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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Um ótimo lugar para se visitar durante o FST de Porto Alegre

Um local de Porto Alegre:o universo da Lancheria do Parque

André Carvalho no SUL21

- “Um suco de laranja batido”;
- “Dois pasteis de carne”;
- “uma torrada com ovo”.

Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Quem já foi na Lancheria do Parque (Av. Osvaldo Aranha, 1086) certamente reconhece as clássicas frases descritas acima. É assim que – aos gritos –, os garçons da Lanchera, como é popularmente conhecida, anunciam a seus colegas no balcão os pedidos dos clientes. Com a Redenção como seu pátio e menção ao parque em seu nome, o local é conhecido por seus lanches e sucos relativamente baratos. Porém, nas décadas de 80 e 90, o seu forte era a venda de cervejas.
Nessa época, o Bom Fim era o bairro boêmio de Porto Alegre e a Avenida Osvaldo Aranha era rodeada por bares como o Ocidente, o Bar João, o Lola, o Viva a Vida, o Luar, Luar, o Bar Fim e o Escaler, entre outros, além do clássico cinema Baltimore. Hoje, restaram apenas o Ocidente, além da própria Lancheria, como “sobreviventes” daquele período.
Naqueles tempos, a propósito, a Lanchera era conhecida por ser um dos últimos lugares abertos na madrugada porto-alegrense, fechando sempre depois das 05h da manhã e por vender cerveja barata, fato que acabava reunindo nas noites de sexta e sábado mais de quinze mil pessoas na sua frente. “A gente fechava aqui e ia sentar nos cordões da calçada com a galera pra conversar. Mas eu não sei o que aconteceu, se as condições sociais foram mudando ou o quê… Mas em tão pouco tempo a madrugada no Bom Fim se tornou bem violenta”, garante Mauri Fachini, funcionário, atendente, com 20 anos de Lancheria.
“Hoje em dia, a cerveja sai bem pouco e já não reunimos mais grandes multidões. Se temos mil clientes diários, é muito”, explica Fachini, que acrescenta: “O bom, pelo menos, é que hoje, os clientes que antes vinham tomar cervejada vêm agora tomar suco. Eles não deixaram de freqüentar a Lancheria”, complementa.

Cooperativa Lancheria do Parque

Eles não param | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sobre o termo “funcionário”, Mauri Fachini faz questão de salientar: “Aqui não temos funcionários, temos colegas de trabalho”. Isso porque há aproximadamente 12 anos, o Seu Ivo e a Dona Inês, proprietários da Lancheria do Parque, decidiram transformá-la em uma cooperativa, tornando seus demais colegas sócios do local.
“Quando o Seu Ivo fez a proposta da sociedade, trabalhavam aqui 10 pessoas. Ele nos informou que não iríamos mais ter férias, não teríamos mais horário normal pra trabalho e queria que a gente se dedicasse integralmente à Lancheria. Porém, daquele dia em diante, deixaríamos de ser funcionários e passaríamos a ser sócios da empresa”, explica Mauri.
Atualmente, trabalham na Lanchera 27 pessoas — porém, Fachini não sabe precisar quem é sócio e quem é trabalhador de carteira assinada. “No momento que começa a trabalhar aqui, não interessa se faz parte da sociedade ou não, porque vai pegar junto igual, vai fazer as mesmas coisas, trabalhando em média 08h, 09h por dia”.
Seu Ivo | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Para ele, a maior vantagem da sociedade foi o ganho financeiro. “Uns ganham um pouquinho mais, outros um pouquinho menos, depende do tempo que se tem de Lancheria”, conta. Além disso, Mauri explica que quando o bar ganha um novo sócio, ninguém tem sua porcentagem diminuída, a não ser o Seu Ivo e a Dona Inês. “Como eles ficaram com a maior porcentagem da sociedade, ao entrar alguém novo, ele faz a divisão dos lucros a partir da cota dele, sem diminuir o que os outros ganham”.
Por se tratar de uma cooperativa, a Lancheria não visa lucros. Isso justifica as suas instalações simples, mas que não desmotivam as pessoas de frequentarem o local.  “Nós não temos ar condicionado, nossos bancos e mesas são os mesmos desde há muito tempo e mesmo assim, as mais variadas pessoas vêm aqui diariamente”, argumentou Fachini. Sobre a divisão dos valores arrecadados, ele explica: “Com a sociedade, nós deixamos de ter salários, trabalhamos com um caderninho. Hoje eu preciso de 500 reais, outro de 300. E aí vai anotando quanto cada um retirou. Chega ao final do dia e faz uma redistribuição. Com isso, nós não trabalhamos com dinheiro em caixa e consequentemente, nunca sabemos quanto ganhamos no mês”.

O confuso – mas nem tanto – sistema de organização da Lancheria

Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Não há quem vá na Lanchera e não se surpreenda com o “diferenciado” sistema de organização de seus cooperativados. Após anotar o pedido na comanda, o garçom avisa ao colega que está no balcão, o que o cliente quer. Para o seu colega e para todos os demais frequentadores, na verdade, já que é aos gritos que eles se comunicam. E o mais curioso é que aquele que faz um lanche ou um suco já está de costas, nem olhando para o garçom.
Mauri garante que, apesar da organização parecer confusa para quem vê de fora, o sistema do grupo não tem mistério. “A gente já se acostumou. Depois de uma semana tu já conhece as vozes que trabalham contigo, sabe quem vai gritar. O chapista pode estar conversando, aí o garçom gritou e ele já vai lá e faz. É automático. Pra quem esta de fora pode parecer difícil, mas pra nós é barbada. Complica quando troca de setor, mas em um ou dois dias já se entra no ritmo”, acrescenta.
Citando o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin – onde o ator passa todo o tempo apertando um mesmo parafuso, cumprindo a mesma função, Fachini explica que a Lancheria tentou fugir dessa lógica, pois cada um trabalha onde trabalha por opção e não por obrigação. “Eu, por exemplo, não tenho função. Eu vivo todos os setores. Se precisar limpar o banheiro, eu vou limpar, se precisar trabalhar na cozinha eu vou pra lá, se precisar cortar fruta, eu vou cortar. Aí tu acabas sabendo de tudo um pouco”. E complementa: “Se um dia tu quiseres sair daqui e montar o teu próprio negócio, tu vai estar apto. Quem trabalha aqui, só tem a ganhar. Tem muitos que saíram daqui e estão se dando bem em outros setores”.

O futebol da madrugada
Balcão vazio é uma foto difícil durante o dia | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

É muito comum encontrar os trabalhadores da Lancheria do Parque em mais de um turno trabalhando arduamente. Isso porque o sistema de horário da cooperativa é diferenciado. “Uns trabalham oito, nove, às vezes até 10 horas diretas, outros preferem trabalhar quatro horas de manhã e o restante de noite, isso varia muito”, conta Mauri.
Porém, o que ninguém imagina, é o que eles fazem assim que as portas do local se fecham. Ao invés de aproveitar o tempo que deveria ser destinado para o descanso, o grupo prefere atravessar a Avenida Osvaldo Aranha e entrar no estádio público Ramiro Souto, localizado dentro do Parque da Redenção.
A partida inicia tradicionalmente às 02h e não tem hora para terminar. Segundo Fachini, o jogo acaba quando o primeiro se cansa ou até “o sol se despontar”. “Eu não jogo mais, joguei por 18 anos, mas agora encerrei minha carreira. Mas o futebol ainda rola. A galera joga no inverno, agasalhado, com neblina, chuvisco, zero grau, menos um. Sempre de madrugada. Tem colega que não trabalha no turno da noite, mas vem pra cá só pra jogar futebol”, conta, faceiro.
Mas o jogo não ocorre somente entre os colegas de Lancheria. Vez que outra o grupo recebe a visita do time de médicos do HPS, do Clínicas, de músicos famosos de Porto Alegre, ou de estudantes da UFRGS para fazer um confronto na madrugada. “Eles estão sempre na noite. Esse é o horário que eles têm para o lazer”, conclui Fachini.
Mas a curiosidade não para na partida de futebol. Mauri conta que tirando o Seu Ivo, que chega há trabalhar cem dias sem tirar um dia de folga, os demais colegas folgam uma vez por semana. Porém, ele diz que em seus dias de folga o local que ele mais gosta de ir é na própria Lancheria do Parque. “Às vezes minha mulher pergunta: ‘Onde é que tu quer comer?’ E eu respondo: “Ah, quero comer na Lanchera”. Por quê? Porque eu sei quem está fazendo, sei de onde veio a comida e sei que é coisa boa. A não ser que eu queira comer um churrasco, aí eu vou pra outro lugar. E não sou só eu, os demais colegas também gostam de vir comer aqui”.

 Lancheria do Parque: um local da diversidade cultural

O famoso suco no copo de liquidificador | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Aproximando-se do seu trigésimo aniversário, a ser comemorado no dia 09 de maio, a Lancheria do Parque é consagrada por seus frequentadores como um dos pontos mais tradicionais e ecléticos da capital. Para Mauri Fachini, a Lancheria é um dos poucos lugares da cidade onde o rico e o pobre encontram-se no mesmo espaço e têm atendimento igual. “Tu podes vir a qualquer hora do dia ou da noite e poderás encontrar um executivo, de terno e gravata, em uma mesa, e um operário, um pedreiro em outra. Aqui dentro eles são iguais e terão um tratamento igual. É isso que a Lancheria quer”, garante.
Porém, não são apenas os trabalhadores comuns que freqüentam o local. Para a classe artística em geral, a Lancheria do Parque é parada obrigatória entre o ensaio e o show, ou para o café da manhã, depois da longa madrugada. Segundo Fachini, “esse pessoal nem são clientes da Lancheria, eles são da casa. O pessoal da Cachorro Grande, do Papas da Língua, Apanhador Só, Pata de Elefante. Às vezes a gente convive mais com eles do que com a nossa própria família”, comenta. E aproveitando a deixa, conta uma historia recente: “Outro dia o André Damasceno veio aqui e falou uma coisa muito engraçada: ‘A Lancheria do Parque tem o segundo melhor bauru de Porto Alegre’. Quando perguntei qual seria o primeiro ele respondeu: ‘O primeiro ainda não se sabe, porque ninguém descobriu’”, concluiu, aos risos.
Se por um lado a classe artística é grande freqüentadora da Lanchera, a dos políticos há muito tempo desistiu de tomar os tradicionais sucos nas horas vagas. “Político do grande escalão só vem, quando vem, em época de eleições, pra fazer política. O Olívio Dutra vinha bastante, agora não vem mais”, conta Fachini.
Questionado por outros nomes, Mauri responde: “A Fê (Fernanda Melchionna, Vereadora de Porto Alegre) vem muito, mas ela nem é vereadora, ela é nossa colega. Outra que vinha muito é a Manuela D’Ávila, mas depois que ficou grande não veio mais. Agora só vem a irmã dela. A Juliana Brizola vem com freqüência também”.
Outra classe que frequenta bastante a Lanchera, segundo Fachini, é a dos jornalistas. “A imprensa vem muito aqui. Nós conhecemos todos os jornalistas, de todas as emissoras de Porto Alegre, temos uma amizade com eles. Um que vinha bastante era o Kenny Braga, o David Coimbra também. Ele até fez uma biografia da nossa cozinheira uma época”.

Mais que uma Lancheria, um ponto turístico da cidade

O toldo vermelho da Osvaldo | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Para muitos a Lancheria do Parque é um local das refeições diárias ou tomar refrescantes sucos. Porém, para muitos outros, o local transcende o conceito de bar ou restaurante, sendo também considerado um ponto turístico de Porto Alegre. São raras as pessoas que, ao receber parentes do interior, ou de outros cantos do Brasil, não os levam a Lancheria, especialmente aos domingos, visto que, costumeiramente, o tradicional passeio porto-alegrense é caminhar no Brique da Redenção, tomar um chimarrão no parque e ao final da tarde ir tomar um suco na Lanchera.
Fachini conta que, certa vez, foi surpreendido por um grupo de chineses que queriam conhecer a Lancheria do Parque. “Eu estava caminhando na rua, quando fui surpreendido pelo grupo. Eles estavam com uns bilhetinhos e me perguntaram: ‘sabe onde fica esse endereço?’, aí eu olhei, ‘pô, é Lancheria do Parque’, nem acreditei”.
Graças a estas e outras coisas, Mauri garante: “Nesses 20 anos de Lancheria, eu conheci o mundo sem sair daqui de dentro. Tenho amizade com pessoas do mundo inteiro. Isso não tem preço. Aí quando tu saí, tu vê que isso é real. As pessoas te conhecem, no lugar que tu for, tu tem pessoas conhecidas, é impressionante”.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Televisão: fábrica de mais-valia ideológica

Elaine Tavares no PALAVRAS INSURGENTES

A televisão é uma usina ideológica. Gera milhares de megawatts de ideologia a cada programa, por mais inocente que pareça ser. E ideologia como definiu Marx: encobrimento da realidade, engano, ilusão, falsa consciência. Então, se considerarmos que a maioria da população latino-americana, aí incluída a brasileira, se informa e se forma através desse veículo, pensá-la e analisá-la deveria ser tarefa intelectual de todo aquele que pensa o mundo. Afinal, como bem afirma Chomsky, no seu clássico “Os Guardiões da Liberdade”, os meios atuam como sistema de transmissão de mensagens e símbolos para o cidadão médio. “Sua função é de divertir, entreter e informar, assim como inculcar nos indivíduos os valores, crenças e códigos de comportamento que lhes farão integrar-se nas estruturas institucionais da sociedade”. Não é sem razão que bordões, modas e gírias penetram nas gentes de tal forma que a reprodução é imediata e sistemática.

Um termômetro dessa usina é a famosa “novela das oito”, que consolidou um lugar no imaginário popular desde os anos 60, com a extinta Tupi, foi recuperado com maestria pela Globo e vem se repetindo nos demais canais. O horário nobre é usado pela teledramaturgia para repassar os valores que interessam à classe dominante, funcionando como uma sistemática propaganda que visa a manutenção do estado de coisas. É clássica, nos folhetins, a eterna disputa entre o bem e o mal, o pobre e o rico, com clara vinculação entre o bem e o rico. Sempre há um empresário bondoso, uma empresária generosa, um fazendeiro de grande coração, que são os protagonistas. E, se a figura principal começa a novela como pobre é certo que, por sua natural bondade, chegará ao final como uma pessoa rica e bem sucedida, porque o que fica implícito que o bem está colado à riqueza, vide a Griselda de Fina Estampa, a novela da vez.

Outro elemento bastante comum nas novelas é o da beleza da submissão. Como os protagonistas são sempre pessoas ricas, eles estão obviamente cercados dos serviçais, que, no mais das vezes os amam e são muito “bem-tratados” pelos patrões. Logo, por conta disso, agem como fiéis cães de guarda. Um desses exemplos pode ser visto atualmente na novela global. É o empregado-amigo (?) da vilã Tereza Cristina. Ele atua na casa da milionária como um mordomo, cúmplice, saco de pancadas, dependendo do humor da mulher. Ora ela lhe conta os dramas, ora lhe bate na cara, ora lhe ameaça tirar tudo o que já lhe deu. E ele, premido pela necessidade, suporta tudo, lambendo-lhe as mãos como um cachorrinho amestrado. Tudo é tão sutil que não há quem não se sinta encantado pelo personagem. Ele provoca o riso e a condescendência, até porque ainda é retratado de forma caricata como um homossexual cheio de maneios, trejeitos e extremamente servil.

Mas, se o servilismo de Crô pode ser questionado pela profunda afetação, outros há que aparecem ainda mais sutis. É o caso da turma da praia que, na pobreza, hostilizava Griselda e, agora, depois que ela ficou rica, passou para o seu lado, vindo inclusive trabalhar com a faz-tudo, assumindo de imediato a postura de defensores e amigos fiéis. Ou ainda a relação dos demais trabalhadores com os patrões “bonzinhos”, como é o caso do Paulo, o Juan, o homem da barraquinha de sucos, e o Renê. Todos são “amigos” e fazem os maiores sacrifícios pelos patrões, reforçando a ideia de que é possível existir essa linda conciliação de classe na vida real. O grupo que atua com o cozinheiro Renê, por exemplo, foi demitido pela vilã, não recebeu os salários, viveu de brisa por um tempo e retomou o trabalho com o antigo chefe por pura bem-querença. Coisa de chorar.

Nesses folhetins também os preconceitos que interessam aos dominantes acabam reforçados sob a faceta de “promoção da democracia”. O negro já não aparece apenas como bandido, mas segue sendo subalterno. No geral faz parte do núcleo pobre, mas é generoso e sabe qual é o “seu lugar”. É o caso do ético funcionário da loja de motos. Um bom rapaz, que, no máximo, pode chegar a gerente da loja. As pessoas que discutem uma forma alternativa de viver aparecem como gente “sem-noção”, no mais das vezes caricaturada, como é o caso da garota que prevê o futuro, a mulher negra que era bruxa, o rapaz que brinca com fogo ou os donos da pousada que em nada se diferem de empresários comuns, a não ser nas roupas exotéricas. Ou o personagem do Zé Mayer, numa antiga novela, que via discos voadores, não aceitava vender suas terras e, no final, “fica bom”, entregando sua propriedade para a empresária boazinha que era dona de uma papeleira. Os homossexuais também encontram espaço nas novelas, dentro da lógica da “democratização”, mas continuam sendo retratados de forma folclórica, como é o caso do Crô, na novela das oito, ou do transexual da novela das sete. Já o índio, como é invisível na vida real, tampouco tem vez nas tramas novelistas e quando tem, como a novela protagonizada por Cléo Pires, vem de forma folclórica e desconectada da vida real. E assim vai...

Gente há que fica indignada com os modelos que as telenovelas reproduzem ano após ano, mas essa é realidade real. Os folhetins nada mais fazem do que reforçar as relações de produção consolidadas pelo sistema capitalista. Até porque são financiados pelo capital, fazendo acontecer aquilo que Ludovico Silva chama de “mais-valia ideológica”. Ou seja, a pessoa que está em casa a desfrutar de uma novela, na verdade segue muito bem atada ao sistema de produção dessa sociedade, consumindo não só os produtos que desfilam sob seu olhar atento, enquanto aguardam o programa favorito, mas também os valores que confirmam e afirmam a sociedade atual. Prisioneira, a pessoa permanece em estado de “produção”, sempre a serviço da classe dominante. Assim, diante da TV – e sem um olhar crítico - as pessoas não descansam, nem desfrutam.

É certo que a televisão e os grandes meios não definem as coisas de forma automática. Como bem já explicou Adelmo Genro, na sua teoria marxista do jornalismo, os meios de comunicação também carregam dentro deles a contradição e vez ou outra isso se explicita, abrindo chance para a visão crítica. Momentos há em que os estereótipos aparecem de maneira tão ridícula que provocam o contrário do que se pretendia ou personagens adquirem tanta força que provocam um explodir da consciência. E, nesses lampejos, as pessoas vão fazendo as análises e podem refletir criticamente. Mas, de qualquer forma, esses momentos não são frequentes nem sistemáticos, o que só confirma a função de fabricação de consenso que é reservada aos meios. Um caso interessante é o do transexual que está sendo retratado na novela da Record, que passa às dez horas. “Dona Augusta” é nascida homem e se faz mulher, sem a folclorização do que é retratado na Globo. É “descoberta” pelo filho que a interna como louca. Toda a discussão do tema é muito bem feita pelos autores, sem estereótipos, sem falsa moral. Mas, é a TV dos bispos evangélicos, que, por sua vez, na vida real pregam a homossexualidade como “doença”. São as contradições.


De qualquer sorte, a teledramaturgia brasileira deveria ser bem melhor acompanhada pelos sindicatos e movimentos sociais. E cada um dos personagens deveria ser analisado naquilo que carrega de ideologia. Não para ensinar aos que “não sabem”, mas para dialogar com aqueles que acabam capturados pelo véu do engano. Assim como se deve falar do que silencia nos meios, o que não aparece, o que não se explicita, também é necessário discutir sobre o que é inculcado, dia após dia, como a melhor maneira de se viver. Pois é nesse entremeio de coisas ditas, malditas e não ditas, que o sistema segue fabricando o consenso, sempre a favor da classe dominante.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Elis Regina representa síntese da MPB, mostra estudo


Por Bruno Yutaka Saito | Valor Econômico


SÃO PAULO – Era comum encontrar pelos muros de cidades brasileiras a pichação “Elis Vive”. A morte da cantora, então no auge, aos 36 anos, em 19 de janeiro de 1982, fora tão inesperada, que deixou fãs inconformados. Trinta anos depois, Elis vive como referência incontornável para quem faz, pensa ou ouve música brasileira. Na celebração da data, CDs com shows na íntegra, a nova edição de uma biografia e um estudo lançam novas luzes sobre a cantora.
Folhapress  A cantora Elis Regina em foto de 1975
A música de Elis é, antes de mais nada, um dos principais símbolos da chamada MPB (Música Popular Brasileira). Ainda que rejeitada por muitos artistas, a sigla “MPB” representa inegavelmente um gênero estabelecido, quase um sinônimo para a “música de qualidade feita no país”. Segundo a historiadora Rafaela Lunardi, a cantora foi fundamental para o estabelecimento do gênero _a tese foi defendida na dissertação de mestrado “Em Busca do ‘Falso Brilhante’. Performance e Projeto Autoral na Trajetória de Elis Regina (Brasil, 1965-1976)”, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
“Na década de 1960, Elis foi uma espécie de porta-estandarte na defesa da música popular brasileira, contribuindo para a formação do rótulo MPB, de características comerciais e ideológicas a um só tempo, pois, do ponto de vista estritamente musicológico, não era possível enquadrar o samba, a bossa nova, o baião, a marcha e, na década de 1970, o pop, o rock e o soul”, afirma Rafaela. “Elis foi uma artista que vivenciou todas as etapas do processo de legitimação da MPB nas décadas de 1960 e 1970, passando por todas as fases e dialogando com as diversas demandas do mercado de música no Brasil.”
Augusto/Folhapress   
No show "Trem Azul", em 1975
Nascida em Porto Alegre (RS), Elis começou a carreira na rádio, ainda criança, e transitou por diversos gêneros durante a carreira. Ao lançar o primeiro disco, “Viva a Brotolândia” (1961), era vista como um novo nome do nascente rock, ao estilo de Celly Campelo. Mas o grande público só tomou conhecimento da cantora quando ela participou dos populares festivais de música daquela década, o que lhe rendeu o convite para apresentar, ao lado de Jair Rodrigues, o programa de televisão “O Fino da Bossa”, em 1965, na TV Record.
Elis, antes de mais nada, conquistou o público por questões artísticas. Aliada à voz potente estava sua capacidade de revelar então novos compositores, como Ivan Lins, Belchior e Milton Nascimento. Mas a figura pública de Elis também fascinava. Seu apelido, “Pimentinha”, indicava tanto uma performance explosiva no palco quanto um temperamento forte. Participou, por exemplo, da (hoje surreal) passeata contra a guitarra elétrica, ao lado de Gilberto Gil, em 1967, em plena ditadura militar. Sua posição em relação ao regime também foi alvo de muitas especulações no período. Por ter cantado na Olimpíada do Exército, em 1972, sofreu perseguição por parte do semanário “O Pasquim”, de Henfil. Mas Elis não era colaboradora, como mostrou tempos depois, ao fazer shows de arrecadação de dinheiro para o fundo de greve do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. Em sua voz, “O Bêbado e o Equilibrista” foi uma espécie de hino da abertura política.
Folha Imagem   
A cantora durante apresentação em 1967

Nesse ponto, a historiadora Rafaela Lunardi e a autora da biografia “Furacão Elis”, Regina Echeverria, divergem. “A Elis relembrada hoje é a Elis do final de sua vida e carreira, uma artista ligada às questões sociopolíticas de seu tempo, a Elis que atuou artisticamente na oposição ao regime militar”, afirma Rafaela. Já Regina tem outra visão: “Ela não foi um símbolo político da época. Tinha o Chico Buarque, o Caetano Veloso, que eram mais engajados. Ela era uma intérprete. A sorte é que ela gravou o hino da anistia, em 1979. O papel dela foi cantar os novos compositores, e não cavar trincheiras”.
Rafaela lembra que a cantora “não possuía uma formação política e/ou universitária que pudesse compará-la intelectualmente a Nara Leão, Chico Buarque ou Edu Lobo, jovens artistas típicos do altamente elitista meio universitário brasileiro da época”. No entanto, essa formação não teria impedido que Elis fosse engajada politicamente. Para a historiadora, a cantora ajudou a “formatar a ideia de ‘moderna MPB’, interpretando ‘canções de protesto’ e atuando na luta em defesa da música nacional”. “Tal resistência apareceu em sua arte ao defender a música popular brasileira contra a invasão estrangeira, numa estratégia nacionalista de luta contra o ‘imperialismo’, liderada pelas esquerdas, sobretudo na década de 1960, e nos setores mais estritamente políticos a partir de ‘Falso Brilhante’, em 1976, quando, segundo seus próprios depoimentos, tornou-se uma artista engajada.”
Para Regina Echeverria, Elis poderia ter extrapolado as fronteiras brasileiras, caso cantasse em inglês. “Mas ela dizia que seu lugar era aqui”, conta a escritora, que lança uma terceira edição, revisada e com novas entrevistas, de “Furacão Elis” (a primeira foi em 1985; a segunda, em 2007). Se Elis não buscou uma carreira no exterior, dentro do Brasil a cantora nunca foi tímida ao buscar o público. Muitos críticos na época acusavam a cantora de ser excessivamente comercial, pela sua resposta positiva às demandas do mercado fonográfico.
As posturas da cantora eram reflexo direto da espontaneidade e honestidade, acredita Regina. Muitas vezes foi incompreendida. “Ela tinha fama de Pimentinha, de brigar muito, mas ela falava: “Peraí, você acha que tenho sangue de barata? Pisa no meu pé e não vou reagir? Não é normal?”. Ela assumia o que falava. No Brasil é difícil as pessoas assumirem o que pensam”, diz a escritora e jornalista.
Shows
Nas celebrações da data, dois lançamentos retomam shows da cantora. No dia 27, sai pela Warner o CD duplo “Um Dia”. São duas apresentações de Elis no Festival de Jazz de Montreux realizados em 20 de julho de 1979. Já havia uma versão anterior do CD, mas com apenas nove músicas. Desta vez, os shows aparecem na íntegra –são 27 faixas no total, incluindo músicas como de “Triste” (Antonio Carlos Jobim) e “Corrida de Jangada” (Edu Lobo). E, pela Universal, “Transversal do Tempo”, traz na íntegra show realizado em abril de 1978, no Rio. Na época, a apresentação divulgava o disco “Elis” (1977).

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

o que me traduz são minhas açoes não o que sou....

Minha maior angustia enquanto coordenador Adjunto e Pedagógico da 13CRE de Bage-RS, era saber até que ponto nossas lutas enquanto categoria e no momento enquanto governo poderiam se ajustar e se transformarem na mesma luta utópica que sempre defendemos.
No princípio estava dando certo, com propostas de revitalizar os gremios estundantis, os conselhos escolares, ouvir os diretores e todos aqueles que gerenciam as comunidades escolares(pais,alunos,professores e funcionários)...
Estava correndo bem, quando de repente, em agosto surge a famigerada implantação de um "novo" modelo para o ensino médio do estado, baseado em fatos reais, de evasão e repetencia, mas copiado de um modelo proposto pela UNESCO, de 2005, que preconizava um ensino médio politécnico, atendendo os interesses da Lei 9394/96, que todos sabemos, foi tirada da gaveta pelo governo da época(FHC) e que nenhum governo estadual tinha tido a ousadia de implentá-lo.
A implementação desse modelo exige que as escolas, como um todo, tanto na parte pedagógica quanto na infraestrura detenha condições de exercê-lo.
A intenção é fantástica, um modelo embora antigo, mas que nesse momento social de avanços tecnológicos seria importante sua implementação.
Baseado em teorias e práticas de autores consagrados a proposta, do ponto de vista teórico é muito interessante e realmente viria para atender as necessidades da sociedade.
Só que, parece que foi esquecido que temos hoje um magistério estremamente competente, mas que a anos luta para se defender, e tentar auferir ganhos em seus rendimentos tão vilipendiados ao longo dos últimos 30 anos.
A proposta, não sabemos se foi exigida pelo Banco Mundial, como diz o CPERS, ou se foi deliberada pela assessoria pedagógica da SEDUC, veio de forma abrupta, rápida, "construida" ligeiramente, sem um embasamento prático de como executá-la levando-se em conta as precariedades humanas e físicas das escolas.
Evidentemente que foi rejeitada pela grande maioria dos educadores, pais, alunos e funcionários das escolas.
Mas, a SEDUC, embora sem domínio da prática do projeto, determinou às CREs que fizessem o convencimento às escolas.
A SEDUC determinou um calendário de conferências, escolares,municipais,regionais e interregionais, com ápice numa conferência estadual, onde a maioria dos professores pudessem referendar a proposta que seria levada ao Conselho Estadual de Educação para ser implementada no ano de 2012.
Tudo "encima do laço"...
As CREs se esmeraram, fizeram cronogramas e foram a luta "sem saber muito bem o que defendiam", pois nem mesmo a SEDUC sabia...
O resultado já era esperado: ampla rejeição da proposta por razões anteriormente ditas.
Fizemos o que pudemos em defender a proposta, até sofremos uma "gozação" de professores de uma cidade que nos apelidou de "santo defensor das causas impossíveis", tamanha era a rejeição à proposta de reformulação do Ensino Médio.
E o pior de tudo é que não tinhamos respostas....
Somente diziamos que se não houver concurso público, melhorias na infra estrutura das escolas, o projeto não sairia do papel.
Mas como ter concurso público se o PISO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA EDUCAÇÃO não está sendo pago??
Qual edital será legal se quando for informado o salário do professor vier abaixo do PISO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA EDUCAÇÃO?
E se o edital vier com valores atuais, será fora da lei, qualquer um contestará...
Então o Concurso não sairá eese ano nem no ano que vem...
Sendo assim, a proposta de reformulação do Ensino Médio não será implementada ano que vem...
O que fizemos então????
Palhaçada???
Confesso que não entendo o que está sendo feito com nossa categoria...será ingenuidade da SEDUC, ou será que nos usaram(CRE) para bancar as ferramentas de" ensaio de convencimento" duma proposta que não aconteceria????
Na dúvida e sem atribuir culpa a nigúem resolvemos  renuncir nosso cargo de coordenador adjunto e nos voltarmos a base, aqueles que permanecem, aqueles que lutam e como eu sempre estiveram na vanguarda do sindicalismo, sem trocar essa caminhada por um cargo ou por privilégios advindos dele.
Alguns ja me disseram que botei fora "minha carreira" política para ficar do lado de um bando de agitadores ideológicos que não me trarão benefício algum.
"eu olhos-os com os olhos lassos, há nos meus olhos ironias e cansaços, eu cruzo os braços e não vou por ai", no dizer de José do Rego, aquilo por luto é muito mais importante que um simples cargo efêmero, passageiro; minha ambição hoje é me tornar um sujeito melhor, consciente, participativo e coletivo...sempre consciente que minha evolução humana e espiritual encontra-se no compartilhar com os outros tentando sempre deixar de me importar com meu "umbigo" que foi importante numa determinada época mas que deve ser esquecido e superado.

TODOS A LUTA CAMARADAS....na certeza de que isso nos orgulha e...é o certo a fazer!

domingo, 9 de outubro de 2011

Falta de emprego é pior problema em Bagé; prefeito recebe nota 6,6


Centro administrativo de Bagé | Foto: Prefeitura de Bagé/Divulgação
Centro administrativo de Bagé | Foto: Prefeitura de Bagé/Divulgação

Da Redação do Sul21

A falta de emprego é o principal problema de Bagé, de acordo com os entrevistados pela pesquisa Kepeler/Sul21. Por outro lado, se fossem sugerir uma ação à prefeitura, os eleitores do município pediriam mais investimentos em saúde. O atual prefeito, Dudu Colombo (PT), recebeu nota média de 6,6 da população.

Leia mais:
 
Os dados constam da pesquisa da Kepeler Consultoria, publicada nesta sexta-feira (6) em parceria com o Sul21. A pesquisa apontou a intenção de voto para a prefeitura de Bagé a um ano da eleição municipal.

problemass e investimentos

A pesquisa perguntou aos eleitores quais os piores problemas do município. A falta de emprego foi a primeira resposta da maioria dos entrevistados – 52,3% deram essa resposta. Para 14,3%, o pior problema de Bagé é a falta de segurança. Os salários baixos são o pior problema para 12,8% dos entrevistados. Outros 8,3% apontaram a má qualidade de assistência médica como pior problema do município.
A pesquisa também perguntou qual seria o pedido ou sugestão que os entrevistados fariam ao prefeito de Bagé. “Investir em saúde” foi a resposta de 13,3% dos entrevistados. Para 11,7%, o mais importante são os investimentos em infraestrutura. Investir em pavimentação foi a resposta de 10,4% dos entrevistados. Para 7,8%, investimentos em segurança são os mais prioritários. Para 7,5%, aumentar os empregos é o mais importante.

Maioria está satisfeita

A pesquisa perguntou aos entrevistados sobre como se sentem em relação à própria vida. A maioria (56,8%) se disse satisfeita com a vida que leva hoje, sendo que 20,5% dos entrevistados disseram estar muito satisfeitos. Outros 19,3% informaram estar pouco satisfeitos em relação à vida que levam hoje. O índice de nada satisfeitos foi de 3%. Não souberam responder ou não informaram 0,6% dos entrevistados.
Fonte: Kepeler Consultoria

Questionados se a vida em Bagé melhorou ou piorou nos últimos cinco anos, 51,5% responderam que a vida mudou para melhor. Para 10,3%, mudou para pior. Dos entrevistados, 36,5% responderam que a vida em Bagé nem melhorou, nem piorou nos últimos cinco anos. Não souberam responder ou não informaram 1,8% dos entrevistados.
Fonte: Kepeler Consultoria

Aprovação do prefeito é de 51%

A pesquisa da Kepeler Consultoria também questionou os entrevistados sobre como avaliam a administração do prefeito Dudu Colombo e também o desempenho do prefeito.
Aprovam a administração municipal 51% dos entrevistados – para 41%, a administração é boa e para 10%, é ótima. Consideram regular a administração 30,3% dos entrevistados. A reprovação da atual administração ficou em 18% – para 7,5% a administração é ruim e para 10,5% é péssima.
Fonte: Kepeler Consultoria

O desempenho do prefeito também foi avaliado. A aprovação ficou nos mesmos 51%. Para 35,3% dos entrevistados, o desempenho do prefeito Dudu Colombo é regular. A reprovação ficou em 10,3% – 3% consideram ruim o desempenho do prefeito e 7,3%, péssimo.
Fonte: Kepeler Consultoria

Avaliação de Dilma e Tarso

A aprovação do governo Dilma Rousseff é de 60% – para 49% dos entrevistados, o governo Dilma é bom e, para 11%, é ótimo. Consideram regular o governo 33,5% dos entrevistados. A reprovação do governo Dilma em Bagé é de apenas 3,8%.
Em relação ao governo Tarso, a aprovação da população de Bagé é de 54,1%. Para 33,8%, o governo Tarso é regular. A reprovação do governo ficou em 6,8%.

Análise dos dados

Por Benedito Tadeu César

Satisfeitos com a vida que levam atualmente e entendendo que as condições de vida melhoraram no município nos últimos cinco anos, os bageenses estão preocupados com o desemprego, a violência e a qualidade da assistência médica que recebem. Nada muito diferente do que ocorre na maioria dos municípios brasileiros, com exceção do que diz respeito à preocupação com o desemprego, que não aparece com tanta intensidade nas regiões com economia mais dinâmica. Hoje, em quase todos os municípios, a saúde aparece como a primeira preocupação, ficando o desemprego em terceiro ou quarto lugar.
A satisfação com a vida se expressa também na aprovação do desempenho dos governantes de todos os níveis. Dilma Roussef, Tarso Genro e Dudu Colombo aparecem bem avaliados, sendo que a aprovação que recebem é proporcional à distância de mantém da vida cotidiana dos moradores. Desta forma, a presidenta da república é a mais bem avaliada, seguida do governador do estado. O prefeito, a quem cabe resolver os problemas mais concretos dos cidadãos, ainda que bem avaliado, recebe o menor índice de aprovação.
No que se refere às questões eleitorais, os bageenses revelam-se divididos, segundo os dados da pesquisa Kepeler/Sul21. O atual prefeito lidera com folga as menções espontâneas, mas aparece em empate técnico com a vereadora Adriana Lara nos dois cenários testados. Os demais possíveis candidatos não atingem índices significativos. O que desperta atenção é o percentual de menções espontâneas consignadas ao ex-prefeito Luiz Fernando Mainardi. Já tendo declarado que não será candidato, ele aparece em segundo lugar na pesquisa espontânea. Ao que parece, se as eleições ocorressem hoje, Maninardi seria o grande eleitor do município, ou seja, seu apoio definiria o resultado.
Nunca é demais lembrar, entretanto, que os cenários eleitorais são dinâmicos. Há cerca de um ano das eleições, nada está ainda definido.

Benedito Tadeu César é cientista político, especialista em pesquisas de opinião pública e professor aposentado da UFRGS.

domingo, 2 de outubro de 2011

Foto-levitação: pés, para que os quero?

 Foto levitação: pés, para que os quero?



“Pés, para que os quero, se tenho asas para voar?”
A frase célebre é da pintora mexicana Frida Kahlo. Mas parece que o espírito da coisa foi totalmente incorporado pela fotógrafa (e pintora) russa Anka Zhuravleva em sua série Gravidade Distorcida.
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(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)

Na série, a russa desafia as leis da física e exibe pessoas levitando em pleno ar. Em geral, as fotos passam uma sensação idílica de paz e sonho.

 Foto levitação: pés, para que os quero?
(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)

 Foto levitação: pés, para que os quero?
(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)
 Foto levitação: pés, para que os quero?
Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa

 Foto levitação: pés, para que os quero?
(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)

Tão intrigante quanto as fotografias é a própria história de Anka. Ela sempre estudou artes, por influência de sua mãe, que também era artista. Mas, na adolescência, ficou repentinamente ófã – seus pai faleceram em um intervalo de menos de dois anos – e seu mundo virou de cabeça para baixo.
Anka começou a viver no submundo de Moscou. Sempre bebendo muito, trabalhou como tatuadora e cantou numa banda de rock. Também fez alguns trabalhos como modelo, aparecendo nua na Playboy russa e em outras revistas masculinas.
Em 2001, ela conheceu o músico Alexander Zhuravlev, em São Petersburgo. Apaixonou-se e imediatamente mudou-se para a casa dele. Desde então, os dois vivem em harmonia – Alexander incentiva a produção artística de Anka, e ambos convivem comn diversos intelectuais e artistas da Rússia.

 Foto levitação: pés, para que os quero?
(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)

 Foto levitação: pés, para que os quero?
(Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa)

 Foto levitação: pés, para que os quero?
Foto: Anka Zhuravleva / Site da Fotógrafa

Você pode conferir mais trabalhos de Anka – inclusive suas pinturas, de tinta a óleo – acessando o site da artista.
 
Viciada em todo e qualquer tipo de arte. Tudo que tem são vinte e dois anos, um violão com uma corda constantemente arrebentada, e centenas de dúvidas. Ama Tchekov, Nirvana e cinema iraniano. Uma metamorfose ambulante, uma pedra no caminho – ou, resumindo tudo, uma gaivota.

domingo, 28 de agosto de 2011

Elogio à preguiça

Para o preguiçoso, “é preciso ser distraído para viver”, afastar-se do mundo sem se perder dele, sendo por isso acusado de não contribuir p/ o progresso. Além de crime contra a sociedade do trabalho, o preguiçoso comete ainda pecado capital. Pela lógica do trabalho e da Igreja, deve, assim, pagar pelo que não faz
por Adauto Novaes no LEMONDE-BRASIL
O crítico e ensaísta Jean Starobinski começa assim o livro Ação e reação:“Em A comédia humana, Balzac descreve as deliciosas viagens de Louis Lambert em meio às palavras: ‘Que belo livro escreveríamos narrando a vida e as aventuras de uma palavra!’”.
É isso que o ciclo “Elogio à Preguiça”propõe. Filósofos franceses e brasileiros narram em oitenta conferências, em quatro estados – Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo e Brasília – a vida e as aventuras da preguiça, e mostram que sua história sempre foi mal contada.
Apesar da oposição, preguiça e trabalhoguardam um misterioso parentesco, quase simétrico e especular. As palavras preguiça e trabalhotêm história. Como nos lembra o filósofo francês Francis Wolff, o trabalho, no sentido moderno do termo, consiste em uma relação intrínseca entre duas ideias: a ideia de labor (pena) e a ideia de atividade socialmente útil. Vemos que para os gregos, diz Wolff, as atividades produtivas, mesmo socialmente úteis, não são moralmente valorizadas. Nada corresponde ao valor “trabalho” nem, em consequência, a desvalorização da preguiça. Acontece mesmo o contrário: “Scholein em grego, que corresponde ao latim otium, designa o que se pode fazer quando não se tem nada a fazer: o ócio. Ascholia, ao contrário, designa o fato de ser privadodessa liberdade... Em latim, ascholia vai se tornar neg-otium, negação do otium, que deu em negócio nas línguas latinas modernas. O negócio é, portanto, desvalorizado, ao contrário daquilo que vai se tornar, no cruzamento de certa moral ascética e do espírito do capitalismo. O negócio é tão desvalorizado na Antiguidade grega, que, na maioria das vezes, é deixado aos escravos. Com efeito, se numerosos escravos eram forçados a trabalhos manuais, por exemplo, nas minas, havia escravos banqueiros, como havia escravos policiais. Nem finanças nem ordem pública eram atividades valorizadas, uma vez que deixadas aos escravos”.
Ora, se saltarmos no tempo, vemos que os laços que atam preguiça e pecado tecem um nó invisível que prende imagens sociais do preguiçoso como improdutivo, indolente, melancólico, indiferente, distraído, voluptuoso, incompetente... Mas eis a questão posta por Marilena Chaui em sua conferência: não é curioso que o desprezo pela preguiça e a extrema valorização do trabalho possam existir em uma sociedade que não desconhece a maldição que recai sobre o trabalho, visto que trabalhar é castigo divino e não virtude do livre-arbítrio humano? A hipótese que passa por quase todas as conferências pode ser assim resumida: no mundo dominado pela tecnociência, nunca se trabalhou tanto e se pensou tão pouco não apenas sobre as condições do trabalho, mas principalmente sobre a ausência do trabalho do espírito, entendendo por espírito “potência de transformação da inteligência”.
A vida íntima que a preguiça leva com o trabalho pode revelar que o preguiçoso trabalha muito. Como?
Para o preguiçoso, “é preciso ser distraído para viver” (Paul Valéry), afastar-se do mundo sem se perder dele, sendo ele, exatamente por isso, acusado de em nada contribuir para o progresso. Além de praticar crime contra a sociedade do trabalho, o preguiçoso comete ainda pecado capital. Pela lógica do mundo do trabalho e da Igreja, o preguiçoso deve, portanto, sentir-se culpado e pagar pelo que não faz.
Ao ver de modo peculiar o fazer, o ocioso pode prestar um grande serviço e ajudar a responder à velha questão moral: “o que devo fazer?”. Dependendo da resposta, teremos diferentes definições do que seja o homem, a política, as crenças, o saber, nossa relação com o mundo e, principalmente, nossa relação com o trabalho. A resposta pode dizer um pouco mais precisamente, não apenas o que fazemos, mas também o que o trabalho faz em nós. Na era do grande desenvolvimento tecnocientífico e digital, maravilhosas máquinas “economizam” o trabalho mecânico, mas criam, ao mesmo tempo, dois novos problemas: primeiro, uma espécie de intoxicação voluntária, “mais a máquina nos parece útil, mais ela nos torna incompletos”. Isto é, mais precisamente, a máquina governando quem a devia governar; daí decorre o segundo problema, bem mais complexo: tantas potências auxiliares mecânicas tendem a reduzir “nossas forças de atenção e de capacidade de trabalho mental”, o que se relaciona aos seguintes fenômenos: impaciência, rapidez e volatilidade nunca antes vistas. Assim escreveu Valéry: “Adeus trabalhos infinitamente lentos, catedrais de trezentos anos cuja construção interminável acomodava curiosas variações e enriquecimentos sucessivos... Adeus perfeições da linguagem, meditações literárias e buscas que tornavam as obras, ao mesmo tempo, comparáveis a objetos preciosos e a instrumentos de precisão! [...] Eis-nos no instante, voltados aos efeitos de choque e contraste, quase obrigados a querer apenas o que ilumina uma excitação de acaso. Buscamos e apreciamos apenas o esboço, os rascunhos. A própria noção de acabamento está quase apagada”.
Certamente o preguiçoso tem muito a dizer sobre o mundo acelerado do progresso e do trabalho que cria objetos indispensáveis, mas também nos deixa, como herança, neurose, depressão, alienação, desastres ecológicos, excesso de ruídos artificiais e técnicos, apressamento, economia de guerra, morte do sujeito, inconsciência de si e, enfim, 191 milhões de vítimas em massacres nos últimos cem anos, entre outros feitos. É certo que o trabalho investiu muita ciência e técnica para criar esse mundo.
A mobilização veloz e incessante do trabalho cego hoje não permite ao homem dizer qual o seu destino e muito menos o que acontece. Ele não dispõe de tempo para pensar e, muito menos, consciência de que seus gestos, no trabalho, produzem muito mais que os objetos que fabrica. Há um excedente invisível, entendendo-se por “excedente” tudo o que não é mensurável, que produz catástrofes através do trabalho “normal e produtivo” que se manifesta na poluição da natureza, nos desastres ecológicos resultantes do descontrole dos sistemas de produção, no esquecimento e na desconstrução de si. Como lembra Robert Musil em O homem sem qualidades, foi preciso muita virtude, engenho e trabalho para tornar possíveis as grandes descobertas científicas e técnicas, graças ao sucesso dos “homens de guerra, caçadores e mercadores”. Tudo isso fundado na disciplina, no senso de organização e na eficácia do trabalho, o que talvez se pudesse resumir assim: o trabalho mecânico da produção de mercadorias pretende tomar o mundo de assalto, produzindo ao mesmo tempo agitação social e frenesi econômico e consumista, dada a multiplicação de objetos “não naturais e não necessários”. Já o preguiçoso põe-se na escuta de si e do mundo que o cerca.
Mas, afinal, quem é o preguiçoso? Enfim, como se pode, então, pensar essa figura que sempre teve péssima reputação no Ocidente? Talvez uma boa definição seja a de um autor inglês, Jerome K. Jerome, em seu livro Pensamentos preguiçosos de um preguiçoso:“A preguiça sempre foi o meu forte. Não é nenhuma glória, é um dom. Um dom raro. É certo que existem muitos farniente, mas um autêntico preguiçoso é exceção. Isso nada tem a ver com alguém que anda com as mãos nos bolsos. Ao contrário, o que melhor caracteriza um verdadeiro preguiçoso é o fato de ele estar sempre intensamente ocupado. De início, é impossível apreciar a preguiça se não há uma massa de trabalho diante de si. Não é nada interessante nada fazer quando não se tem nada a fazer! Em revanche, perder seu tempo é uma verdadeira ocupação, e uma das mais fatigantes. A preguiça, como um beijo, para ser agradável deve ser roubada”. Jerome K. Jerome leva-nos a pensar que a preguiça não é uma coisa passiva. Perder o tempo mecânico dá trabalho e exige enorme atividade do espírito. O farnientesubmete-se à lógica do capital; é parte do processo, porque já está nos cálculos da mão de obra excedente do processo de produção: a existência de excluídos. O ocioso não é propriamente quem se opõe ao trabalho. É quem sabe usar a inteligência.

Adauto Novaes

foi jornalista e professor. Estudou filosofia na França. Foi diretor, durante 20 anos, do Centro de Estudos e Pesquisas da Fundação Nacional de Arte/Ministério da Cultura. Organizou diversos ciclos de conferências, sendo o último deles "Mutações – a experiência do pensamento" (mais informações em www.cultura.gov.br/pensamento).

domingo, 7 de agosto de 2011

Leis que permanecem desconhecidas para os usuários...

Mãe desempregada também
tem direito a salário maternidade

Mulheres que contribuíram de um mês a dez anos à Previdência Social têm direito ao salário maternidade, mesmo que estejam desempregadas. Poucas sabem disso porque, além de ser explicitado em linguagem jurídica e burocrática, o direito é pouco divulgado. O benefício vale também para os casos de adoção.
Para ter direito ao benefício, concedido a partir do oitavo mês de gravidez, é preciso que o nascimento do descendente ocorra até 12 meses após a última contribuição. O direito também pode ser requerido após o nascimento do bebê, no período de até 12 meses.
O valor varia porque é calculado com base nas 12 últimas contribuições. Caso o período de contribuição seja superior a 10 anos, a mulher adquire a qualidade de assegurada por 24 meses. Nesse caso, o direito pode ser requerido até 24 meses após o nascimento do bebê.
Adoção - Se a criança tiver até um ano, a mãe desempregada recebe o salário por quatro meses; se tiver de um a quatro anos, a mãe desempregada recebe o salário por dois meses; e se tiver de quatro a oito anos a mãe desempregada recebe apenas um salário.
Informações - O benefício pode ser solicitado nas agências do INSS, após agendamento pelo telefone 135 ou pelo site www.previdencia.gov.br

P.S. Informação recebida por email diz que: 
Como trabalho no INSS, gostaria de esclarecer que para quem contribuiu por mais de 10 anos, mantém a qualidade de segurada por 24 meses, e nesse período deve ser o nascimento da criança e não o prazo para requerer o benefício, pois este pode ser requerido até 5 anos após o nascimento. E esse prazo de qualidade de segurada pode ser prolongado por mais 12 meses, nesse caso 36 meses, se a segurada recebeu seguro-desemprego no último vínculo empregatício ou se simplesmente possui registro no SINE a procura de emprego.
Abraço,
Zoara

sábado, 6 de agosto de 2011

O Trompetista e o Suicida



  •  Eugenio Lara no PENSE





  • Difícil imaginar outra modalidade mais universal de comunicação do que a música. Certamente, a comunicação entre os espíritos mais elevados deve ser também por música, como se fosse um concerto, a mente em harmonia, com ritmo, pulsão, beleza: o improviso emocionalmente controlado. Em “Contatos Imediatos do Terceiro Grau”, belo filme de Steven Spielberg, a linguagem musical, universal, foi o meio de contato com os extraterrestres, com poucas notas musicais, minimalistas. Bela sacada!


    A música funciona sempre como catalisador de nossas emoções. Basta ver os hinos entoados durante as antigas batalhas ou na guerra esportiva, nos hinos cantados de modo veemente, agressivo, pelas torcidas organizadas ou mesmo pelas não-organizadas, nos bares, nas quadras, na várzea, nos estádios monumentais: a música nas passeatas, nos festivais, como foi em Woodstock e hoje nos bailes funk, de emos, góticos, em raves, nos pagodes da vida.


    Quantos músicos não foram perseguidos, torturados e mortos por empregarem sua arte musical como ação eficiente de protesto, de denúncia? Lembro-me de meus prediletos Victor Jarra, Geraldo Vandré, Violeta Parra, Taiguara, de tantos músicos outros que ousaram ofertar sua expressão musical a serviço dos direitos humanos, contra a repressão, a violência, o autoritarismo, contra as corporações, o Estado repressor.


    Poderia ficar aqui, ad infinitum, citando variados casos onde a música funciona como fonte inspiradora, de acalanto, consolação, de protesto. Entretanto, escrevo essas palavras iniciais para expressar a profunda emoção lacrimosa que senti ao ver e ouvir na TV o depoimento de um músico radicado em Brasília-DF, um trompetista bastante reconhecido e requisitado, sobre a energia que a música movimenta, sem que nos demos conta disso.


    Refiro-me ao músico paraibano Moisés Alves, em um depoimento comovente sobre a sua costumeira compulsão em tocar seu trompete, tirando dele notas e harmonias sensíveis, alegres, ternas ou tristes, improvisadas. Em meio à apresentação de sua banda Moisés Alves Quinteto, no Clube do Choro de Brasília - Capital do Choro, retransmitida pela TV Senado, ele proferiu um testemunho que vale a pena compartilhar. De modo sincero, expôs a paixão que tem pela música e a necessidade inexplicável em tocar seu instrumento.


    Conta ele que, certa vez, estava no apartamento de um amigo, muito rico, em um imóvel luxuoso, lá mesmo em Brasília, onde mora. Ele pediu ao amigo se poderia tocar, pois estava sentindo uma vontade compulsiva, algo que sempre ocorre com ele. Naquele dia, o desejo foi mais forte...


    Tarde seca e pouco ensolarada, como são as tardes de Brasília no final de inverno. Tocou seu trompete à beira da janela na sala, improvisou um belo solo. Mais ou menos uma hora e meia após a inusitada execução musical, alguém bateu à porta do apartamento. Seu amigo, ao atender, se deparou com um vizinho extasiado, embevecido, querendo saber se era ele mesmo que havia tocado o solo de trompete. Disse-lhe que não, que o solo havia sido obra de um amigo seu, ali presente. Chamou-lhe. O rapaz se apresentou e deu um testemunho marcante e emocionado: “Eu estava prestes a me suicidar quando ouvi aquela música. Parei com meus pensamentos destrutivos e ao ouvir aquele som, desisti da ideia de me matar”.


    O pobre suicida, não mais que de repente, começou a ver as coisas sob outro ângulo, mudou seu tônus mental devido àquela música. Deve ter imaginado que, apesar de tudo, de toda a desgraça e desilusão de sua vida, valeria a pena prosseguir, ao curtir aquele som agradável e mavioso. E em seu depoimento, concluiu Moisés: “a música movimenta energias que desconhecemos”.


    Imaginar que os espíritos nos dirigem, como eles mesmo afirmaram a Allan Kardec, sempre me pareceu um exagero, compreensível, ainda mais em uma época anterior à psicanálise, à engenharia genética, à física quântica. Algo bem diferente daquela frase notória do fundador do positivismo, Auguste Comte: “os vivos são sempre e cada vez mais governados necessariamente pelos mortos”. No caso, não se trata de uma imortalidade subjetiva, meramente cultural, como imaginava o grande idealizador da Religião da Humanidade. Trata-se de uma imortalidade dinâmica e objetiva, no dizer do pensador espírita Jaci Regis, pois neste caso, apesar da compulsão costumeira de nosso amigo trompetista, aquele momento foi especial sob o ponto de vista extrafísico. A meu ver, a influência espiritual foi decisiva, muito mais do que um suposto acaso ou algum tipo de sincronicidade, vazia de sentido.


    Eu, no lugar de nosso amigo suicida, se ouvisse um daqueles funks repetitivos e insuportáveis, naquele momento dramático, aí sim reforçaria minha coragem em me matar. Seria a cereja no bolo de meu suicídio voluntário. Por sorte, não era surdo. O que ele ouviu naquele instante foi decisivo, determinante. O amparo espiritual de nosso simpático suicida foi eficiente. Essas coisas acontecem a todo momento. Nós é que em nossa santa ignorância, não percebemos. Porque a vida é muito mais simples e interessante do que imaginamos...




    Eugenio Lara, arquiteto, jornalista e designer gráfico, é fundador e editor do site PENSE - Pensamento Social Espírita [www.viasantos.com/pense], membro-fundador do Centro de Pesquisa e Documentação Espírita (CPDoc) e autor dos livros em edição digital: Racismo e Espiritismo; Milenarismo e Espiritismo; Amélie Boudet, uma Mulher de Verdade - Ensaio Biográfico; Conceito Espírita de Evolução; Os Quatro Espíritos de Kardec e Os Celtas e o Espiritismo.
    E-mail: eugenlara@hotmail.com

    domingo, 29 de maio de 2011

    Em referendo, eleitores de Malta aprovam a legalização do divórcio


    AFP
    Schembri (direita) comemora junto do deputado Jeffrey Pullicino Orlando

    Os eleitores da ilha de Malta decidiram, por meio de um referendo, aprovar a introdução do divórcio no país, um dos poucos no mundo que ainda não permitem esta prática.

    O primeiro-ministro de Malta, Lawrence Gonzi, anunciou neste domingo o resultado do referendo, realizado no sábado. Cerca de 72% dos malteses aptos a votar compareceram às urnas, segundo o governo.
    Os números oficiais ainda não foram divulgados. A líder do movimento do "sim", Deborah Schembri, estima que o seu campo tenha obtido cerca de 54% dos votos, segundo a agência AFP.
    O premiê, que defendia o "não" ao divórcio, disse que o resultado não era o que ele esperava, mas afirmou que respeita a decisão da maioria e que irá viabilizar a legislação necessária.
    Por sua vez, o líder da oposição, Joseph Muscat, disse que "uma nova Malta nasceu" a partir da decisão das urnas.
    Até a votação desse sábado, Malta era o único país da Europa - sem contar o Vaticano - onde não era possível para os casais se divorciar.
    Catolicismo
    A ilha, cuja população é formada em boa parte por católicos ultraconveservadores, tem uma nova geração de eleitores que age independentemente dos partidos políticos, segundo informa o correspondente da BBC em Roma David Willey.
    De acordo com Willey, a Igreja Católica de Malta atualmente adota um procedimento que permite a anulação dos casamentos, sob certas condições estritas, mas este processo é longo e muito caro.
    De acordo com a lei aprovada, que já passou pelo Parlamento, os casais poderão se divorciar em Malta depois de quatro anos de casamento - uma medida semelhante à adotada pela Irlanda, outro país majoritariamente católico.
    Já a Itália, cuja população é esmagadoramente católica, aprovou sua lei de divórcio há 40 anos.
    A Igreja Católica maltesa fez campanha em favor do "não" no referendo. No entanto, segundo o correspondente da BBC, o grande número de cidadãos que desejam o divórcio no país fez com que a opinião pública derrubasse a doutrina católica.
    O Vaticano ainda não se manifestou sobre o resultado do referendo em Malta.

    Fonte: BBC-Brasil

    sexta-feira, 27 de maio de 2011

    Dilma pode ter se baseado em “kit errado” ao vetar cartilha contra homofobia


    João Peres – Rede Brasil Atual via Sul21

    Presidência e ministro Fernando Haddad não descartam que Dilma tenha visto material do Ministério de Saúde, que foi levado por evangélicos ao Planalto na reunião de quarta-feira

    Livretos do Ministério da Saúde apresentados por evangélicos à presidenta Dilma Rousseff podem ter levado à suspensão do kit elaborado pelo Ministério da Educação (MEC) para combater a homofobia nas escolas públicas. A hipótese não é descartada pela própria Presidência da República e pelo MEC.
    Na quarta-feira (25), após encontro com frentes religiosas, Dilma determinou que fosse reanalisado o material, constituído por um caderno, seis boletins, três vídeos e um cartaz. A intenção do MEC era ajudar o debate em salas de aula do Ensino Médio a respeito da discriminação contra homossexuais.
    Informações recebidas pela Rede Brasil Atual dão conta de que o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), um dos principais interlocutores do encontro, mostrou à presidenta um material elaborado pelo Ministério da Saúde. A assessoria do parlamentar descreveu os títulos dos materiais apresentados na reunião. “O caderno das coisas importantes” foi elaborado pelo MEC, mas em parceria com o escritório da Organização das Nações Unidas para Educação e Cultura (Unesco) e sem qualquer relação com o kit contra a homofobia. Outro, também em parceria com a agência da ONU, é a história em quadrinhos “A vida como é – e as coisas como são”, lançada em 2010 abordando as relações entre filhos homossexuais e seus pais.
    Os demais são de um programa do Ministério da Saúde que visa a reduzir danos no uso de drogas e ao combate a doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Ao ser informada por telefone que o material citado não diz respeito aokit contra a homofobia, a assessoria do deputado afirmou que “chegou a nossas mãos como sendo o kit-gay (sic). De qualquer maneira é pornográfico”.
    Uma das ilustrações mostra dois rapazes praticando sexo. O Ministério da Saúde informou que se trata de um material voltado a um público absolutamente específico: agentes que trabalham com a prevenção de DSTs e com viciados em drogas, sem qualquer conexão com o material elaborado pelo MEC e jamais tendo sido distribuído em escolas.
    Origem
    A fonte das cartilhas encaminhadas a parlamentares ligados às causas religiosas é o Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política (Fenasp). O presidente da entidade, Pastor Wilton Acosta, usou parte do material do Ministério da Saúde em um debate da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão a respeito dos programas do governo federal sobre diversidade sexual.
    As mesmas imagens estão disponíveis na página da Fenasp na internet. A reportagem tentou, sem sucesso, contato telefônico com Acosta. A secretária-geral da organização, Damares Alves, afirmou não saber se as cartilhas foram apresentadas a Dilma Rousseff como parte do kit contra a homofobia. O mesmo material foi levado por Damares a uma reunião com o ministro da Educação, Fernando Haddad. “A gente quis mostrar para ele que é uma prática do governo a produção de material de mau gosto”, explica.
    Ela lamenta que o combate à homofobia tenha se transformado “em prioridade” para o ministério e avalia que a campanha que seria difundida pelo kit não ajudaria a combater o problema. Damares considera que mostrar relações homoafetivas não vai colaborar em nada para a discussão. “Como dizer que não vivemos a normalidade da heterossexualidade? Isso pode mudar nas próximas gerações, mas essa geração ainda entende a normalidade na heterossexualidade”, questiona.

    Incertezas
    A assessoria de comunicação da Presidência da República afirmou não haver condições de afirmar se Dilma viu ou não o material correto. A informação é de que Dilma analisou as cartilhas e os vídeos sem a presença de assessores ou do ministro da Educação.
    Em rápido pronunciamento a jornalistas nesta quinta-feira (26), a presidenta afirmou não ter visto os filmes, mas considerou o material inadequado. “Não vai ser permitido a nenhum órgão do governo fazer propaganda de opções sexuais, nem de nenhuma forma nós não podemos interferir na vida privada das pessoas”, disse.
    O ministro da Educação confirmou que a presidenta não soube precisar se o material a que teve acesso faz parte dokit contra a homofobia. Haddad lembrou que filmes e textos que circulam pelo Congresso são de campanhas do Ministério da Saúde, levando à desinformação de alguns parlamentares e da sociedade. “Houve muita confusão a respeito. Quando uma discussão deixa de ser técnica e passa a ser política você tem muita dificuldade de organizar um debate racional sobre o assunto”, lamentou o ministro, que considera acertada a decisão de suspender a distribuição das cartilhas em meio a um cenário de turbulência.
    A ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Iriny Lopes, foi outra que ponderou que a decisão não representa um retrocesso nas políticas governamentais de conquistas de direitos. “O programa de enfrentamento à homofobia é um programa definitivo. Ele não sofrerá retrocessos. O governo da presidenta Dilma é pautado pela questão de direitos, a presidenta tem demonstrado isso em todos os seus gestos”, disse.
    A determinação do Planalto é que qualquer material relativo aos direitos sociais terá de passar por análise de uma comissão a ser montada no Palácio do Planalto antes de vir a público.

    quarta-feira, 4 de maio de 2011

    O lugar da mãe no afeto humano



    NOTA :O discurso feminista e transcultural questionou a figura da mãe, mostrando suas várias concepções nas diferentes tradições da humaniidade. E foi bom que assim fizeram pois libertaram a figura da mãe de certos esteriótipos. Mas a mãe é mais que tudo isso. É um dos arquétipos fundamentais formadores da identidade de cada pessoa. Essa força criadora foi bem expressa por uma mulher africana que, a propósito do dia mães, me permito traduzir do alemão e publicar neste espaço, até como homenagem de afeto a nossas mães: LB
    No dia das mães não fala a inteligência analítica mas a inteligência cordial. Logico, o comércio explora esse dia, mas o significado da figura da mãe é tão poderoso que não se deixa nunca desvirtuar totalmente. É excusado sublinhar a importância da mãe na orientação futura da vida de uma criança. Baste-nos referir as constribuições inestimáveis de Jean Piaget com sua psicologia e pedagogia evolutiva e principalmente as de Donald Winnicott com sua pediatria combinada com psicanálise infantil. Eles nos detalharam os complexos percursos da psiqué infantil nesses momentos iniciais e seminais da vida.
    Hoje não cabe esse tipo de reflexão por mais importante que seja. Tem seu lugar o afeto cujas raizes ancestrais se encontram há mais de cem milhões de anos, quando no processo da evolução se formou o cérebro límbico, próprio dos mamíferos, dos quais nós descendemos. Com eles nos vieram os sentimentos do amor, do afeto e do cuidado, guardados como informações até os dias atuais em nosso código genético. Entreguemo-nos brevemente à terna energia do afeto.
    Há muitos textos conhecidos que exaltam a figura da mãe como o belíssimo do bispo chileno Ramon Jara. Mas há um outro de grande beleza e verdade que nos vem de África, de uma nobre abissínia, recolhido como prefácio ao livro “Introdução à essência da mitologia” (1941), escrito por dois grandes mestres na área: Charles Kerény e Carl Gustav Jung. Assim fala uma mulher em nome de todas as mães.
    “Como pode saber um homem o que é uma mulher? A vida da mulher é inteiremante diferente daquela dos homens. Deus a fez assim. O homem fica o mesmo, do tempo de sua circuncisão até o seu declínio. Ele é o mesmo antes e depois de ter encontrado, pela primeira vez, uma mulher. O dia, porém, em que a mulher conheceu seu primeiro amor, sua vida se divide em duas partes. Neste dia ela se torna outra. Antes do primeiro amor, o homem é igual ao que era antes. A mulher, a partir do dia de seu primeiro amor, é outra. E assim permanecerá a vida toda.
    O homem passa uma noite com uma mulher e depois vai embora. Sua vida e seu corpo são sempre os mesmos. A mulher, porém, concebe. Como mãe, ela é diferente da mulher que não é mãe. Pois, ela carrega em seu corpo, por nove meses, as consequências de uma noite. Algo cresce em sua vida e de sua vida jamais desaparecerá. Pois ela é mãe. E permanecerá mãe, mesmo quando a criança ou todas as crianças tiverem que morrer. Pois ela carregou a criança em seu coração. Mesmo depois que ela nasceu, continua a carregá-la em seu coração. E de seu coração não sairá jamais. Mesmo que a criança tenha morrido”.
    “Tudo isso o homem não conhece. Ele não sabe nada disso. Ele não conhece a diferença entre o “antes do amor” e o “depois do amor”, entre antes da maternidade e depois da maternidade. Ele não pode conhecer. Só uma mulher pode saber e falar sobre isso. É por isso que nós mães nunca nos deixamos persuadir por nossos maridos. A mulher pode somente uma coisa. Ela pode cuidar dela mesma. Ela pode se conservar decentemente. Ela deve ser o que a sua natureza é. Ela deve ser sempre menina e mãe. Antes de cada amor é menina. Depois de cada amor é mãe. Nissso poderás saber se ela é uma boa mulher ou não”.
    Essas reflexões são dedicadas às mães vivas ou falecidas que no dia das mães lembramos com afeto. Elas estão em nossos corações. E de lá jamais sairão.
    Autor do livro em parceria com Rose-Marie Muraro Feminino e Masculino. Uma nova consciência pra o encontro das diferenças (Sextante)

    sábado, 9 de abril de 2011

    Os Bolsonaros e a rua Lima e Silva



    O grupo Somos – Comunicação, Saúde e Sexualidade publicou nota manifestando repúdio às recentes declarações racistas e homofóbicas do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e criticando a matéria publicada pelo jornal Zero Hora sobre o vandalismo que teria tomado conta da rua Lima e Silva, no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre. Intitulada “Vandalismo, drogas e sexo a céu aberto”, a matéria tem como ilustrações fotos de casais gays se beijando. A nota do Somos afirma:
    Na última semana nos deparamos com o deputado Jair Bolsonaro dando declarações racistas, heterossexistas e homofóbicas em rede nacional de televisão. “Pra mim ser gay é promíscuo, sim”, disse o deputado, democraticamente eleito pelo Partido Progressista do Rio de Janeiro, quando questionado sobre suas posições.
    As crenças do deputado, expressas de modo bastante claro, são preocupantes. Mas a democracia, instituição pela qual no deputado não parece ter muito apreço, tem sua utilidade nesse caso: grande parte das pessoas acredita que é um direito de Bolsonaro dizer o que pensa. Então, que ele diga o que pensa, que nós discordemos de suas ideias, que haja discussões e que nada mude na realidade em que vivemos. Afinal, é um “direito democrático” dizer que gay é promíscuo, é um “direito democrático” votar em um candidato que acredita nisso, tanto quanto é um “direito democrático” discordar disso. Será mesmo?
    A própria noção do que é democracia é totalmente distorcida neste caso. Ter liberdade de expressão significa ter direito de posicionar-se contra ou a favor de acontecimentos do nosso presente, mas jamais significa incitar ao ódio, promover a discriminação e a violência ou impor a todo um grupo de pessoas um rótulo preconceituoso. Isso não é liberdade de expressão: é liberdade de promoção e implantação do ódio. Entretanto, devemos tirar uma lição bastante preciosa das declarações de Bolsonaro. Ele dá voz a um murmúrio quase silencioso de muitos cidadãos e cidadãs brasileiras, que efetivamente concordam com suas ideias, eleitores e eleitoras que votaram no deputado e que legitimam suas posições. Há uma massa de pessoas que também acreditam no que Bolsonaro diz, e que também acreditam que é este o tipo de democracia que precisa vigorar no Brasil. Temos de estar atentos/as ao que isso pode significar para o jogo político. Além disso, é importante que as pessoas se expressem publicamente, que assumam suas crenças e que se responsabilizem por elas. Se concordam com as declarações do deputado, que tomem a voz: é importante tirar os/as reacionários do “armário” para que as discussões se tornem mais claras.
    Na edição desta segunda-feira do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, as páginas 4 e 5 são dedicadas a descrever e denunciar os supostos abusos cometidos por jovens que se encontram na rua Lima e Silva, localizada no bairro Cidade Baixa na capital gaúcha. O bairro é reconhecidamente o preferido pela boemia porto-alegrense e é frequentado por muitos grupos em diferentes dias e diferentes ruas. A matéria, entretanto, foca como problema a sociabilidade jovem que acontece ali, sobretudo aos domingos, entre jovens. O título da matéria “Vandalismo, drogas e sexo a céu aberto” deixa muito a desejar, ainda mais quando contrastado com as fotografias que ilustram o texto: não há sexo a céu aberto, mas beijos entre dois meninos ou entre duas meninas. É este o conceito de “sexo a céu aberto”?
    O SOMOS já desenvolveu uma pesquisa de levantamento de dados e um trabalho de prevenção às infecções sexualmente transmissíveis junto aos jovens que se reúnem em frente ao Centro Comercial Nova Olaria. Durante a implementação das ações da pesquisa e do projeto Qual É A Sua, desde o ano de 2007, fizemos observações participantes na sociabilidade dos jovens na rua Lima e Silva. Durante os mais de 6 meses de observações, não presenciamos nenhuma cena de sexo a céu aberto, como sugere a matéria, também não presenciamos nenhum/a jovem subindo os parapeitos dos prédios para cheirar cocaína. Vale lembrar que jovens menores de 18 anos não podem entrar em motéis e normalmente moram junto com seus pais, o que dificulta os momentos de práticas sexuais a sós – mesmo assim, jamais vimos nenhum tipo de atentado violento ao pudor acontecendo na Lima e Silva.
    Sim, é verdade que os/as jovens fazem xixi nas ruas, posto que os banheiros dos estabelecimentos próximos ficam fechados – apenas para os jovens – e a Prefeitura não disponibiliza banheiros públicos naquela região da cidade. Porém, o “problema” de urina e fezes nas ruas não é uma característica apenas da Lima e Silva – várias outras regiões de Porto Alegre têm sofrido com o total descaso da política de limpeza urbana do município. Se há consumo de drogas ilícitas, como a cocaína, ou abuso de drogas lícitas, como o álcool, é importante salientar que o uso e abuso destes tipos de drogas acontecem também a algumas quadras da rua Lima e Silva, ao longo da rua João Alfredo. A diferença entre a sociabilidade das duas ruas é que a primeira é predominantemente frequentada por jovens gays e lésbicas, enquanto que a segunda é destino de jovens heterossexuais – de classe média. O uso e abuso de drogas lícitas e ilícitas não é privilégio dos jovens que se reúnem na rua Lima e Silva, mas uma prática mais ou menos disseminada e comum entre vários grupos de pessoas que frequentam vários outros ambientes de sociabilidade, sem que isso se torne um problema unicamente porque o consumo se dá dentro destes espaços, sem que o público em geral veja. É esse, então, o problema? Que sejamos obrigados a ver com nossos olhos aquilo que normalmente preferimos ignorar? Acreditamos que exista, sim, um problema em relação à sociabilidade dos/as jovens que frequentam a Lima e Silva aos domingos; entretanto, as maneiras com que a sociedade e a mídia vêm lidando com este problema, além da omissão do Poder Público Municipal, só têm piorado a situação.
    A matéria de Zero Hora, cuja demanda de pauta ainda é um mistério, explicita problemas que não se restringem àquele grupo de jovens. É curioso notar que ao longo do texto, nenhum dos/as jovens foi ouvido/a ou entrevistado/a. Por quê? Se a eles/as são impetradas tantas transgressões, por que não ouvi-los/as sobre o que têm a dizer? Por que damos ouvidos às declarações de Bolsonaro, por exemplo, e é tão difícil de articularmos uma resposta consistente contra suas posições? Por que não há nas páginas de Zero Hora uma matéria sobre o uso e abuso de álcool e cocaína nas boates freqüentadas pelos jovens da classe média heterossexual de Porto Alegre? Por que não há políticas públicas relevantes para dar conta dos jovens, sobretudo no município de Porto Alegre? Por que é tão fácil de acreditar que Bolsonaro tem direito de dizer o que pensa, chamando isso de liberdade de expressão, enquanto que jovens gays e lésbicas não podem se beijar em público, posto que isso é atentado violento ao pudor? É porque, talvez, em alguma medida, aqueles/as que veem como um problema jovens gays e lésbicas se beijando em público estejam também de acordo com as declarações de Bolsonaro.
    O SOMOS se posiciona contrariamente às declarações do deputado Jair Bolsonaro e repudia qualquer tipo de atitude ou ideia que incite ao ódio e à violência; defendemos, sim, a liberdade de expressão, mas somos absolutamente contrários/as a posições que denigrem os Direitos Humanos. Pela mesma razão, somos a favor de um tratamento mais digno e menos preconceituoso em relação aos/às jovens que frequentam a rua Lima e Silva aos domingos, de modo que todos os atores sociais e instituições públicas envolvidas nessa situação possam tomar medidas inclusivas para resolver a questão, sempre orientadas pelos princípios preconizados pelos Direitos Humanos.