sexta-feira, 7 de março de 2008

Beto Guedes - A Página do Relâmpago Elétrico (1977)




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Brasil, 1968 (1): o assalto ao Céu, a descida ao Inferno





Mário Maestri

Os inícios dos anos 1960 haviam sido contraditórios para as lutas sociais no mundo. Em 1964, sob a orientação colaboracionista do Partido Comunista, o movimento popular brasileiro fora derrotado sem lutar. Em 1965-66, a mesma política facilitara o massacre de um milhão e meio de comunistas e a consolidação da ditadura na Indonésia. O assassinato do líder marroquino socialista Ben Barka, na França, em outubro de 1965, e a deposição de Ben Bella, por Boumedienne, na Argélia, em junho do mesmo ano, registravam também os limites da luta pela emancipação social, sob a direção de classes burguesas nacionais tidas como progressistas.

A década iniciara-se também sob signos auspiciosos. Nas barbas do gigante imperialista, em 1959, a partir da Sierra Maestra, um grupo de jovens revolucionários galvanizara a população da pequena ilha e vergara a ditadura odiada. Dois anos mais tarde, a revolução cubana assumia caráter claramente socialista. Em abril de 1961, o fiasco da invasão imperialista da baía dos Porcos aumentara a humilhação estadunidense. Sobretudo na Indochina, avançava incessantemente a luta armada das forças populares vietnamitas, apesar dos ingentes recursos militares empregados pelos EUA.

A derrota brasileira

A derrota no Brasil pesara fortemente sobre a conjuntura mundial. No início da década de 1960, amplos setores populares e médios haviam aderido às propostas de difusas reformas de base que, prometia-se, resgatariam os marginais das cidades e dos campos e relançariam o industrialismo, que modernizara relativamente nas três décadas anteriores a anacrônica estrutura rural da nação. Em 1964, o projeto nacional-reformista fora abortado violentamente. Em nome das classes proprietárias do país, os militares impuseram a ditadura, reprimindo duramente o movimento popular. A derrota fora ainda mais frustrante porque ocorrera sem qualquer resistência, precisamente quando muitos se julgavam a um passo da vitória.

Os grandes líderes populistas — Jango, Brizola e Arraes — abandonaram o país sem resistirem. Brizola propusera, inutilmente, oposição de última hora, rejeitada terminantemente pelo presidente João Goulart, seu cunhado. O Partido Comunista Brasileiro, a grande organização da esquerda, de orientação pró-soviética, mantivera até o triste fim do governo constitucional seu atrelamento ao populismo nacionalista, emperrando a organização autônoma dos trabalhadores. Após o golpe de 1964, o Partidão reafirmou sem qualquer autocrítica sua política colaboracionista.

Porém, no Brasil, a euforia dos vencedores seria curta. Através do mundo, a crise capitalista mundial, que se insinuaria nas principais economias mundiais em 1967, pela primeira vez após longos anos de crescimento ininterrupto, exigia que trabalhadores e assalariados apertassem os cintos, para que o grande capital tirasse suas castanhas do fogo. Desde abril de 1964, os militares brasileiros intervieram nos sindicatos; parlamentares populares tiveram os direitos políticos cassados; militares democratas foram reformados; conquistas sociais foram confiscadas; a renda da classe média e dos trabalhadores despencou devido à violenta política recessiva ditada pelo grande capital ao governo subserviente do ditador Castelo Branco (1964-67).

O desemprego aumentava. A inflação crescia. As classes médias passavam desiludidas para a oposição, após haverem marchado em março de 1964 com Deus, pela pátria e pela família, convocadas pelo imperialismo, pela Igreja e pelos partidos de direita, preparando a intervenção militar que salvaria o país da "ditadura sindicalista". Políticos anti-populares, ou que haviam apoiado o golpe, como Carlos Lacerda e Juscelino Kubitschek, marginalizados do poder, uniram-se a João Goulart em uma efêmera "Frente Ampla", em fins de 1966, ao compreender que os militares pretendiam eternizar-se no poder.

Poder Negro

A situação internacional era tensa e dinâmica. Após o fiasco dos regimes árabes conservadores, com destaque para o Egito, a Síria e a Jordânia, na Guerra dos Seis Dias contra Israel, de inícios de junho 1967, a guerrilha palestina assumia a luta anti-sionista em lugar das direções conservadoras desmoralizadas. Com a crise econômica chegando aos EUA, em boa parte devido aos gastos de guerra, que antes haviam apenas garantido lucros ao grande capital, o movimento pacifista estadunidense questionava duramente a intervenção no Vietnã e os valores do american way of life. O imperialismo yankee era golpeado no próprio ventre. Malcolm X fora assassinado em fevereiro de 1965, em Nova York, mas o black power fortalecia-se e os bairros negros ardiam sob o fogo do ódio da população humilhada. Os hispano-estadunidenses e as próprias populações ameríndias levantavam também a cabeça. No Vietnã, em 30 de janeiro 1968, morreriam os sonhos de vitória militar, com a ofensiva do Ano Ted, durante a qual os vietcongs atacaram mais de trinta cidades sul-vietnamitas e a própria embaixada norte americana, em Saigon. Entretanto, a classe operária estadunidense mantinha-se imóvel sob a hegemonia do grande capital.

De 31 de julho a 10 de agosto de 1967, produzia-se em Havana, Cuba, o primeiro encontro internacional da Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS). Após teorizar sumária e superficialmente a experiência vivida na ilha, a direção cubana propunha claramente a generalização incondicional da luta guerrilheira rural. "Criar um, dois, mil Vietnãs". Ainda que de forma confusa e voluntarista, a OLAS rompia o monopólio político soviético, que defendia, na América Latina e através do mundo, a colaboração e subordinação do movimento popular às burguesias nacionais, apresentadas como progressistas. A presença de Carlos Marighella no encontro da OLAS, noticiada amplamente, ao ser conhecida no Brasil levou à expulsão do conhecido militante comunista do PCB. A captura e morte de Guevara, em 8 de outubro de 1967, na selva boliviana, foi vista com um duro percalço no longo caminho a ser trilhado, e não como resultado das inconseqüências da proposta de início da luta armada por pequenos grupos à margem das lutas e da consciência reais dos trabalhadores.

No Brasil, como na França, na Itália, na Alemanha Federal, no Japão, no México e em tantas outras regiões do mundo, 1968 abrir-se-ia sob o signo da resistência já explícita. A crise econômica de 1967 levara a que o movimento operário brasileiro, lutando contra o arrocho salarial, se recuperasse, minimamente, dos golpes sofridos. Em 16 de abril, mil e duzentos operários da siderúrgica Belgo-Mineira cruzavam os braços em Contagem, Minas Gerais. Logo, dezesseis mil trabalhadores encontravam-se em greve. O movimento encerrou-se no início do mês seguinte, com um abono salarial de 10%. No 1° de maio de 1968, outra importante vitória. O governador Abreu Sodré e sua comitiva, convidados por sindicalistas pelegos e do PCB para subir ao palanque da praça da Sé, foram vaiados, escorraçados e obrigados a refugiar-se na catedral paulistana. Os participantes do comício queimaram o palanque e partiram em passeata. No mês seguinte, eclodiram breves paralisações nas montadoras de São Bernardo.

Paris brûle-t-il?

Em maio, fortíssimos ventos europeus avivavam o braseiro nacional. A cidade de Paris, e a seguir a França, foi convulsionada pelo estudantado universitário enragé. Muito logo, o movimento operário iniciou dura e longa greve geral. O governo De Gaulle recuou, a ordem burguesa tremeu, falou-se em governo popular, antes que o Partido Comunista Francês canalizasse a mobilização da rua e as ocupações de fábrica para a luta institucional, enterrando-as sob um estrondoso fracasso eleitoral. O maio francês galvanizou o mundo, colocando quase nas sombras as lutas estudantis e operárias igualmente muito duras na Itália e na própria Alemanha Federal, avivada neste último país pelo atentado ao líder estudantil Rudi Dutschke, em 11 de abril de 1968. No mesmo mês era assassinado Martin Luther King, em Memphis, Tennessee. Na França, lutara-se contra o autoritarismo, contra a discriminação, contra os privilégios, pelo socialismo operário e democrático. Uma geração de líderes de vinte anos conquistava a juventude do mundo com seu radicalismo, inconformismo, desprendimento, coerência. Daniel Cohn-Bendit, Alain Krivine, Jacques Sauvageot etc.

A vitória cubana impusera o princípio de que a revolução se iniciaria pela ação exemplar de alguns guerrilheiros. Em 1967, o foquismo seria teorizado em "Revolução na revolução?", pelo jovem francês Regis Debrey, intelectual de rápida vocação guerrilheira de pouco sucesso. Se o foco não pudesse ser lançado no campo, seria iniciado na cidade. Desde janeiro de 1967, o ativismo dos Guardas Vermelhas contra a restauração capitalista, hoje plenamente vitoriosa, prestigiava o maoísmo, sobretudo entre os jovens católicos radicalizados. A ação das organizações trotskistas na França propagandeou o marxismo-revolucionário, o anti-stalinismo, o anti-burocrático, tornando a seguir Ernest Mandel figura pública mundial.

Fragilizado pela derrota de 1964, o PCB explodia em uma constelação de grupos radicalizados. Jovens chegados em boa parte da Juventude Universitária Católica (JUC) e da Juventude Operária Católica (JOC) aderiam à luta anti-imperialista e anti-capitalista. Então, o Brasil conhece uma multiplicidade de pequenas organizações revolucionárias (ALN, PCBR, AP, POLOP, VAR-Palmares, POC, Fração Bolchevique-Trotskista, MRT etc.) com algumas centenas de militantes, mais comumente de 17 a 25 anos, e abrangência em geral regional. A juventude universitária e secundarista abraçava a luta política, cultural e ideológica, com destemor, magnanimidade e impaciência. Saía às ruas pichando – literalmente, pois, na época, não havia o spray – "Mais verbas e menos canhões"; "Um, dois, mil Vietnãs", "O povo unido derruba a ditadura"; "Viva a aliança operário-estudantil". Conscientes que não há prática sem teoria, os jovens militantes liam sem cessar, sobretudo história, economia, sociologia — A revolução russa, de Trotsky; O diário na Bolívia, de Guevara; Os três Profetas, de Isaac Deutscher; A revolução brasileira, de Caio Prado Júnior; O livro vermelho, de Mao; os Poemas do Cárcere, de Ho Chi Minh.

Em 1968, por primeira vez no Brasil, a Civilização Brasileira publicava O capital, de Kark Marx. Militantes imberbes devoravam os grossos volumes, de fio a pavio, página por página, sem compreenderem muito. Estudavam-se e debatiam-se os mínimos detalhes da revolução russa, chinesa e cubana, ainda que fosse bem menor o interesse sobre a história do Brasil, sobretudo do período anterior a 1930, durante o qual as categorias da sociologia do capitalismo não eram plenamente funcionais. Pelo país afora, discutia-se e polemizava-se duramente. O futuro estava ao alcance da mão. Abraçavam-se as nuvens, em um assalto aos céus.

Mário Maestri é doutor em História pela UCL, Bélgica. É professor do curso e do programa de Pós-Graduação em História da UPF. Esteve preso, em 1968, quando estudante, e viveu, como refugiado, no Chile e na Bélgica, de 1971 a 1977. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email


Encontro com Milton Santos ou: O Mundo Global visto do lado de cá

A partir de uma entrevista feita com o intelectual Milton Santos em 4 de janeiro de 2001 é discutido o tema da globalização e seus efeitos nos países e cidades do planeta.


Créditos: Makingoff - Tuk

Gênero:
Documentário
Diretor: Silvio Tendler
Duração: 89 minutos
Ano de Lançamento: 2006
País de Origem: Brasil
Idioma do Áudio: Português
Qualidade de Vídeo: DVD Rip
Vídeo Codec: DivX
Vídeo Bitrate: 163 Kbps
Áudio Codec: LameMP3
Áudio Bitrate: 1280 Kbps
Resolução: 720X480
Formato de Tela: Tela Cheia (4x3)
Frame Rate: 29.970 FPS
Tamanho: 855 Mb
Legendas: Sem Legenda

Ganhou o Candango de Melhor Filme - Júri Popular, no Festival de Brasília 2006.
O diretor Sílvio Tendler conheceu Milton Santos em 1995, enquanto dirigia Josué de Castro - Cidadão do Mundo.

- A entrevista gravada com Milton Santos foi a última audiovisual por ele concedida. Em junho do mesmo ano ele faleceu, devido a um câncer.

O festival de Brasília existe há 39 anos e sua principal marca é a da ousadia. Tem como amálgama a paixão do seu público que reage movido pela emoção sem preconceitos. Foi o caso do festival que se encerrou esta semana

Primeiro preconceito: documentário não é cinema. O júri oficial descartou os filmes documentários da premiação para melhor filme. O público que gosta de cinema votou em dois documentários (curta e longa metragem) para melhor filme.

Segundo preconceito: coisa séria enche e cansa. O júri popular votou em dois filmes "papo cabeça".

O curta de Anna Azevedo, O Homem-Livro, trata de um pedreiro que, numa modesta casa de subúrbio do Rio de Janeiro constrói uma biblioteca. A modéstia pára por aí. O pedreiro já tem um acervo de 42 mil livros que ocupam todos os espaços de sua casa. Ao vivo, durante uma entrevista a que assistia pela televisão, pede ao arquiteto Oscar Niemeyer que lhe ajude a construir uma biblioteca. O arquiteto aceita.

A força do personagem contagia a platéia que ovaciona o filme. No meio da torrente de obras tecnicamente bem realizadas desprovidas de conteúdo, o filme destaca-se, juntamente com outras três ou quatro honrosas exceções, por sua simplicidade e singeleza técnicas que evidenciam a força do personagem.

Melhor longa metragem, o público votou no meu "Encontro com Milton Santos ou o Mundo Global Visto do Lado de Cá". Difícil argumentar em causa própria mas, também não desperdiçaria o espaço e a ocasião para partilhar minhas emoções. Fiz, o que chamo, um panfleto necessário sobre a globalização. Nestes tempos de consumo voraz apresentei um diagnóstico do processo civilizatório que, segundo o escritor uruguaio Eduardo Galeano, um dos entrevistados no filme, "está consumindo o planeta". O filme discute ainda ética, justiça e democracia. Foi isso que o público quis. E votou.

Acredito no cinema político e no seu potencial transformador. Se não acreditasse não estaria hoje trabalhando com comunicação, não estaria agora varando a madrugada escrevendo este artigo... Não acredito na neutralidade da informação. Não sou objetivo, tenho objetivos com minha arte engajada. O mais nobre deles é de tentar ajudar a construir um mundo melhor, mais solidário. Por isso fiz Milton Santos, uma parceria com este filósofo e geógrafo que proporciona um outro olhar sobre o mundo e apresenta alternativas a este que aí está. Proponho através da ótica cinematográfica ajudar a construir uma outra ética para a humanidade. Ë ver para crer. O público de Brasília viu e aplaudiu. O cinema pode ser, como diz o professor Milton Santos, outra coisa.

Silvio Tendler é cineasta, autor dos filmes Os Anos JK - Uma Trajetória Política (1980); Jango (1984); Castro Alves - Retrato do Poeta (1990) e Glauber, o filme, labirinto do Brasil (2001).

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RECESSÃO AMERICANA TERÁ GRAVE IMPACTO NA AMÉRICA LATINA, MAS NO BRASIL SERÁ MENOR

Luiz Carlos Azenha

O CEPR, Center for Economic and Policy Research, de Washington, é dedicado a estudar a relação política e econômica entre os Estados Unidos e a América Latina. Em estudo recém-divulgado, assinado por Mark Weisbrot, John Schmitt e Luis Sandoval, avalia o impacto econômico de uma recessão americana na região.

Vocês sabem que os Estados Unidos importam tudo. Do suco de laranja brasileiro a brinquedos eletrônicos chineses. O déficit comercial americano bateu em 5.8% do PIB em 2006. "Deficits dessa magnitude levaram a um grande crescimento da dívida externa dos Estados Unidos", dizem os autores, lembrando que ela chegou a U$ 2,9 trilhões no final de 2006, ou 19,7% do PIB.

Eles argumentam que a situação é insustentável. E acreditam que, a partir da redução do crescimento americano - ou mesmo de uma recessão - o déficit comercial americano será ajustado, caindo de 5.2% do PIB em 2007 para 3% em 2010.

"Alguns países são mais dependentes do mercado americano do que outros. Por exemplo, 77% das exportações do México vão para o mercado americano e essas exportações representaram cerca de 21% do PIB em 2007. Outros países onde as exportações para os Estados Unidos constituem uma parcela significativa do PIB incluem Honduras (37%), Nicarágua (26%), Canadá (23%) e vários outros países da América Central e do Caribe", diz o texto.

Já na América do Sul, as exportações para o mercado americano representam "apenas" 2.9% do PIB do Brasil e 1.6% do PIB da Argentina. "As exportações da Venezuela para os Estados Unidos representam 15% do PIB, mas 95% disso é petróleo. Nos cálculos que seguem consideramos que as exportações de petróleo, gás e produtos relacionados não cairão por causa da redução do crescimento econômico dos Estados Unidos. Isso reduz o efeito da crise americana no Canadá, Colômbia, Equador e Venezuela."

Os economistas projetaram dois cenários. Um considera um pequeno ajuste no déficit comercial dos Estados Unidos. Outro, um ajuste profundo.

A redução do PIB brasileiro por conta disso, segundo o estudo, ficaria entre 0.2 e 0.4% do PIB.

A do Canadá ficaria entre 2.8 e 4% do PIB.

A do México ficaria entre 2.9 e 4.1% do PIB.

A da Venezuela ficaria entre 0.1 e 0.2% do PIB.

A de Honduras ficaria entre 5.9 e 8.3% do PIB.

A da Bolívia entre 0.3 e 0.5%.

A da Colômbia entre 0.4 e 0.5%.

A do Equador entre 0.6 e 0.8%.

A do Chile entre 0.9 e 1.2%.

"Os países que vão sofrer mais como resultado da redução de importações americanas são aqueles com os quais os Estados Unidos fizeram tratados de 'livre comércio' em décadas recentes, inclusive o NAFTA entre EUA, Canadá e México, o Tratado de Livre Comércio da América Central com a República Dominicana e o CAFTA, que inclui Estados Unidos, Guatemala, El Salvador, Costa Rica, Nicarágua, Honduras e a República Dominicana", diz o estudo.

Os autores não consideraram outros efeitos da redução da atividade econômica nos Estados Unidos, como nas remessas de dinheiro. Menos atividade econômica, menos emprego, queda das remessas.

As remessas representam 31% do PIB do Haiti, 17% na Nicarágua, 16% em El Salvador, 16% na Jamaica e 11% na Guatemala. Nem todo o dinheiro vem dos Estados Unidos, mas com certeza é a maior fatia.

A partir do estudo podemos tirar várias conclusões.

Existe justificativa para que países da região, especialmente os exportadores de energia, procurem outros mercados e façam parcerias com o Irã, a Rússia, a China e a Índia. Não há nada de revolucionário nisso, apesar do que dizem o governo Bush e a TV Globo. É uma questão de sobrevivência econômica.

Países como a Nicarágua, por exemplo, vão ficar mais dependentes de quem pode lhes facilitar a vida - Hugo Chávez e os bilhões que ele controla com o barril de petróleo a 100 dólares.

Vem aí uma crise econômica grave, com efeitos na segurança pública e na política, em países importantes como o México - onde já assistimos à militarização do governo para combater a imigração ilegal e os movimentos sociais. O México já desloca tropas para segurar, na fronteira com a Guatemala, o fluxo de imigrantes ilegais da América Central que estão a caminho dos Estados Unidos.

Teremos desespero econômico em países como Honduras, Guatemala e Haiti - os militares brasileiros que se preparem para uma explosão política de fundo social no Haiti. A Guatemala, de governo novo, está de olho em reforçar os laços econômicos especialmente com o Brasil.

Os imigrantes servirão de bode expiatório para problemas econômicos estruturais e dependência excessiva do mercado americano. Já acontece na Costa Rica, onde o "problema" são os imigrantes que chegam da Nicarágua; e na República Dominicana, onde a "culpa" é de quem vem do Haiti.

Podemos esperar maior imigração entre países da América Latina, com as consequências econômicas e políticas resultantes disso.

Como a soberania política está intimamente ligada à soberania econômica, assistiremos à ascensão relativa de países com recursos naturais - Venezuela, Equador, Bolívia, Colômbia e Brasil.

É uma oportunidade de ouro para que o Brasil faça avançar seus interesses econômicos e políticos até o México.

A paz verdadeira na América Latina, com a eliminação política - e não militar - das FARC faz todo sentido para a integração econômica, especialmente na América do Sul.

Quem seria o maior ganhador de um mercado continental e da integração física através de estradas, ferrovias, ligações aéreas e trocas de mercadorias?

Que tal o Brasil?

Qual é a maior dificuldade para que isso aconteça?

Seria a instabilidade política?

A quem interessa desmobilizar as FARC de forma pacífica, através de um acordo político?

A quem interessa evitar a partilha da Bolívia, através de uma saída diplomática?

A quem interessa mandar bala nas FARC?

A quem interessa partilhar a Bolívia?

Eu gostaria de ouvir as respostas. Mas sem a papagaiada do Ali Kamel e congêneres.