Escrito por Eduardo Almeida no Correio da Cidadania | |
O "Chomsky Verde" não poupa palavras para alertar sobre a crise
invisível da fome. Claro e incisivo em suas opiniões, Devinder Sharma é o
tipo de entrevistado que coloca o editor numa situação complicada.
Pinçar o mais importante entre tantas colocações cruciais torna-se um
desafio técnico.
Devinder Sharma, 55 anos, é jornalista, escrevendo e mantendo colunas
em um punhado de jornais editados em diferentes línguas indianas – e
freqüentemente é solicitado para foros de debate e entrevistas,
inclusive pela rede americana CNN. Sharma mantém seu blog "Ground
Reality", Realidade Nua e Crua, numa tradução livre, focado no debate
sobre políticas para alimentação, agricultura e fome (http://devinder-sharma.blogspot.com/) - visitado por dezenas de milhares de internautas em todo o mundo, sobretudo formadores de opinião.
Sharma mora em Nova Deli, onde dirige uma iniciativa independente
chamada Foro para a Biotecnologia e Segurança Alimentar. Autodefine-se
como um "analista sobre políticas para alimentação e comércio". Tem
formação agronômica, sendo reconhecido estudioso e pensador sobre o
desenvolvimento, a sustentabilidade e a fome, tema de livros que tem
publicado. Chomsky Verde foi o apelido que ganhou do semanário indiano The Week
no ano passado pela similaridade de sua postura crítica ampla e aguda
com a do famoso lingüista e pensador americano Noam Chomsky. Devinder
Sharma ainda encontra tempo para constantes visitas e debates em
comunidades rurais de seu país.
A passagem recente pelo Brasil aprofundou sua análise sobre o país.
As conclusões são pouco lisonjeiras. Confessa-se "assombrado diante do
modo como as empresas de agronegócio, incluindo gigantes internacionais,
controlam a economia brasileira", sem entender como o Brasil, com todo o
"vasto celeiro de biodiversidade e riqueza genética que possui",
prefere um modelo de desenvolvimento rural que "marginaliza as
comunidades rurais e deixa rastros profundos de destruição ecológica".
Em tempos de crise financeira mundial e emergências globais, Sharma
denuncia o aumento da fome no mundo e acentua o protagonismo popular na
superação das crises, lembrando Ghandi – "Ele nos disse que se faz
necessário um sistema de produção pelas massas e não para as massas".
Não faz por menos, detona em série com os modelos atuais de
desenvolvimento – "a ‘economia do crescimento’ que as economias
emergentes perseguem é, na realidade, nada mais que economia da
violência"; com o endeusamento do PIB – "é uma cortina de fumaça para
que o rico explore o pobre"; com o capitalismo wallstreetiano – "levará o
mundo na direção da extinção da espécie humana"; com a democracia tal
como se apresenta hoje no mundo, com a ONU, sobrando ainda para os
economistas.
Apresentado por colega comum de rede de discussão ao jornalista free
lancer baiano Eduardo Almeida, Sharma concedeu a entrevista pela
internet.
O senhor esteve por sete dias no Brasil recentemente. Esse país tem
estado em evidência em temas contraditórios que são objeto de suas
preocupações: a luta contra a fome e o agronegócio de grande escala com
elevado apetite por desmatamento e organismos geneticamente modificados
(OGMs). O que mais lhe chamou a atenção no Brasil?
Devinder Sharma: Eu vim ao Brasil a convite da AS-PTA (Assessoria
e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa, ONG brasileira
dedicada à agroecologia e agricultura familiar) para participar de uma
conferência internacional, no Rio de Janeiro, sobre alimentos e lavouras
geneticamente modificados. A conferência congregou ativistas,
especialistas, ONGs, representantes governamentais e de organizações de
produtores da Índia, Brasil e África do Sul - nações que formam o IBSA
–, além de outros países. Em certo sentido, o evento foi focado em
fortalecer o movimento anti-transgênicos no Brasil. Sabendo que o Brasil
vem adotando crescentemente lavouras geneticamente modificadas, e já
tomou o lugar da Argentina como país com maior área de lavouras GM
(geneticamente modificadas) na América do Sul, foi importante ter um uma
compreensão, em primeira mão, das razões que estão por trás dessa
crescente difusão das lavouras GM, e, ao mesmo tempo, conhecer a luta
das pessoas contra esse tipo de agricultura.
Além disso, na semana em que estive no Brasil, busquei informações sobre
duas outras áreas de meu interesse. Uma se relaciona ao Programa Fome
Zero, que o presidente Lula lançou entre 2003 e 2004, e a outra diz
respeito à formidável reviravolta que o Brasil realizou em desenvolver
gado puro de algumas raças indianas e ainda se tornando importante
exportador dessas raças para a América Latina, África e Ásia. Essas
raças bovinas proporcionam rendimentos em leite comparáveis às raças
Jersey e holandesa, enquanto suas primas pobres na Índia são tachadas de
‘improdutivas’, com capacidade de produção de leite muito baixa.
As crescentes ações do Brasil em outros países tropicais,
especialmente da África e América Latina, difundem tecnologias para
produções de grãos e carne em larga escala, ao estilo "revolução verde",
em pacotes que freqüentemente incluem transgênicos, química pesada e
pouco cuidado com o meio ambiente. O senhor acha que a dita "estória de
sucesso do moderno agronegócio brasileiro" é um bom espelho para países
tropicais em desenvolvimento?
Devinder Sharma: Este é um motivo para grave inquietação. A
guinada deliberada do Brasil, de uma agricultura sustentável, utilizando
o vasto celeiro de biodiversidade e riqueza genética que possui, para a
agricultura industrial, que é ecologicamente destrutiva e leva ao
aquecimento global, vem não apenas resultando na marginalização das
comunidades rurais como também deixando rastros profundos de destruição
ecológica, cujos custos serão assumidos pelas gerações futuras. A dívida
ecológica que o Brasil tem criado no processo supera o ganho econômico
de curto prazo que ele visa. Como não há jeito de medir o rastro de
destruição ecológica em termos econômicos, o Brasil parece inteiramente
despreocupado.
Eu fico assombrado diante do modo como as empresas de agronegócio,
incluindo gigantes internacionais, controlam a economia brasileira. O agrobusiness prospera
na destruição das florestas originais, no envenenamento dos solos,
minando as águas subterrâneas e contaminando a cadeia alimentar. Estudos
recentes evidenciam que os pequenos produtores são os mais atingidos, e
acabam migrando em massa para as cidades. Não obstante, o ministro da
Agricultura, assim como o (da Indústria e) do Comércio, parece
simplesmente facilitar a encampação empresarial da agricultura e, assim,
almejam políticas agrícolas e comerciais que não projetam nem protegem
os interesses de produtores e do meio de vida, não apenas do Brasil, mas
também de outros países em desenvolvimento.
Que papel o senhor espera que Estados Democráticos como a Índia e o
Brasil podem desempenhar na construção de uma Nova Ordem Mundial livre
da fome, com agricultura sustentável, respeito pela biodiversidade, com
justiça social e comércio justo? Sendo o seu país considerado a maior
democracia do Mundo e tendo o senhor uma abordagem crítica sobre a
relutância do governo indiano em prevenir situações de opressão social,
qual o problema com a Democracia? Falhando em garantir poder real ao
povo em tantos países, deve a Democracia ser aprofundada e redesenhada?
Devinder Sharma: Houve um tempo em que Abraham Lincoln afirmou
que "a democracia é do povo, pelo povo e para o povo". Hoje, as
propaladas democracias ao redor do mundo, incluindo a Índia, o Brasil e
os Estados Unidos, tornaram-se "da indústria, pela indústria e para a
indústria". Gigantes democráticos do mundo em desenvolvimento – Brasil,
Índia, África do Sul – estão ocupados criando uma nova ordem mundial
onde o interesse empresarial reine supremo. Os governos em todos esses
países perderam o contato com as massas e seguem um modelo econômico que
não enxerga nada além de negócios, comércio e indústria.
Na Índia, que reivindica o título de maior democracia do mundo, não há
justificativa plausível para o fato de que um terço da população de 1,2
bilhões de pessoas esteja vivendo com fome. Com quase 47% das crianças
com idade inferior a seis anos subnutridas, e com 55% da população
classificada pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento) como afetada pela pobreza, a Índia projeta-se a si
mesma como uma superpotência emergente. Nos anos recentes, desde que a
Índia se antecipou na liberalização econômica, as disparidades
econômicas têm apenas aumentado. Os ricos se tornaram mais ricos e os
pobres vêm sendo empurrados contra a parede. O gradual apossamento dos
recursos naturais pela indústria tem criado um sentimento de
desesperança entre as comunidades tribais. O aprofundamento da
desconfiança, entre os mais pobres das regiões mais pobres do país, em
relação às políticas de governo é de tal ordem que quase um terço do
país, principalmente o rico cinturão mineral (estados do Nordeste e
Centro-Norte da Índia), enfrenta rebeliões lideradas pelos maoístas.
Eu me admiro como a Índia pode ser uma orgulhosa democracia se
sucessivos governos têm falhado em satisfazer as aspirações da maioria
da população. Como fome e pobreza podem existir em escala tão dramática
numa democracia? A projeção do crescimento econômico, onde se reivindica
ter a segunda maior taxa de crescimento econômico, pouco se espelha nas
realidades. Os governos perderam o contato com as massas e o poder real
está nas mãos do empresariado. Tanto é assim que a maioria dos
representantes populares eleitos para o Parlamento agora são
milionários. Você não pode vencer uma eleição se não for rico. A
verdadeira essência da democracia, conseqüentemente, se perdeu. A
democracia se tornou uma ‘Empresariocracia’. Acredito fortemente que é
chegado o tempo de uma revisão sobre o significado de democracia.
Na medida em que se submetem ao controle empresarial, as democracias
perdem essência e comprometem o papel para o qual foram concebidas por
nossos antepassados. Quero dizer, o mundo dos negócios, certamente, não
vai nos propiciar equidade e justiça.
O senhor tem sustentado que os mercados de capitais são os principais
protagonistas do esgotamento dos recursos naturais em escala planetária
e na manutenção da fome e da injustiça. O neoliberalismo disseminou a
idéia de que o capitalismo ainda é o grande propulsor do desenvolvimento
e, de fato, países emergentes, como Índia, China e Brasil, têm crescido
a altas taxas em parte devido a grandes influxos de capital. Acredita
em caminhos alternativos ao desenvolvimento que beneficiem as maiorias e
minorias excluídas de modos social e ambientalmente sustentáveis?
Devinder Sharma: Não há outra inovação – se você não gosta do
termo invenção – nos tempos recentes que não apenas influenciou, mas
acelerou o processo do consumo desenfreado do que a emergência de Wall
Street. De fato, os economistas podem se recusar a aceitar isso agora e
por razões óbvias, mas os mercados de capitais levarão o mundo na
direção da extinção da espécie humana, como nos alertou o cientista
australiano Frank Fenner.
Eu fico impressionado com a maneira como opera o mercado de capitais. Esses mercados transformaram tudo em commodity.
Grande parte dos males ambientais do mundo é conseqüência direta do
mercado de capitais. Os mercados de capitais sugarão cada gota d’água –
ou outro recurso natural – do planeta. Há um preço para tudo, incluindo o
ar que você respira.
A ‘economia do crescimento’ que as economias emergentes perseguem é, na
realidade, nada mais que economia da violência. Ela desencadeia
violência contra os recursos naturais, contra o clima, contra a natureza
e também contra o próximo, o ser humano. Ela retira os recursos
naturais, físicos e também financeiros das mãos dos pobres para os
bolsos dos ricos e das elites. Dizem-nos freqüentemente que os 20% de
providos da população mundial controlam e usam os recursos dos 80% dos
desprovidos. A globalização reforça ainda mais esse monopólio e amplia
as disparidades já existentes. Tira recursos das mãos dos pobres para
adicionar à fortuna dos ricos.
Muitos pensadores e economistas de sensibilidade social têm
argumentado que é inevitável primeiro alavancar o PIB por todos os meios
e somente depois implementar políticas de distribuição de rendas. Como o
senhor concebe o desenvolvimento no quadro internacional atual?
Devinder Sharma: Os economistas são uma raça esperta. Eles
conceberam o PIB como um indicador de crescimento. Eles o moldaram com
tanta destreza que nós aceitamos um indicador de riqueza pessoal como um
ponteiro para o desenvolvimento nacional.
Quanta ilusão de crescimento eles criaram. Eles fizeram com que tudo, incluindo o clima global, se pareça com uma commodity
a ser vendida e explorada. Quanto mais você explora, mais o PIB sobe.
Você pode destruir um país numa guerra, e então você o reconstrói e o
PIB se eleva. Isso é o que aconteceu com o Iraque.
O PIB, para o leigo, significa o montante de dinheiro que troca de mãos.
Se você compra um carro, o PIB sobe. Se você corta uma árvore, o PIB
sobe. Mas se você preserva a árvore, o PIB pode não crescer. Agora você
tem que decidir se precisa da árvore ou do PIB.
Se você visualizar globalmente, o aumento no PIB não tem levado a
desenvolvimento integral. Mesmo nos Estados Unidos, o país mais rico do
mundo, a fome quebrou um recorde de 14 anos. Hoje, uma em cada 10
pessoas passa fome. A menos que a gente reverta essa prescrição
deformada de crescimento econômico, nós nunca teremos a renda sendo
distribuída razoavelmente em qualquer população. Vale lembrar, o PIB não
é a pedra de toque do desenvolvimento. Ele é uma cortina de fumaça para
que o rico explore o pobre.
No contexto da atual crise econômica e seu impacto sobre a
agricultura e a segurança alimentar, que diretrizes e abordagens, em sua
opinião, devem ser adotadas por países em desenvolvimento no sentido de
prevenir desastres e retomar o desenvolvimento social sustentável?
Devinder Sharma: O colapso econômico atual trouxe globalmente US$
20 trilhões em pacotes de ajuda. Esses pacotes beneficiaram bancos e
firmas de investimento que, na verdade, deveriam ter sido penalizadas
por levar a economia mundial à beira do precipício. Ao invés disso, eles
receberam aplausos e honrarias pelo crime econômico que cometeram com
toda impunidade.
A questão que precisa ser colocada é: por que o mundo injetou tanto
dinheiro em bancos e empresas de investimento? A resposta é que o
objetivo é manter o fluxo financeiro, que permitirá aos governos manter o
ritmo do crescimento econômico. Eu tenho perguntado constantemente onde
está o objetivo subjacente dessa generosidade. A resposta que obtenho é
de que o objetivo é reduzir a fome e a pobreza ao proporcionar
oportunidade de renda e meios de vida. Se não há crescimento não haverá
oportunidades para criação de meios de vida. Isso é certamente
divertido, com jeito de arrogância intelectual beirando a estupidez.
O que está sendo camuflado é que o mundo necessita apenas de US$ 1
trilhão para eliminar a fome, doenças e pobreza da face do planeta. Nós
não temos dinheiro para isso. Mas nós temos US$ 20 trilhões para
socorrer os corruptos e escroques dos negócios e da indústria.
Superar as barreiras políticas, econômicas e ideológicas estruturais
ao desenvolvimento social e sustentável, incluindo zerar a fome,
certamente não é tarefa fácil. Como poderemos lidar, nessa luta, com os
desafios extras representados pelas chamadas emergências globais, como
aquecimento global, mudanças climáticas, perda de biodiversidade e crise
energética?
Devinder Sharma: As barreiras estruturais ao desenvolvimento
social e sustentável, incluindo combater a fome, estão, na verdade,
entremeadas nas políticas neoliberais equivocadas. Os desafios extras
das mudanças climáticas, aquecimento global, perda de biodiversidade e
da sempre crescente crise energética são também resultados do paradigma
do crescimento.
Deixe-me fazer uma pergunta. Se a prescrição econômica para a economia
global que o mundo vem seguindo é tão boa, por favor, me diga por que o
mundo chegou a essa beira de precipício? Por que os recursos naturais do
planeta foram poluídos e pilhados? Por que os rios estão fluindo sujos,
e por que as fontes de água limpa estão todas secando?
Por que a biodiversidade tem desaparecido a um ritmo tão alarmante,
trazendo o mundo mais próximo da extinção? Por que motivo o IPCC (Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, promovido pela ONU) chega
ao ponto de nos alertar que, se não procedermos a uma mudança radical
no modo em que o mundo progride, não haverá tempo suficiente para evitar
um colapso da população humana? Essa é uma clara denúncia das políticas
econômicas que o mundo foi levado a seguir. As emergências que você
menciona são o resultado de um pensamento econômico grosseiramente
falho.
A resposta está no que Mahatma Gandhi nos falou. Ele disse que a Terra tem o suficiente para a necessidade de cada um, mas não para a ganância. Ele também nos disse que se faz necessário um sistema de produção pelas massas e não para
as massas. Esse, em essência, é o fundamento do conceito de soberania
alimentar de que a sociedade civil fala. Ao invés de fomentar o livre
comércio, usando a OMC (Organização Mundial do Comércio) como agente
policial para basicamente disponibilizar mercado à produção agrícola
altamente subsidiada dos países da OCDE (Organização de Cooperação e
Desenvolvimento Econômico, ou "Clube dos Países Ricos"), o mundo deve
voltar-se ao atendimento da auto-suficiência alimentar. Tornar os países
dependentes de importações de alimentos é uma receita para o desastre,
mas certamente soma para o PIB e, o que não é dito, quanto mais
comércio, mais aquecimento global.
Contudo, você se surpreenderá em saber que nos últimos 30 e poucos anos,
desde que o Banco Mundial e o FMI começaram os programas de ajustes
estruturais, 105 dos 149 países do Terceiro Mundo se tornaram
importadores de alimentos. Se a Rodada de Doha, da forma como tem sido
concebida, chegar a uma conclusão em breve, escreva o que estou dizendo,
o restante dos países do Terceiro Mundo também se tornará importador de
alimentos a qualquer momento. E não se esqueça: importar alimentos é
como importar desemprego. Os alimentos se tornarão, então, a mais forte
das armas políticas.
Como o senhor avalia o papel exercido pelas Nações Unidas e seu
Sistema (PNUD, FAO e outras) no esforço para enfrentar os principais
problemas da Humanidade? A ONU estabeleceu os Objetivos do Milênio (ODM)
a serem atingidos em 2015. Isso irá funcionar?
Devinder Sharma: Os Objetivos do Milênio não vão dar certo.
Lembro que quando a Cúpula Mundial sobre Alimentação, em 1996 (em Roma),
anunciou que é criminoso observar 24.000 pessoas sucumbindo ante a fome
todos os dias e os dirigentes internacionais manifestavam urgência no
enfrentamento da fome, prometendo reduzir em 50% as estimadas 842
milhões de pessoas famintas até 2015, eu reagi com choque e desgosto.
Disse, então, que isso é um caso clássico de desonestidade política.
Pelo tempo que o mundo promete reduzir à metade o número de famintos,
considerando que 24.000 pessoas morrem de fome todos os dias em algum
lugar, 128 milhões de pessoas podem ter sucumbido apenas pela fome. Como
isso pode ser classificado como emergência? Não seria isso um crime
contra a Humanidade?
Os ODM meramente reiteraram a promessa da Cúpula Mundial sobre a
Alimentação. E, como sabemos hoje, o número de famintos na verdade
aumentou: de 842 milhões em 1996 para 1,1 bilhão em 2010. A ONU pode com
certeza se vangloriar, se mostrar satisfeita com sua ‘grande’ missão
humanitária. Mas a realidade é que a ONU não é nada melhor que o Banco
Mundial. A linha fronteiriça entre a ONU e o Banco Mundial foi borrada
com o passar dos anos.
Quais as suas visões sobre Cooperação Sul-Sul? Países como Índia e
Brasil compartilham condições similares em muitos aspectos, mas
continuam mantendo relativamente fracos comércio e intercâmbio
técnico-científico. Velhos vínculos Norte-Sul, heranças estruturais do
colonialismo, parecem colidir com a perspectiva de os países do Terceiro
Mundo se associarem no enfrentamento de desafios comuns. O que o senhor
acha que Índia e Brasil poderiam fazer em conjunto pelo avanço da luta
contra a fome e pelo desenvolvimento sustentável em seus respectivos
países e em outros?
Devinder Sharma: Cooperação Sul-Sul soa agradável. Os acadêmicos
têm usado isso em resposta ao "fator NHA" (não há alternativa). Eu
sempre acho graça quando ouço falar em cooperação Sul-Sul. Eu não
conheço nenhum país do Sul que não almeje imitar o Norte. O que quer que
os líderes políticos possam dizer, eles se sentem honrados quando
convidados a se alinhar para a foto nas cúpulas do G20. Os acadêmicos
fazem o mesmo; os economistas, claro, extrapolam. Se você observa os
currículos, lá está a menção orgulhosa de universidades do Norte que
eles visitaram ou onde realizaram trabalhos.
Mesmo quando o presidente Lula e o primeiro-ministro Manmohan Singh
falam em colaboração bilateral, no mais das vezes é para promover o
mesmo sistema que eles tomam emprestado dos países ocidentais. Na
verdade, a cooperação Sul-Sul, quando existe, é construída sobre os
mesmos princípios de exploração. O ‘big brother’ faz exatamente o mesmo,
com seu primo menor, que os Estados Unidos fazem com a Índia e o
Brasil.
Isso não significa que a cooperação Sul-Sul não seja possível. Tudo que
ela precisa como ponto de partida é confiança e respeito. Isso só é
possível se o líder do país mais desenvolvido exibe estadismo político e
se abstém do papel de peixe grande que come o peixe menor. Tenhamos
esperança de que, algum dia, alguém mostre sagacidade política e uma
nova ordem possa então surgir.
A título de exemplo, está sendo anunciado na África um programa ambicioso, o AGRA – Aliança para a Revolução Verde na África (Alliance for Green Revolution in África)
-, com o objetivo de incrementar a produção agrícola. Kofi Annan
(ex-Secretário Geral da ONU) está à frente desta iniciativa.
Lamentavelmente, esse programa é baseado em agricultura industrial e
incentiva o domínio empresarial da agricultura.
A AGRA não é o que a África precisa. Nesse caso, melhor teria sido a
África buscar cooperação Sul-Sul com países em desenvolvimento,
apostando em sistemas agrícolas que não matam os agricultores. A África
precisaria aprender as lições do fiasco da revolução verde na Índia.
Mais de 200 mil camponeses cometeram suicídio nos últimos 15 anos na
Índia, essencialmente porque a equação da revolução verde deu errado.
Estou certo de que os líderes africanos não desejam que seus camponeses
morram. Portanto a África não precisa da AGRA, mas sim da ‘SAGRA’ -
Agricultura Sustentável para a África (Sustainable Agriculture for Africa).
No começo de setembro, Moçambique foi palco de agitações populares.
Sete pessoas foram mortas quando manifestantes se mostraram
inconformados com o aumento do preço do pão. O senhor acha que isso pode
indicar uma nova crise de alimentos mundial como se esboçou em
2007-2008?
Devinder Sharma: As manifestações por comida em Moçambique e as
crescentes tensões no Paquistão, Egito e Rússia siberiana por causa da
espiral altista de preços de alimentos evidenciam a crise mundial de
alimentos e suas vulnerabilidades. Apesar de a FAO-ONU mostrar
preocupações – mas não o receio de repetição da crise de 2007-2008 –,
não se vê nenhuma iniciativa em superar os desequilíbrios do sistema de
gerenciamento dos alimentos que ocasionam a crise. Enquanto o mundo
assiste a agitações populares por alimentos em 37 países, os estoques de
grãos de empresas multinacionais e de tradings deram um salto.
Não se vê nenhum aprendizado com a débâcle que aconteceu em
2007-2008. Na verdade, o G-20 tem encorajado uma repetição do problema.
Ele tem orientado seus países membros a remover tudo que impeça
investimentos estrangeiros diretos em varejo de alimentos e, ao mesmo
tempo, pressiona agressivamente os países em desenvolvimento a removerem
todas as barreiras comerciais nos Acordos de Livre Comércio e outros
tratados regionais. Os países em desenvolvimento, portanto, têm se
tornado cada vez mais importadores de alimentos. Observemos que
Moçambique teve suas manifestações populares quando a Rússia impôs
proibição à exportação de trigo por mais um ano após uma seca severa e
incêndios no campo.
O que aconteceu em Moçambique nesse setembro é algo que pode se repetir
em qualquer lugar nos anos vindouros. A menos que o mundo incentive os
países em desenvolvimento e os menos desenvolvidos a se tornarem
auto-suficientes em grãos alimentares, a ameaça iminente de distúrbios
continuará sobre a cabeça das nações como espadas de Dâmocles.
Entretanto, como o assunto afeta os interesses dos gigantes do
agronegócio, o G-20 prefere encarar de outra maneira.
Eduardo Almeida é jornalista.
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Você tem que se decidir: a árvore ou o PIB?
Crise social em Portugal...
1/5 dos que recebem apoio social não tem o que comer
Existem quase cinco mil pessoas na fila de espera
e a maioria esmagadora das 200 mil que recorrem ao Banco Alimentar são
mulheres. Metade dos que procuram comida ganha menos de 250 euros.
Foto Paulete Matos.
Mais de um quinto das pessoas que procuram instituições de
solidariedade sente falta de alimentos pelo menos uma vez por semana,
segundo um inquérito realizado pela Universidade Católica, em parceria
com o Banco Alimentar e a Associação Entreajuda.
Do universo de 4691 usuários de mais de 500 instituições que responderam
aos questionários, 27 por cento mencionaram estar um dia inteiro sem
comer algumas vezes por semana ou pelo menos uma vez.
“Vinte por cento diz não ter comida até ao final do mês, 32 por cento
diz que tal acontece às vezes e 49 por cento diz ter sempre comida até
ao fim do mês”, refere ainda o estudo divulgado este domingo.
Sessenta e seis mil famílias recorrem à rede do Banco Alimentar Contra a
Fome (BACF) o que corresponde a mais de 200 mil pessoas, segundo a
análise da Universidade Católica. Na amostra recolhida para o estudo há
75 por cento de mulheres, o que “pode dever-se ao fato de serem elas
que, dentro do agregado familiar, mais se dirigirem às instituições a
pedir ajuda”.
No que respeita ao apoio em medicamentos, pode concluir-se que
atualmente são 6600 as famílias ajudadas, num total de quase 16 mil
pessoas. Estima-se ainda que as instituições que pertencem à rede do
BACF dão igualmente apoio monetário a 5700 famílias e 11 968 pessoas.
Numa análise mais detalhada por faixa etária, o questionário mostra que
são pelo menos 74 mil as crianças que recebem apoio alimentar da rede
do BACF, número que o próprio estudo admite estar aquém da realidade.
Nos últimos três anos, mais de 70 por cento das instituições de
solidariedade social registaram mais pedidos de apoio para alimentação,
situação atribuída sobretudo pelo aumento do desemprego. É a
vulnerabilidade econômica decorrente quer do aumento do desemprego, quer
das baixas reformas, que, a par de rupturas familiares, estão na base
do aumento da procura alimentar”, conclui a análise.
O inquérito do Centro de Estudos e Sondagens da Católica foi respondido
por 1500 organizações de solidariedade que integram a rede do Banco
Alimentar, num universo de mais de 3200 instituições.
A pobreza que vem com a sobrevivência e não com o luxo
Segundo o estudo, cerca de um terço dos inquiridos contraiu
empréstimos, a esmagadora maioria para a compra de casa, mas so menos de
metade dizem pagar sempre as mensalidades.
Além da compra de casa (53 por cento), o carro (19 por cento) e os
electrodomésticos (16 por cento) são os bens que mais frequentemente são
comprados a crédito. Apenas seis por cento diz ter recorrido a crédito
para adquirir um televisor, verificando-se a mesma percentagem para
consolas de jogos.
Da análise resulta ainda que quatro em cada dez pessoas só compram os
medicamentos quando têm dinheiro ou optam pelos mais baratos, não
conseguindo adquirir sempre os remédios que são receitados pelo médico.
Numa auto-avaliação à sua situação económica, 72 por cento dos
inquiridos sentem-se pobres, com uma larga maioria a atribuir a culpa da
sua situação à própria sociedade (situações de desemprego ou
rendimentos baixos).
Fonte: EsquerdaNet
A crítica para além do voto: ilusões perigosas
Che pedagogo
Fui a Cuba, pela primeira vez, em 1997, juntamente com
outros companheiros e companheiras do movimento sindical brasileiro.
Naquele momento, os cubanos passavam pelo que denominavam de “período
especial”. Além da continuidade do violento bloqueio econômico imposto
pelas elites estadunidenses, havia acontecido a queda da experiência
socialista na União Soviética. E, claro, como decorrência, o afastamento
das relações econômicas da Rússia com Cuba, o que afetava
significativamente a qualidade de vida do povo cubano.
Em novembro de 2010, voltei, juntamente com o Secretário-Adjunto de
Relações Internacionais da CTB João Batista Lemos, para participar de
uma reunião de Centrais Sindicais componentes do Encontro Sindical Nossa
América – ESNA e de Centros de Formação Sindical e de Investigação, com
o objetivo de definir um programa de formação e investigação na
América. Em outro artigo que irei escrever, pretendo transmitir aos
leitores, as decisões tomadas na reunião e que se constituem no programa
de atividades a serem desenvolvidas.
Nessa viagem, tive contato com um livro denominado “Del pensamiento
pedagógico de Ernesto Che Guevara”, escrito pela professora cubana
Lidia Turner Martí, doutora em Ciências Pedagógicas, Filosofia e Letras.
Acostumado com a observação de que Che foi um grande revolucionário,
despojado, capaz de dar sua própria vida para contribuir na luta pela
libertação dos povos, não me ocorria que pudesse ter qualidades tais,
que permitissem contribuir, de forma significativa, para a pedagogia
cubana. Lídia Marti afirma que “o estudo e análise da obra de Che nos
leva a afirmar que fez aportes notáveis à pedagogia cubana..... Suas
idéias, colocadas em discursos, ensaios, cartas, e até nos diários de
campanha, encerram profundas análises da essência do homem, dos métodos
para sua formação e da relação estreita entre educação e desenvolvimento
econômico e social”. O próprio autor do prólogo do livro, Justo A.C.
Rodriguez, confessa que mesmo sendo um leitor entusiasta da obra de Che,
não havia reparado na direção pedagógica do seu pensamento.
Para Che é importante que haja uma correspondência entre personalidade
individual e pessoa pública, estabelecendo-se uma relação dialética
entre o individual e o social. É nessa unidade dialética que se situam
as bases para as idéias de Che sobre educação e sobre a formação do
homem novo.
Lídia Martí destaca dois elementos que considera fundamentais na obra de
Che: a formação de qualidades e valores no homem que constrói uma nova
sociedade e a consideração da Pedagogia como uma ciência necessária no
processo cubano.
Guevara disse que precisamos formar a juventude, principalmente com as
seguintes qualidades: sensibilidade diante dos problemas humanos, amor
ao estudo, modéstia, simplicidade, solidariedade, inconformidade diante
do mal-feito, intransigência diante da injustiça e do formalismo. Afirma
que “neste processo de construção do socialismo podemos ver o homem
novo que vai nascendo. Sua imagem não está, todavia, acabada; não
poderia estar nunca, já que o processo marcha paralelo ao
desenvolvimento das forças econômicas novas...”. Para Che, o coletivismo
– que se desenvolve no trabalho grupal - deve ser uma qualidade
importantíssima na construção da personalidade do homem socialista.
Nesse sentido, ele se opõe ao individualismo que chega a ser exacerbado
nas sociedades capitalistas. Nelas, principalmente nas classes
dominantes, prevalecem valores opostos aos que Che defende para o novo
homem socialista.
Com a prevalência dos valores socialistas, Che sintetiza sua preocupação
pedagógica: “A sociedade em seu conjunto deve converter-se numa grande
escola”.
Nessa segunda viagem a Cuba, 13 anos depois da primeira, pude verificar que os valores para um novo tipo de ser humano - solidário e inconformado diante das injustiças - continuam sendo construídos pelo povo cubano.
Nessa segunda viagem a Cuba, 13 anos depois da primeira, pude verificar que os valores para um novo tipo de ser humano - solidário e inconformado diante das injustiças - continuam sendo construídos pelo povo cubano.
*
Professor, sociólogo, Coordenador Técnico do Centro de Estudos
Sindicais (CES), membro da Comissão Sindical Nacional do PCdoB, ex-
Presidente do SINPRO-Campinas e região, ex-Presidente da CONTEE.
domingo, 21 de novembro de 2010
Sharia: Introdução à jurisprudência islâmica(1)
Sharia é agora um termo familiar para os muçulmanos e não muçulmanos, que muitas vezes ouvimos em notícias sobre política, questões feministas, terrorismo e civilização. Mas, apesar de ser citado constantemente, poucas vezes é explicado, mantendo-se assim uma imagem obscura e muitas vezes negativa sobre o mesmo, já que é associado pelos meios de comunicação à amputação de membros, a morte por apedrejamento, a chibatadas e outros castigos medievais. Sendo assim a Sharia difundida como uma legislação injusta imposta sobre pessoas que vivem em nações onde as leis se baseiam nela.
Na realidade, o islamismo trouxe consigo um conjunto de leis que regem a vida do muçulmano, essas leis compõem a Sharia, que é elaborada pela combinação de diversas fontes, incluindo o Alcorão (o livro sagrado dos muçulmanos), os Ahadith (ditos e condutas do Profeta Maomé SAAS) e as Fatwas (decisões dos estudiosos islâmicos para questões do cotidiano, que muitas vezes usam interpretações do alcorão e dos Ahadith)
Na tradição islâmica, Sharia, é vista como algo que alimenta a humanidade. Não como algo primitivo, mas como algo divinamente revelado. Em uma sociedade onde os problemas sociais são endêmicos a Sharia liberta a humanidade alcançando seu maior potencial individual que será somado às realizações de toda uma sociedade. Sendo responsável pela evolução da conduta do ser humano em momentos históricos onde, o mesmo, afastou-se do conceito de civilização. Dessa forma a Sharia representaria a lei de Deus na terra.
“Em verdade, revelamos-te o Livro corroborante e preservador dos anteriores. Julga-os, pois, conforme o que Deus revelou e não sigas os seus caprichos, desviando-te da verdade que te chegou. A cada um de vós temos ditado uma lei e uma norma; e se Deus quisesse, teria feito de vós uma só nação; porém, fez-vos como sois, para testar-vos quanto àquilo que vos concedeu. Emulai-vos, pois, na benevolência, porque todos vós retornáreis a Deus, o Qual vos inteirará das vossas divergências”.
Alcorão, 5:48
Para os muçulmanos, a vida não começa no nascimento, mas muito tempo antes disso. Antes mesmo da criação do primeiro homem. Tudo começou quando Deus criou as almas de todos aqueles que irão existir e lhes perguntou: "Eu não sou o seu Senhor?" Todos eles responderam: "Sim".
Deus decretou para cada alma um tempo na terra para que pudesse julgá-la. Em seguida, após a conclusão dos respectivos termos escolhidos, Ele irá julgá-los e enviá-los ao seu destino eterno: ou uma de felicidade sem fim, ou de uma tristeza eterna.
Esta vida é, então, uma viagem que apresenta aos homens muitos caminhos. Apenas um desses caminhos é claro e direto. Esse caminho é a Sharia.
Orientação divina
Sharia significa em árabe "O bom e claro caminho para a água". Islamicamente, é usado para se referir aos assuntos de religião que Deus tem legislado para Seus servos. O significado lingüístico da Sharia reverbera em seu uso técnico: assim como a água é vital para a vida humana, é vital a Sharia para a vida, a alma e a mente.
O islamismo ensina que ao longo da história, Deus enviou mensageiros para pessoas em todo o mundo, guindo-os para o caminho correto que os levará para a felicidade neste mundo e no outro a seguir. Todos os mensageiros ensinaram a mesma mensagem sobre a crença (o Alcorão ensina que todos os mensageiros chamaram as pessoas para a adoração do único Deus), mas o conjunto específico das leis divinas que regulam a vida das pessoas variou de acordo com as necessidades de cada povo e de seu tempo.
No Islã, o Profeta Muhammad (SAAS) é considerado o último mensageiro e, portanto, sua Sharia representa a última manifestação da misericórdia divina sobre a conduta correta do ser humano.
“Estão-vos vedados: a carniça, o sangue, a carne de suíno e tudo o que tenha sido sacrificado com a invocação de outro nome que não seja o de Deus; os animais estrangulados, os vitimados a golpes, os mortos por causa de uma queda, ou chifrados, os abatidos por feras, salvo se conseguirdes sacrificá-los ritualmente; o (animal) que tenha sido sacrificado nos altares. Também vos está vedado fazer adivinhações com setas, porque isso é uma profanação. Hoje, os incrédulos desesperam por fazer-vos renunciar à vossa religião. Não os temais, e temei a Mim! Hoje, completei a religião para vós; tenho-vos agraciado generosamente sem intenção de pecar, se vir compelido a (alimentar-se do vedado), saiba que Deus é Indulgente, Misericordiosíssimo” (Alcorão, 5:3)
Questões Legais
A Sharia regulamenta todas as ações humanas e as coloca em cinco categorias: Obrigatórias, Recomendadas, Permitidas, Não-Recomendadas e Proibidas.
- Obrigatórias: Devem ser realizadas e, quando realizadas com boas intenções são recompensadas.
- Recomendadas: Se forem feitas serão recompensada e se não forem não serão punida.
- Permitidas: Não são nem encorajadas nem reprimidas, a maioria das ações humanas se enquadram nessa categoria.
- Indesejadas: Se forem evitadas serão recompensadas mas fazê-la não acarreta em punição.
- Proibidas: Evitar essas ações é um dever para o muçulmano e será recompensado, realizar essas ações levará a condenação e punição.
Os piores pecados humanos são aqueles praticados contra Deus e a Fé, depois os pecados que machucam outros seres humanos, e então os pegados de conduta própria no dia a dia, como ofensas, mentiras e dar falso testemunho.
No islamismo, Deus pode perdoar todos os pecados, caso deseje, menos a falta de fé.
A Sharia abrange todos os aspectos da vida humana. Manuais da Sharia são frequentemente divididos em quatro partes: as leis relativas aos atos pessoais de culto, as leis relativas a operações comerciais, as leis relativas ao casamento e divórcio e as leis penais.
Fonte: arabesq
Coletivo Estadual de Saúde promove seminário de formação
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Mídia, golpes e tortura
No Brasil a Casa Grande não descansa. E a
principal voz da Casa Grande no Brasil é a mídia hegemônica, aquele
grupo de poucas famílias que se pretende o intérprete da realidade
brasileira, apesar de há muito ter deixado de sê-lo. A um jornalismo
sério, que tivesse compromisso com a história, a um jornalismo que
tivesse alguma ligação, tênue que fosse, com a idéia de democracia, que
se preocupasse com a educação das novas gerações, caberia discutir a
monstruosidade da tortura, mostrar o que ela tem de lesa-humanidade.
Mostrar que qualquer processo que envolva tortura não merece qualquer
crédito. Mas esse não é o jornalismo brasileiro. O artigo é de Emiliano
José.
Emiliano José no Carta Maior
Talvez pudéssemos inverter um pouco a ordem
das coisas: que tal, ao invés de divulgar o relato de processos do STM
sobre pessoas covardemente torturadas, como o faz agora o secretariado
da mídia golpista brasileira, perguntássemos sobre qual o papel dessa
mesma mídia na implantação da ditadura militar?
Não seria algo elucidativo, educativo para as novas gerações? Que tal compreender a verdadeira natureza de nossa mídia hegemônica para, então, entender por que, nesse momento, usando processos inteiramente submetidos à ordem castrense, ao terror ditatorial, tenta atingir a presidente da República, recentemente eleita, numa espécie de vingança pela derrota que sofreu? Perguntar por que ela não se conforma com essa nova derrota, a terceira derrota da mídia nas últimas eleições, derrotada pela opinião pública brasileira. Com que direito quer um terceiro turno, ilegítimo, revelador apenas de seus ressentimentos?
Eu insisto: no Brasil a Casa Grande não descansa. E a principal voz da Casa Grande no Brasil é a mídia hegemônica, aquele grupo de poucas famílias que se pretende o intérprete da realidade brasileira, apesar de há muito ter deixado de sê-lo. Não vou retroceder muito no tempo. Não vou esmiuçar o papel destacado de nossa mídia na tentativa de golpe contra o presidente Getúlio Vargas. O quartel-general do golpe era permanentemente orientado pela mídia. A mídia hegemônica de então e o golpe já quase consumado foram derrotados pelo suicídio do presidente.
O que pretendo mesmo é refrescar a memória ou informar um pouco que seja sobre o papel de nossa mídia no golpe de 1964. Não se trata apenas de ela ter elaborado todo o discurso que deu sustentação ao golpe contra o presidente Jango Goulart. Não se trata disso somente.
Trata-se do fato, por demais evidente, e há vasto repertório bibliográfico a respeito, de que a mídia participou diretamente das articulações golpistas. Ela derrubou Goulart lado a lado com os militares golpistas. Reuniu-se com eles para preparar o golpe. Não tem como se defender disso. É algo que hoje já pertence à história.
Com isso se quer dizer, e creio que é preciso insistir nisso, que a mídia hegemônica brasileira foi um ator fundamental na construção de uma ditadura sanguinária, terrorista no Brasil, a mesma que vai torturar covardemente homens, mulheres, crianças, que vai desaparecer com pessoas depois de desfigurá-las, provocar suicídios, que será capaz de todas as crueldades, perversidades para garantir a sua continuidade no poder por 21 anos.
A Rede Globo, criada lá pelos finais de 1969, não foi uma simples iniciativa empresarial. Foi um empreendimento político. Com a Rede Globo pretendeu-se unificar o discurso da ditadura, justificar tudo ela pretendesse, inclusive os assassinatos, o terrorismo que ela praticava cotidianamente. Inúmeras vezes assistíamos, no Jornal Nacional, notícias dando conta do atropelamento de companheiros, da morte de um militante por outro, versões montadas pela repressão para justificar a morte nas masmorras da ditadura. A Rede Globo encarnava e ecoava a voz do terror, foi criada para tanto.
E o grupo Globo é apenas parte de toda uma estrutura midiática que deu sustentação à ditadura, embora talvez, então, a parte mais importante. Não é difícil lembrar do terrível, do terrorista general Garrastazu Médici, ditador, que dizia que bastava assistir ao Jornal Nacional para perceber como tudo caminhava às mil maravilhas no Brasil. O Jornal Nacional era o diário oficial da ditadura.
Por isso, não há como nos surpreendermos com a tentativa, canhestra, de tentar desqualificar a presidente Dilma, pinçando aspectos do vasto processo buscado nos arquivos do STM, como a matéria de 19 de novembro, de O Globo. Não nos surpreendemos, mas não há como não nos indignarmos. É a voz da ditadura que volta, são os mesmos métodos que voltam, embora, agora, por impossibilidade, a tortura física não possa voltar.
A um jornalismo sério, que tivesse compromisso com a história, a um jornalismo que tivesse alguma ligação, tênue que fosse, com a idéia de democracia, que se preocupasse com a educação das novas gerações, caberia discutir a monstruosidade da tortura, mostrar o que ela tem de lesa-humanidade, mostrar a necessidade de evitar que ela exista, inclusive nas cadeias brasileiras de hoje. Mostrar que qualquer processo que envolva tortura não merece qualquer crédito. Mas, não.
O jornalismo realmente existente vai pinçar aspectos no processo que eventualmente desgastem a presidente da República. Nos próximos dias, a mídia golpista vai se debruçar sobre isso, podem anotar. É a tentativa do terceiro turno, evidência do ressentimento pela terceira derrota – a mídia perdeu em 2002 e 2006, quando Lula venceu, e perdeu agora, com a vitória de Dilma. Não se conforma, A Casa Grande não descansa.
Nem sei, nem vou procurar saber sobre todo o processo que envolveu a presidente. Escrevi vários livros sobre a ditadura, inclusive sobre Carlos Lamarca e Carlos Marighella, que tangenciam organizações revolucionárias pelas quais a presidente Dilma passou – e que orgulho ter militado em organizações revolucionárias. Não me detive, no entanto, na trajetória específica da presidente Dilma Roussef, nem caberia.
Mas será que os jornalistas que têm feito o papel de pescadores de leads e subleads negativos, de títulos desqualificadores da presidente têm alguma noção do que seja a tortura? Imagino que não, até porque só obedecem ordens, a pauta é previamente pensada, ordenada, e depois se faz a matéria.
Repito aqui o que escrevi em um dos meus livros, valendo-me das contribuições do psicanalista Hélio Pellegrino. A tortura nunca é mero procedimento técnico destinado à coleta rápida de informações. É também isso, mas nunca apenas isso. Ela é a expressão tenebrosa da patologia de todo um sistema social e político, expressão da ditadura militar de então. Ela visa à destruição do ser humano.
À custa de um sofrimento corporal inimaginável, teoricamente insuportável, a tortura pretende separar corpo e mente, instalar a guerra entre um e outro, semear a discórdia entre ambos. O corpo torna-se um inimigo – com sua dor, atormenta o torturado, persegue o torturado. A mente vai para um lado, o corpo sofrido para outro. O torturado fica exposto ao sol e à chuva, ao desabrigo absoluto, sem chão, entregue às ansiedades inconscientes mais primitivas. E apesar disso, tantas vezes, tantos de nós, quando não fomos trucidados e mortos na tortura, resistimos a esse terror, e saímos inteiros, ou quase inteiros, dessa situação-limite.
O que vale um processo feito sob a ditadura? O que valem declarações tiradas sob tortura? Responderia que valem apenas para revelar o que foi o terror, para revelar o que fizeram com as vítimas desse terror. Por que nos impressionamos e nos indignamos tanto com as vítimas do nazi-fascismo, inclusive nossa mídia, impressão e indignação justas, e somos, lá eles como costumam dizer os baianos, tão condescendentes com o terror da ditadura, com as torturas dos assassinos do período 1964-1985?
Eu compreendendo por que a mídia age assim com a nossa memória histórica, e já o disse antes: age assim pela simples razão de que ela tem tudo a ver com a gênese da ditadura, porque dela não pode se apartar, lamentavelmente. Por isso, nos preparemos para a luta dos próximos dias: ela vai buscar nos porões da ditadura o que possa servir aos seus propósitos de lutar contra o governo democrático, republicano e popular da presidente Dilma. E nos encontrará onde sempre estivemos: na luta intransigente, isso mesmo, intransigente, a favor da democracia, dos direitos humanos, e contra toda sorte de crimes contra a humanidade.
(*) Jornalista, escritor.
Não seria algo elucidativo, educativo para as novas gerações? Que tal compreender a verdadeira natureza de nossa mídia hegemônica para, então, entender por que, nesse momento, usando processos inteiramente submetidos à ordem castrense, ao terror ditatorial, tenta atingir a presidente da República, recentemente eleita, numa espécie de vingança pela derrota que sofreu? Perguntar por que ela não se conforma com essa nova derrota, a terceira derrota da mídia nas últimas eleições, derrotada pela opinião pública brasileira. Com que direito quer um terceiro turno, ilegítimo, revelador apenas de seus ressentimentos?
Eu insisto: no Brasil a Casa Grande não descansa. E a principal voz da Casa Grande no Brasil é a mídia hegemônica, aquele grupo de poucas famílias que se pretende o intérprete da realidade brasileira, apesar de há muito ter deixado de sê-lo. Não vou retroceder muito no tempo. Não vou esmiuçar o papel destacado de nossa mídia na tentativa de golpe contra o presidente Getúlio Vargas. O quartel-general do golpe era permanentemente orientado pela mídia. A mídia hegemônica de então e o golpe já quase consumado foram derrotados pelo suicídio do presidente.
O que pretendo mesmo é refrescar a memória ou informar um pouco que seja sobre o papel de nossa mídia no golpe de 1964. Não se trata apenas de ela ter elaborado todo o discurso que deu sustentação ao golpe contra o presidente Jango Goulart. Não se trata disso somente.
Trata-se do fato, por demais evidente, e há vasto repertório bibliográfico a respeito, de que a mídia participou diretamente das articulações golpistas. Ela derrubou Goulart lado a lado com os militares golpistas. Reuniu-se com eles para preparar o golpe. Não tem como se defender disso. É algo que hoje já pertence à história.
Com isso se quer dizer, e creio que é preciso insistir nisso, que a mídia hegemônica brasileira foi um ator fundamental na construção de uma ditadura sanguinária, terrorista no Brasil, a mesma que vai torturar covardemente homens, mulheres, crianças, que vai desaparecer com pessoas depois de desfigurá-las, provocar suicídios, que será capaz de todas as crueldades, perversidades para garantir a sua continuidade no poder por 21 anos.
A Rede Globo, criada lá pelos finais de 1969, não foi uma simples iniciativa empresarial. Foi um empreendimento político. Com a Rede Globo pretendeu-se unificar o discurso da ditadura, justificar tudo ela pretendesse, inclusive os assassinatos, o terrorismo que ela praticava cotidianamente. Inúmeras vezes assistíamos, no Jornal Nacional, notícias dando conta do atropelamento de companheiros, da morte de um militante por outro, versões montadas pela repressão para justificar a morte nas masmorras da ditadura. A Rede Globo encarnava e ecoava a voz do terror, foi criada para tanto.
E o grupo Globo é apenas parte de toda uma estrutura midiática que deu sustentação à ditadura, embora talvez, então, a parte mais importante. Não é difícil lembrar do terrível, do terrorista general Garrastazu Médici, ditador, que dizia que bastava assistir ao Jornal Nacional para perceber como tudo caminhava às mil maravilhas no Brasil. O Jornal Nacional era o diário oficial da ditadura.
Por isso, não há como nos surpreendermos com a tentativa, canhestra, de tentar desqualificar a presidente Dilma, pinçando aspectos do vasto processo buscado nos arquivos do STM, como a matéria de 19 de novembro, de O Globo. Não nos surpreendemos, mas não há como não nos indignarmos. É a voz da ditadura que volta, são os mesmos métodos que voltam, embora, agora, por impossibilidade, a tortura física não possa voltar.
A um jornalismo sério, que tivesse compromisso com a história, a um jornalismo que tivesse alguma ligação, tênue que fosse, com a idéia de democracia, que se preocupasse com a educação das novas gerações, caberia discutir a monstruosidade da tortura, mostrar o que ela tem de lesa-humanidade, mostrar a necessidade de evitar que ela exista, inclusive nas cadeias brasileiras de hoje. Mostrar que qualquer processo que envolva tortura não merece qualquer crédito. Mas, não.
O jornalismo realmente existente vai pinçar aspectos no processo que eventualmente desgastem a presidente da República. Nos próximos dias, a mídia golpista vai se debruçar sobre isso, podem anotar. É a tentativa do terceiro turno, evidência do ressentimento pela terceira derrota – a mídia perdeu em 2002 e 2006, quando Lula venceu, e perdeu agora, com a vitória de Dilma. Não se conforma, A Casa Grande não descansa.
Nem sei, nem vou procurar saber sobre todo o processo que envolveu a presidente. Escrevi vários livros sobre a ditadura, inclusive sobre Carlos Lamarca e Carlos Marighella, que tangenciam organizações revolucionárias pelas quais a presidente Dilma passou – e que orgulho ter militado em organizações revolucionárias. Não me detive, no entanto, na trajetória específica da presidente Dilma Roussef, nem caberia.
Mas será que os jornalistas que têm feito o papel de pescadores de leads e subleads negativos, de títulos desqualificadores da presidente têm alguma noção do que seja a tortura? Imagino que não, até porque só obedecem ordens, a pauta é previamente pensada, ordenada, e depois se faz a matéria.
Repito aqui o que escrevi em um dos meus livros, valendo-me das contribuições do psicanalista Hélio Pellegrino. A tortura nunca é mero procedimento técnico destinado à coleta rápida de informações. É também isso, mas nunca apenas isso. Ela é a expressão tenebrosa da patologia de todo um sistema social e político, expressão da ditadura militar de então. Ela visa à destruição do ser humano.
À custa de um sofrimento corporal inimaginável, teoricamente insuportável, a tortura pretende separar corpo e mente, instalar a guerra entre um e outro, semear a discórdia entre ambos. O corpo torna-se um inimigo – com sua dor, atormenta o torturado, persegue o torturado. A mente vai para um lado, o corpo sofrido para outro. O torturado fica exposto ao sol e à chuva, ao desabrigo absoluto, sem chão, entregue às ansiedades inconscientes mais primitivas. E apesar disso, tantas vezes, tantos de nós, quando não fomos trucidados e mortos na tortura, resistimos a esse terror, e saímos inteiros, ou quase inteiros, dessa situação-limite.
O que vale um processo feito sob a ditadura? O que valem declarações tiradas sob tortura? Responderia que valem apenas para revelar o que foi o terror, para revelar o que fizeram com as vítimas desse terror. Por que nos impressionamos e nos indignamos tanto com as vítimas do nazi-fascismo, inclusive nossa mídia, impressão e indignação justas, e somos, lá eles como costumam dizer os baianos, tão condescendentes com o terror da ditadura, com as torturas dos assassinos do período 1964-1985?
Eu compreendendo por que a mídia age assim com a nossa memória histórica, e já o disse antes: age assim pela simples razão de que ela tem tudo a ver com a gênese da ditadura, porque dela não pode se apartar, lamentavelmente. Por isso, nos preparemos para a luta dos próximos dias: ela vai buscar nos porões da ditadura o que possa servir aos seus propósitos de lutar contra o governo democrático, republicano e popular da presidente Dilma. E nos encontrará onde sempre estivemos: na luta intransigente, isso mesmo, intransigente, a favor da democracia, dos direitos humanos, e contra toda sorte de crimes contra a humanidade.
(*) Jornalista, escritor.
Via Campesina ajuda haitianos a superar tragédias
Felipe Prestes no SUL21
Como se não bastassem as mazelas de uma política instável e as
dificuldades socioeconômicas e ambientais, o Haiti tem sido assolado por
tragédias em 2010. Os problemas não cessaram, depois que a capital
Porto Príncipe foi destruída por um terremoto, que provocou a morte de
300 mil pessoas e deixou 1,5 milhão desabrigadas. Agora, uma epidemia de
cólera se alastra pelo país, que também sofre com a costumeira passagem
de furacões.
Um pequeno grupo de brasileiros, coordenado pela Via Campesina, trabalha para amenizar as dificuldades por que passa o povo haitiano e para que a imagem do país mundo afora não fique marcada apenas por tragédias e miséria. O gaúcho José Luis Patrola coordena o grupo da Via Campesina, batizado de Brigada Dessalines (Dessalines foi um dos heróis da independência haitiana), que desde 2009 coopera com camponeses haitianos. Patrola está no centro de apoio do grupo, que fica na província de Latibonit, região mais atingida pela epidemia de cólera.
Um pequeno grupo de brasileiros, coordenado pela Via Campesina, trabalha para amenizar as dificuldades por que passa o povo haitiano e para que a imagem do país mundo afora não fique marcada apenas por tragédias e miséria. O gaúcho José Luis Patrola coordena o grupo da Via Campesina, batizado de Brigada Dessalines (Dessalines foi um dos heróis da independência haitiana), que desde 2009 coopera com camponeses haitianos. Patrola está no centro de apoio do grupo, que fica na província de Latibonit, região mais atingida pela epidemia de cólera.
Ele conta, por e-mail, que o número de mortos pela doença já
ultrapassou os 1.110, e que há 18.382 haitianos hospitalizados. O
problema se deve especialmente à qualidade da água no país – é pela água
contaminada que a cólera se espalha – e também pela precariedade dos
serviços de prevenção e tratamento. Em países com melhores condições, a
cólera já não é, há bastante tempo, uma doença tão letal. “A grande
maioria dos mortos são camponeses da região de Latbonit que consumiram
água contaminada. Os hospitais da região estão lotados há um mês”, conta
Patrola.
Para Patrola, a comunidade internacional precisa repensar o tipo de
auxílio que dá ao Haiti. Ele explica que problemas estruturais do país
precisam ser resolvidos. Não bastam paliativos emergenciais. A passagem
do furacão Tomas, por exemplo, há duas semanas, devastou plantações nas
regiões Sul e Noroeste do país e pode gerar desabastecimento de
alimentos no Haiti nos próximos meses. “O Haiti vive um grave problema
de desmatamento, acompanhado por técnicas agrícolas predatórias ao meio
ambiente, que levarão a um caos generalizado caso o problema não se
resolva de maneira sólida”, explica.
É o que explica também o colega de Patrola, o alagoano Thalles Gomes.
“Uma das grandes crises do Haiti é ambiental: 95% do país estão
desmatados. Isso agrava o efeito de terremotos e ciclones”, diz. Gomes
faz parte da Brigada Dessalines e esteve no Haiti entre abril e outubro
de 2010. De passagem por Porto Alegre, nesta semana, teve um longa
conversa com o Sul21.
Thalles conta que o grupo trabalha no Haiti desde 2009. Os objetivos
principais são a cooperação agrícola e o auxílio aos camponeses
haitianos, para que estes problemas ambientais possam ser sanados. Em
2010, a Brigada Dessalines já instalou 1.300 cisternas no interior do
Haiti. As cisternas, feitas de polietileno (um tipo de plástico), são
são fáceis de instalar e utilizadas em emergências. Foram obtidas em
parceria com o governo da Bahia.
O grupo também ajudou a formar seis bancos de sementes no país,
porque grande parte dos camponeses não consegue armazenar sementes e
precisa comprá-las. E criou ainda viveiros de mudas, para auxiliar o
processo de reflorestamento tão necessário no país. Ao todo, 40
brasileiros da Via Campesina já passaram pelo Haiti neste período,
trabalhando para a Brigada, que também recebe auxílio e auxilia pessoas
de outras partes da América Latina. “A gente recebeu paraguaios,
argentinos, venezuelanos e colombianos. Servimos como centro de apoio
para quem passa por lá”.
Para além da tragédia
Após o terremoto de janeiro de 2010, a Brigada intensificou suas
atividades, enviando, além de pessoas especializadas na questão
agrícola, médicos, enfermeiros e pessoas ligadas à construção civil. “A
ideia não era ajudar diretamente as vítimas do terremoto, porque não é
nossa especialidade, mas ajudar os camponeses neste momento difícil,
porque o terremoto atingiu a capital Porto Príncipe – 300 mil mortos e
1,5 milhão de desabrigados -, mas as pessoas desabrigadas foram para o
campo. O Haiti já tem problema forte de estrutura no campo, com o
terremoto isso piorou”, conta Thalles.
Neste novo grupo, Thalles – graduado em Cinema, e membro da Comissão
Pastoral da Terra, que integra a Via Campesina – foi enviado como
responsável pela área de comunicação. Ele conta que sua tarefa foi atuar
em dois níveis. Um deles era a cooperação com rádios locais, ligadas a
organizações de camponeses. Thalles explica que, devido ao analfabetismo
de 40% e à falta de infraestrutura no Haiti, o rádio é o meio de
comunicação mais difundido. “Os haitianos têm o hábito de conviver com o
país através do rádio”.
A atuação da Brigada neste sentido foi feita em parceria com o
governo venezuelano. Está sendo desenvolvido um projeto para fortalecer
25 rádios que Thalles chama de comunitárias, por sua estrutura. “Apesar
de terem licença comercial, grande parte das rádios do país funcionam
com estrutura de rádio comunitária e não têm equipamentos básicos de
transmissão. As músicas são tocadas em fita cassete”, exemplifica. Ele
conta que as rádios do interior se beneficiam do fato de o Haiti ser
montanhoso. Instalam seus transmissores precários no alto das montanhas,
conseguindo assim atingir um grande número de lares. Como a energia
elétrica no país é racionada, estas rádios também dependem de placas
solares ou geradores. “A ideia é criar condições mínimas para o
funcionamento destas rádios”.
O outro nível de atuação de Thalles Gomes foi produzir informação
para ser disseminada no Brasil e em outros países da América Latina. Do
Haiti, Thalles colaborou com diversos órgãos da imprensa latinoamericana
e produziu dezenas de matéria – trabalho que continua desenvolvendo
mesmo estando no Brasil. Ele explica que sua missão é mostrar para a
América Latina um Haiti não só como um país onde a sorte passou longe.
“O Haiti só tem sido manchete na tragédia. Nossa perspectiva era mostrar
o Haiti para além dos mortos. A gente queria mostrar a economia, a
cultura e a política haitiana. Para além da miséria tem cotidiano. Tem
futebol, festa, religião, vodu, música. Tem o dia-a-dia. Acho que,
quando se pensar no Haiti, tem que se pensar para além da tragédia”,
afirma.
Thalles conta que a experiência no Haiti foi “divisora de águas” em
sua vida e que uma das coisas que mais o surpreenderam foi a consciência
histórica do povo haitiano, presente em todos os níveis da população,
do camponês ao estudante universitário. Eles têm conhecimento da própria
história: o que foi a revolução que levou o país à independência, quais
são os interesses internacionais que estão em jogo, por que o país
chegou neste ponto. Isto foi o que mais me impactou positivamente”, diz.
Ele também exalta dois aspectos culturais que considera mais
relevantes no país caribenho: o idioma kréyol e a religião vodu. “São
duas criações haitianas. O kreyol é uma língua que foi criada pelos
escravos. Eles falavam de uma forma que os franceses não podiam
entender. A partir daí conseguiram se organizar para se libertar. E o
vodu tem elementos das culturas africana, indígena e europeia. Também
foi a partir do vodu que a revolução começou. Hoje em dia é um dos
poucos espaços de organização da população, porque no vodu não há
interferência estrangeira branca”, diz.
Críticas à atuação do Brasil
Thalles Gomes considera a atuação do Brasil no Haiti à frente da
Minustah (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti) um
“contrassenso” com a política externa proposta pelo Governo Lula, de
integração e cooperação com os povos da América Latina e Caribe. “A
proposta da Minustah era criar a ideia de uma cooperação Sul-Sul, então
ela é formada apenas por exércitos de países subdesenvolvidos. Mas isso
mascara uma ocupação militar. O que o Haiti precisa não é de armas, mas
de solidariedade na área econômica e social”, afirma
Thalles relata que a missão da ONU não tem ajudado na reconstrução do
país, mas apenas tratado de reprimir a população, quando há distúrbios
causados pela desordem política e social e pelos desastres naturais. “Em
seis meses no Haiti não vi nenhuma obra feita pelo Minustah. O que eles
fazem é como o Bope faz nas favelas do RJ: trazer a estabilidade com
repressão”.
Como se isso não bastasse, há fortes indícios de que a cólera chegou
ao Haiti por meio de soldados nepaleses da Minustah contaminados. Devido
a esta suspeita, haitianos têm ido às ruas para protestar contra a
missão. Nos protestos três haitianos já morreram, e Thalles mostra isto
como um exemplo da repressão feita pelas Nações Unidas. “A Minustah não
consegue dar respostas concretas quando a população precisa. Não
conseguiu dar respostas concretas ao terremoto, não conseguiu dar
respostas concretas para evitar os danos causados por ciclones. E para
uma epidemia que pode ter sido trazida pela própria ONU não consegue dar
respostas rápidas e claras”.
Thalles aponta as contradições do modelo de ajuda humanitária que é
realizado pela ONU no Haiti. Ele aponta que a ONU agora acena com mais
US$ 164 milhões para combater a cólera e que já foram despendidos, desde
2004, US$ 3,6 bilhões apenas para manter as operações da Minustah no
Haiti. Enquanto isto, cerca de 50% da população haitiana ainda permanece
abaixo da linha de pobreza.
Para explicar o que ocorre no Haiti, Thalles cita um termo sugestivo,
cunhado pela jornalista canadense Naomi Klein: capitalismo do desastre.
“O Haiti é o país mais pobre da América, mas é o que mais recebe ajuda
internacional no mundo. É um dinheiro que chega a o país, mantém os
altos salários de funcionários da ONU e das ONG’s e esse dinheiro não
muda as condições socioeconômicas do país”, resume.
EUA aumentam operações clandestinas contra Venezuela
O mecanismo de ajuda financeira a grupos de oposição aos
governos democráticos latino-americanos que não lêem pela cartilha
de Washington, como a Venezuela de Hugo Chávez, pode nos dar uma idéia
de como a recente vitória eleitoral da presidente Dilma Roussef no
Brasil poderá sofrer contestações nos seus quatro anos de mandato,
indicando também algumas pistas do que pode ter ocorrido na recente
campanha eleitoral por parte da estratégia oposicionista apoiada pela
velha mídia.
por Eva Golinger*via vermelho
Segundo o informe anual de 2010 do Escritório de Iniciativas para uma
Transição (OTI) da Agência Internacional de Desenvolvimento dos
Estados Unidos (USAID) sobre suas operações na Venezuela, 9,29 milhões
de dólares foram investidos esse ano em esforços para apoiar os
objetivos da política exterior norte-americana e promover a democracia
neste país sul americano. Esta cifra representa um aumento de quase
dois milhões de dólares em relação ao ano passado, quando esse mesmo
escritório de transição financiou atividades políticas contra o
governo de Hugo Chávez com 7,45 milhões de dólares.
Transição (OTI) da Agência Internacional de Desenvolvimento dos
Estados Unidos (USAID) sobre suas operações na Venezuela, 9,29 milhões
de dólares foram investidos esse ano em esforços para apoiar os
objetivos da política exterior norte-americana e promover a democracia
neste país sul americano. Esta cifra representa um aumento de quase
dois milhões de dólares em relação ao ano passado, quando esse mesmo
escritório de transição financiou atividades políticas contra o
governo de Hugo Chávez com 7,45 milhões de dólares.
A OTI é uma divisão da USAID dedicada a apoiar objetivos da política
exterior dos EUA através da promoção da democracia (segundo sua
avaliação) em países que se encontram em crise. A OTI fornece
assistência rápida, flexível e de curto prazo para transições
políticas e de estabilização. Ainda que a OTI seja, tradicionalmente,
um mecanismo de curto prazo para injetar milhões de dólares em fundos
líquidos que influem sobre a situação política de países
estrategicamente importantes para Washington, o caso da Venezuela é
diferente. A OTI abriu sua sede nesse país em 2002 e a mantém até
hoje, apesar de não contar com a devida autorização do governo da
Venezuela. Na verdade, é o único escritório que a USAID mantém durante
tanto tempo em algum país.
As operações clandestinas da OTI
Em nota oficial com a data de 22 de janeiro de 2002, o presidente da
OTI, Russel Porter, revela como e por que a USAID chegou à Venezuela.
Dias antes, em 04 de janeiro, o escritório de Assuntos Andinos do
Departamento de Estado pediu a OTI para estabelecer um programa para a
Venezuela. Estava claro que havia uma preocupação crescente sobre a
saúde política do país. Solicitaram à OTI que oferecesse programas e
assistência para fortalecer os elementos democráticos (sic) que
estavam sob a mira do governo de Chávez.
Porter visitou a Venezuela em 18 de janeiro de 2002 e logo comentou:
"Para preservar a democracia, é necessário um apoio imediato para a
mídia independente e para a sociedade civil. Uma das grandes
debilidades da Venezuela é a falta de uma sociedade civil vibrante". A
National Endowment for Democracy (NED) tem um programa de 900 mil
dólares na Venezuela que apóia o Instituto Democrata (NDI), o
Instituto Republicano Internacional (IRI) e o Centro de Solidariedade
Laboral (três institutos quase governamentais norte americanos) para
fortalecer os partidos políticos e os sindicatos (a CTV). Este
programa é útil, porém não é suficiente. Alem do que não é flexível e
nem trabalha com novos grupos ou grupos não tradicionais. E também lhe
falta um componente de meios de comunicação.
Desde então, a OTI marca a sua presença na Venezuela enviando milhões
de dólares por ano para manter vivo o conflito no país. Segundo o
último informe anual de 2010, a OTI atua a partir da Embaixada dos
Estados Unidos e é parte de um esforço maior para promover a
democracia naquele país.
O principal investimento dos 9 milhões de dólares em 2010 foi durante
a campanha eleitoral da oposição para as eleições legislativas de 26
de setembro passado. A USAID trabalha com vários associados da
sociedade civil oferecendo assistência técnica para os partidos
políticos, apoio técnico para os trabalhadores em direitos humanos e
apoiando esforços para fortalecer a sociedade civil. Na Venezuela,
sabe-se que `sociedade civil' é o outro nome com que se identifica a
oposição ao governo de Hugo Chávez.
Os partidos políticos e as organizações financiadas pela USAID têm
sido documentados através de uma grande investigação realizada por
esta escritora e incluem grupos como Súmate, Ciudadania Activa, Radar
de Los Barrios, Primero Justicia, Um Nuevo Tiempo, Acción Democrática,
Copei, Futuro Presente, Voluntad Popular, Universidad Católica Andros
Bello, Universidad Metropolitana, Sinergia, Cedice, CTV, Fedecamaras,
Espacio Publico, Instituto Prensa y Sociedad, Voto Joven entre tantos
que têm se dedicado à desestabilização do país.
Um fluxo secreto de dinheiro
Não obstante, o atual abastecimento de dinheiro da USAID/OTI a grupos
e partidos políticos venezuelanos é mantido em segredo. Quando abriu
suas operações em 2002, a OTI contratou a empresa estadunidense
Development Alternatives Inc. (DAÍ) um dos maiores prestadores de
serviços ao Departamento de Estado, da USAID e do Pentágono em nível
mundial. Essa empresa, a DAÍ, operava uma empresa no El Rosal – o Wall
Street de Caracas – de onde distribuía fundos milionários a
organizações venezuelanas através de pequenos convênios não superiores
a 100 mil dólares cada um.
De 2002 a 2010 mais de 600 desses pequenos convênios foram entregues
por esse escritório a grupos da oposição venezuelana para seguirem
alimentando o conflito no país e apoiando os esforços para provocar a
saída do poder do presidente Hugo Chávez.
Em finais de 2009, a empresa DAÍ começou a ter graves problemas com
suas operações no Afeganistão, quando foram assassinados cinco de seus
empregados por supostos militantes do Talibã durante um ataque com
explosivos na cidade de Gardez em 15 de novembro. Alguns dias antes,
um de seus empregados havia sido detido em Cuba e acusado de
espionagem e subversão pela distribuição ilegal de componentes de
satélite a grupos contra-revolucionários.
Quando escrevi um artigo publicado em 30 de dezembro de 2009, e
agentes da CIA mortos no Afeganistão trabalhavam para uma empresa de
fachada ativa na Venezuela e em Cuba, evidenciava-se o vínculo
operacional da DAÍ no Afeganistão, em Cuba e na Venezuela e sua
natureza suspeita, o próprio presidente e chefe executivo da empresa,
Jim Boomgard, me contatou e alertou-me (melhor dizer ameaçou-me) que
se continuasse a escrever o que escrevia, eu seria responsabilizada
por qualquer coisa que se passasse com seus empregados em nível
mundial.
Contudo, o senhor Boomgard, que disse não saber muito sobre as
operações de sua empresa na Venezuela, conseguiu entender que o que
faziam na Venezuela não valia tanto como o que faziam no Afeganistão.
Semanas depois de sua entrevista comigo, o DAÍ, misteriosamente,
fechou seu escritório em Caracas.
Entrementes, a OTI continua suas operações na Venezuela e mesmo tendo
outros sócios norte americanos que manejam uma parte de seus fundos
multimilionários, como IRI, NDI, Freedon House e a Fundación
Panamericana Del Desarrollo (Fupad), não existe transparência sobre o
fluxo de dinheiro de suas contrapartidas venezuelanas.
Um informe da Fundação para as Relações Internacionais e Diálogo
Exterior (FRIDE) sobre a promoção da democracia na Venezuela, com data
de maio de 2010, explica que grande parte do dinheiro vindo do
exterior, mais de 50 milhões de dólares esse ano, segundo eles e que
financia a grupos políticos de oposição na Venezuela, entra no país de
forma ilícita em dólares ou euros e se transforma em dinheiro
venezuelano no mercado negro (Assim que denunciei essas atividades
ilegais baseadas no informe mencionado, o FRIDE desapareceu com o
texto original e publicou um novo em que abandonava qualquer
referência ao mecanismo de entrega de dinheiro externo a grupos
venezuelanos).
Se o DAÍ já não atua na Venezuela realizando pequenos convênios com
organizações opositoras com dinheiro estadunidense, o que cabe indagar
é como chegam esses milhões de dólares a tais grupos e através de qual
mecanismo? Segundo a USAID, suas operações estariam agora se
realizando através da Embaixada dos Estados Unidos? Esta embaixada
está entregando dinheiro diretamente a grupos de oposição
venezuelanos?
O informe anual USAID/OTI de 2010 diz, especificamente, que seus
esforços já estão dirigidos a um evento próximo: as eleições
presidenciais de 2012 na Venezuela. Seguirão aumentando os milhões de
dólares para a subversão e a desestabilização do país, incrementando a
clandestinidade de suas operações na Venezuela, se o governo não tomar
medidas concretas para impedir tal fato.
Operações psicológicas
Washington usa vários mecanismos de ingerência para tingir seus
objetivos. As operações psicológicas são operações planificadas para
transmitir informação seletiva e indicadores para públicos
estrangeiros e com isso influir sobre suas emoções, motivos,
racionalidade objetiva e – ultimamente – sobre o comportamento de
governos, organizações, grupos e indivíduos, segundo o Pentágono.
No orçamento do Departamento de Defesa para 2011, há uma solicitação
nova para operações psicológicas para o Comando Sul, que é quem
coordena todas as missões militares dos Estados Unidos na América
Latina. Em particular, tal solicitação fala de um programa de voz de
operações psicológicas, o que se entende como rádio ou alguma outra
transmissão de áudio que apóie esse objetivo.
Segundo a explicação contida no orçamento, a execução de operações
psicológicas (PSYOP) inclui a investigação sobre audiências
estrangeiras, desenvolvendo, produzindo e disseminando produtos
(programas) para influir sobre essas audiências, bem como a condução
de avaliações para determinar a eficácia das atividades de operações
psicológicas. Essas atividades podem incluir a manutenção de várias
páginas da web e o monitoramento de meios técnicos e eletrônicos.
O orçamento completo para as operações psicológicas durante o ano de
2011 é de 384.8 (trezentos e oitenta e quatro milhões e oitocentos
mil) dólares, que inclui 201.8 (duzentos e um milhões e oitocentos
mil) dólares para a divisão de operações psicológicas e o
estabelecimento, pela primeira vez, de um programa de operações
psicológicas com o uso da voz para o Comando Sul.
Este programa de operações psicológicas é totalmente distinto de
iniciativas como A Voz da América, por exemplo, que é um programa do
Departamento de Estado e da agência estatal Board Broadcasting
Governors (BBG) que manejam a propaganda dos EUA em nível mundial. Na
verdade, o orçamento da BBG para o ano de 2011 é de 768.8 milhões de
dólares e inclui um programa de cinco dias a cada semana, em espanhol,
para a televisão venezuelana.
O aumento das operações psicológicas dirigidos à Venezuela e a América
Latina evidencia uma ampliação da agressão norte americana para com
essa região. É preciso lembrar que, desde o ano de 2006, a Direção
Nacional de Inteligência dos EUA desempenha uma missão especial de
inteligência para a Venezuela e Cuba. Somente quatro dessas missões
especiais existem no mundo: uma para o Irã, outra para a Coréia do
Norte, uma terceira para o Afeganistão e o Paquistão e a quarta para
Venezuela e Cuba. Essa missão recebe uma parte importante do orçamento
de mais de 80 bilhões de dólares que emprega a Direção Nacional de
Inteligência, entidade que coordena as 16 agências de inteligência em
Washington.
(*) EVA GOLINGER é advogada e especialista em analisar documentos
desclassificados pelo Departamento de Estado dos EUA, relativos a
atividades na América Latina, em especial na Venezuela.
__________________________________
Traduzido do espanhol por Izaías Almada.
Fonte: http://aporrea.org.tiburon/n169169.html
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