sob a ocupação de Israel, e Israel sob ocupação internacional e árabe.

Eu não menosprezo a importância da força. O poder militar é vital para Israel. Sem ele, não seríamos capazes de sobreviver um único dia. Pobre do país que menospreze a eficácia desse poder. Mas não podemos esquecer, nem por um momento sequer, que a força é eficaz somente como preventivo, para impedir a destruição e conquista de Israel, para proteger nossas vidas e nossa liberdade.

Qualquer tentativa de uso da força de forma não preventiva, que não seja em defesa própria, mas, pelo contrário, como forma de esmagar problemas e aniquilar ideias, levará a mais desastres, como aquele que provocamos em águas internacionais, em alto-mar, diante da costa de Gaza.

Autor: Amos Oz (CA)
Revisão: Augusto Valente

segunda-feira, 7 de junho de 2010

O caso do “Exodus” repetiu-se, com troca de papéis. Agora, os israelitas são os britânicos.

Mate um turco e descanse



O caso do “Exodus” repetiu-se, com troca de papéis. Agora, os israelitas são os britânicos.
No mar alto, em águas internacionais, a marinha israelita atacou o barco. Os comandos mascarados atacaram com fúria. Centenas de agredidos resistiram. Os soldados atiraram. Houve mortos, muitos feridos. O barco foi levado a outro porto, os passageiros desembarcaram. O mundo viu-os andando pelo cais, homens e mulheres, velhos e jovens, todos esgotados, rasgados, um depois do outro, escoltados por soldados…
O navio era o “Exodus 1947”. Havia deixado a França na esperança de romper o bloqueio britânico, imposto para impedir que navios abarrotados de sobreviventes do Holocausto aportassem nas costas da Palestina. Se não conseguissem aportar, imigrantes ilegais, seriam levados pelos britânicos aos campos de concentração em Chipre, como já acontecera antes. Ninguém se preocuparia com eles por mais de um, dois dias.
Em Israel, no governo, estava Ernest Bevin, do Partido Labour, ministro britânico, arrogante e brutal, apaixonado pelo poder. Jamais deixaria que um bando de judeus mandasse no seu governo. E decidiu dar uma lição aos judeus, o mundo por testemunha. “É provocação!” gritou ele e, claro, estava certo. O objetivo era mesmo gerar um acto de provocação, para atrair os olhos do mundo para o bloqueio britânico da Palestina.
O que aconteceu todos sabem: o ataque degenerou, uma estupidez levou à outra, o mundo solidarizou-se com os passageiros dos barcos. Os britânicos, senhores da Palestina não cederam e pagaram o preço. Pesado preço.
Muitos crêem que o caso do “Exodus” marcou o ponto de viragem da luta para a criação do Estado de Israel. O mandato britânico entrou em colapso sob o peso da condenação internacional e os britânicos tiveram de deixar a Palestina. Houve, é claro, muitas outras razões de peso para aquela decisão, mas o episódio do “Exodus” provou ser a palha que quebrou a espinha dorsal do camelo.
Esta semana, em Israel, não fui o único que lembrou este episódio. De facto, foi quase impossível não lembrar, sobretudo os israelitas que já vivíamos na Palestina naquele tempo e vimos tudo.
Há diferenças importantes, é claro. Aqueles eram sobreviventes do Holocausto; hoje, são pacifistas de todo o mundo. Mas então, como hoje, o mundo viu soldados pesadamente armados a atacar brutalmente passageiros desarmados – que resistiram com o que encontraram à mão, paus e porretes e com os punhos. Daquela vez, como hoje, aconteceu no mar alto – daquela vez, a 40 km da costa; agora, a 65 km.
Analisado em rectrospectiva, o comportamento do governo britânico em todo o caso parece inacreditavelmente estúpido. Mas Bevin não era bobo; os oficiais britânicos que comandaram a acção não eram idiotas. Afinal, acabavam de terminar a guerra mundial, do lado vencedor.
Se agiram como perfeitos idiotas do começo ao fim, foi por arrogância, insensibilidade e absoluto desprezo pela opinião pública mundial.
Ehud Barak é o Bevin israelita. Burro, não é; nem os generais israelitas são burros. Mas são hoje responsáveis por uma cadeia de decisões e actos alucinados, cujas implicações são difíceis de avaliar. O ex-ministro e actual comentador Yossi Sarid descreveu o comité dos sete ministros – “grupo dos sete” –, que decide sobre questões de segurança, como “os sete idiotas” – e devo protestar. Foi um insulto aos idiotas.
Os preparativos para a frota exigiram mais de um ano. Centenas de mensagens de e-mail andaram pelo mundo. Eu mesmo recebi dúzias. Não era segredo. Tudo foi feito às claras.
Houve tempo de sobra para que instituições políticas e militares em Israel se preparassem para a chegada dos barcos. Os políticos poderiam ter sido consultados. Os soldados, treinados. Os diplomatas, informados. O pessoal da espionagem trabalhou.
De nada adiantou. Todas as decisões foram erradas, do primeiro ao último momento. E ainda não terminou.
A ideia de romper o bloqueio com uma frota de pacifistas roça a genialidade. Põe Israel num dilema – tendo de escolher entre várias alternativas, todas ruins. É a situação em que qualquer general sonha ver o general adversário.
As alternativas:
(a) Permitir que a Frota chegue a Gaza, sem obstáculos. O secretário do Gabinete apoiava essa ideia. Mas levaria ao fim do bloqueio, porque depois dessa frota viriam outras, cada vez maiores.
(b) Deter os navios em águas territoriais, vistoriar a carga, assegurar-se de que não havia nem armas nem “terroristas” e deixá-los prosseguir até ao porto. Levantaria alguns protestos em todo o mundo, mas preservar-se-ia o bloqueio, pelo menos em princípio.
(c) Capturar os barcos em alto mar e levar todos até Ashdod. O risco, nesse caso, seria a batalha contra os activistas a bordo, até Ashdod.
Como os governantes em Israel sempre fazem, quando têm de escolher entre várias alternativas ruins, o governo Netanyahu escolheu a pior.
Todos os que acompanharam os preparativos noticiados pelos jornais previam que havia risco de resultar em mortos e feridos. Ninguém aborda um barco turco à espera de ser recebido por garotinhas louras que ofereçam rosas. Todos sabem que os turcos não se rendem facilmente.
As ordens que os soldados receberam – e a imprensa divulgou – incluíam as palavras fatais: “a qualquer custo”. Qualquer soldado sabe o que significam essas palavras terríveis. Não bastasse, na lista dos objectivos da missão, a atenção aos passageiros civis aparecia em terceiro lugar, depois da salvaguarda da segurança dos soldados e da necessidade de cumprir a missão.
Se Binyamin Netanyahu, Ehud Barak, o comandante geral do exército e o comandante da marinha não sabiam que a operação poderia levar a matar e ferir civis desarmados, então é necessário concluir – até os que ainda relutem – que são todos insuperavelmente incompetentes. Merecem ouvir as palavras imortais de Oliver Cromwell ao Parlamento: “Estão aí há tempo demais, considerado o serviço que têm prestado… Vão-se! Livrem-nos de vocês. Em nome de Deus, fora!”
Este acontecimento aponta outra vez para um dos mais sérios aspectos da situação: Israel vive numa bolha, numa espécie de gueto mental, que nos isola do mundo e nos impede de ver outra realidade: a que o resto do mundo vê. Um psiquiatra veria aí sintoma de grave doença mental.
A propaganda do governo e do exército israelitas, para o público interno, conta uma história simples: os heróicos soldados de Israel, valentes e sensíveis, elite da elite, abordaram o navio com intenções de “parlamentar” e foram atacados por uma turba selvagem e violenta. Os porta-vozes oficiais nunca esqueceram de repetir a palavra “linchamento”.
No primeiro dia, praticamente toda a comunicação social israelita acreditou. Afinal, claro que os judeus são sempre as vítimas. Sempre. Aplica-se a soldados judeus, claro. Claro. Soldados judeus abordam barco estrangeiro em águas internacionais e, imediatamente, se metamorfoseiam em vítimas encurraladas, sem escolha, obrigados a defender-se de ataque violento incitado por anti-semitas.
Impossível não lembrar a clássica piada de humor judeu, sobre a mãe judia na Rússia, que se despede do filho convocado para o exército do czar, em guerra contra a Turquia. “Não se desgaste”, aconselha a mãe. “Mate um turco, e descanse. Mate outro turco e descanse outra vez…”
“Mas mãe”, o filho interrompe, “E se o turco me matar?”
“Matá-lo”?, exclama a mãe. “E por que o mataria? O que você lhe fez?”
Soa como loucura, para qualquer pessoa normal. Soldados pesadamente armados de um comando de elite abordam um navio no mar, no meio da noite, por mar e por ar – e são as vítimas?
Mas há aí uma gota de verdade: são vítimas, sim, de comandantes arrogantes e incompetentes, de políticos irresponsáveis e da imprensa que os mesmos arrogantes, incompetentes e irresponsáveis alimentam. De facto, são vítimas também da população de Israel, dado que esses eleitores, não outros, elegeram aquele governo, inclusive a oposição, que não é diferente da situação.
O caso do “Exodus” repetiu-se, com troca de papéis. Agora, os israelitas são os britânicos.
Em algum lugar, algum novo Leon Uris prepara-se para escrever o próximo livro, “Exodus 2010”. Um novo Otto Preminger planeia filmar novo blockbuster. Um novo Paul Newman brilhará nele. Sorte, que não faltam hoje talentosos actores turcos.
Há mais de 200 anos, Thomas Jefferson declarou que todas as nações deveriam agir “com respeito decente pelas opiniões da humanidade”. Em Israel, os líderes jamais aceitaram a sabedoria dessa lição. Preferem a lição de David Ben-Gurion: “Não importa o que pensem os não-judeus. Só importa o que os judeus fazem.” Vai-se ver, tinha a certeza de que não há judeus que agem como imbecis.
Fazer da Turquia, inimiga, é pior que simples tolice. Há décadas, a Turquia tem sido a mais próxima aliada de Israel na Região, muito mais próxima do que a opinião pública supõe. A Turquia poderia, no futuro, fazer o papel de importante mediadora entre Israel e o mundo árabe-muçulmano, entre Israel e a Síria e, sim, também entre Israel e o Irão. É possível que Israel, agora, tenha conseguido unir o povo turco contra Israel – e já há quem diga que esse seria o único tema em torno do qual os turcos afinal se uniram.
Estamos a viver o segundo capítulo da operação “Chumbo Derretido”. Daquela vez, Israel reuniu a opinião pública contra Israel e os israelitas, chocámos os raros amigos de Israel e facilitámos a luta para os inimigos de Israel. Agora, Israel repete o feito, com talvez ainda mais sucesso. Israel conseguirá virar, contra Israel, a opinião pública mundial.
Este processo é lento. É como a água, acumulando por trás da barragem. A água sobe devagar, em silêncio, mal se vê. E quando alcança o nível crítico, a barragem cede e será o desastre, para Israel. Israel aproxima-se perigosamente desse ponto.
“Mate um turco e descanse…” recomenda a mãe, na piada. O governo de Israel nem descansa! Parece decidido a não parar, até ter convertido em inimigo, o último amigo que reste a Israel.
Publicado por Gush Shalom [Bloco da Paz], Israel, em Haaret’z, Telavive, 3/6/2010
Tradução de Caia Fittipaldi, disponível em viomundo.com.br

Quilombolas - problemas a vista..

No STF, Ação Direta coloca em risco titulação de terras quilombolas




Tatiana Félix *Adital -
 

A qualquer momento o Supremo Tribunal Federal (STF) pode julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 3239 (ADIN) do decreto 4887/2003. Caso o STF dê parecer favorável à ADIN, as comunidades de remanescentes de quilombo no país, perderiam um dos seus poucos benefícios, que é o reconhecimento de seus territórios.
O Decreto Federal 4887 foi publicado pelo Presidente Lula em 2003, regulamentando o processo administrativo de titulação das terras de comunidades quilombolas no Brasil e obedecendo a um direito que é previsto na Constituição Federal. Entretanto, em 2004, o Partido da Frente Liberal (PFL), atual Democratas (DEM), entrou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN 3239), que pede a revogação do Decreto 4887.
Se o STF considerar válida a proposta dos Democratas, a titulação de terras volta a obedecer ao antigo Decreto 3912, de 2001, que somente reconhecia como terras quilombolas as que "estavam ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos em 5 de outubro de 1988".
Fernando Prioste, assessor jurídico da organização Terra de Direitos, afirmou que o risco da anulação de titulação de terras existe. "Se a decisão for mais dura, além de dificultar o reconhecimento de novas áreas para os quilombolas, pode até anular as titulações já concedidas", explicou. Segundo ele, cerca de 3 mil comunidades quilombolas em todo o país, seriam prejudicadas perdendo não só as terras, como todo o investimento feito nela.
A anulação de titulações e uma maior dificuldade no processo, acarretariam em um aumento de conflitos de terras, como a grilagem, a construção de barragens ou outros empreendimentos, já tão comuns de acontecer no país. Problemas como estes são gerados, principalmente, pela falta de definição de terras no campo.
"A política pública no país ainda está engatinhando e o processo de titulação não é bom. Caso o STF julgue constitucional a ADIN, o processo de titulação vai demorar mais ainda", esclareceu.
Entidades que defendem a titulação de terras quilombolas estão acompanhando o processo da ADIN e divulgaram uma carta no último dia 21, onde pedem a realização de audiências públicas, antes da votação no STF.

Titulação de terras

No ano passado, longe de atender a meta prometida de onze titulações, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma (Incra) finalizou apenas dois processos, dando títulos à apenas duas comunidades no Rio Grande do Sul, em áreas que não somam um hectare de terra.
Além do Incra, que representa o Governo Federal, instituições como o Instituto de Terras do Pará (Iterpa) e o Instituto de Terras do Maranhão (Iterma) também concedem titulações às comunidades quilombolas. Somando os processos das três entidades, no ano passado o país reconheceu sete territórios, beneficiando mais de 300 famílias. O Pará é o estado que mais reconhece terras de quilombos, segundo Fernando.
Em 2009, foram abertos quase 140 processos novos para regularização de quilombos no Incra, totalizando 955 procedimentos em tramitação. No final de 2009, 76% dos processos se encontravam ainda em fase inicial, apenas com o número de protocolo.

* Jornalista da Adital

sexta-feira, 4 de junho de 2010

A direita do RS é imbecil ou mal intencionada?

Caso Ford, a manipulação ideológica da direita

Juremir Machado - Correio do Povo de 04/06

Tem dias em que a ficha cai.
Chega de conversa fiada.
Basta de falsa objetividade.
Que se abra o jogo.
Que se ford.
Vamos ao problema.
A reabertura do caso Ford, com a condenação da montadora a devolver o dinheiro gaúcho que pegou adiantado, não usou e não entregou, dá o que pensar.
Foi a maior manipulação ideológica do Rio Grande do Sul moderno. Uma guerra sem quartel e estratégica.
Não uma guerra ideológica da esquerda contra a Ford.
Uma guerra ideológica da direita contra o governo Olívio Dutra. Um pretexto para atingir o petismo.
Uma vingança contra a chamada arrogância do PT.
Se a Ford não tivesse ido embora, talvez a direita tivesse lhe pedido para fazer isso, pois nunca uma ruptura de contrato foi tão benéfica e providencial para a propaganda ideológica da direita gaúcha.
A Ford queria mundos e fundos.
Antônio Britto estava disposto a dar tudo.
Olívio Dutra teve a coragem de ponderar.
O antipetismo gaúcho é tão visceral, tão xiita, tão fanático e fundamentalista, que precisava de um motivo para se vingar dessa pedra no sapato. Encontrou. O PT incomodava demais. Havia desbancado os tradicionais donos do poder.
Nada mais inadmissível. Um verdadeiro pecado mortal. Tinha de ser punido por essa ousadia.
Certamente houve erros na condução da negociação com a Ford.
O PT cometeu erros ao longo da sua curta trajetória. A lista é longa das suas babadas.
Olívio Dutra também errou.
A Ford cometeu mais erros ainda. Na época, tinha um presidente medíocre e arrogante que não sabia e não queria negociar. Representava a poderosa Ford e pretendia impor no grito todos os seus desejos.
Queria tudo: isenção de impostos, adiantamentos, infraestrutura, mamão com açúcar, privilégios sem fim.
Uma multinacional não aceita ser tratada como qualquer empresa. Quem abre uma empresa, paga impostos. Salvo de for uma montadora messiânica. Ao cair fora, a Ford aplicou um cambalacho de vigarista barato.
Partiu com a grana dos gaúchos.
A mídia amiga da direita deitou e rolou. Convenceu os convencidos de que a Ford havia sido expulsa. Afetou a consciência dos mais simples e dos mais ideológicos. Deliciou-se dando as cartas e jogando de mão.
Falava sozinha. Foi a época de ouro do conservadorismo na mídia gaúcha.
Tudo tem um preço: o da Ford era alto demais.
A manipulação ideológica em torno do caso Ford continua rendendo. É o hit mais tocado pela direita.
Ainda toca o coração dos incautos.
Dizem que os petistas são xiitas, radicais e ultrapassados. Muitos, claro, são. Mas nem todos.
Desconheço gente mais xiita do que os da tribo dos antipetistas. É um fundamentalismo rasteiro, primário, rastaquera, carregado de ódio e de simplificações, do tipo petista come criancinha e vomita heresias.
Eu não sou petista. Não tenho partido. Nunca terei.
Tenho é paciência para levar anos analisando certos fatos.
Tem muita gente que deveria pedir desculpas a Olívio Dutra. Gente que, se o PT estivesse no governo gaúcho agora, nem ficaria a favor da devolução do dinheiro pela Ford. Essa montadora é cara-de-pau.
Desenterrei tudo sobre o caso Ford. Estudei o dossiê como quem se prepara para uma tese. Mergulhei na história. Não hesito em afirmar: a saída da Ford foi um motivo para esculhambar o petismo. Continua sendo.
Só há coisa a repetir: queremos nosso dinheiro.
O resto é conversa para reacionário dormir feliz.

Led Zeppelin - Discografía 1 e 2

Led Zeppelin I - 1969

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Créditos: loooloblog
 
Download: 1
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Led Zeppelin II - 1969

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A Nova Classe Média existe??

Desigualdade abissal e a falsa classe média
  Paulo Passarinho - Correio da Cidadania   
 
Água mole em pedra dura tanto bate até que fura; mentira, repetida inúmeras vezes, se transforma em verdade; ou, hegemonia também se constrói através do discurso, especialmente pela sua própria repetição, foram algumas das sentenças que me vieram à cabeça quando li um recente artigo de Caetano Veloso. No texto, o artista, declarando-se eleitor de Marina Silva, escreveu que entre Serra e Dilma ficaria com a candidata lulista, "porque ela defende a independência do Banco Central".
 
Uma amiga me explicou que é natural que seja assim, pois, se assim não for, o Banco Central fica subordinado aos políticos, sempre muito corruptos ou irresponsáveis. Ponderei que a solução da "independência" significa colocar o Banco Central sob comando dos bancos privados, principais beneficiários do modelo e da política econômica. Além de serem os principais financiadores dos tais políticos que não prestam...
 
Acho que deixei a minha amiga com uma pulga atrás da orelha, mas atentei para a força que determinadas "verdades", exaustivamente repetidas pela mídia dominante, exerce sobre todos nós.
 
E me ocorreu um outro fenômeno, ora em curso: acho que ninguém mais atenta, se importa ou acredita que continuamos submetidos a um modelo econômico totalmente controlado pelo sistema financeiro, e nocivo ao povo e à nação brasileira.
 
A razão desse fenômeno se relaciona a algumas versões construídas durante esses quase oito anos de governo Lula.
 
Desenvolvimentismo e distribuição de renda passaram a ser as maiores características de um "novo modelo" que teria se implantado no país. Marcio Pochmann, atual presidente do IPEA, em artigo publicado no ‘O Globo’, chegou a escrever que "nos últimos anos o Brasil passou a acusar importantes sinais de transição para o modelo social-desenvolvimentista".
 
Desenvolvimentismo deve ser traduzido por taxas de crescimento da economia, que nos teria retirado da estagnação econômica, marca deixada por nossa história econômica, de 1980 para cá.
 
O exame, contudo, das taxas de crescimento do país entre os anos de 2003 e 2009 não nos permite aceitar tanto otimismo. Nesse período, de acordo com dados oficiais e estudos do professor Reinaldo Gonçalves, o país cresceu a uma média de 3,5%. Esse resultado, primeiramente, nos coloca ainda muito distantes da média histórica de crescimento do PIB brasileiro. Entre 1890 e 2009, a taxa média de crescimento real foi de 4,5%. Entre 1932 e 1980, essa taxa chega a 6,8%.
 
Não restam dúvidas de que houve mudanças no ritmo do crescimento econômico do país em relação ao governo anterior, de FHC, quando essa taxa média foi de apenas 2,3%. Mas o próprio Reinaldo Gonçalves nos pondera que, de 2003 a 2008, tivemos uma conjuntura internacional extremamente favorável. Nesse período, a renda mundial cresceu à taxa média real anual de 4,2% e o comércio mundial a uma taxa anual de 7,2%. Mesmo incluindo o ano de crise de 2009, essas taxas ficam respectivamente em 3,6% e 4,3%.
 
O resultado que alcançamos, assim, em termos da participação do Brasil na economia mundial, poderá surpreender a muitos: em 2002, tínhamos uma participação de 2,81% no PIB mundial, e agora, em 2009, representamos 2,79% da produção mundial.
 
Em termos mais diretos, esses dados nos mostram que, em comparação com os outros países, nós crescemos menos do que a maioria desses, não nos aproveitando a contento de uma conjuntura internacional extremamente favorável.
 
Mas e a distribuição de renda?
 
Esse é um outro assunto que merece maior atenção do que as manchetes de jornais nos sugerem.
 
Primeiramente, de acordo com os dados da PNAD, existe uma melhor distribuição de renda entre aqueles que vivem de rendimentos do trabalho – salários, diárias, renda de autônomos. A PNAD capta com mais precisão esse tipo de rendimento, não cobrindo de forma adequada rendimentos típicos dos capitalistas, especialmente juros e lucros. Entretanto, esse é um processo que vem sendo observado desde 1995 e se associa a vários fatores: forte redução dos índices inflacionários; reajustes reais do salário-mínimo; programas de transferência de renda e a extensão de direitos da seguridade social.
 
A evolução do salário mínimo real, a partir de 1995, nos dá uma clara idéia desse processo. De acordo com o Dieese, e tendo o salário mínimo de julho de 1940 como referência para um índice igual a 100, em 1995 tivemos o mais baixo valor da história, com o índice de 24,53. Em 2003, esse índice já havia se recuperado, chegando a 30,70 (elevação de 25,15%, em relação a 1995), e em 2008 alcançou a 42,75 (elevação de 39,25%, em relação a 2003). Desse modo, entre 1995 e 2008, o crescimento real do valor do salário-mínimo foi de 74,28%, continuando a sua trajetória de elevação real até hoje, em 2010.
 
Mas, além desse importante dado sobre o salário-mínimo, tivemos o crescimento do emprego formal. O governo tem se utilizado dos dados do Caged – Cadastro Geral de Emprego e Desemprego do Ministério do Trabalho – para a divulgação de dados recordes de geração de empregos no país. Contudo, o que não se divulga com tanto estardalhaço é que os saldos positivos na geração de novos postos de trabalho no país ocorrem exclusivamente até a faixa salarial correspondente a dois salários-mínimos. A partir da faixa salarial entre dois e três, o saldo de vagas é negativo. Não há, portanto, saldo positivo na geração de empregos nas faixas salariais acima de dois salários.
 
Esse fenômeno pode nos ajudar a entender os dados de um estudo do IPEA que apontou que, entre 2002 e 2008, trabalhadores brasileiros mais qualificados (na verdade, com mais de 9 anos de estudo) tiveram, na média, queda nos seus rendimentos. Esse estudo aponta que, nas ocupações que exigem um nível de escolaridade acima de onze anos, por exemplo, houve uma redução no salário médio de mais de 12% neste período considerado.
 
Dessa forma, muito antes de festejarmos a criação de uma nova classe média ou a ascensão de milhões a uma nova classe social, o que devemos admitir é que temos reduzido de fato o número de miseráveis.
 
E, principalmente, em função da extensão de mecanismos de crédito aos mais pobres – com prazos de pagamento extremamente elásticos, além de taxas de juros que garantem altíssimas rentabilidades aos financiadores -, houve um aumento do consumo de bens duráveis para uma imensa parcela da população.
 
Neste contexto, mecanismos como o crédito consignado ou a ampliação da oferta dos serviços de cartão de crédito estimularam esse tipo de consumo, através principalmente do aumento do nível de endividamento das famílias.
 
Confundir esse processo em curso com o fortalecimento da classe média me parece uma grosseira simplificação. O propalado crescimento da chamada "classe C" – para estudos veiculados pela FGV-RJ, e com ampla repercussão na imprensa (para muitos, golpista), brasileiros com uma renda familiar de R$ 1.200,00 já estariam classificados nessa categoria! – deveria ser analisado com mais critério e cuidado.
 
E, antes de chegarmos a conclusões rápidas ou superficiais sobre um processo de real melhoria da distribuição de rendas – incluindo os capitalistas, é claro – no Brasil, é importante assinalar que mantemos uma das estruturas tributárias das mais regressivas do mundo. E, ao mesmo tempo, a política fiscal praticada pelo governo – onde no ano passado, por exemplo, mais de 35% do Orçamento Geral da União se destinaram ao pagamento de juros e amortizações da dívida pública – privilegia, de forma escancarada, aos mais ricos.
 
Por tudo isso, prefiro ficar com as palavras de Jessé Souza, coordenador do Centro de Pesquisa sobre Desigualdade Social da Universidade Federal de Juiz de Fora e autor do livro ‘A Ralé Brasileira’. Em recente entrevista, ele afirmou: "Esses índices mostram apenas que a pobreza absoluta diminuiu. Mas a desigualdade é um conceito relacional".
 
O Brasil é uma das sociedades complexas mais desiguais do planeta. Entre 30% e 40% de sua população tem inserção precária no mercado e na esfera pública. Somos uma sociedade altamente conservadora, que aceita conviver com parcela significativa da população vivendo como "subgente". Essa classe social, que chamamos provocativamente de "ralé", é a mão de obra barata para as classes média e alta que podem - contando com o exército de empregadas, motoboys, porteiros, carregadores, babás e prostitutas - se dedicar às ocupações rentáveis e com alto retorno em prestígio.
 
É isso que chamo de "desigualdade abissal" como nosso problema central. Desigualdade abissal que, sem uma profunda alteração do modelo econômico em curso, com uma total alteração da política econômica dos banqueiros, não será alterada.
 
Paulo Passarinho é economista e membro do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.