domingo, 5 de agosto de 2007

Bush corrige a pontaria (2): Líbano





Luiz Eça

A nova estratégia americana para o Oriente Médio, que elege os xiitas como inimigos-chave e os sunitas como eventuais aliados, conseguiu equilibrar as coisas no Líbano.


Os americanos estavam desmoralizados pelo apoio prestado a Israel na invasão, ao lhes fornecer armamentos e retardar o cessar fogo da ONU para dar tempo aos israelenses de infligirem o máximo de danos ao Hezbolá. Foram cúmplices no massacre de mais de mil civis, o que uniu todas as forças políticas libanesas contra Bush. Ele buscou reaproximar-se do governo do sunita Fued Siniora, doando 1 bilhão de dólares ao país que ajudara a destruir. E mais: co-organizou uma reunião de países em Paris, que prometeram quase 8 bilhões para a reconstrução do Libano. Com isso, o governo Siniora voltou às boas com os Estados Unidos e sua aliança com os xiitas começou a ruir. Foi ao chão quando ele recusou a solicitação do Hezbolá para que fosse aumentada a participação xiita no ministério.

Os xiitas reagiram retirando os ministros que tinham no governo Siniora e promovendo grandes manifestações de protesto. A temperatura da crise subiu com a ONU marcando data para o julgamento por um tribunal internacional dos responsáveis pelo assassinato do ex-primeiro ministro sunita, Rafik Hariri em 2005. E se aqueceu ainda mais com o ataque do Fatah al Islam, entricheirado no campo de refugiados de Nahrl AL Bared, contra o exército libanês. O governo Siniora e autoridades americanas acusaram a Síria de estar por trás destas ações delituosas.

A Síria tem uma grande presença no Líbano desde o fim da guerra civil que dilacerou o país, opondo muçulmanos a cristãos. Em 1991, as facções se reconciliaram e solicitaram, com aval da ONU e dos Estados Unidos, a entrada do exército sírio para garantir a paz e reorganizar o exército libanês.

Formou-se, então, um governo de união nacional. Mas, depois de alguns anos, as divergências voltaram. Enquanto os xiitas e parte dos cristãos queriam que os sírios permanecessem mais tempo como proteção contra Israel, os sunitas, drusos e parte dos cristãos consideravam-nos força de ocupação e exigiam sua saída.

Em 2005, o ex-primeiro ministro Rafik Hariri, sunita, foi assassinado. Tendo sido, inicialmente, aliado dos sírios , ele passara para a oposição. Tendo acusado o governo da Síria pelo crime, os partidários de Hariri promoveram uma grande campanha, com respaldo internacional, que resultou na retirada do exército sírio. Chamada a intervir, a ONU nomeou uma comissão de investigação dirigida pelo o alemão Detlev Mehlis.

As primeiras conclusões, largamente difundidas pelo governo americano e agências de notícias internacionais, culpavam a Síria.

Houve, porém, opiniões discordantes até de figuras insuspeitas como o professor Eyal Zisser, especialista em Síria, do Instituto Dayan da Universidade de Tel-Aviv : “É completamente ilógico supor que a Síria o tenha feito. Seria uma decisão imbecil de sua parte. O mundo inteiro está de olho na Síria e ela não teria interesse algum em desestabilizar o Líbano". Parece que ele tinha razão.

As conclusões de Mehlis baseavam-se em dois depoimentos que se provaram duvidosos. Muhammad Said Saddik, segundo a revista Der Spiegel, jactou-se publicamente de que seu testemunho no caso Hariri iria torná-lo um milionário. Por sua vez, Hussam Taher Hussam, posteriormente, voltou atrás, dizendo que era mentira, depois de raptado, torturado e de ter recebido a oferta de 1,3 milhão de dólares de agentes libaneses.

Mehlis se resignou e o seu sucessor, o promotor público belga Serge Brammertz, recomeçou toda a investigação considerando divesas hipóteses.

Para os sírios e xiitas, o atentado teria sido obra do Mossad. Ou mesmo da CIA, que, pelas últimas revelações dos seus arquivos secretos, seria bem capaz disso.

O tribunal da ONU deve começar breve. A Síria recusa-se a colaborar. Sustenta que o processo será político, não jurídico, e que, sob a influência dos Estados Unidos, não se pode esperar isenção. O relatório Mehlis, apontando os suspeitos, ainda não é conhecido. Depois da farsa da primeira investigação, o receio sírio é compreensível.

O caso do Fatah al Islam não foi bem apresentado pela nossa imprensa.

O repórter investigativo Seymour Hersh, da revista New Yorker, deixa as coisas claras: "Uma torrente de dinheiro americano, não aprovado pelo Congresso, foi para o governo do Líbano, o qual, por sua vez, o direcionou para ao menos três grupos jihadistas". Um deles seria o Fatah Al Islam. Hersh cita uma das suas fontes, Alastair Crooke, ex-agente da inteligência britânica: "Fui informado de que, dentro de 24 horas, eles (o Fatah Al-Islam) receberiam armas e dinheiro de pessoas que se apresentaram como representantes dos interesses do governo libanês”.

O Fatah al Islam foi formado por sunitas que se separaram do Fatah al Intifada, adotando uma orientação jihadista (tipo al Qaeda). Diz Abu Hazem, um dos líderes do Al Intifada: "Eles nos disseram que estavam treinando para atacar Israel. De repente, descobrimos que estavam treinando para atacar xiitas no Líbano”.

Para isso, o Fatah Al Islam contaria com recursos dos Estados Unidos e da poderosa família Hariri, liderada por Saad Hariri, filho do líder assassinado, e inimigo dos sírios e do Hezbolá.

Por que então atacaram o exército dos seus aliados do governo libanês?

Frank Lamb, jornalista freelancer, que investigou o assunto no campo de refugiados, explica, no semanário Mother Jones. Os jihadistas teriam exigido um aumento nos fundos fornecidos através do banco Hariri. Como foi negado, eles assaltaram o banco, seguindo-se o tiroteio com militares libaneses, início do conflito que já causou 140 mortes.

No momento, o Líbano está dividido: metade apóia o Hezbolá e os xiitas e metade defende o governo sunita-cristão, pró-americano e anti-Síria. Fala-se que a instalação do tribunal da ONU para julgar o affair Hariri poderá ser o estopim de uma nova crise. Não é provável. Como todos os tribunais, este será lento e muitos meses se passarão antes de funcionar pra valer. Até lá, os desdobramentos são imponderáveis.

Luiz Eça é jornalista.

A flexinsegurança

Vivemos um tempo em que a estabilidade da economia só é possível à custa da instabilidade dos trabalhadores, em que a sustentabilidade das políticas sociais exige a vulnerabilidade crescente dos cidadãos em caso de acidente, doença ou desemprego.

Vivemos um tempo em que a estabilidade da economia só é possível à custa da instabilidade dos trabalhadores, em que a sustentabilidade das políticas sociais exige a vulnerabilidade crescente dos cidadãos em caso de acidente, doença ou desemprego. Esta discrepância entre as necessidades do “sistema” e a vida das pessoas nunca foi tão disfarçada por conceitos que ora desprezam o que os cidadãos sempre prezaram ou ora prezam o que a grande maioria dos cidadãos não tem condições de prezar.

Entre os primeiros, cito emprego estável, pensão segura e assistência médica gratuita. De repente, o que antes era prezado é agora demonizado: a estabilidade no emprego torna-se rigidez das relações laborais; as pensões transformam-se na metáfora da falência do Estado; o serviço nacional de saúde deixa de ser um benefício justo para ser um custo insuportável.

Entre os conceitos agora prezados, menciono o da autonomia individual. Este conceito, promovido em abstrato para poder surtir os efeitos desejados pelo “sistema”, esconde, de fato, dois contextos muito distintos: os cidadãos para quem a autonomia individual é uma condição de florescimento pessoal, a busca incessante de novas realizações pessoais; e os cidadãos para quem a autonomia individual é um fardo insuportável, que os deixa totalmente vulneráveis perante a adversidade do desemprego ou da doença, e que, em casos extremos, lhes dá opção de escolher entre os contentores do lixo do bairro rico ou pedir esmola nas portas do metrô.

No domínio das relações laborais está a emergir uma variante de conceito de autonomia. Chama-se flexigurança. Trata-se de aplicar entre nós (em Portugal) um modelo que tem sido adoptado com êxito num dos países com maior protecção social da Europa, a Dinamarca. Em teoria, trata-se de conferir mais flexibilidade às relações laborais sem pôr em causa a segurança do emprego e do rendimento dos trabalhadores. Na prática, vai aumentar a precarização dos contratos de trabalho num dos países na Europa onde, na prática, é já mais fácil despedir.

Não vai haver segurança de rendimentos, porque, enquanto o Estado providência da Dinamarca é um dos mais fortes da Europa, o nosso é o mais fraco; porque o subsídio de desemprego é baixo e termina antes que o novo emprego surja; porque o carácter semiperiférico da nossa economia e o pouco investimento em ciência e tecnologia vai levar a que as mudanças de emprego sejam, em geral, para piores, não para melhores, empregos; porque a percentagem dos trabalhadores portugueses que, apesar de trabalharem, estão abaixo do nível de pobreza, é já a mais alta da Europa; porque o fator de maior vulnerabilidade na vida dos trabalhadores, a doença, está a aumentar através da política de destruição do serviço nacional de saúde levada a cabo pelo Ministro da Saúde; porque os empresários portugueses sabem que dos acordos de concertação social só são “obrigados” a cumprir as cláusulas que lhes são favoráveis, deixando incumpridas todas as restantes com a cumplicidade do Estado.

Enfim, com a flexigurança que, de fato, é uma flexinsegurança, os trabalhadores portugueses estarão, em teoria, muito próximos dos trabalhadores dinamarqueses e, na prática, muito próximos dos trabalhadores indianos.


Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

Fidel Castro afirma que boxeadores desertores não serão presos


O líder cubano Fidel Castro anunciou que os boxeadores Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, que desertaram nos Jogos Pan-Americanos do Rio, não serão presos, informou um artigo publicado neste domingo pelo líder cubano.


"Estes cidadãos não terão prisão decretada, muito menos serão usados métodos utilizados pelos norte-americanos, como acontece (nas prisões) em Abu Ghraib e Guantánamo. Este tipo de prisão jamais será usada em nosso país", comentou Castro na primeira página do jornal local.

Rigondeaux, campeão olímpico de Sidney-2000 e Atenas-2004, na categoria 54 kg, e Lara, campeão mundial na categoria 69 kg, serão levados "temporariamente a uma casa de visita, onde terão acesso aos familiares e poderão conversar com a imprensa", analisou Castro. "Será oferecido trabalho à favor do esporte, de acordo com seus conhecimentos e experiências", assegurou o líder cubano, que havia os acusado de traição.

Os boxeadores que abandonaram no dia 22 de junho à Vila Pan-Americana antes de competir, foram encontrados pelas autoridades brasileiras na última quinta-feira em Cabo Frio, a 120 km do Rio, sem documentos. Ao serem encontrados, declararam ter cometido um erro, e que estão arrependidos e querem voltar a Cuba.

Castro afirmou que os atletas não foram transferidos para uma prisão, e que permaneciam no mesmo hotel onde foram alojados pela Polícia Federal brasileira, e estão aguardando os documentos necessários para poderem viajar.

"As autoridades solicitaram a documentação e a representação do consulado de Cuba. Seguindo instruções de nosso Embaixador, vamos realizara os tramites pertinente", comentou Castro ao ser perguntado sobra quando os boxeadores vão retornar ao país.

Para o presidente do país centro-americano, o líder Fidel Castro, o caso é uma mostra de "onde o esporte e a política se mesclam, em busca de soluções corretas e princípios, acima dos interesses e das amarguras".

"As autoridades brasileiras podem ficar tranqüilas. Cuba sabe se comportar a altura das circunstancias, acrescentou castro em seu editorial titulado como "A política e o esporte", finalizou Castro.