Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
sábado, 17 de abril de 2010
Tom Zé – Jogos de Armar (2000)
download CD
download CD auxiliar
Créditos: UmQueTenha
Para compreender melhor o que significa CD auxiliar leia aqui nesse sitio(http://migre.me/wA7q) e desfrute dessa proposta fantástica e socializadora de Tom Zé...
Duke Ellington - The Great Paris Concert [2CD, 1963]
Live at the Olympia Theatre, Paris
1. Kinda Dukish 1:51
2. Rockin' In Rhythmn 3:47
3. On The Sunny Side Of The Street 3:01
4. The Star-Crossed Lovers 4:13
5. All Of Me 2:35
6. Theme From "The Asphalt Jungle" 4:06
7. Concerto For Cootie 2:35
8. Tutti For Cootie 4:46
9. Suite Thursday: Misfit Blues 3:37
10. Suite Thursday: Schwiphti 2:51
11. Suite Thursday: Zweet Zurzday 3:54
12. Suite Thursday: Lay-By 6:27
13. Perdido 5:21
14. The Eighth Veil 2:36
15. Rose Of Rio Grande 2:41
16. Cop Out 6:56
17. Bula 4:38
18. Jam With Sam 3:57
19. Happy-Go-Lucky Local 3:21
20. Tone Parallel To Harlem 13:59 Album Only
21. Don't Get Around Much Anymore (LP/Studio Version) 2:43
22. Do Nothing Till You Hear From Me (Live) 4:52
23. Black And Tan Fantasy 2:42
24. Creole Love Call 2:07
25. The Mooche 5:38
26. Things Ain't What They Used To Be (Live) 3:10
27. Pyramid 3:40
28. The Blues (From "Black, Brown & Beige") (Live) 3:48
29. Echoes Of Harlem 3:36
30. Satin Doll (Live) 2:39
Movimento dos Sem Mídia(MSM) reage às manipulações do PiG...
Eduardo Guimarães: MSM denunciará crime eleitoral
por Eduardo Guimarães, no Cidadania.com
Faço saber, a quem possa interessar, que o Movimento dos Sem Mídia,
organização não-governamental da sociedade civil constituída em 13 de
outubro de 2007 em assembléia-geral integrada por 52 sócios fundadores e
que conta com 137 filiados, ingressará na Justiça Eleitoral com pedido
de investigação dos seguintes fatos:
Em 27 de março deste ano, foi divulgada pesquisa eleitoral do
instituto Datafolha que versou sobre a intenção de voto do eleitorado
para o cargo de presidente da República. A sondagem apontou diferenças
de 9 e de 10 pontos percentuais entre os pré-candidatos José Serra e
Dilma Rousseff, em favor do primeiro, nos dois cenários principais
apresentados aos pesquisados.
Sete dias depois (em 3 de abril), houve divulgação de pesquisa Vox
Populi que revelou quadro bem diferente, com diferença de 3 e de 5
pontos, de acordo com o cenário de postulantes ao cargo de presidente,
em favor do candidato do PSDB. No mesmo dia, o jornal Folha de São
Paulo, proprietário do instituto Datafolha, publica denúncia de que
o “tipo de questionário” apresentado pelo instituto concorrente aos
pesquisados “é conhecido por distorcer resultados”.
Nos dias seguintes, a diferença dos levantamentos estatísticos e a
denúncia da Folha provocaram uma vastidão de matérias na
imprensa, com acusações tanto ao Datafolha quanto ao Vox Populi, sendo
que as acusações do maior jornal do país tiveram espaço quase exclusivo
nos grandes meios de comunicação.
Em 13 de abril, o instituto Sensus divulgou nova pesquisa sobre a
sucessão presidencial mostrando quadro diametralmente diferente do
apurado pelo instituto Datafolha. Nessa pesquisa, a diferença entre os
pré-candidatos Dilma e Serra reduziu-se dos 9 e 10 pontos percentuais
detectados pelo Datafolha 10 dias antes, para 0,4 e 2,8 pontos nos dois
respectivos cenários pesquisados.
A Folha de São Paulo, então, produziu acusações ainda mais
sérias em sucessivas matérias largamente reproduzidas por toda a grande
imprensa e que levaram o PSDB a entrar na Justiça Eleitoral contra o
Sensus, requisitando as fichas das entrevistas da pesquisa para análise
de especialistas contratados pelo partido. E, no último dia 16, a mesma
imprensa e o mesmo partido político denunciaram supostas manobras
protelatórias do instituto para fornecer os dados requeridos pela
Justiça Eleitoral.
Finalmente, na última sexta-feira (16 de abril de 2010), o site da
revista Veja divulgou, antes do jornal dono do instituto
Datafolha, pesquisa deste instituto sobre a sucessão presidencial. A
pesquisa mostrou resultado gravemente diferente do que foi apurado pelo
Sensus e divulgado 3 dias antes. O Datafolha afirma que a diferença em
favor de Serra seria, agora, de 10 e 12 pontos percentuais.
Não existe a menor dúvida de que um ou mais de um desses institutos
de pesquisa (Datafolha, Sensus ou Vox Populi) cometeu um legítimo crime
eleitoral. Existe até denúncia, amplamente comentada na imprensa, nesse
mesmo sentido. Esse fato gera intranqüilidade social e tem um poder
enorme de influir nos rumos da eleição.
A LEI Nº 9.504, de 30 DE SETEMBRO DE 1997, Art.33, § 4º, reza que “A
divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, punível com detenção
de seis meses a um ano e multa no valor de cinqüenta mil a cem mil
UFIR”.
Diante destes fatos, informo que o Movimento dos Sem Mídia pedirá à
Justiça Eleitoral investigação rigorosa dos fatos supra mencionados em
benefício da ordem pública e da segurança da sociedade de que a eleição
deste ano transcorrerá sob a égide da democracia e da justiça.
Uma outra alternativa para 2010??
O que está em jogo em 2010 |
Editorial do Correio da Cidadania
Lulistas sinceros acreditam que o presidente está realizando um avanço
social maior do que o próprio Getulio Vargas. Os que divergem desse
ponto de vista não sabem "o que realmente está em jogo em 2010".
Portanto, o ponto a discutir com eles diz respeito a esta questão.
O fenômeno Lula tem um efeito social real, independentemente do êxito ou
do fracasso do seu governo.
O caso dele é semelhante ao de Obama. É o fato de um negro ocupar a Casa
Branca que tem um efeito não identificável diretamente, mas certamente
muito forte, na sociedade norte-americana. Os Estados Unidos não serão
os mesmos depois de Obama, independentemente do que vier a acontecer com
a sua administração: o povo negro percebeu que "pode".
A ascensão de um "pau de arara" à Presidência da República tem o mesmo
significado: o povo percebeu que pode chegar lá. Portanto, o Brasil
pós-Lula não será o mesmo. Mas o Brasil será esse?
Para quem se considera socialista esta não é a pergunta chave para
definir o que está realmente em jogo em 2010, e sim esta outra: ao
término do governo Lula, o Brasil estará mais próximo ou mais distante
da ruptura socialista?
Cientes de que a resposta só pode ser negativa, os lulistas levantam a
questão do futuro do Brasil mais em termos de ameaça aos que divergem da
sua posição do que de esperança de grandes avanços, porque estão
cansados de saber que, no pós-Lula, as políticas econômicas não serão
muito distintas das atuais, seja eleito qualquer dos candidatos do campo
da ordem estabelecida.
Fica valendo, portanto, apenas a ameaça: se a esquerda assumir uma
postura divisionista, os tucanos vencerão e anularão todas as conquistas
proletárias.
Ora, todos sabemos que, na medida em que o campo da ordem – hoje
preponderante – for se tornando hegemônico, as conquistas da classe
operária em épocas passadas irão sendo anuladas uma a uma. Não por outra
razão, aliás, a campanha de 2010 está sendo diligentemente montada para
atingir dois objetivos: incutir na mente do eleitorado que as coisas
estão melhorando e que não há qualquer alternativa ao sistema
capitalista.
Se a direita lograr atingir esses dois objetivos, a hegemonia neoliberal
estará totalmente consolidada. O próprio povo passará a entender que,
para poder melhorar de vida, os capitalistas têm que ser atendidos em
todas as suas reivindicações. Claro que isto não significará o fim do
socialismo porque o socialismo existirá enquanto um homem explorar
outro. Mas adiará seu retorno à agenda política do país e isto
representará milhões de pessoas esmagadas pela truculência do sistema.
Portanto, o que está em jogo em 2010 é a possibilidade (longínqua, mas
real) de desarmar essa armadilha por meio de uma denúncia e de uma
proposta alternativa que consigam sensibilizar uma parcela significativa
do eleitorado.
Não façamos ilusões quanto ao tamanho dessa parcela. Não será grande.
Porém, se criar uma base para expansão da proposta socialista, já
representará um avanço político.
Na verdade, trata-se de uma tarefa quase impossível, dada a brutal
desproporção entre os recursos dos candidatos do campo da ordem e os
candidatos socialistas. Contudo, é a única saída autêntica para quem,
perfeitamente a par da extrema debilidade da esquerda, vê na campanha
eleitoral uma oportunidade mínima, porém valiosa, de lançar sementes
para combater a consolidação da hegemonia burguesa.
Não venham, pois, os lulistas com cobranças históricas antecipadas. O
que a história responsabilizará, isto sim, serão aqueles que não
souberam ler corretamente a conjuntura.
|
sexta-feira, 16 de abril de 2010
Uma nova ordem mundial...
O BRIC e o desafio de construir uma nova ordem mundial
Reunidos em Brasília nesta quinta-feira (15), os dirigentes
dos países que compõem o BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) se
defrontam com o desafio de debater, propor e começar a construir uma
nova ordem econômica e política mundial num cenário ainda marcado pela
mais grave crise do capitalismo desde o pós-guerra, o declínio dos EUA e
a mudança da correlação de forças da geopolítica internacional, com a
emergência de novos protagonistas de peso.
Por Umberto Martins - no sitio vermelho
BRIC é um acrônimo criado em
novembro de 2001 pelo economista Jim O´Neill, do banco Goldman Sachs,
que reuniu os quatro países por características comuns como a dimensão
territorial, a demografia e o potencial de crescimento. O´Neill estimou,
na época, que até o final de 2050 o grupo vai se transformar na
principal força da economia mundial.
Interesses convergentes
Inicialmente, o conceito não teve grande repercussão, mas o caminho percorrido pela história desde então parece justificar as previsões de O´Neill, enquanto a necessidade de fortalecer os laços econômicos e políticos entre os países do BRIC levou à formação de um bloco político informal, que realiza agora no Brasil a sua segunda reunião.
Brasil, Rússia, Índia e China detêm 26% do território, 42% da população e 14,5% do PIB mundial. Nos últimos cinco anos, contribuíram com mais de 50% da expansão do PIB mundial, de acordo com estatísticas exibidas por acadêmicos no seminário realizado em Brasília 4ª feira (14) pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA).
Os laços econômicos e políticos no interior do BRIC também foram fortalecidos. Um sinal disto, entre outros, é o fato da China ter se transformado, em 2009, na principal parceira comercial do Brasil, desbancando os EUA. As dessemelhanças e assimetrias, assim como a proeminência chinesa, também são notáveis, embora aparentemente não constituam um obstáculo intransponível à unidade política.
Proeminência chinesa
De acordo com informações do pesquisador Zhang Yuyan, da Academia de Ciências chinesa, apresentados no seminário do IPEA, a China, sozinha, responde por 7,1% do PIB mundial e se os países do BRIC realizam 14,5% das exportações mundiais, nada menos que 9,1% são responsabilidade daquela nação asiática, que lidera o ranking das vendas internacionais e vem também ocupando fatia crescente do comércio com Brasil, Rússia e Índia.
Todavia, os interesses comuns são consideráveis e cresceram no rastro da crise mundial. O BRIC sofreu menos os impactos da recessão americana e se recuperou mais rapidamente, puxando a economia internacional para o leito do desenvolvimento. Isto fortaleceu politicamente o “bloco”.
Conforme afirmou o diretor do Instituto de Estudos da Ásia e Pacífico, Li Xiangyang, durante o seminário, enquanto as potências europeias, o Japão e os EUA continuam atolados na crise, com pálidos sinais de recuperação e lidando com assombrosos déficits fiscais, os problemas dos países do BRIC decorrem do crescimento, que alguns consideram excessivo, pressões inflacionárias e fluxo de capitais estrangeiros especulativos.
Ordem mundial caducou
A crise evidenciou o esgotamento da ordem capitalista mundial, herdada do pós-guerra e ancorada na supremacia do dólar, e acentuou a necessidade de uma nova ordem, em harmonia com o desenvolvimento desigual, especialmente da China, e a mudança consequente da correlação de forças no plano econômico.
O que está em foco, de acordo com o ministro de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, é “saber se algumas nações continuarão a se achar superiores e, portanto, com mais direito ou não”. Na mesma linha, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ponderou que a intenção não é formar uma “aristocracia dos emergentes”, mas dar voz e poder aos mais pobres.
“Essa perspectiva”, observa o presidente do IPEA, Marcio Polchmann, “nos coloca numa posição estratégica para fazer proposições que estejam em sintonia com os desafios mundiais. São problemas comuns, como é o caso do meio ambiente, a mudança do perfil de consumo nos países, a questão monetária e a governança global".
Questão nuclear
“Estamos num processo de rearticulação do sistema político e econômico internacional e, nesse processo ou as regras continuarão a privilegiar alguns países ou teremos uma situação de acordo com a dimensão das nossas sociedades”, salientou Pinheiro Guimarães. Entre os problemas candentes destaca-se os da chamada questão nuclear.
“Precisamos saber quem controlará o processo nuclear”, disse o ministro de Assuntos Estratégicos. “No fundo há uma disputa tecnológica e científica entre países”. A tentativa das potências ocidentais de impedir o desenvolvimento da tecnologia nuclear no Irã, Coreia do Norte e outros países reflete isto.
O Brasil adotou uma posição firme a este respeito, apesar da pressão dos EUA, rejeitando sanções contra o país persa e pregando o diálogo e, a julgar pelo ministro Celso Amorim, a posição do Brasil se aproxima da que é defendida hoje pela China, apesar da mídia americana ter divulgado a falsa versão de que os dirigentes chineses estão afinados com a tática do imperialismo americano, de impor novas sanções aos iranianos.
Substituição do dólar
Outro dilema avaliado pelo BRIC é de um novo Sistema Monetário Internacional (SMI), que passa pela substituição do padrão dólar como moeda internacional. Isto não vai ser resolvido a curto prazo, mas iniciativas embrionárias neste sentido como a diversificação das reservas (ainda atreladas ao dólar) e experiências de trocas comerciais com moedas locais na América Latina e na Ásia.
“O atual sistema monetário internacional é desfavorável aos países em desenvolvimento”, comentou Li Yang, que também defendeu mudanças no FMI e, segundo o jornal Valor (15-4), foi apoiado por Marcio Polchmann, que preconizou uma aliança entre os países do BRIC para “um novo padrão de consumo e produção”. O Brasil e a Rússia também estão defendendo transações comerciais entre os países do grupo com base nas moedas próprias, descartando o dólar.
Ao lado da reunião do BRIC, Brasília também foi palco de uma outra importante reunião, a 4ª Cúpula dos Chefes de Estado e de Governo do IBAS (grupo composto por Índia, Brasil e África do Sul), cujo documento final (Declaração de Brasília) defende uma reforma urgente da ONU e a conclusão da Rodada Doha no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
As duas reuniões (do BRIC e do IBAS) apontam a mesma necessidade de uma reformulação urgente e ampla da ordem econômica e política internacional, que ficou ainda mais caduca após o estouro da crise mundial do capitalismo nos EUA.
Interesses convergentes
Inicialmente, o conceito não teve grande repercussão, mas o caminho percorrido pela história desde então parece justificar as previsões de O´Neill, enquanto a necessidade de fortalecer os laços econômicos e políticos entre os países do BRIC levou à formação de um bloco político informal, que realiza agora no Brasil a sua segunda reunião.
Brasil, Rússia, Índia e China detêm 26% do território, 42% da população e 14,5% do PIB mundial. Nos últimos cinco anos, contribuíram com mais de 50% da expansão do PIB mundial, de acordo com estatísticas exibidas por acadêmicos no seminário realizado em Brasília 4ª feira (14) pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA).
Os laços econômicos e políticos no interior do BRIC também foram fortalecidos. Um sinal disto, entre outros, é o fato da China ter se transformado, em 2009, na principal parceira comercial do Brasil, desbancando os EUA. As dessemelhanças e assimetrias, assim como a proeminência chinesa, também são notáveis, embora aparentemente não constituam um obstáculo intransponível à unidade política.
Proeminência chinesa
De acordo com informações do pesquisador Zhang Yuyan, da Academia de Ciências chinesa, apresentados no seminário do IPEA, a China, sozinha, responde por 7,1% do PIB mundial e se os países do BRIC realizam 14,5% das exportações mundiais, nada menos que 9,1% são responsabilidade daquela nação asiática, que lidera o ranking das vendas internacionais e vem também ocupando fatia crescente do comércio com Brasil, Rússia e Índia.
Todavia, os interesses comuns são consideráveis e cresceram no rastro da crise mundial. O BRIC sofreu menos os impactos da recessão americana e se recuperou mais rapidamente, puxando a economia internacional para o leito do desenvolvimento. Isto fortaleceu politicamente o “bloco”.
Conforme afirmou o diretor do Instituto de Estudos da Ásia e Pacífico, Li Xiangyang, durante o seminário, enquanto as potências europeias, o Japão e os EUA continuam atolados na crise, com pálidos sinais de recuperação e lidando com assombrosos déficits fiscais, os problemas dos países do BRIC decorrem do crescimento, que alguns consideram excessivo, pressões inflacionárias e fluxo de capitais estrangeiros especulativos.
Ordem mundial caducou
A crise evidenciou o esgotamento da ordem capitalista mundial, herdada do pós-guerra e ancorada na supremacia do dólar, e acentuou a necessidade de uma nova ordem, em harmonia com o desenvolvimento desigual, especialmente da China, e a mudança consequente da correlação de forças no plano econômico.
O que está em foco, de acordo com o ministro de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, é “saber se algumas nações continuarão a se achar superiores e, portanto, com mais direito ou não”. Na mesma linha, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ponderou que a intenção não é formar uma “aristocracia dos emergentes”, mas dar voz e poder aos mais pobres.
“Essa perspectiva”, observa o presidente do IPEA, Marcio Polchmann, “nos coloca numa posição estratégica para fazer proposições que estejam em sintonia com os desafios mundiais. São problemas comuns, como é o caso do meio ambiente, a mudança do perfil de consumo nos países, a questão monetária e a governança global".
Questão nuclear
“Estamos num processo de rearticulação do sistema político e econômico internacional e, nesse processo ou as regras continuarão a privilegiar alguns países ou teremos uma situação de acordo com a dimensão das nossas sociedades”, salientou Pinheiro Guimarães. Entre os problemas candentes destaca-se os da chamada questão nuclear.
“Precisamos saber quem controlará o processo nuclear”, disse o ministro de Assuntos Estratégicos. “No fundo há uma disputa tecnológica e científica entre países”. A tentativa das potências ocidentais de impedir o desenvolvimento da tecnologia nuclear no Irã, Coreia do Norte e outros países reflete isto.
O Brasil adotou uma posição firme a este respeito, apesar da pressão dos EUA, rejeitando sanções contra o país persa e pregando o diálogo e, a julgar pelo ministro Celso Amorim, a posição do Brasil se aproxima da que é defendida hoje pela China, apesar da mídia americana ter divulgado a falsa versão de que os dirigentes chineses estão afinados com a tática do imperialismo americano, de impor novas sanções aos iranianos.
Substituição do dólar
Outro dilema avaliado pelo BRIC é de um novo Sistema Monetário Internacional (SMI), que passa pela substituição do padrão dólar como moeda internacional. Isto não vai ser resolvido a curto prazo, mas iniciativas embrionárias neste sentido como a diversificação das reservas (ainda atreladas ao dólar) e experiências de trocas comerciais com moedas locais na América Latina e na Ásia.
“O atual sistema monetário internacional é desfavorável aos países em desenvolvimento”, comentou Li Yang, que também defendeu mudanças no FMI e, segundo o jornal Valor (15-4), foi apoiado por Marcio Polchmann, que preconizou uma aliança entre os países do BRIC para “um novo padrão de consumo e produção”. O Brasil e a Rússia também estão defendendo transações comerciais entre os países do grupo com base nas moedas próprias, descartando o dólar.
Ao lado da reunião do BRIC, Brasília também foi palco de uma outra importante reunião, a 4ª Cúpula dos Chefes de Estado e de Governo do IBAS (grupo composto por Índia, Brasil e África do Sul), cujo documento final (Declaração de Brasília) defende uma reforma urgente da ONU e a conclusão da Rodada Doha no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
As duas reuniões (do BRIC e do IBAS) apontam a mesma necessidade de uma reformulação urgente e ampla da ordem econômica e política internacional, que ficou ainda mais caduca após o estouro da crise mundial do capitalismo nos EUA.
quinta-feira, 15 de abril de 2010
A luta esta começando.....
Debate em SP: a internet pode enfrentar o PIG?
===
Em 2010 o PIG (Partido da Imprensa Golpista) vai jogar mais sujo
ainda para tentar fazer valer seus interesses e eleger o presidente do
interesse deles.
No fórum “Democracia e Liberdade de Expressão”, os perdigueiros
do PIG mostraram seus dentes e afirmaram com todas as letras que farão
campanha para José Serra e que “ouvir o outro lado da notícia é
besteira”.
Maria Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) confirmou que a entidade faz papel de oposição ao governo e com isso PIG ganhou um novo apelido na blogosfera: “Partido da Dona Judith”.
Maria Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) confirmou que a entidade faz papel de oposição ao governo e com isso PIG ganhou um novo apelido na blogosfera: “Partido da Dona Judith”.
O Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e
Região vem manifestando seu compromisso com a necessidade de se
articular meios alternativos de comunicação para se contrapor ao poder
de uma dezena de famílias que controlam a quase totalidade da mídia
brasileira, transformando a informação em negócio e de defesa de seus
interesses.
A internet é ainda um grande espaço democrático de disputa de
idéias e os blogueiros vem construindo uma alternativa ao poder do PIG.
Para debater esse tema, o Sindicato realiza nesta quinta-feira
(15/04), em comemoração aos 87 anos de sua fundação, um debate entre os
blogueiros Rodrigo Vianna (site Escrivinhador), Eduardo Guimarães (blog
Cidadania.com) e Luiz Cláudio Marcolino, presidente do Sindicato.
O debate será transmitido on-line via webtv pelo site do
Sindicato dos bancários www.spbancarios.com.br
pelo site do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC www.smabc.org.br pelo
site da Confederação Nacional dos Metalúrgicos www.cnmcut.org.br e
pela Rede Brasil Atual www.redebrasilatual.com.br
Tema: O Papel da Internet na Democratização da Informação
Local: Sindicato dos Bancários - Rua São Bento, 413 - auditório azul - Centro - São Paulo/SP
Dia: 15 de abril (quinta-feira)
horário: pontualmente às 19 horas
Tema: O Papel da Internet na Democratização da Informação
Local: Sindicato dos Bancários - Rua São Bento, 413 - auditório azul - Centro - São Paulo/SP
Dia: 15 de abril (quinta-feira)
horário: pontualmente às 19 horas
A Igreja Católica e a Pedofilia...até quando a impunidade?
Vítimas de pedofilia contam rotina de medo sob o rigor da Igreja na Irlanda
Ernani Lemos e Juliana Yonezawa | Dublin
Ex-internos de instituições dirigidas por
padres e freiras católicos nos anos 1940 e 1950 na Irlanda dizem ainda
ter pesadelos com os abusos sofridos e prometem lutar pela punição dos
culpados, mesmo décadas depois
“A Irlanda deveria se envergonhar para sempre por
permitir que tal barbaridade acontecesse a qualquer ser humano. Eu amo
meu país e nunca vou deixar de amar. Eu sou católico e continuarei
sendo. Independentemente de ir ou não à igreja. Mas eu jamais vou
perdoar as pessoas que fizeram aquelas atrocidades comigo e com meus
irmãos”, diz Michael O’Brien.
“A única forma que eu tenho de descrever aquelas instituições é
dizer que são piores do que prisões e similares aos campos de
concentração da Alemanha. A rotina era rigorosa e muito dura. Nós
passamos fome e sofremos de malnutrição. Eles deveriam nos preparar para
a vida, nos educar e ensinar uma profissão. Em vez disso, só nos
infligiram punições e o dogma religioso”, conta Christopher Heaphy.
As palavras ásperas e carregadas de rancor são de dois
auto-intitulados “sobreviventes” dos abusos sexuais e da violência
praticados contra crianças por membros da Igreja Católica na Irlanda.
Sentados na poltrona de um hotel em Dublin, O’Brien e Heaphy contam ao Opera Mundi, em detalhes, o horror
que passaram em instituições infantis dirigidas por religiosos nas
décadas de 1940 e 1950.
Christopher Heaphy (à esquerda) e Michael O’Brien (à direita), foram vítimas de abusos em escolas católicas
“Eles não nos tratavam como crianças, nem mesmo como seres
humanos. Nós éramos tratados como animais”, desabafa O’Brien. Aos 77
anos de idade, o irlandês de Tipperary dedica a vida à luta pelos
direitos das vítimas dos abusos. Em 1999, ele criou a associação Right
for Peace – uma organização de pessoas que viveram situações semelhantes
nos abrigos infantis, orfanatos e reformatórios católicos da Irlanda.
O’Brien foi parar em uma dessas instituições em 1941, quando tinha 8
anos, logo após a morte da mãe. Ele e os sete irmãos foram tirados do
pai e colocados em diferentes internatos. “Eu fui abusado desde o
instante em que entrei naquele lugar. Sexualmente, fisicamente,
mentalmente e verbalmente. Todos os dias, sem nenhuma razão. E não foram
apenas os castigos e os abusos. Eles tiraram de nós as nossas famílias.
Isso é imperdoável. O crime contra uma criança inocente é o pior crime
que alguém pode cometer”, relata.
Michael O’Brien era semi-analfabeto quando deixou a Escola
Industrial São José (St Joseph’s Industrial School), aos 16 anos. “Após
oito anos de internato, minha mentalidade era a de uma criança. Eu não
sabia nada sobre o mundo. Não sabia o que era mulher ou dinheiro. Não
imaginava que poderia comprar coisas. Não estava pronto para a vida,
porque eles não faziam o que deveriam fazer, que era nos educar”. Mesmo
com tantas lembranças ruins, o ex-interno se considera um dos sortudos.
Ele serviu ao exército e aprendeu a ler sozinho, usando livros que
encontrava nos quartéis e alojamentos. Mais tarde, trabalhou como
funcionário público, virou político e conseguiu ser eleito prefeito da
cidade de Clonmel, onde nasceu. O’Brien casou-se há 55 anos, tem quatro
filhos, 11 netos e seis bisnetos. Mesmo com uma vida aparentemente bem
estruturada, ele diz que não se sente uma pessoa normal e que não
consegue passar um único dia sequer sem se lembrar dos maus tratos da
infância. “Vou fazê-los pagar enquanto eu viver, não perdoando. Vou
lutar para que haja reparação até o dia em que eu morrer. Lutar para que
não aconteça de novo. Nunca serei feliz enquanto não houver justiça”,
promete.
Christopher Heaphy, de 65 anos, líder da associação Right of
Place, também se dedica em tempo integral a buscar punição para os
culpados e reparação às vítimas dos abusos. Ele perdeu a mãe quando
tinha 5 anos de idade e foi enviado para a Escola Industrial Greenmount
em Cork, sul da Irlanda. “O governo poderia ter ajudado meu pai a cuidar
de mim e dos meus dois irmãos. Em vez disso, eles nos arrancaram de
casa e nos trancaram em instituições”, desabafa.
Christopher Heaphy tinha pesadelos com as lembranças de infância marcada por abusos de padres
Enquanto conta sobre o passado, com a voz calma e delicada,
Cristopher se emociona com os momentos que marcaram a vida dele:
“Vivíamos sob terror e medo todos os dias. Eu me reprimi. Saí de lá e
não falava. Mal lia ou escrevia. Estava sempre amedrontado. Precisei
superar muitas dificuldades na vida. Nunca contei à minha esposa sobre
os abusos. Ela não entendia por que eu dava pulos e chutes na cama
durante a noite. A verdade é que eu ainda tinha a impressão de que
aqueles homens vinham colocar a mão debaixo das minhas cobertas para me
molestar enquanto eu dormia”.
Hoje, o irlandês tem três filhos e foi abandonado pela primeira esposa por causa do comportamento estranho que tinha em casa. “Agradeço por ela ter ido embora e levado as crianças. Eu era um estranho para eles. Na época, eu não podia dar o amor que eles precisavam. O triste é saber que hoje, depois de quase 30 anos, eu mal conheço meus filhos. Não pude vivenciar a alegria de vê-los crescendo”.
Hoje, o irlandês tem três filhos e foi abandonado pela primeira esposa por causa do comportamento estranho que tinha em casa. “Agradeço por ela ter ido embora e levado as crianças. Eu era um estranho para eles. Na época, eu não podia dar o amor que eles precisavam. O triste é saber que hoje, depois de quase 30 anos, eu mal conheço meus filhos. Não pude vivenciar a alegria de vê-los crescendo”.
Heaphy se formou em engenharia aos 58 anos de idade, mas se acha
muito velho para trabalhar na área. Para ele, são três os principais
culpados pelos abusos cometidos contra as crianças: o governo, por
fracassar em proteger os cidadãos; a Igreja, por ter protegido os
sacerdotes; e os próprios religiosos que dirigiam as instituições
infantis. “Eles cometeram os crimes contra nós. Os crimes foram
denunciados na época, mas a Igreja só protegeu a si mesma. Não protegeu
as crianças. E, agora, todos deveriam enfrentar as implicações legais
dos direitos civis que quebraram”, defende o ex-interno. O governo
irlandês indenizou os “sobreviventes” com uma reparação média de 63 mil
euros. A Igreja não pagou nada.
Instituições
As escolas industriais na Irlanda foram instituições para onde eram levadas crianças sem pais ou das quais os parentes não tinham condições de cuidar. As entidades eram dirigidas por ordens religiosas da Igreja Católica e recebiam ajuda financeira do governo para dar educação e ensinar uma profissão aos menores. Mas, na prática, segundo relatos dos ex-internos, pouco se ensinava nas salas de aula. O Estado era responsável pelas escolas, mas, de acordo com as associações de sobreviventes, os Ministérios da Educação, da Saúde e da Justiça jamais fiscalizaram as condições de ensino, de higiene ou de comportamento nos locais. O governo irlandês admitiu as falhas recentemente, ao indenizar as vítimas dos maus tratos.
Desde 1930, milhares de crianças passaram pelas cerca de 250 escolas industriais da Irlanda. O contato com a família era perdido, já que a visita dos parentes era desencorajada. Os internos só eram liberados ao completar 16 anos. Cristopher Heaphy foi uma exceção. Aos 12 anos, o garoto foi espancado por um religioso e, durante uma rara visita, conseguiu mostrar ao pai as cicatrizes e machucados. O pai o levou à Justiça e o então ministro Jack Lynch assinou uma ordem liberando o garoto da instituição. A escola foi fechada três anos depois. Mais tarde, Lynch se tornou primeiro-ministro da Irlanda, mas pouco fez para mudar o que acontecia dentro dos muros de várias outras entidades para crianças.
Ao falar sobre as escolas industriais, tanto Heaphy quanto O’Brien se referem ao “tempo em que servimos naqueles lugares”. Para ambos, foi uma época de puro sofrimento, sem nenhuma boa lembrança.
“Eu nunca tive um julgamento, nunca fui legalmente representado. E acabei tirado do conforto da minha casa e jogado naquele lugar, como se fosse um assassino. Já as pessoas que me violentaram nunca foram punidas nem levadas ao tribunal”, lamenta O’Brien. “O crime era tão horrível que ninguém acreditava. Era desumano. Animalesco. E nós não podíamos fazer nada, a não ser esperar pela próxima pessoa a nos chamar para cometer a mesma violência de novo. Eu espero que você nunca testemunhe algo semelhante ao que eu passei”, completa.
As escolas industriais foram fechadas nos anos 1990 e substituídas por escolas para menores delinquentes. Atualmente, há apenas cinco em funcionamento em todo o pais. Os crimes dos quais membros da Igreja Católica são acusados de cometer contra crianças durante mais de 60 anos teriam acontecido também em orfanatos, reformatórios e em sacristias de igrejas. Ordens religiosas como os Christian Brothers (Irmãos Cristãos) chefiavam muitos desses locais.
Segundo investigações, meninas irlandesas teriam sofrido menos abusos sexuais. Mas eram frequentemente molestadas moralmente, humilhadas e espancadas em instituições dirigidas por freiras, como as da ordem Sisters of Mercy (Irmãs da Piedade). Há também relatos de trabalhos forçados em instituições femininas, como os Magdalene Asylums (Orfanatos de Madalena). As entidades que abrigavam mulheres consideradas socialmente degradadas ficaram famosas em outros países quando foram retratadas no cinema em 2002 no filme Em Nome de Deus (The Magdalene Sisters), de Peter Mullan. O último abrigo da irmandade em Dublin foi fechado em 1996.
Religião
Antigamente, na Irlanda, havia uma tradição forte quanto à profissão dos homens: qualquer um que decidisse ser médico ou padre teria o futuro garantido. Quando um filho decidia ser sacerdote, a família não precisava mais se preocupar. Ele teria a melhor educação, as melhores roupas, uma boa moradia e tudo mais de que precisasse. Cristopher Heaphy aponta isso como um dos fatores que podem ter levado a tantos abusos por membros da Igreja. “Esses homens foram supervalorizados. Nós os colocamos em pedestais onde eles jamais deveriam estar. Por isso, eles se sentiam superiores e com direito de fazer tudo o que achassem certo”, comenta.
Entretanto, o engenheiro não perdeu a religiosidade. “Eu acredito em Deus. A Igreja é uma instituição gerenciada por homens. Quem cometeu os crimes são pessoas e elas devem responder por isso. Mas eu ainda vou à missa. Minha relação com Deus é direta, cara a cara. Não há um padre entre nós”.
A postura de Michael O’Brien é semelhante. “Eu não vou à igreja. Mas sempre serei católico por um único motivo: minha mãe me batizou na igreja católica. E isso eu devo a ela”, explica. “Mas não tenho motivos para ir à igreja. Muitos padres iam à minha casa conversar e beber uísque quando eu era prefeito. Depois que eu deixei o cargo e resolvi contar sobre os abusos, eles fingem que não me conhecem”, lamenta.
Sofrimento como rotina
De acordo com os relatos, nas escolas industriais as crianças eram acordadas às 6h. Mesmo no inverno, elas usavam roupas curtas e, por vezes, não tinham sapatos. Antes da missa das 7h, todos tinham de tomar café da manhã: um pedaço de pão mergulhado num galão que misturava água e geleia. Em seguida, todos deveriam estudar até a hora do almoço. Na prática, crianças amedrontadas eram obrigadas a ficar sentadas em suas mesas por horas, sem falar e sem aprender nada. Se alguém era questionado e desse a resposta errada, tinha que ir à frente da sala, tirar a roupa e apanhar do ‘professor’ diante de todos os colegas. No meio da ‘aula’, alguns padres apareciam para tirar vários alunos das classes. Os menores eram levados para o campo, onde trabalhavam recolhendo pedras, batatas e outros vegetais.
“Não bastava trabalhar e obedecer. Os castigos eram severos e sem motivo. Nós éramos atirados em uma banheira de água fria. Depois tínhamos que tirar a roupa e subir uma escada, enquanto um adulto nos batia com uma vara. Não havia razão para aquilo. Eles eram sádicos”, diz Heaphy. O’Brien completa: “Nós éramos tirados da cama no meio da noite para apanhar com a vara. Eles batiam em qualquer parte do corpo. Por quê? Eu acho que aquilo dava a eles satisfação sexual”.
Ao chegar às escolas industriais, os garotos tinham o cabelo raspado e ganhavam um número. Os nomes eram esquecidos e aquela era a nova identidade deles. “O espancamento não era suficiente, eles queriam nos humilhar. Os padres nos chutavam enquanto andávamos pelos corredores e diziam que não éramos ninguém, que nunca seríamos nada. Aquilo era um abuso mental. Nós tínhamos medo o tempo todo”, lembra o engenheiro.
“Havia o abuso mental, o abuso psicológico, o abuso físico... mas nada se compara ao abuso sexual. Sujo, nojento, asqueroso. Um homem me violentou brutalmente no meu primeiro dia naquele lugar e depois me bateu, dizendo que eu era culpado pelo que tinha acontecido, que eu era o diabo trazendo tentação. O pior foi ver o mesmo homem me dar a comunhão na missa da próxima manhã. Depois de me estuprar, ele colocou a hóstia em minha boca”, desabafa o ex-prefeito.
Heaphy conta que viveu situações semelhantes: “Em um instante eu tinha o padre me ensinando religião. No próximo minuto, ele estava arrancando as minhas roupas e estuprando meu pequeno corpo inocente. Isso causou problemas psicológicos que me perseguem durante toda a vida”.
Quando confrontadas com evidencias de abuso sexual, as autoridades transferiam as crianças para outras instituições, onde elas poderiam ser abusadas novamente.
Suicídio
As lembranças e os pesadelos que perseguem as vítimas dos abusos muitas vezes conseguem acabar com a vida dessas pessoas. O’Brien confessa ter tentado se matar uma vez. “Eu voltava dirigindo de Dublin para Clonmel e quis destruir o carro para acabar de vez com o sofrimento. Estava completamente desesperado, me sentindo como um pedaço de sujeira. Só não terminei com a dor naquele momento porque minha mulher estava ao meu lado e me convenceu a não fazer aquela besteira”, relata.
Heaphy foi mais longe. Aos 29 anos, passou por um momento de desespero e cortou as veias sanguíneas do braço. A hemorragia não foi suficiente para matá-lo. “Eu fiz isso por causa dos crimes psicológicos. Eu continuo indo ao analista a cada duas semanas até hoje, mas nunca vou me livrar disso. Às vezes eu paro e penso que esse não é um corpo para estar dentro. Em um momento eu estou alegre e, no instante seguinte, algo me lembra o que aconteceu e a vida perde o sentido”.
Outros ex-internos não tiveram a mesma sorte. Por questões de privacidade, as associações de vítimas trabalham para manter em sigilo as identidades, mas sabe-se que muitos chegaram a cometer suicídio após anos de tormento.
Escândalo
Os casos de violência contra internos das escolas industriais ficaram amplamente conhecidos em maio de 2009, quando o juiz Sean Ryan divulgou um relatório de 2600 páginas contendo o resultado de nove anos de trabalho da Comissão de Investigação de Abuso Infantil na Irlanda. A Comissão ouviu o testemunho de mais de 250 ex-internos e oficiais dessas instituições. O documento afirma que durante 60 anos, da década de 30 até o fechamento das escolas nos anos 90, mais de 2 mil meninos e meninas foram espancados, violentados e humilhados por padres e freiras. Irlandeses que atualmente vivem em países como Austrália e Estados Unidos voltaram para casa para contar sobre a infância de terror e intimidação. O relatório classifica como ‘endemia’ a rotina de estupro e molestação nas entidades gerenciadas pela igreja católica. Representantes da igreja conseguiram adiar a divulgação do texto por várias vezes e garantiram o direito de anonimato das pessoas citadas no documento como culpadas pelos abusos, mesmo em casos de indivíduos julgados e condenados por ataques físicos e sexuais contra crianças. A manobra revoltou as vítimas. “Eu lutei 10 anos da minha vida para tudo isso vir à tona. Eu fiquei exposto e expus minha família. E agora ninguém será punido. É muito triste”, lamenta Michael O’Brien.
Igreja
A proporção do caso preocupou as lideranças da igreja católica. No começo desse ano, bispos irlandeses foram chamados ao Vaticano para explicar como estavam lidando com a questão da violência infantil. Em 19 de março, o Papa divulgou uma carta dirigida aos católicos da Irlanda. No texto, Bento XVI se diz profundamente perturbado com as informações sobre o abuso sofrido pelas crianças. O chefe da Igreja pede desculpas pelo que ele chama de “traição, pecado e atos criminosos”. O conteúdo da carta, no entanto, não foi tão bem recebido pelos irlandeses. “Nós aceitamos as desculpas do Papa. Isso não é um problema. Acontece que a maior parte da carta foi nada mais do que uma demonstração de solidariedade aos bispos, cardeais e padres que falharam com o país. O texto foi dirigido a eles, para mantê-los dentro da igreja”, comenta Heaphy. O’Brien tem opinião parecida: “A carta trouxe uma desculpa que me deixou feliz. Mas o principal ponto do documento é a própria Igreja. É pedir aos bispos para unir a igreja, para salvar a instituição. Não há nenhuma preocupação em salvar as pessoas abusadas pelos membros da Igreja”.
Ainda no mês de março, o cardeal primaz da Irlanda pediu perdão por ocultar os casos de abuso sexual no clero. Sean Brady se disse envergonhado por não ter defendido valores que prega para os fiéis. Ele admitiu que, em 1975, pediu a vítimas da violência que mantivessem silêncio. As associações de ex-internos ficaram revoltadas e começaram um movimento pela renúncia do Arcebispo. Em 31 de março, Brady se reuniu com líderes das vítimas e prometeu uma investigação nacional sobre todas as denúncias. O representante máximo da igreja católica na Irlanda afirmou, no entanto, que só renuncia se o Papa pedir. A decisão do cardeal é aguardada para o fim de maio.
*Texto e fotos.
Instituições
As escolas industriais na Irlanda foram instituições para onde eram levadas crianças sem pais ou das quais os parentes não tinham condições de cuidar. As entidades eram dirigidas por ordens religiosas da Igreja Católica e recebiam ajuda financeira do governo para dar educação e ensinar uma profissão aos menores. Mas, na prática, segundo relatos dos ex-internos, pouco se ensinava nas salas de aula. O Estado era responsável pelas escolas, mas, de acordo com as associações de sobreviventes, os Ministérios da Educação, da Saúde e da Justiça jamais fiscalizaram as condições de ensino, de higiene ou de comportamento nos locais. O governo irlandês admitiu as falhas recentemente, ao indenizar as vítimas dos maus tratos.
Desde 1930, milhares de crianças passaram pelas cerca de 250 escolas industriais da Irlanda. O contato com a família era perdido, já que a visita dos parentes era desencorajada. Os internos só eram liberados ao completar 16 anos. Cristopher Heaphy foi uma exceção. Aos 12 anos, o garoto foi espancado por um religioso e, durante uma rara visita, conseguiu mostrar ao pai as cicatrizes e machucados. O pai o levou à Justiça e o então ministro Jack Lynch assinou uma ordem liberando o garoto da instituição. A escola foi fechada três anos depois. Mais tarde, Lynch se tornou primeiro-ministro da Irlanda, mas pouco fez para mudar o que acontecia dentro dos muros de várias outras entidades para crianças.
Ao falar sobre as escolas industriais, tanto Heaphy quanto O’Brien se referem ao “tempo em que servimos naqueles lugares”. Para ambos, foi uma época de puro sofrimento, sem nenhuma boa lembrança.
“Eu nunca tive um julgamento, nunca fui legalmente representado. E acabei tirado do conforto da minha casa e jogado naquele lugar, como se fosse um assassino. Já as pessoas que me violentaram nunca foram punidas nem levadas ao tribunal”, lamenta O’Brien. “O crime era tão horrível que ninguém acreditava. Era desumano. Animalesco. E nós não podíamos fazer nada, a não ser esperar pela próxima pessoa a nos chamar para cometer a mesma violência de novo. Eu espero que você nunca testemunhe algo semelhante ao que eu passei”, completa.
As escolas industriais foram fechadas nos anos 1990 e substituídas por escolas para menores delinquentes. Atualmente, há apenas cinco em funcionamento em todo o pais. Os crimes dos quais membros da Igreja Católica são acusados de cometer contra crianças durante mais de 60 anos teriam acontecido também em orfanatos, reformatórios e em sacristias de igrejas. Ordens religiosas como os Christian Brothers (Irmãos Cristãos) chefiavam muitos desses locais.
Segundo investigações, meninas irlandesas teriam sofrido menos abusos sexuais. Mas eram frequentemente molestadas moralmente, humilhadas e espancadas em instituições dirigidas por freiras, como as da ordem Sisters of Mercy (Irmãs da Piedade). Há também relatos de trabalhos forçados em instituições femininas, como os Magdalene Asylums (Orfanatos de Madalena). As entidades que abrigavam mulheres consideradas socialmente degradadas ficaram famosas em outros países quando foram retratadas no cinema em 2002 no filme Em Nome de Deus (The Magdalene Sisters), de Peter Mullan. O último abrigo da irmandade em Dublin foi fechado em 1996.
Religião
Antigamente, na Irlanda, havia uma tradição forte quanto à profissão dos homens: qualquer um que decidisse ser médico ou padre teria o futuro garantido. Quando um filho decidia ser sacerdote, a família não precisava mais se preocupar. Ele teria a melhor educação, as melhores roupas, uma boa moradia e tudo mais de que precisasse. Cristopher Heaphy aponta isso como um dos fatores que podem ter levado a tantos abusos por membros da Igreja. “Esses homens foram supervalorizados. Nós os colocamos em pedestais onde eles jamais deveriam estar. Por isso, eles se sentiam superiores e com direito de fazer tudo o que achassem certo”, comenta.
Entretanto, o engenheiro não perdeu a religiosidade. “Eu acredito em Deus. A Igreja é uma instituição gerenciada por homens. Quem cometeu os crimes são pessoas e elas devem responder por isso. Mas eu ainda vou à missa. Minha relação com Deus é direta, cara a cara. Não há um padre entre nós”.
A postura de Michael O’Brien é semelhante. “Eu não vou à igreja. Mas sempre serei católico por um único motivo: minha mãe me batizou na igreja católica. E isso eu devo a ela”, explica. “Mas não tenho motivos para ir à igreja. Muitos padres iam à minha casa conversar e beber uísque quando eu era prefeito. Depois que eu deixei o cargo e resolvi contar sobre os abusos, eles fingem que não me conhecem”, lamenta.
Sofrimento como rotina
De acordo com os relatos, nas escolas industriais as crianças eram acordadas às 6h. Mesmo no inverno, elas usavam roupas curtas e, por vezes, não tinham sapatos. Antes da missa das 7h, todos tinham de tomar café da manhã: um pedaço de pão mergulhado num galão que misturava água e geleia. Em seguida, todos deveriam estudar até a hora do almoço. Na prática, crianças amedrontadas eram obrigadas a ficar sentadas em suas mesas por horas, sem falar e sem aprender nada. Se alguém era questionado e desse a resposta errada, tinha que ir à frente da sala, tirar a roupa e apanhar do ‘professor’ diante de todos os colegas. No meio da ‘aula’, alguns padres apareciam para tirar vários alunos das classes. Os menores eram levados para o campo, onde trabalhavam recolhendo pedras, batatas e outros vegetais.
“Não bastava trabalhar e obedecer. Os castigos eram severos e sem motivo. Nós éramos atirados em uma banheira de água fria. Depois tínhamos que tirar a roupa e subir uma escada, enquanto um adulto nos batia com uma vara. Não havia razão para aquilo. Eles eram sádicos”, diz Heaphy. O’Brien completa: “Nós éramos tirados da cama no meio da noite para apanhar com a vara. Eles batiam em qualquer parte do corpo. Por quê? Eu acho que aquilo dava a eles satisfação sexual”.
Ao chegar às escolas industriais, os garotos tinham o cabelo raspado e ganhavam um número. Os nomes eram esquecidos e aquela era a nova identidade deles. “O espancamento não era suficiente, eles queriam nos humilhar. Os padres nos chutavam enquanto andávamos pelos corredores e diziam que não éramos ninguém, que nunca seríamos nada. Aquilo era um abuso mental. Nós tínhamos medo o tempo todo”, lembra o engenheiro.
“Havia o abuso mental, o abuso psicológico, o abuso físico... mas nada se compara ao abuso sexual. Sujo, nojento, asqueroso. Um homem me violentou brutalmente no meu primeiro dia naquele lugar e depois me bateu, dizendo que eu era culpado pelo que tinha acontecido, que eu era o diabo trazendo tentação. O pior foi ver o mesmo homem me dar a comunhão na missa da próxima manhã. Depois de me estuprar, ele colocou a hóstia em minha boca”, desabafa o ex-prefeito.
Heaphy conta que viveu situações semelhantes: “Em um instante eu tinha o padre me ensinando religião. No próximo minuto, ele estava arrancando as minhas roupas e estuprando meu pequeno corpo inocente. Isso causou problemas psicológicos que me perseguem durante toda a vida”.
Quando confrontadas com evidencias de abuso sexual, as autoridades transferiam as crianças para outras instituições, onde elas poderiam ser abusadas novamente.
Suicídio
As lembranças e os pesadelos que perseguem as vítimas dos abusos muitas vezes conseguem acabar com a vida dessas pessoas. O’Brien confessa ter tentado se matar uma vez. “Eu voltava dirigindo de Dublin para Clonmel e quis destruir o carro para acabar de vez com o sofrimento. Estava completamente desesperado, me sentindo como um pedaço de sujeira. Só não terminei com a dor naquele momento porque minha mulher estava ao meu lado e me convenceu a não fazer aquela besteira”, relata.
Heaphy foi mais longe. Aos 29 anos, passou por um momento de desespero e cortou as veias sanguíneas do braço. A hemorragia não foi suficiente para matá-lo. “Eu fiz isso por causa dos crimes psicológicos. Eu continuo indo ao analista a cada duas semanas até hoje, mas nunca vou me livrar disso. Às vezes eu paro e penso que esse não é um corpo para estar dentro. Em um momento eu estou alegre e, no instante seguinte, algo me lembra o que aconteceu e a vida perde o sentido”.
Outros ex-internos não tiveram a mesma sorte. Por questões de privacidade, as associações de vítimas trabalham para manter em sigilo as identidades, mas sabe-se que muitos chegaram a cometer suicídio após anos de tormento.
Escândalo
Os casos de violência contra internos das escolas industriais ficaram amplamente conhecidos em maio de 2009, quando o juiz Sean Ryan divulgou um relatório de 2600 páginas contendo o resultado de nove anos de trabalho da Comissão de Investigação de Abuso Infantil na Irlanda. A Comissão ouviu o testemunho de mais de 250 ex-internos e oficiais dessas instituições. O documento afirma que durante 60 anos, da década de 30 até o fechamento das escolas nos anos 90, mais de 2 mil meninos e meninas foram espancados, violentados e humilhados por padres e freiras. Irlandeses que atualmente vivem em países como Austrália e Estados Unidos voltaram para casa para contar sobre a infância de terror e intimidação. O relatório classifica como ‘endemia’ a rotina de estupro e molestação nas entidades gerenciadas pela igreja católica. Representantes da igreja conseguiram adiar a divulgação do texto por várias vezes e garantiram o direito de anonimato das pessoas citadas no documento como culpadas pelos abusos, mesmo em casos de indivíduos julgados e condenados por ataques físicos e sexuais contra crianças. A manobra revoltou as vítimas. “Eu lutei 10 anos da minha vida para tudo isso vir à tona. Eu fiquei exposto e expus minha família. E agora ninguém será punido. É muito triste”, lamenta Michael O’Brien.
Igreja
A proporção do caso preocupou as lideranças da igreja católica. No começo desse ano, bispos irlandeses foram chamados ao Vaticano para explicar como estavam lidando com a questão da violência infantil. Em 19 de março, o Papa divulgou uma carta dirigida aos católicos da Irlanda. No texto, Bento XVI se diz profundamente perturbado com as informações sobre o abuso sofrido pelas crianças. O chefe da Igreja pede desculpas pelo que ele chama de “traição, pecado e atos criminosos”. O conteúdo da carta, no entanto, não foi tão bem recebido pelos irlandeses. “Nós aceitamos as desculpas do Papa. Isso não é um problema. Acontece que a maior parte da carta foi nada mais do que uma demonstração de solidariedade aos bispos, cardeais e padres que falharam com o país. O texto foi dirigido a eles, para mantê-los dentro da igreja”, comenta Heaphy. O’Brien tem opinião parecida: “A carta trouxe uma desculpa que me deixou feliz. Mas o principal ponto do documento é a própria Igreja. É pedir aos bispos para unir a igreja, para salvar a instituição. Não há nenhuma preocupação em salvar as pessoas abusadas pelos membros da Igreja”.
Ainda no mês de março, o cardeal primaz da Irlanda pediu perdão por ocultar os casos de abuso sexual no clero. Sean Brady se disse envergonhado por não ter defendido valores que prega para os fiéis. Ele admitiu que, em 1975, pediu a vítimas da violência que mantivessem silêncio. As associações de ex-internos ficaram revoltadas e começaram um movimento pela renúncia do Arcebispo. Em 31 de março, Brady se reuniu com líderes das vítimas e prometeu uma investigação nacional sobre todas as denúncias. O representante máximo da igreja católica na Irlanda afirmou, no entanto, que só renuncia se o Papa pedir. A decisão do cardeal é aguardada para o fim de maio.
*Texto e fotos.
A UDR ataca...todo cuidado é pouco...
A imagem do MST segundo a CNA
Jeansley Lima
Logo depois da aprovação do requerimento de abertura de uma nova
CPMI no Congresso Nacional contra o MST, a Confederação Nacional de
Agricultura (CNA) encomendou uma pesquisa ao Ibope, que ouviu 2002
pessoas de todas as regiões do país, entre os dias 12 a 16 de novembro
de 2009. Para criar um novo fato político para tentar desmoralizar o
MST, a pesquisa CNA/Ibope contou com a habitual complacência das
principais emissoras de TV e dos grandes jornais impressos para sua
divulgação. O destaque foi que 60% dos brasileiros desaprovam o MST.
A pesquisa aponta dados que sequer foram divulgados. Somente 20%
dos entrevistados afirmaram conhecer bem o MST, enquanto 73% declararam
conhecer pouco. Não se sabe ao certo a definição do que é “conhecer bem o
MST”, contudo, podemos fazer algumas suposições. A primeira é que os
entrevistados de algum modo já tiveram em algum assentamento/acampamento
do MST, conhecem o seu funcionamento e as experiências de produção
agrícola, ou os processos educativos e culturais desenvolvidos. Com
isso, teriam elementos para opinar a respeito. Outra hipótese – e a mais
provável - é que os entrevistados acompanham a cobertura da mídia,
especialmente da televisão, sobre o MST e, portanto, estão seguros do
que afirmam sobre o assunto.
Dessa maneira, levando em conta o modo como a mídia cobre os
conflitos agrários, a luta do MST e sua relação com o governo e a
sociedade é plausível entender o motivo por que 53% dos entrevistados
associam o MST à violência. Afinal, não seria por só verem o movimento
representado dessa maneira na TV?
A velhinha de Taubaté já seria capaz de prever os resultados de uma
pesquisa encomendada pela senadora Kátia Abreu (DEM/TO), postulante a
líder dos ruralistas no Congresso Nacional, a respeito do MST. E esta
não é apenas uma dedução simplista. O caráter panfletário e manipulador
da pesquisa são expostos em algumas questões, que revelam as suas
verdadeiras intenções.
Vejamos, por exemplo, a pergunta se o entrevistado concorda ou
discorda que “quem já possui propriedade hoje tem o direito de escolher
se quer ou não produzir nela”, ou se o mesmo está de acordo com a
seguinte frase: “o que lhe pertence ninguém pode tomar”. Como a grande
maioria dos entrevistados concordou com tais assertivas, 77% e 87%
respectivamente, a CNA pretende reiterar que a ocupação de terra é um
crime - por entender que a propriedade, para todos os efeitos, é
inviolável - e que a população recrimina essa ação, por isso o MST deve
ser investigado e para isso conta com o suposto suporte popular.
Além de tratar questões políticas e sociais com uma perspectiva
dissimulada, a pesquisa pretende tentar legitimar a violência dos
proprietários rurais para defenderem suas terras. Nesse ponto, a
pretensão ruralista deu com os burros n’água. Cerca de 60% dos
entrevistados não concordam que os proprietários rurais utilizem dos
seus meios para evitar as ocupações (ou seja, repudiam jagunços e grupos
armados). Somente 4% concordam que os ruralistas devem usar dos seus
próprios recursos para garantir a reintegração da terra.
A maioria acredita que a solução da questão está a cargo do governo
e da justiça. Para quem historicamente se dispõe da arbitrariedade e da
violência para tratar as questões sociais, os contratantes da pesquisa
devem ter ficado desapontados com o resultado.
Na pesquisa, há mais uma tentativa desesperada dos ruralistas de
relacionar o governo Lula ao MST, insinuando que as ocupações de terra
são financiadas com recursos públicos. Porém, 35% dos entrevistados
acreditam que o governo federal é desfavorável ao MST, dado superado
apenas pela mídia, 40%, e o Congresso Nacional, 41%.
Assim, os dados indicam que a população não acredita na tese
defendida pelos ruralistas, que deseja que o governo federal e a
sociedade sejam contrários ao MST tanto quanto a eles. No que se refere à
ocupação das terras, mesmo que sejam latifúndios improdutivos, terras
griladas, ou propriedades que desenvolvem atividades ilegais, como o
trabalho escravo, 68% dos entrevistados discordam desse tipo de ação do
MST.
Embora 29% afirmam que a finalidade desta ação seja para assentar
as famílias que estão acampadas, enquanto 66% acreditam que serve para
pressionar o governo para fazer a reforma agrária. Os ruralistas tentam
convencer a população que a ocupação é um crime. Por isso, devem ser
combatidas com rigor, a ponto de utilizar deste argumento para a todo
custo aprovar um projeto de lei que torna a ocupação de terra um crime
hediondo, como o seqüestro, latrocínio e o tráfico de drogas.
E para deleite da Kátia Abreu, Ronaldo Caiado e quejandos, a
pesquisa alcançou a auge esperado no seguinte item: 82% dos
entrevistados afirmaram ser a favor da CPMI e 11% contra. Nesse sentido,
os ruralistas entendem que a população reprova o MST e concorda que
todas as tentativas de investigação, pois se trata de um movimento
criminoso.
A pesquisa também pondera ao seu público sobre os objetivos do MST,
que segundo o Ibope são três: a luta pela terra; a distribuição de
renda e a busca por uma sociedade mais justa e igualitária. Em termos
gerais, a CNA gostaria de saber se o seu discurso conservador e contra
os pobres tinha ressonância na sociedade, ou se a causa do MST era vista
popularmente como justa. E 88% dos entrevistados concordam com os
objetivos descritos, apesar de 57% desconfiarem que o MST esteja lutando
para tais fins. Enquanto 58% acham que o MST é legítimo porque são
trabalhadores querendo terra para trabalhar e morar, mas que não têm
condições de pagar por ela.
Assim, os ruralistas se defrontam com a legitimidade da reforma
agrária na sociedade e que a maioria da população considera justa a sua
causa. Daí se justifica a incessante tentativa de usarem o artifício de
criminalizar os movimentos sociais e suas lideranças, julgando-os
incapazes para atingir tal fim. Apesar de utilizar variados instrumentos
para tentar impedir o avanço da reforma agrária, a bancada ruralista
não conseguiu o argumento necessário para inviabilizar um projeto social
que conceba uma sociedade mais justa e igual e não conta com o apoio da
população brasileira.
quarta-feira, 14 de abril de 2010
Incra critica ação ilegal de ruralistas em Bagé
É lamentável que em nossa cidade ainda persiste esse pensamento atrasado e conservador, por que não, racista, por parte de alguns membros do ruralismo local. O original encontra-se no sitio rsurgente,
by Marco Aurélio Weissheimer.
A Superintendência Regional do Incra no RS divulgou nota oficial
criticando a situação de conflito criada em Bagé por proprietários
rurais que impediram, ontem, que funcionários do instituto ingressassem
na área da comunidade quilombola das Palmas, em processo de
regularização. A nota relata o ocorrido e lamenta a ação dos ruralistas:
A Superintendência Regional do Incra RS vem a público lamentar a
situação de conflito criada em Bagé por proprietários rurais. Hoje (13)
pela manhã, técnicos do Incra estiveram a campo iniciando o levantamento
fundiário necessário ao Relatório Técnico de Identificação e
Delimitação do território da comunidade quilombola das Palmas. Um grupo
de ruralistas cercou a equipe e não permitiu a realização do trabalho,
dentro da área do próprio quilombo, em atitude totalmente ilegal e
incompreensível.
Os servidores registraram queixa, e o Incra/RS está tomando
providências para a realização do levantamento em segurança.
Cabe ressaltar que a atitude desmedida deste grupo depõe contra
os avanços que o estado têm registrado nas políticas de reconhecimento
dos direitos das comunidades remanescentes de quilombo. São do RS as
duas primeiras comunidades quilombolas urbanas tituladas no país, no
resgate de uma dívida histórica que o Estado brasileiro tem com o povo
negro. Um avanço na cidadania, nos direitos humanos.
Em Bagé, a comunidade das Palmas habita a região há 200 anos. Em
2005, abriu processo no Incra para a regularização do seu território. Já
possui laudo sócio-histórico-antropológico feito por pesquisadores da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e o Incra/RS precisa iniciar
os demais estudos necessários para definir o território a ser titulado
em nome da comunidade.
Todo o processo é realizado de maneira pública, com muita
tranqüilidade, seguindo a legislação competente, com acompanhamento do
Ministério Público Federal. Uma vez publicado o RTID, há garantia de
prazo de contestação por quem quer que se sinta prejudicado.
Proprietários de áreas que devam ser desapropriadas são indenizados, a
preço de mercado, conforme os termos legais.
Por tudo isto, é lamentável a atitude de um grupo como este em
Bagé, que não buscou o diálogo, e sim o confronto. Só podemos entender
que esta seja, terrivelmente para os gaúchos, a manifestação explícita
de um racismo que tanto castiga o povo negro em nosso país, e que nos
envergonha. Os quilombolas vizinhos, na visão destes proprietários, não
têm o direito de registrar a sua própria terra.
Lamentamos esta atitude. Mas seguiremos o curso da história e da
lei, e o município de Bagé poderá se orgulhar de ter resgatado a
cidadania de seus quilombolas, quando a comunidade das Palmas estiver de
posse de seu título, depois de séculos de espera.
Em busca de uma alternativa socialista...
Gerald Cohen: Em busca de uma alternativa
socialista
“O Socialismo”, disse Albert Einstein, é
a tentativa da humanidade “superar e sobrepujar a fase predatória da
evolução humana”; e, para Gerald. A. Cohen, “todo mercado (...) é um
sistema predatório”. Essa é a essência do último livro de Cohen,
considerado pelo The Guardian como o maior filósofo político marxista
dos nossos dias. O propósito do autor, que morreu em agosto de 2009, é
assentar o que chama de as bases “preliminares” - uma tentativa que,
afinal, bem poderia chegar a ser derrotada por realidades inexoráveis –
de uma alternativa socialista.
Ellen Melksins Wood resenha o livro
póstumo de Gerald A. Cohen “Why not Socialism?” (Princeton, 83 pgs, ISBN
978 0 691 143613).
“O Socialismo”, disse Albert Einstein, é a
tentativa da humanidade “superar e sobrepujar a fase predatória da
evolução humana”; e, para Gerald. A. Cohen, “todo mercado (...) é um
sistema predatório”. Tal é a essência de seu último livro, breve porém
incisivo e elegantemente escrito (Cohen morreu em agosto passado). Seu
propósito é assentar o que chama de as bases “preliminares” - uma
tentativa que, afinal, bem poderia chegar a ser derrotada por realidades
inexoráveis – de uma alternativa socialista. É desejável, pergunta-se, e
se desejável, factível, construir uma sociedade movida por algo que não
seja a predação, que não responda às motivações “mesquinhas”, “baixas”,
“repugnantes” do mercado, mas que esteja antes dirigida por um
compromisso moral com a comunidade e com a igualdade?
Em seu estilo caracteristicamente lúcido, comprometido e delicadamente humorístico, Cohen começa imaginando um grupo de pessoas numa excursão para um camping. Nessas circunstâncias, sugere que a maioria das pessoas seriam “vigorosamente a favor de uma forma socialista de vida, preferindo-a outras alternativas factíveis”, comportando-se assim, pois, conforme aos princípios de igualdade e de comunidade, muito distintos dos que governam o comportamento normal no mercado. A questão é se esses princípios do acampamento poderiam ou deveriam ser postos em prática por obra do conjunto da sociedade. Na sua opinião, isso seria desejável para evitar os resultados necessariamente injustos dos mecanismos de mercado e as desigualdades que os acompanha. Mas é factivel?
Sobre isso, o veredito está por se pronunciar. É importante, insiste Cohen, distinguir entre dois tipos muito diferentes de obstáculos, os que emanam das limitações da natureza humana e os procedentes das limitações da tecnologia social; e conclui que nosso principal problema não é o egoísmo humano, mas a “carência do que chamamos de tecnologia organizativa adequada”. Trata-se, em outras palavras, de um problema de design. Mas, o fato de que não saibamos como desenhar a maquinaria social que teria de funcionar no socialismo não significa que nunca o poderemos ou que nunca o quereremos.
Cohen foca na idéia do “socialismo de mercado”, um sistema que estaria ainda fundado no mecanismo de preços, mas que evitaria a concentração de capital que gera o grosso das desigualdades do mercado capitalista. Isso, para ele, seria melhor que nada. É “o gênio do mercado que recruta motivações de baixa qualidade para fins desejáveis”; mas, o que os socialistas de mercado esquecem é que também há efeitos indesejáveis e que também esse seu tipo de mercado se orienta conforme esses motivos “mesquinhos”. Assim, pois, ele preferiria seguir buscando um meio de obter efeitos econômicos produtivos fundado em outras motivações.
As preocupações morais da filosofia de Cohen e – na sua análise dos mercados – e sua ênfase na moralidade das motivações poderiam parecer, à primeira vista, muito distantes; até diametralmente opostos à obra com que começou a se tornar conhecido: Karl Marx's Theory of History: A Defense (1978). O necrológio de Cohen publicado no The Guardian, em que ele é descrito como “comprovadamente o principal filósofo político da esquerda”, falou desse livro como de uma “reinterpretação revolucionária da teoria marxista”. Na realidade, o que Cohen produziu foi algo ainda mais audacioso. Era menos uma reinterpretação de Marx que uma defesa cerrada da interpretação mais ortodoxa.
É verdade, como se disse no Guardian, que aquilo que Cohen e seus colegas “marxistas analíticos” gostavam de chamar de o “no-bullshit Marxism” ou o “marxismo não charlatão”(1) arrastaram a teoria marxista para o vão da “ciência social burguesa da corrente principal”, aplicando-lhe as técnicas linguísticas e lógidas da filosofia analítica; só isso já era uma façanha. A teoria que ele defendia, cuja substância era um determinismo tecnológico, devia menos a Marx que a intérpretes posteriores, como Georgi Plejánov; mas terminou sendo tomada como a essência do materialismo histórico, no modo como o entendiam tanto os ideólogos dos partidos comunistas quanto os antimarxistas mais furibundos. O que tornou o projeto de Cohen ainda mais notório foi que, na época em que publicou sua defesa, essa ortodoxia tinha sido vigorosamente desafiada por historiadores que trabalhavam na tradição marxista, desde E.P.Thompson a Robert Brenner; e o velho determinismo tecnológico já tinha cedido espaço a interpretações muito diferentes de Marx.
É verdade que, uma vez descoberto, não é provável que todo progresso chegue a desaparecer por completo. Mas a compulsão primordial de melhorar constantemente as forças técnicas de produção não é uma lei geral da história. É, para bem ou para o mal, uma característica específica de uma forma social, o capitalismo. Seu modo particular de exploração, à diferença de quaisquer outro gera, como condição mesma de sua sobrevivência, uma compulsão implacável de melhorar a produtividade e, assim, de rebaixar os custos do trabalho, a fim de satisfazer e maximizar o lucro.
Embora as inevitabilidades históricas do determinismo tecnológico de Cohen tenham sido traduzidas por outros marxistas analíticos na linguagem da “eleição racional”, parecia haver nesse determinismo pouca margem para a eleição moral ou para as motivações morais, como forças históricas dinâmicas. Sem embargo, sua carreira intelectual subsequente se consagrou na questão da justiça e da igualdade socialistas, que estão no núcleo de seu último livro. Pareceria um caminho distante desde sua peculiar variedade de marxismo; e, visto que terminou descrevendo a si mesmo como um “ex-marxista”, poderíamos nos ver tentados a deixar as coisas assim, limitando-nos a concluir que, tendo repudiado o marxismo, e com ele quaisquer ilusões sobre o curso necessário da história, restou livre para pensar sobre o socialismo, não em termos de algo historicamente inevitável, mas como uma opção moral.
As coisas, porém, não são simples assim. Se contrastarmos o marxismo de Cohen com outras versões disponíveis, o que salta aos olhos é a congruência entre seu precoce determinismo tecnológico e sua filosofia moral dos últimos anos de vida. Não só porque seguiu apaixonadamente compromissado, como ex-marxista não menos que como marxista ortodoxo, com os valores socialistas e em especial com a igualdade. O certo é que sua teoria da história também está conectada com sua filosofia moral, no sentido de que ambas, afinal, são a-históricas. Isso é óbvio o suficiente quando referido nas abstrações da filosofia analítica, mas parece algo estranho se atribuído a uma teoria da história. O fato é que resulta extremamente difícil sustentar esse tipo de determinismo transhistórico [em termos kantianos, transcendental], sem se desinteressar dos processos históricos: não só das particularidades e das contingências do tempo e lugar, mas dos princípios diferencialmente operantes em cada modo específico de organizar a vida social.
(1) Bullshit é expressão da língua inglesa falada nos EUA e muito popular, que o filósofo Harry Frankfurt tomou de empréstimo para se referir a trabalhos intelectuais que não são exatamente nem falsários nem mentirosos, mas algo ainda pior, porque o falsário ou mentiroso são capazes de distinguir o verdadeiro do falso, ao passo que o bullshiter perdeu até essa capacidade.
(*) Ellen Meiksins Wood foi durante muitos anos professora de ciência política e filosofia na York University de Toronto, Canadá e também fez parte do comitê editorial da New Left Review. Entre 1997 e 2000 co-editou, junto com Paul Sweezy e Harry Magdoff, a revista estadunidense Monthlly Review. De orientação marxista, Wood publicou recentemente: “Citizens to Lords: A Social History of Western Political Thought from Antiguity to Middle Ages (Verso, London, 2008), The Origin of Capitalism: A Longer View (Verso, London, 2002). No Brasil, a Boitempo Editorial publicou Democracia contra Capitalismo: A Renovação do Materialismo Histórico, em 2003.
Tradução: Katarina Peixoto
Em seu estilo caracteristicamente lúcido, comprometido e delicadamente humorístico, Cohen começa imaginando um grupo de pessoas numa excursão para um camping. Nessas circunstâncias, sugere que a maioria das pessoas seriam “vigorosamente a favor de uma forma socialista de vida, preferindo-a outras alternativas factíveis”, comportando-se assim, pois, conforme aos princípios de igualdade e de comunidade, muito distintos dos que governam o comportamento normal no mercado. A questão é se esses princípios do acampamento poderiam ou deveriam ser postos em prática por obra do conjunto da sociedade. Na sua opinião, isso seria desejável para evitar os resultados necessariamente injustos dos mecanismos de mercado e as desigualdades que os acompanha. Mas é factivel?
Sobre isso, o veredito está por se pronunciar. É importante, insiste Cohen, distinguir entre dois tipos muito diferentes de obstáculos, os que emanam das limitações da natureza humana e os procedentes das limitações da tecnologia social; e conclui que nosso principal problema não é o egoísmo humano, mas a “carência do que chamamos de tecnologia organizativa adequada”. Trata-se, em outras palavras, de um problema de design. Mas, o fato de que não saibamos como desenhar a maquinaria social que teria de funcionar no socialismo não significa que nunca o poderemos ou que nunca o quereremos.
Cohen foca na idéia do “socialismo de mercado”, um sistema que estaria ainda fundado no mecanismo de preços, mas que evitaria a concentração de capital que gera o grosso das desigualdades do mercado capitalista. Isso, para ele, seria melhor que nada. É “o gênio do mercado que recruta motivações de baixa qualidade para fins desejáveis”; mas, o que os socialistas de mercado esquecem é que também há efeitos indesejáveis e que também esse seu tipo de mercado se orienta conforme esses motivos “mesquinhos”. Assim, pois, ele preferiria seguir buscando um meio de obter efeitos econômicos produtivos fundado em outras motivações.
As preocupações morais da filosofia de Cohen e – na sua análise dos mercados – e sua ênfase na moralidade das motivações poderiam parecer, à primeira vista, muito distantes; até diametralmente opostos à obra com que começou a se tornar conhecido: Karl Marx's Theory of History: A Defense (1978). O necrológio de Cohen publicado no The Guardian, em que ele é descrito como “comprovadamente o principal filósofo político da esquerda”, falou desse livro como de uma “reinterpretação revolucionária da teoria marxista”. Na realidade, o que Cohen produziu foi algo ainda mais audacioso. Era menos uma reinterpretação de Marx que uma defesa cerrada da interpretação mais ortodoxa.
É verdade, como se disse no Guardian, que aquilo que Cohen e seus colegas “marxistas analíticos” gostavam de chamar de o “no-bullshit Marxism” ou o “marxismo não charlatão”(1) arrastaram a teoria marxista para o vão da “ciência social burguesa da corrente principal”, aplicando-lhe as técnicas linguísticas e lógidas da filosofia analítica; só isso já era uma façanha. A teoria que ele defendia, cuja substância era um determinismo tecnológico, devia menos a Marx que a intérpretes posteriores, como Georgi Plejánov; mas terminou sendo tomada como a essência do materialismo histórico, no modo como o entendiam tanto os ideólogos dos partidos comunistas quanto os antimarxistas mais furibundos. O que tornou o projeto de Cohen ainda mais notório foi que, na época em que publicou sua defesa, essa ortodoxia tinha sido vigorosamente desafiada por historiadores que trabalhavam na tradição marxista, desde E.P.Thompson a Robert Brenner; e o velho determinismo tecnológico já tinha cedido espaço a interpretações muito diferentes de Marx.
É verdade que, uma vez descoberto, não é provável que todo progresso chegue a desaparecer por completo. Mas a compulsão primordial de melhorar constantemente as forças técnicas de produção não é uma lei geral da história. É, para bem ou para o mal, uma característica específica de uma forma social, o capitalismo. Seu modo particular de exploração, à diferença de quaisquer outro gera, como condição mesma de sua sobrevivência, uma compulsão implacável de melhorar a produtividade e, assim, de rebaixar os custos do trabalho, a fim de satisfazer e maximizar o lucro.
Embora as inevitabilidades históricas do determinismo tecnológico de Cohen tenham sido traduzidas por outros marxistas analíticos na linguagem da “eleição racional”, parecia haver nesse determinismo pouca margem para a eleição moral ou para as motivações morais, como forças históricas dinâmicas. Sem embargo, sua carreira intelectual subsequente se consagrou na questão da justiça e da igualdade socialistas, que estão no núcleo de seu último livro. Pareceria um caminho distante desde sua peculiar variedade de marxismo; e, visto que terminou descrevendo a si mesmo como um “ex-marxista”, poderíamos nos ver tentados a deixar as coisas assim, limitando-nos a concluir que, tendo repudiado o marxismo, e com ele quaisquer ilusões sobre o curso necessário da história, restou livre para pensar sobre o socialismo, não em termos de algo historicamente inevitável, mas como uma opção moral.
As coisas, porém, não são simples assim. Se contrastarmos o marxismo de Cohen com outras versões disponíveis, o que salta aos olhos é a congruência entre seu precoce determinismo tecnológico e sua filosofia moral dos últimos anos de vida. Não só porque seguiu apaixonadamente compromissado, como ex-marxista não menos que como marxista ortodoxo, com os valores socialistas e em especial com a igualdade. O certo é que sua teoria da história também está conectada com sua filosofia moral, no sentido de que ambas, afinal, são a-históricas. Isso é óbvio o suficiente quando referido nas abstrações da filosofia analítica, mas parece algo estranho se atribuído a uma teoria da história. O fato é que resulta extremamente difícil sustentar esse tipo de determinismo transhistórico [em termos kantianos, transcendental], sem se desinteressar dos processos históricos: não só das particularidades e das contingências do tempo e lugar, mas dos princípios diferencialmente operantes em cada modo específico de organizar a vida social.
(1) Bullshit é expressão da língua inglesa falada nos EUA e muito popular, que o filósofo Harry Frankfurt tomou de empréstimo para se referir a trabalhos intelectuais que não são exatamente nem falsários nem mentirosos, mas algo ainda pior, porque o falsário ou mentiroso são capazes de distinguir o verdadeiro do falso, ao passo que o bullshiter perdeu até essa capacidade.
(*) Ellen Meiksins Wood foi durante muitos anos professora de ciência política e filosofia na York University de Toronto, Canadá e também fez parte do comitê editorial da New Left Review. Entre 1997 e 2000 co-editou, junto com Paul Sweezy e Harry Magdoff, a revista estadunidense Monthlly Review. De orientação marxista, Wood publicou recentemente: “Citizens to Lords: A Social History of Western Political Thought from Antiguity to Middle Ages (Verso, London, 2008), The Origin of Capitalism: A Longer View (Verso, London, 2002). No Brasil, a Boitempo Editorial publicou Democracia contra Capitalismo: A Renovação do Materialismo Histórico, em 2003.
Tradução: Katarina Peixoto
Assinar:
Postagens (Atom)