sábado, 14 de dezembro de 2013

John Holloway: “Nossa força depende da capacidade de dizermos não”

Para autor de Fissurar o capitalismo, é preciso construir outras formas de se viver cotidianamente
Por Adriana Delorenzo
Holloway: “Ser anticapitalista é a coisa mais comum do mundo. Todos sabemos que o capitalismo é um desastre, o problema é que não sabemos como sair daqui, como criar um mundo digno” (Reprodução)
Romper com o mundo como ele é e criar um diferente. Esse é o objetivo de muitos militantes e ativistas. Mas como fazer para construir uma realidade em que não haja Gaza nem Guantánamo nem poucos bilionários e 1 bilhão de pessoas morrendo de fome? O cientista político irlandês, radicado no México, John Holloway traz esse desafio em seu novo livroFissurar o capitalismo (Editora Publisher Brasil). São 33 teses que explicam como criar rupturas no sistema para não continuar a reproduzi-lo. Do idoso que cultiva hortas verticais em sua sacada como forma de revolta contra o concreto e a poluição que o cerca. Do funcionário público que usa seu tempo livre para ajudar doentes com aids. Da professora que dedica sua vida contra a globalização capitalista. São diversos exemplos trazidos pelo autor, de pessoas comuns que recusam a lógica do dinheiro para dar forma a suas vidas. No entanto, após a rejeição, é preciso tentar fazer algo diferente. É aí que surge o problema. “As fissuras são sempre perguntas, não respostas.”
Professor da Universidade Autonôma de Puebla, o trabalho de Holloway tem influência do zapatismo, movimento que há quase 20 anos vem tentando construir esse outro fazer. No México, essas fissuras têm sido criadas, sem que se espere por uma revolução futura. Como trazido em seu primeiro livro traduzido no Brasil, Mudar o mundo sem tomar o poder, Holloway acredita que pensar em revolução hoje é multiplicar essas fissuras. “Uma revolução centrada no Estado é um processo altamente autoantagonista, uma fissura que se expande e se engessa ao mesmo tempo”, diz o autor na obra recém-lançada. Nesta entrevista à Fórum, Holloway fala sobre os novos movimentos que vêm tomando as ruas em diversos países do mundo, inclusive no Brasil.
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Ótima hora para Fissurar o capitalismo
Fórum – Em seu novo livro, traduzido no Brasil como Fissurar o capitalismo, o senhor propõe que, por meio da recusa do capitalismo, sejam criadas fissuras dentro do próprio sistema. Poderia dar exemplos de atividades que criam essas “rupturas” no capitalismo?
John Holloway – Os distúrbios das últimas semanas [junho e julho] no Rio de Janeiro, São Paulo, Istambul, Estocolmo, Sofia, Atenas, começaram por razões diferentes, mas acho que, em todas as ruas do mundo, todos estão dizendo o mesmo canto: “O capitalismo é um fracasso, um fracasso, um fracasso!” Ser anticapitalista é a coisa mais comum do mundo. Todos sabemos que o capitalismo é um desastre, que está destruindo a humanidade. O problema é que não sabemos como sair daqui, como criar um mundo digno. Os velhos modelos de revolução não servem, temos de pensar em novas maneiras de conseguir uma mudança revolucionária.
Não é uma questão de inventar um programa, mas de observar como as pessoas já estão rejeitando o capitalismo e tratando de construir outras formas de viver, formas mais sensatas de se relacionar. Há tentativas de uma beleza espetacular, como a dos zapatistas em Chiapas, que há 20 anos estão dizendo: “Nós não vamos aceitar a agressão capitalista, aqui vamos construir outra forma de viver, outra maneira de nos organizarmos.”
Podemos pensar também nas muitas lutas atuais contra mineradoras na América Latina, onde as pessoas estão dizendo claramente: “Nós não vamos aceitar a lógica do capital, vamos defender uma vida baseada em outros princípios, vamos defender a comunidade e a nossa relação com a terra”. Ou mesmo podemos pensar em um grupo de estudantes que concordam em não querer dedicar suas vidas a serem explorados por uma empresa e vão caminhar no sentido contrário, se dedicando a fazer outra coisa, criando um centro social, uma horta comunitária ou qualquer outra coisa.
Podemos pensar nesses diferentes exemplos como rachaduras ou fissuras, como rupturas na estrutura de dominação. Quando nos concentramos nisso, percebemos que o mundo está cheio de fissuras, cheio de revoltas. Todas são contraditórias, todas têm seus problemas, mas a única maneira que eu penso a revolução, hoje, é em termos de criação, expansão, multiplicação e confluência dessas fissuras, desses espaços ou momentos em que dizemos: “Nós não aceitamos a lógica do capital, vamos criar outra coisa”.
Fórum – Em seu primeiro livro publicado no Brasil, Mudar o mundo sem tomar o poder, o senhor critica o estadocentrismo de parte da esquerda. Como é possível provocar mudanças sem tomar o poder do Estado?
Holloway – A maneira mais óbvia para alcançar a mudança é por meio do Estado, e, sim, houve mudanças nos atuais governos de esquerda na América Latina. O problema é que o Estado é uma forma específica de organização que surgiu com o capitalismo e que tem tido a função, nos últimos séculos, de promover a acumulação do capital. O Estado, por seus hábitos e detalhes de seu funcionamento, exclui as pessoas, limitando a sua participação, no caso das democracias, no ato simbólico de votar a cada quatro ou seis anos.
Então, se queremos realizar mudanças dentro do capitalismo, o Estado é uma forma adequada, nada mais.  Sabemos muito bem que o capitalismo é uma dinâmica suicida para a humanidade. Se quisermos ir além do capitalismo, não tem sentido escolher uma forma de organização especificamente capitalista, que exclui sistematicamente as pessoas. É por isso que os movimentos de revolta se organizam de forma diferente, de forma includente, pelas assembleias, conselhos, comunas, formas de organização baseadas na tentativa de articular as opiniões e desejos de todos. A única maneira de romper com o capitalismo é por meio dessas formas anticapitalistas.
Fórum – Do livro Mudar o mundo sem tomar o poder para Fissurar o Capitalismo, o que mudou? Houve algum processo ou movimento que o influenciou?
Holloway – Não houve nenhum movimento específico. Creio que depois de 2001/2002, na Argentina surge uma questão. E agora? Para onde vamos? Como manter o ritmo?
E se tornou mais evidente que não é suficiente gritar nas ruas e derrubar governos. Se depois das manifestações do fim de semana temos que voltar a vender nossa força de trabalho na segunda-feira – ou tentar vendê-la –, não haverá mudado muito.
A nossa força depende da capacidade de dizermos “não”, não só para os políticos, mas também para os capitalistas, que eles vão para o inferno.
Para isso, precisamos desenvolver uma vida que não dependa deles. Parece irreal, talvez, mas é o que as pessoas estão fazendo por todos os lados, por opção ou necessidade. Nas fissuras.
Fórum – Recentemente, vêm ocorrendo muitos protestos no Brasil que questionaram as tarifas dos transportes públicos e os gastos públicos na construção dos estádios para a Copa do Mundo, enquanto as cidades têm vários problemas. O senhor fala em seu livro das fissuras espaciais nas cidades. Por que as cidades seriam um campo fértil para essas fissuras?
Holloway – É a obscenidade do mundo de hoje. Começa com as tarifas de transportes públicos ou gastos públicos, ou corrupção ou destruição de um parque – como em Istambul –, mas o que explode é realmente uma raiva contra um mundo obsceno, um mundo de injustiças grotescas de violência que ultrapassa a compreensão, de destruição sistemática da natureza, um mundo que nos ataca em nossos interesses, mas que também nos insulta como seres humanos. Essas explosões que temos visto nos últimos meses ocorrem mais facilmente em cidades onde a obscenidade do sistema se impõe de forma muito agressiva. Mas o grande desafio é como ir construindo espaços para um mundo não obsceno, que vão contra e para além do capitalismo. Esta luta por um mundo digno é o que chamamos normalmente vida, ou amor, ou revolução.
Fórum – Também vimos vários movimentos que questionam a democracia representativa (os 99% contra os 1%), como Occupy e o 15-M na Espanha.
Holloway – Os movimentos dos indignados e os Occupy são parte da mesma explosão de cansaço e raiva. Temos aceitado este sistema que está nos matando por tanto tempo, mas já basta! É o grito da revolta zapatista de 1994 que está ecoando em um lugar após o outro. Basta! O sistema representativo é parte deste sistema obsceno, não faz nada para mudá-lo, só dá mais força. A desilusão segue na eleição de qualquer governo “progressista” (Lula, Dilma, os Kirchner, Obama), abre nos melhores casos outras perspectivas, as pessoas percebem que a mudança não pode ser feita por meio do Estado e começam a pensar na política de outra maneira.
Fórum – No livro, o senhor aborda a questão do tempo abstrato ou o tempo da futura revolução. Como as novas tecnologias mudam a relação entre o presente e o futuro, aqui e agora, e também do trabalho? Por exemplo, qual é o efeito da transmissão dos protestos em tempo real através da internet?
Holloway – O “Basta!”  rompe com o conceito tradicional que coloca a revolução no futuro. Antes se falava da paciência revolucionária como uma virtude: tinha que ir construindo o  movimento, preparando-se para o grande dia, no futuro, o grande dia que nunca chegou, ou se chegou não foi o que pensávamos que seria. Agora, está claro que não podemos esperar, temos de quebrar o sistema atual, aqui e agora, onde podemos. Temos de quebrar os relógios, rejeitar a homogeneidade, a continuidade e disciplina que eles incorporam. Creio que o uso das novas tecnologias para transmitir os protestos é importante, mas não produz o “Basta”, pode dar uma força contagiante que impressione.  F
Serviço
Fissurar o capitalismo
272 páginas
R$ 35
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Sonho americano? Conheça 10 fatos chocantes sobre os EUA


Sonho americano? Conheça 10 fatos chocantes sobre os EUA
Maior população prisional do mundo, pobreza infantil acima dos 22%, nenhum subsídio de maternidade, graves carências no acesso à saúde… bem-vindos ao “paraíso americano”
(Imagem: Divulgação)
Os EUA costumam se revelar ao mundo como os grandes defensores das liberdades, como a nação com a melhor qualidade de vida do planeta e que nada é melhor do que o “american way of life” (o modo de vida americano). A realidade, no entanto, é outra. Os EUA também têm telhado de vidro como a maioria dos países, a diferença é que as informações são constantemente camufladas. Confira abaixo 10 fatos pouco abordados pela mídia ocidental.
1. Maior população prisional do mundo
Elevando-se desde os anos 80, a surreal taxa de encarceramento dos EUA é um negócio e um instrumento de controle social: à medida que o negócio das prisões privadas alastra-se como uma gangrena, uma nova categoria de milionários consolida seu poder político. Os donos destas carcerárias são também, na prática, donos de escravos, que trabalham nas fábricas do interior das prisões por salários inferiores a 50 cents por hora. Este trabalho escravo é tão competitivo, que muitos municípios hoje sobrevivem financeiramente graças às suas próprias prisões, aprovando simultaneamente leis que vulgarizam sentenças de até 15 anos de prisão por crimes menores como roubar chicletes. O alvo destas leis draconianas são os mais pobres, mas, sobretudo, os negros, que representando apenas 13% da população norte-americana, compõem 40% da população prisional do país.
2. 22% das crianças americanas vive abaixo do limiar da pobreza.
Calcula-se que cerca de 16 milhões de crianças norte-americanas vivam sem “segurança alimentar”, ou seja, em famílias sem capacidade econômica para satisfazer os requisitos nutricionais mínimos de uma dieta saudável. As estatísticas provam que estas crianças têm piores resultados escolares, aceitam piores empregos, não vão à universidade e têm uma maior probabilidade de, quando adultos, serem presos.
3. Entre 1890 e 2012, os EUA invadiram ou bombardearam 149 países.
O número de países nos quais os EUA intervieram militarmente é maior do que aqueles em que ainda não o fizeram. Números conservadores apontam para mais de oito milhões de mortes causadas pelo país só no século XX. Por trás desta lista, escondem-se centenas de outras operações secretas, golpes de Estado e patrocínio de ditadores e grupos terroristas. Segundo Obama, recipiente do Nobel da Paz, os EUA conduzem neste momente mais de 70 operações militares secretas em vários países do mundo.
O mesmo presidente criou o maior orçamento militar norte-americano desde a Segunda Guerra Mundial, superando de longe George W. Bush.
4. Os EUA são o único país da OCDE que não oferece qualquer tipo de subsídio de maternidade.
Embora estes números variem de acordo com o Estado e dependam dos contratos redigidos por cada empresa, é prática corrente que as mulheres norte-americanas não tenham direito a nenhum dia pago antes ou depois de dar à luz. Em muitos casos, não existe sequer a possibilidade de tirar baixa sem vencimento. Quase todos os países do mundo oferecem entre 12 e 50 semanas pagas em licença maternidade. Neste aspecto, os Estados Unidos fazem companhia à Papua Nova Guiné e à Suazilândia.
5. 125 norte-americanos morrem todos os dias por não poderem pagar qualquer tipo de plano de saúde.
Se não tiver seguro de saúde (como 50 milhões de norte-americanos não têm), então há boas razões para temes ainda mais a ambulância e os cuidados de saúde que o governo presta. Viagens de ambulância custam em média o equivalente a 1300 reais e a estadia num hospital público mais de 500 reais por noite. Para a maioria das operações cirúrgicas (que chegam à casa das dezenas de milhar), é bom que possa pagar um seguro de saúde privado. Caso contrário, a América é a terra das oportunidades e, como o nome indica, terá a oportunidade de se endividar e também a oportunidade de ficar em casa, torcendo para não morrer.
6. Os EUA foram fundados sobre o genocídio de 10 milhões de nativos. Só entre 1940 e 1980, 40% de todas as mulheres em reservas índias foram esterilizadas contra sua vontade pelo governo norte-americano.
Esqueçam a história do Dia de Ação de Graças com índios e colonos partilhando placidamente o mesmo peru em torno da mesma mesa. A História dos Estados Unidos começa no programa de erradicação dos índios. Tendo em conta as restrições atuais à imigração ilegal, ninguém diria que os fundadores deste país foram eles mesmos imigrantes ilegais, que vieram sem o consentimento dos que já viviam na América. Durante dois séculos, os índios foram perseguidos e assassinados, despojados de tudo e empurrados para minúsculas reservas de terras inférteis, em lixeiras nucleares e sobre solos contaminados. Em pleno século XX, os EUA iniciaram um plano de esterilização forçada de mulheres índias, pedindo-lhes para colocar uma cruz num formulário escrito em idioma que não compreendiam, ameaçando-as com o corte de subsídios caso não consentissem ou, simplesmente, recusando-lhes acesso a maternidades e hospitais. Mas que ninguém se espante, os EUA foram o primeiro país do mundo oficializar esterilizações forçadas como parte de um programa de eugenia, inicialmente contra pessoas portadoras de deficiência e, mais tarde, contra negros e índios.
7. Todos os imigrantes são obrigados a jurarem não ser comunistas para poder viver nos EUA.
Além de ter que jurar não ser um agente secreto nem um criminoso de guerra nazi, vão lhe perguntar se é, ou alguma vez foi membro do Partido Comunista, se tem simpatias anarquista ou se defende intelectualmente alguma organização considerada terrorista. Se responder que sim a qualquer destas perguntas, será automaticamente negado o direito de viver e trabalhar nos EUA por “prova de fraco carácter moral”.
8. O preço médio de uma licenciatura numa universidade pública é 80 mil dólares.
O ensino superior é uma autêntica mina de ouro para os banqueiros. Virtualmente, todos os estudantes têm dívidas astronômicas, que, acrescidas de juros, levarão, em média, 15 anos para pagar. Durante esse período, os alunos tornam-se servos dos bancos e das suas dívidas, sendo muitas vezes forçados a contrair novos empréstimos para pagar os antigos e assim sobreviver. O sistema de servidão completa-se com a liberdade dos bancos de vender e comprar as dívidas dos alunos a seu bel prazer, sem o consentimento ou sequer o conhecimento do devedor. Num dia, deve-se dinheiro a um banco com uma taxa de juros e, no dia seguinte, pode-se dever dinheiro a um banco diferente com nova e mais elevada taxa de juro. Entre 1999 e 2012, a dívida total dos estudantes norte-americanos cresceu à marca dos 1,5 trilhões de dólares, elevando-se assustadores 500%.
9. Os EUA são o país do mundo com mais armas: para cada dez norte-americanos, há nove armas de fogo.
Não é de se espantar que os EUA levem o primeiro lugar na lista dos países com a maior coleção de armas. O que surpreende é a comparação com outras partes do mundo: no restante do planeta, há uma arma para cada dez pessoas. Nos Estados Unidos, nove para cada dez. Nos EUA podemos encontrar 5% de todas as pessoas do mundo e 30% de todas as armas, algo em torno de 275 milhões. Esta estatística tende a se elevar, já que os norte-americanos compram mais de metade de todas as armas fabricadas no mundo.
10. Há mais norte-americanos que acreditam no Diabo do que os que acreditam em Darwin.
A maioria dos norte-americanos são céticos. Pelo menos no que toca à teoria da evolução, já que apenas 40% dos norte-americanos acreditam nela. Já a existência de Satanás e do inferno soa perfeitamente plausível a mais de 60% dos norte-americanos. Esta radicalidade religiosa explica as “conversas diárias” do ex-presidente Bush com Deus e mesmo os comentários do ex-pré-candidato republicano Rick Santorum, que acusou acadêmicos norte-americanos de serem controlados por Satã.