sexta-feira, 18 de novembro de 2011

As escolhas do CPERS e seus riscos políticos



A assembleia geral do CPERS realizada na tarde desta sexta-feira (18), no Gigantinho, deliberou pela greve já por tempo indeterminado em defesa do pagamento imediato do piso nacional da categoria pelo governo Tarso Genro (PT). A decisão não foi unânime. Uma parte da categoria defendeu que a greve fosse deflagrada no início do próximo ano letivo (março de 2012), alegando que não há mobilização suficiente neste momento para garantir uma greve vitoriosa. Saiu vitoriosa, porém, a tese da direção, defendida na assembleia pela presidente do CPERS, Rejane de Oliveira. Filiada ao PT, a presidente do sindicato manifestou enfaticamente na assembleia sua autonomia em relação ao governo. De fato, essa autonomia acabou prevalecendo, coincidindo com posições de setores ligados ao PSOL e ao PSTU dentro do sindicato, que fazem oposição ao governo Tarso Genro.
O sucesso ou fracasso da greve dependerá, entre outras coisas, do grau de adesão que o movimento terá no início da próxima semana. O CPERS sabe que não há nenhuma possibilidade de o governo estadual pagar o piso este ano (não há sequer previsão orçamentária para tanto), o que foi reafirmado, aliás, logo após o final da assembleia, pelo Secretário Estadual da Educação, José Clóvis de Azevedo. A opção da greve é, portanto, uma opção pelo confronto, apostando no desgaste político do governo a 30 dias do encerramento do ano letivo. Mas esse desgaste pode respingar na própria direção do CPERS. Os professores que falaram em defesa do início da greve em março advertiram para o risco de uma greve fraca agora prejudicar toda a mobilização da categoria no próximo período.
Em entrevista à rádio Gaúcha, logo após a decisão da assembleia, o secretário José Clóvis de Azevedo disse que respeita a decisão da categoria, mas questionou a validade do movimento que, segundo ele, “trará grandes prejuízos para estudantes, pais e os próprios professores”, na medida em que “o CPERS rompeu unilateralmente o diálogo com o governo”.

Opinião do blog: A mobilização do CPERS é legítima e deve ser respeitada. No entanto, a atual direção do sindicato corre o risco de sofrer uma pesada derrota política. A falta de consenso na assembleia desta sexta já é um indicador desse risco. O CPERS apoiou Tarso Genro na campanha eleitoral e parte para o confronto agora, após apenas 11 meses de governo, baseado na cobrança da temporalidade de uma promessa. Tarso diz que prometeu pagar o piso até o final de seu governo e reafirmou esse compromisso. O CPERS, por sua vez, cobra o cumprimento imediato da promessa e espalhou cartazes pelo Estado chamando o governador de mentiroso. Repete, assim, movimento realizado no governo Olívio Dutra, que também recebeu as acusações de “traidor” e “mentiroso”. Os discursos contra Olívio foram tão enfáticos quanto os usados agora contra Tarso. E o que é mesmo que foi conquistado? Quatro anos de governo Rigotto e quatro de Yeda, com os resultados bem conhecidos.
O CPERS apoiou a candidatura Tarso sabendo que os problemas salariais da categoria não seriam resolvidos em onze meses. Mente quem diz que o governo Tarso é igual ao governo Yeda. Quem quiser tirar a dúvida, converse, por exemplo, com o reitor da UERGS ou com a direção da FAPERGS. O governo Tarso não é um governo revolucionário de esquerda que vai romper com o capitalismo (afirmação um pouco surreal de ser feita a essa altura do campeonato, mas necessária, diante da reincidência de certos discursos e cobranças). Disso se segue, entre outras coisas, que os problemas salariais dos servidores não serão resolvidos no curto prazo. Mas, até aqui, as negociações com os servidores não vem sendo conduzidas pelo coronel Mendes. E, ao contrário do que ocorreu no governo Yeda, várias categorias de servidores começaram a ter alguma recuperação salarial.
Diante do que aconteceu no Rio Grande do Sul nos últimos quatro anos, um sindicato importante como o CPERS tem o dever de olhar um pouco além de sua pauta corporativa, pois mais legítima e justa que ela seja. Desconsiderar isso não é exercer autonomia sindical, mas sim optar pela aventura política. Na política como na vida, nem sempre a opção mais radical é a correta.
Mas a greve é do jogo e não adianta chorar. Na oposição, o PT apoiou movimentos similares. Agora, cada um com as suas tarefas: cabe ao governo manter a tranquilidade, tentar manter as escolas funcionando e buscar o diálogo com os setores que estiverem dispostos a fazê-los; cabe ao CPERS mostrar que tem a adesão que diz ter para a greve; e cabe aos dirigentes do sindicato assumir por inteiro suas responsabilidades políticas e suas respectivas consequências.

Perfil do corrupto

Frei Betto, no SUL21

Manifestações públicas em várias cidades exigem o fim do voto secreto no Congresso; o direito de o CNJ investigar e punir juízes; a vigência da Ficha Limpa nas eleições de 2012; e o combate à corrupção na política.
Por que há tanta corrupção no Brasil? Temos leis, sistema judiciário, polícias e mídia atenta. Prevalece, entretanto, a impunidade – a mãe dos corruptos. Você conhece um notório corrupto brasileiro? Foi processado e está na cadeia?
O corrupto não se admite como tal. Esperto, age movido pela ambição de dinheiro. Não é propriamente um ladrão. Antes, trata-se de um requintado chantagista, desses de conversa frouxa, sorriso amável, salamaleques gentis. Anzol sem isca peixe não belisca.
O corrupto não se expõe; extorque. Considera a comissão um direito; a porcentagem, pagamento por serviços; o desvio, forma de apropriar-se do que lhe pertence; o caixa dois, investimento eleitoral. Bobos aqueles que fazem tráfico de influência sem tirar proveito.
Há vários tipos de corruptos. O corrupto oficial se vale da função pública para extrair vantagens a si, à família e aos amigos. Troca a placa do carro, embarca a mulher com passagem custeada pelo erário, usa cartão de crédito debitável no orçamento do Estado, faz gastos e obriga o contribuinte a pagar. Considera natural o superfaturamento, a ausência de licitação, a concorrência com cartas marcadas.
Sua lógica é corrupta: “Se não aproveito, outro sai no lucro em meu lugar”. Seu único temor é ser apanhado em flagrante. Não se envergonha de se olhar no espelho, apenas teme ver o nome estampado nos jornais e a cara na TV.
O corrupto não tem escrúpulo em dar ou receber caixas de uísque no Natal, presentes caros de fornecedores ou patrocinar férias de juízes. Afrouxam-no com agrados e, assim, ele relaxa a burocracia que retém as verbas públicas.
Há o corrupto privado. Jamais menciona quantias, tão somente insinua. É o rei da metáfora. Nunca é direto. Fala em circunlóquios, seguro de que o interlocutor sabe ler nas entrelinhas.
O corrupto “franciscano” pratica o toma lá, dá cá. Seu lema: “quem não chora, não mama”. Não ostenta riquezas, não viaja ao exterior, faz-se de pobretão para melhor encobrir a maracutaia. É o primeiro a indignar-se quando o assunto é a corrupção.
O corrupto exibido gasta o que não ganha, constrói mansões, enche o pasto de bois, convencido de que puxa-saquismo é amizade e sorriso cúmplice, cegueira.
O corrupto cúmplice assiste ao vídeo da deputada embolsando propina escusa e ainda finge não acreditar no que vê. E a absolve para, mais tarde, ser também absolvido.
O corrupto previdente fica de olho na Copa do Mundo, em 2014, e nas Olimpíadas do Rio, em 2016. Sabe que os jogos Pan-americanos no Rio, em 2007, orçados em R$ 800 milhões, consumiram R$ 4 bilhões.
O corrupto não sorri, agrada; não cumprimenta, estende a mão; não elogia, incensa; não possui valores, apenas saldo bancário. De tal modo se corrompe que nem mais percebe que é um corrupto. Julga-se um negocista bem-sucedido.
Melífluo, o corrupto é cheio de dedos, encosta-se nos honestos para se lhe aproveitar a sombra, trata os subalternos com uma dureza que o faz parecer o mais íntegro dos seres humanos.
Enquanto os corruptos brasileiros não vão para a cadeia, ao menos nós, eleitores, ano que vem podemos impedi-los de serem eleitos para funções públicas.

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor do romance “Minas do Ouro” (Rocco), entre outros livros. twitter: @freibetto.

A IDENTIDADE DOS QUADRINHOS NACIONAIS

Por Tiago Bacelar - ZINE BRASIL

Apesar de a produção nacional de quadrinhos ter tido início no século XIX, os gibis brasileiros sempre lutaram para ter uma identidade nacional, quando ao mesmo tempo lutavam para enfrentar os comics americanos e os mangás japoneses e as várias mudanças políticas da nossa história. Poderia se afirmar com isso, que nessa vertente, foi à tira, a única a desenvolver características profundamente nacionais. Apesar de não ter nascido por aqui, a tira ganhou um formato de abordagem bem diferenciado de outros países ocidentais. Somada a rebeldia durante a Ditadura Militar e o underground dos anos 80, a tira ganhou uma roupagem ácida e nada comportada.
Os primeiros vestígios do quadrinho nacional surgem pelas mãos do italiano Angelo Agostini, que firmou carreira no Brasil. Em 1859, veio para São Paulo com sua mãe, a cantora lírica Raquel Agostini. Cinco anos mais tarde, dá inicio à sua carreira de cartunista, com a revista "Diabo Coxo", que contava com textos do poeta Luiz Gama e foi o primeiro jornal ilustrado publicado em São Paulo.
Com o fechamento do Diabo Coxo, Agostini lançou o Cabrião, que circulou até 1867. No mesmo ano, o desenhista parte para a luta abolicionista no Rio de Janeiro, onde inicia a sua fase satírica, principalmente em tudo no que dizia respeito ao governo do Imperador Dom Pedro II. Foi nesse período que colaborou com as publicações "O Mosquito", "Revista Ilustrada" e "Vida Fluminense”.
Em 30 de janeiro de 1869, Agostini publica na revista "Vida Fluminense", Nhô-Quim, considerado o primeiro gibi brasileiro e um dos mais antigos do mundo. Sete anos mais tarde, lança As Aventuras de Zé Caipora, na Revista Ilustrada, sendo o primeiro quadrinho lançado por aqui a ter um personagem fixo. Por desentendimentos com a elite local, Agostini volta a Paris, onde vive por vários anos. Na sua volta ao Brasil, entra para a revista "Dom Quixote" e "Tico-Tico", com a publicação de novas histórias do Zé Caipora, o qual foi publicado até dezembro de 1906. Quatro anos, Angelo Agostini morre e deixa aberto um longo caminho de lutas para o gibi nacional.
A revista Tico-Tico, primeira revista em quadrinhos publicada no Brasil com histórias fechadas e completas, foi lançada, em 1905, pelo jornalista Luís Bartolomeu de Souza e Silva. Em seus primeiros anos, limitou-se a reproduzir os comics americanos de Richard Outcault, “Buster Brown e Tige”, que foram chamados por aqui de Chiquinho e Jagunço. Com o sucesso da publicação, a Tico-Tico decide abrir espaço para desenhistas brasileiros como J. Carlos, autor dos personagens Melindrosa e Lamparina, Max Yantok, criador das histórias de Joca Bemol, Barão de Rapapé e Chico Muque, e Alfredo Storni com as Aventuras de Zé Macaco e Faustina.
Mais tarde se juntariam a estes artistas, o desenhista Luiz Sá com as populares histórias de Reco-Reco, Bolão e Azeitona. A grande maioria dos quadrinhos listados acima eram cópias de obras estrangeiras. A revista Tico-Tico foi publicada até 1956 e ganhou em sua existência leitores como o político Rui Barbosa e o poeta Carlos Drummond de Andrade. Em 1929 foi lançada a Gazeta Infantil, como encarte do jornal A Gazeta, onde foi publicado o nacional Juca Pato. Em 1950 a revista foi extinta.
Conhecido ainda como histórias em quadrinhos, o termo só viria a mudar para Gibi em 1939 com o lançamento de uma revista de mesmo nome, pela Editora Globo. Inicialmente, ela foi lançada como suplemento do jornal O Globo, e foi chamada originalmente de O Globo Juvenil, como uma reação de Roberto Marinho ao sucesso do Suplemento Juvenil do jornal A Nação, que mais tarde viraria a Editora Ebal. Na época, Gibi era uma gíria carioca para menino negro. Por isso que, quando foi lançada pela Editora Globo, a logomarca da revista era a cabeça de uma criança negra.
A revista O Guri, de propriedade de Assis Chateaubriand, surgiu na mesma época, e publicava a charge mais madura do Amigo da Onça, desenhada pelo cartunista Péricles de Andrade Maranhão. O Amigo da Onça foi publicado pela primeira vez na revista O Cruzeiro em 23 de outubro de 1943. Recheado de ironias e críticas, a história do Amigo da Onça mostra um personagem que gosta de quebrar as máscaras e falsidades dos outros, colocando-os em situação para lá de embaraçosas. Foi dessa criação de Péricles que nasceu o jargão popular Amigo da Onça.
A Editora Ebal foi fundada em 1945 por Adolfo Aizen, considerado o Pai dos Gibis no Brasil por sua ousadia em querer difundi-lo no país. O primeiro título lançado pela Ebal foi a Seleções Coloridas, que traziam histórias da Disney e de Carl Barks. Já firmada como a principal editora do gênero no Brasil nos anos 50 e 60, a Ebal era líder nas bancas, chegando a ter mais de 30 títulos mensais com tiragens acima de 150 mil exemplares. Além de comics americanos, a Ebal publicou vários gibis feitos por brasileiros, como Álbum Gigante, Edição Maravilhosa, com adaptações de obras de Euclides da Cunha e José de Alencar, Série Sagrada, com biografias de santos católicos e Episódios e História do Brasil e Figuras do Brasil, com adaptações de fatos históricos.
Durante a década de 50 com a popularização das rádios novelas, seus personagens mais heróicos ganharam versões em quadrinhos. Foi o caso de Jerônimo e O Vingador. Os anos 50 também marcam a ascensão do gênero Terror. Muitos autores brasileiros aproveitaram para preencher o vazio deixado pelos quadrinistas americanos como Eugênio Colonnese, Jayme Cortez, Nico Rosso e Helena Fonseca. Em 1960 começou a ser publicada a revista A Turma do Pererê de Ziraldo, que contava as aventuras do saci pererê, uma das muitas lendas do folclore brasileiro.
Também na década de 60 o cartunista Henfil deu início à tradição do formato "tira" com seus personagens Graúna e Os Fradinhos. Foi nesse formato de tira que surgiu Maurício de Souza, criador da Turma da Mônica. De 1970 a 1986, as revistas de Mauricio foram publicadas na editora Abril, e a partir de 1987 começaram a ser lançadas pela editora Globo, em conjunto com os estúdios Mauricio de Sousa. Suas tiras são publicadas em diversos jornais desde 1959.
Nascido em 27 de Outubro de 1935, Mauricio de Sousa acabou se tornando e se consolidando como o desenhista brasileiro de maior prestígio mundial da atualidade, sendo um dos poucos no Brasil a viverem só de quadrinhos e produtos relacionados a seus personagens. Filho de Antônio Maurício de Sousa, poeta e barbeiro, e de Petronilha Araújo de Sousa, poetisa, Mauricio de Sousa começou sua carreira, desenhando cartazes e ilustrações para rádios e jornais de Mogi das Cruzes, onde viveu. Começou a desenhar histórias em quadrinhos em 1959, com as aventuras do cachorrinho Bidu, que mais tarde viraria a logomarca da Maurício de Sousa Produções.
Mauricio montou uma grande equipe de desenhistas e roteiristas e depois de algum tempo passou a desenhar somente as histórias de Horácio, o dinossauro. Pai de dez filhos, além de criar personagens baseados em seus amigos de infância, Mauricio sempre criou personagens baseados em seus filhos, tais como: Mônica, Magali, Marina, Maria Cebolinha, Nimbus e Do Contra.
Certo dia, o desenhista das histórias da Turma da Mônica, Maurício de Sousa, foi a Tóquio, objetivando estudar a realidade das crianças japonesas. Ele pretendia averiguar quais eram os seus hábitos, desejos, como eram tratados e o que o governo fazia por elas. A viagem foi patrocinada pela Fundação Japão. “Eu queria de todas formas conhecer quem era Osamu Tezuka, um ídolo de mais de três gerações de japoneses”, revelou Maurício. Na chegada ao Japão, o desenhista brasileiro foi surpreendido pela recepção inesperada de Tezuka.

O resultado desse primeiro encontro foi o surgimento de um elo de amizade entre Maurício e o criador do mangá moderno, fortificada com a vinda dele ao Brasil. “Tezuka foi um amigo de fato, confidente e aberto para confidências. Discutíamos em profundidade os caminhos passados e eventualmente os futuros dos quadrinhos e da animação. E foi dele a sugestão de que, mesmo que a Turma da Mônica se espalhe por todo o mundo, ela deve continuar com a poesia, carinho e cuidados na sua produção como até hoje tivemos”, explicou. A amizade do desenhista brasileiro com Tezuka acabou influenciando os seus próprios desenhos.
“Tanto eu, quanto muitos dos artistas da nossa equipe se motivaram a desenhar após conhecerem a obra de Tezuka. A maioria, niseis. E isso quando ainda não havia a febre dos mangás, que hoje influenciam orientais e ocidentais. Tezuka iniciou o processo que, sem dúvida, também ajudou a influenciar nossos traços limpos e firmes”, ressaltou. No início de 1989, Maurício tentou entrar em contato com Tezuka, mas não conseguia. “Recebi várias desculpas pelo telefone, e, nada. Logo em seguida, viajei para Tóquio para realizar algumas transações comerciais. Já tinha desistido de encontrá-lo”, relembrou. Na chegada ao Japão, Maurício recebeu uma ligação de um assistente de Osamu Tezuka. Ele queria que Maurício fosse imediatamente para o Hotel New-Otani, pois Tezuka o estaria esperando para uma conversa.
“Fiquei feliz de rever um amigo, e, fui para lá com uma intérprete. Ao entrar no local marcado, entendi o porquê das desculpas dos seus assessores. Fiquei chocado ao vê-lo abatido e magro, em virtude do estágio avançado do câncer. Mas, no decorrer da conversa, esqueci da sua aparência ao verificar que sua energia e lucidez estavam todas ali, intocadas pela doença”, recordou. Tezuka falou com Maurício sobre muitos assuntos como: a crise da Mushi Produções, as suas últimas produções e uma co-produção, onde os seus personagens se misturariam com os da Turma da Mônica.
Terminado o encontro, um diretor da Tezuka Productions o levou de volta para o hospital. Tezuka tinha fugido para ver o desenhista brasileiro. Maurício recebeu a notícia de sua morte, assim que chegou ao Brasil. Finalizando a nossa entrevista, Maurício explicou o quanto Tezuka foi importante para os quadrinhos e desenhos animados de modo geral, não somente os japoneses. “Um mega criativo como foi o mestre Tezuka deixa círculos que se expandem, na sua forma de influenciar. É como se fossem os círculos que se abrem na água tranqüila após receber uma pedra. Com Tezuka, a água recebeu um pedaço de diamante. Até hoje quando me lembro dele, agradeço por ter tido o privilégio de conhecê-lo e aprendido muitas coisas que me ajudaram na minha carreira”, finalizou.
A década de 60 foi à era de ouro para os gibis de super-heróis no Brasil. Influenciados pelas histórias da Marvel, que chegaram ao País em 1967, tais histórias sustentaram as pequenas editoras paulistas durante um bom tempo. Os super-heróis brasileiros só atuavam quando a editora andava bem das pernas. O primeiro super-herói brasileiro surgiu em 1959, quando a editora Outubro lançou um gibi, inspirado no seriado de televisão, o Capitão Sete, uma cópia do Super-Homem.
O gibi narrava às aventuras de Carlinhos, um garoto levado ao Sétimo Planeta onde desenvolve super-poderes iguais aos do herói da DC. O personagem foi adaptado para o gibi por Jaime Cortez, diretor de arte da Outubro. O gibi do Capitão Sete foi publicado até 1965, passando por vários desenhistas, como Juarez Odilon, Shimamato, Sérgio Lima e encerrando-se nas mãos do argentino Osvaldo Talo. Esta atitude de plagiar descaradamente, comum para a época, só viria a mudar nos anos 70, quando foi criada uma nova lei de direito autoral.
Em 1965 surgiu o Raio Negro de Gedeone Malagola, que acabou agradando os leitores brasileiros, que tinha até então certo nojo das produções brasileiras. Raio Negro abusou do uso em seu formato da concepção de Andy Warhol sobre a cultura de massa, contando as bravuras dos super-heróis Homem-Lua e Hydroman. No mesmo ano, Minami Keizi funda a editora Edrel, em meio ao Golpe Militar de 64.
Sua primeira ação foi contratar os niseis Cláudio Seto, Fernando Ikoma e Paulo Fukue, no intuito de trazer novidades para os leitores brasileiros. No ano seguinte, a Edrel lançou a revista Humor Negro, desenhada por Seto. Entretanto, a baixa qualidade do material não agradou o público-leitor, resultando no seu cancelamento após três edições publicadas. Mesmo com esse fracasso inicial, Minami Keizi não se abateu.
Era uma questão de tempo para os “mangás” nacionais se tornarem o símbolo desse curto período de vida da Edrel. A editora lançou várias revistas com histórias de samurais e outras com personagens inspirados em várias obras de Osamu Tezuka, como Astro Boy, a Princesa e o Cavaleiro e Kimba. Em 1967, a Edrel publica o especial Álbum Encantado, inspirado no estilo shonen, um gênero japonês voltados para adolescentes do sexo masculino. No mesmo ano, Minami Keizi lança Tupãzinho, uma revista de ação e aventura. Na época, a editora Abril chegou a propor para Keizi uma publicação especial para Tupãzinho. Por não querer prejudicar sua empresa, ele não aceitou a oferta da Abril e contra-atacou com uma nova publicação.
No início de 1968, a Edrel publicou Flavo, de Cláudio Seto, na recém lançada, revista Ídolo Juvenil. Flavo era um misto de ficção e contos de fadas. Como forma de enfrentar a Disney e os super-heróis da DC e da Marvel, a Edrel decidiu explorar a questão do erotismo, das doenças sexualmente transmissíveis e dos assassinatos complexos. Na prática, esse projeto acabou sendo voltado para o público adulto, com destaque para os desenhos de Fernando Ikoma e Paulo Fukue.
Numa linha inspirada no shoujo, voltado para meninas, Cláudio Seto, lançou, em março do mesmo ano, a revista Lágrimas do Céu. Suas tramas eram apimentadas de seqüências melodramáticas, cheias de romance. Em agosto, a Edrel publicou o gibi Ninja, desenhado pelo irmão de Seto. Seu público, que era formado só por niseis, não se agradou com as histórias. Essa revista foi cancelada depois de duas edições.
No final de 1968, os censores do Governo Militar se instauraram na sede da Edrel, assim como foi feito nos jornais, nas emissoras de televisão, enfim, em qualquer lugar que fosse conveniente para a ditadura controlar. Dessa forma, todas as publicações passaram a ter o seu conteúdo fiscalizado. Em 1969, Seto emplacou o grande sucesso O Samurai, em clássicos épicos com muito erotismo e violência. Até então, nunca, no Brasil, havia se visto tanto sangue, fúria e paixão numa publicação de quadrinhos.
O governo do general Emílio Garrastazu Médici foi marcado pela violência e repressão a qualquer tipo de manifestação contrária ao regime. O presidente estabeleceu o aumento da censura prévia em todos os meios de comunicação, no intuito de controlar o fluxo de informações, vendendo a todos a idéia do país em grande desenvolvimento econômico, buscando legitimar o golpe através deste crescimento. Em 1973, Médici, irritado com as publicações ousadas da Edrel, ordena o seu fechamento imediato. Com isso, Keizi, Fukue, Seto, Ikoma e a própria Edrel acabaram caindo no esquecimento perante o público. Nesse período, muitas editoras tiveram o mesmo destino da Edrel. O Judoka, da editora Ebal, foi criado às pressas para substituir o personagem Judô-Master, de Charlton Comics, que deixara de ser produzido nos EUA. Sobreviveu até 1973.
Nos anos 90, os artistas brasileiros começam a apelar para o gênero “mangá” brasileiro. Muitas revistas lançadas na época delas eram inspiradas nos animes, desenhos animados japoneses que estavam passando na televisão como a Hyper Comics, de João Vicente. Lançada pela editora Magnum, ela fazia sátiras de séries como Sailor Moon e Cavaleiros do Zodíaco.
“O seu cancelamento reflete o mau sistema de distribuição das publicações, que torna as vendagens quase como uma loteria, onde o editor conta infelizmente com poucos pontos de venda. Na maioria das vezes, isso prejudica publicações de grande tiragem. As de baixa tiragem acabam ficando com um preço elevado por exemplar”, justificou o desenhista Daniel HDR. Por sua vez, em 1999, surge o fenômeno do mangá nacional, Holy Avenger, de Marcelo Cassaro e Érika Awano. A série foi encerrada com 40 edições. Atualmente, um desenho animado estaria sendo produzido pelo cineasta Sérgio Martinelli, diretor de animação e professor de cinema na Universidade Mackenzie, de São Paulo. Holy Avenger foi inspirado nas histórias medievais dos RPGs e no estilo presente nos mangás desse gênero no Japão.
“O fenômeno Holy Avenger pode ser explicado pela forte ligação das histórias com as publicações de RPG que a sua editora já publicava. Por ser uma atividade sociabilizante, o RPG tem a capacidade de manter vínculos por muito tempo com seu publico, podendo com o tempo ganhar novos adeptos. Isso se repetiu com Holy Avenger. Muitos quadrinhos, por não acompanharem seu público, acabam não conseguindo essa proeza. No aspecto de distribuição, Holy Avenger teve os mesmos problemas que a maioria das revistas no país. Mas, a editora soube lidar com os exemplares a mais, relançando-os, mantendo, assim, uma constância no material”, analisou o desenhista Daniel HDR, que nasceu em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Eu já gostava de quadrinhos desde pequeno. Meu pai colecionava quadrinhos, mas tinha como profissão o trabalho de desenhista técnico e projetista. Inicialmente, tive o ímpeto do fã que gosta de se dedicar exclusivamente com isso, mas com as dificuldades do mercado brasileiro, levo essa atividade prazerosa, em paralelo com a de publicitário e professor universitário”, revelou.
Em seguida, Daniel HDR foi trabalhar nas editoras norte-americanas Dark Horse e Marvel Comics, onde passou a desenhar quadrinhos de super-heróis. “Atuar nesse mercado, para mim, tem a mesma importância de publicar em editoras daqui. O essencial, para um desenhista, é está lançando suas produções, o que é algo muito difícil hoje em dia, em meios convencionais. A internet tem se mostrado como uma boa alternativa para os autores iniciantes e experientes”, explicou.
Nesse período que esteve nos Estados Unidos, o artista fez a adaptação americana oficial do mangá de Digimon, que acabou sendo publicada no Japão. “Esse trabalho foi gratificante, pois me aproximou do traço oriental. Ele abriu para mim portas no mercado asiático, onde não havia atuado ainda”, relembrou.
Juntamente com Daniel HDR veio mais um representante do “mangá” nacional, Combo Rangers, criado pelo desenhista Fábio Yabu, nascido em 1979 na cidade de Santos, estado de São Paulo. Suas principais influências foram Osamu Tezuka, Jack Kirby, Walt Disney, Mauricio de Sousa e Stan Lee. Yabu não se considera um desenhista. “Eu sou um contador de histórias, um produtor de conteúdo. Não desenho todas as minhas obras, mas escrevo todas elas com muito prazer”, revelou Fábio Yabu.
Durante a entrevista, o artista contou como surgiu à idéia de criar um quadrinho on-line, os Combo Rangers. “Eles surgiram da minha vontade de trabalhar com meus próprios personagens, o meio on-line foi à forma que encontrei de distribuir meu conteúdo a um baixo custo. Minha inspiração para fazê-los partiu das histórias de seriados japoneses, animes e desenhos antigos como Superamigos”. Para transportar os Combo Rangers da Internet para a publicação pela JBC, Fábio Yabu teve que adaptá-la.
“Nesse projeto, eu tive que fazer uma criação totalmente nova, pois as histórias seguiam rumos diferentes. Então não houve muito problema, além de ter que recomeçar tudo do zero”. Em 2003, Combo Rangers passou a ser publicado pela Panini, onde foi encerrado no ano seguinte. Encerrando o nosso papo, Fábio Yabu fez uma análise do período em que sua obra foi lançada por aqui no Brasil.
“Foi um processo de evolução, como tudo na vida. Foram períodos distintos, dos quais me orgulho muito”. Recentemente, Fábio Yabu lançou o seu primeiro livro, Princesas do Mar - O Mundo de Salácia. Hoje em dia, o gibi nacional ainda tenta sobreviver às duras penas num mercado, que antes era dominado pelos quadrinhos americanos e hoje vive uma enxurrada de mangás nas bancas. Artistas como Mauricio de Sousa e Ziraldo, que vivem unicamente de quadrinhos, infelizmente, ainda é uma exceção. Se isso vai mudar, só vai depender do incentivo das editoras brasileiras a publicação de histórias em quadrinhos feitas por artistas nacionais.

Magistério do RS pode encerrar de braços cruzados o primeiro ano de governo Tarso


Greve do magistério seria primeira no governo Tarso Genro, no apagar das luzes do primeiro ano de mandato | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Samir Oliveira no SUL21

O governador Tarso Genro está às vésperas de enfrentar a primeira greve geral do magistério durante seu mandato. O Cpers reúne os professores da rede pública estadual na tarde desta sexta-feira (18) para deliberar sobre a possibilidade de paralisação por tempo indeterminado.
Leia Mais:
A presidente do sindicato, Rejane de Oliveira, informa que dos 42 núcleos regionais do Cpers, 29 definiram por realizar uma greve. Seis optaram por não realizar o movimento, cinco querem uma greve somente em março e dois acatarão a decisão que for tomada pela maioria.
O magistério gaúcho, assim como em outros estados, reivindica o pagamento imediato do piso nacional de R$ 1.187,00 para uma jornada de 40 horas semanais – considerado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com Rosane de Oliveira, 29 dos 42 núcleos regionais do Cpers já optaram pela greve: "as reformas que o governo quer fazer são uma afronta aos professores" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rejane alega também que as propostas de reforma educacional defendidas pelo Palácio Piratini acirraram o descontentamento da categoria. “Até estávamos pacientes esperando o pagamento do piso. Mas as reformas que o governo quer fazer são uma afronta aos professores e jogam sob os nossos ombros as responsabilidades pelas mazelas da escola pública”, critica a presidente do Cpers, em referência a um sistema de promoções e avaliações que o governo pretende implantar.

“Que o Cpers não se lance na aventura de romper o diálogo”, pede o governador

O Palácio Piratini já se mobiliza diante da possibilidade de ter que enfrentar uma greve dos professores da rede pública estadual. Nesta quinta-feira (17), o governador Tarso Genro fez um apelo ao sindicato da categoria: “Estamos pedindo ao Cpers que não se lance na aventura de romper o diálogo conosco. Se quiserem virar as costas para nós, saibam que quando olharem para trás ainda estaremos de frente para conversar”, disse o petista durante cerimônia em que anunciou a liberação de R$ 44 milhões para a reforma de escolas.
Tarso Genro pede manutenção do diálogo: "Se quiserem virar as costas para nós, saibam que quando olharem para trás ainda estaremos de frente para conversar” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O governador lamentou que estejam divulgando a informação de que ele teria dito que pagaria o piso nacional do magistério já no primeiro ano de governo – quando, na verdade, sempre sustentou que quitaria o compromisso ao longo dos quatro anos de mandato. “Isso é uma inverdade vergonhosa. Lastimo profundamente que essa informação esteja sendo divulgada, porque isso desautoriza a credibilidade de uma instituição que tem uma história respeitável de lutas como o Cpers”, criticou.
Tarso ressaltou, ainda, que se houver greve, ela será respeitada. Mas alertou que os professores não devem aderir à paralisação baseados em falsas informações. “Os trabalhadores têm o direito de entrar em greve, mas não entrem por informações falsas, entrem em greve conscientemente, se isso for um desejo da categoria”, defendeu.
“Essa ato nos surpreende, porque várias pautas foram atendidas. Lamentamos essa atitude do Cpers, que rompe com as negociações", diz Miriam Marroni | Foto: Marcos Eifler/ALRS

“Greve é injusta, inoportuna e prejudica a sociedade”, dizem deputados petistas

A base aliada do governo estadual resolveu engrossar o coro em defesa do Palácio Piratini, diante da ameaça de uma greve no magistério gaúcho. Os líderes do PT, PSB, PCdoB, PDT, PTB e PRB convocaram uma coletiva de imprensa na tarde desta quinta-feira (17) para reafirmarem o apoio às medidas adotadas pelo governador Tarso Genro na área educacional.
O deputado estadual Raul Pont disse que uma greve às vésperas do final do ano letivo é “inoportuna e irá atrapalhar a sociedade, as famílias e os alunos”. O petista lembrou que o orçamento de 2012 traz um aumento de R$ 1,1 bilhão para a educação, dos quais R$ 400 mil serão destinados à recomposição salarial dos professores – e outros R$ 100 mil podem ser incorporados ao montante.
A líder do governo na Assembleia Legislativa, deputada Miriam Marroni, disse que os parlamentares estão surpresos com a possibilidade de uma greve. “Essa ato nos surpreende, porque várias pautas foram atendidas. Lamentamos essa atitude do Cpers, que rompe com as negociações. Uma greve no final do ano letivo não é justa”, condenou a deputada.