Escrito por Demetrio Cherobini no Correio da Cidadania | |
Um clássico, um engodo e uma aposta: tal é o que se encontra na edição brasileira de A educação para além do capital
de István Mészáros, lançado primeiramente em 2005 e depois em 2008,
pela Editora Boitempo. O clássico fica por conta do próprio texto de
Mészáros, uma proposta consistente, coerente e radical a respeito de
como os revolucionários do século XXI podem orientar seus esforços no
campo da educação, a fim de superar a dominação exercida pelo capital
sobre o sócio-metabolismo humano e realizar a "comunidade humana
emancipada". O engodo, destaque negativo da publicação, cabe
inteiramente ao prefaciador do livro, Emir Sader, que, desgraçadamente,
tenta desviar a atenção do leitor para preocupações e objetivos diversos
dos que estão contidos nas formulações do pensador húngaro. A aposta, o
que resta disso tudo, é a de que os trabalhadores saibam ter a postura
crítica necessária para perceber e superar as mistificações ideológicas
que proliferam em nossos dias – até mesmo em torno das publicações
progressistas - e tentam lhes perpetuar na condição de acomodação,
entorpecimento e paralisia frente ao seu inimigo visceral.
Desde A teoria da alienação em Marx, escrito na década de 1960, até seus textos mais recentes, como O desafio e o fardo do tempo histórico, de 2007, o ponto-chave que orienta a reflexão filosófica de Mészáros é a realização da transcendência positiva da auto-alienação do trabalho. O mesmo se dá, evidentemente, em A educação para além do capital,
concebido originalmente como uma conferência a ser proferida no Fórum
Mundial de Educação, na cidade de Porto Alegre, em 2004. Nesse contexto,
pode-se dizer que a crítica radical da alienação é o elemento decisivo
para se entender não apenas a proposta, discutida nesse livro, de "contra-interiorização"
da realidade histórico-social, que precisa se dar em ambientes formais e
informais de aprendizagem, mas da teoria social e política do filósofo
húngaro em sua totalidade.
Sem compreender isso, qualquer empreendimento que vise elucidar
criticamente as proposições de Mészáros sobre as formas – atuais e
vindouras - de mediar o sócio-metabolismo humano fica tremendamente
prejudicado. A educação é importante para um projeto político-social
alternativo porque a superação da alienação só pode ser feita por meio
de uma atividade autoconsciente. Esta é, pois, a condição para
passarmos de uma situação onde nos encontramos completamente
fragmentados, cindidos, diminuídos, submissos às nossas próprias
criações materiais e estranhos em relação aos nossos semelhantes, para
uma outra, na qual poderemos nos desenvolver ao máximo e nos tornarmos ricos no sentido qualitativo da palavra: sujeitos que sentem intimamente a carência de uma multiplicidade de manifestações humanas de vida (Cf. Marx).
Mas quem lê desavisadamente o prefácio à edição brasileira de A educação para além do capital é induzido a crer que as preocupações de Mészáros são as mesmas de Sader, a saber: como fortalecer a esfera pública em contraposição ao domínio do privado.
Vejamos, nesse sentido, o que afirma o politólogo brasileiro: "Talvez
nada exemplifique melhor o universo instaurado pelo neoliberalismo, em
que ‘tudo se vende, tudo se compra’, ‘tudo tem preço’, do que a
mercantilização da educação. Uma sociedade que impede a emancipação só
pode transformar os espaços educacionais em shoppings centers,
funcionais à sua lógica do consumo e do lucro. O enfraquecimento da
educação pública, paralelo ao crescimento do sistema privado, deu-se ao
mesmo tempo em que a socialização se deslocou da escola para a mídia, a
publicidade e o consumo" (Cf. SADER, 2005, 16).
Uma leitura atenta, contudo, vai nos mostrar que os termos de referência
de Mészáros são completamente outros. Em primeiro lugar, porque não é o
neoliberalismo que mercantiliza tudo – inclusive a educação -, e sim,
em nosso contexto, o sistema do capital. Em segundo lugar, a
questão realmente importante não é exatamente o "enfraquecimento da
educação pública" em comparação com o crescimento do ensino privado. Ao
colocar as questões desse modo, Sader tenta fazer-nos crer que a
preocupação de Mészáros seria com um eventual fortalecimento do setor
público em contraposição ao setor privado – seria, portanto, combater
precipuamente o "neoliberalismo".
Mas o filósofo húngaro não é tão ingênuo assim e não mistifica dessa
maneira o setor "público" (o Estado). Antes disso, está muito mais
interessado em demonstrar como é o sistema do capital – e não somente o "neoliberalismo" -, com todas as suas contradições, incluindo-se aí o próprio Estado,
que faz parte de sua base material e que deve ser superado em
concomitância com esse complexo mais amplo no qual está inserido. A
educação pode contribuir com esse propósito, desde que não se limite
apenas ao âmbito formal de ensino – note-se, então, que não se
trata de colocar a questão em termos de "público" e "privado" - e se
volte para a formação das mediações materiais não antagônicas de
regulação do sócio-metabolismo humano. E isso só pode ser feito se a
educação em questão for radicalmente crítica, isto é, articuladora teórico-prática de negação e afirmação no sentido da construção do socialismo – ponto importantíssimo que nem sequer é tocado no curioso prefácio.
A preocupação de Mészáros, portanto, é em firmar uma educação revolucionária, e não meramente "pública" (ademais, em Para além do capital, o filósofo húngaro deixa bem claro que o objetivo dos socialistas é a socialização do poder de decisão sobre todos os âmbitos da atividade humana, e não a mera estatização das coisas – porque isto não elimina, em definitivo, o problema da alienação).
Em terceiro lugar, é um equívoco completo afirmar algo parecido com "a
socialização se deslocou da escola para a mídia, a publicidade e o
consumo". Na verdade, a socialização - isto é, o aprendizado das
relações, normas e valores sociais, a internalização do mundo
humano, a apropriação ativa das produções histórico-culturais - nunca
poderia ter feito esse percurso porque ela é, na verdade, como a
educação, "a própria vida", ou seja, se confunde com a própria vida,
seja na escola ou fora dela. O referido prefácio, portanto, desvia o foco da nossa atenção para pontos que não são
preocupações centrais de Mészáros. Constitui, na verdade, um
tragicômico registro de um caso de prefaciador que apresentou como se
fossem do prefaciado idéias que na verdade não lhe pertenciam
(acreditamos que mistificação seja um termo bastante apropriado para designar o sentido desse tipo de operação intelectual).
A educação para a superação da alienação é, de acordo com Mészáros, a que se insere conscientemente na luta de classes. Aí, ela se desenvolve a partir da adoção crítica de um ponto de vista
estruturalmente antagônico em relação ao sistema do capital. Essa nova
práxis compreende tal perspectiva, os interesses que lhe são inerentes,
articula-os em torno de uma ideologia capaz de proporcionar os
devidos "estímulos mobilizadores" para as ações sócio-políticas da
"classe com cadeias radicais" rumo à sua emancipação. É uma educação que
está, pois, consciente de que só uma revolução pode libertar os
trabalhadores da prisão configurada pelos processos alienados e
alienantes de produção e reprodução do capital.
Nesse contexto, todas as mistificações sobre as relações dos
homens com os produtos do seu trabalho, onde estes lhes aparecem como
auto-constituídos e dotados de propriedades humanas, devem ser
combatidas. A educação socialista é, por definição, uma educação desmistificadora dos
processos atualmente estabelecidos de controle sócio-metabólico,
realizados de acordo com as exigências do capital. É, pois, numa
palavra, crítica radical dos fetiches de um sistema que vive de produzir fetiches – incluindo-se aí, evidentemente, o próprio fetiche do Estado.
O projeto socialista requer, assim, que nos orientemos a partir de um
quadro estratégico adequado, de atuação nacional e internacional, com
vistas a irmos para além do capital, e não meramente do capitalismo e seu regime jurídico garantidor da propriedade privada. A educação para além do capital é aquela que, concebendo-se como mediação indispensável, se integra conscientemente nesse projeto de transição que deverá fazer vir à luz uma sociedade capaz de proporcionar tempo disponível para a realização das potencialidades humanas. A educação é, portanto, na visão de Mészáros, parte de um projeto político-social - mediação coadunada com outras mediações - que precisa progressivamente negar a forma de sociabilidade atualmente cristalizada e afirmar
uma alternativa viável em relação a ela. É esse movimento que
constitui, pois, a crítica radical, a práxis revolucionária rumo à
comunidade humana emancipada, a sociedade regulada pelos produtores
livremente associados de que falava Marx.
É importante ressaltar tais questões, pois Mészáros volta a elas freqüentemente. É a crítica da ordem do capital que deve constituir a forma da educação transformadora. Isto exige uma ampla e profunda modificação de práticas e relações materiais – ou seja, dos sistemas de mediações atualmente estabelecidos -, que deve se dar com base no objetivo de transferir o poder de decisão sobre
os processos sócio-metabólicos da humanidade para os produtores
associados. Por isso, a reflexão sobre educação não pode se realizar
meramente tendo-se em vista os ambientes formais de ensino, mas sim, sobretudo, as esferas informais
de apropriação dos produtos históricos. Nessas duas "frentes de
batalha", ela necessita se estabelecer como prática que é, assim como a
revolução, auto-determinada e permanente.
O filósofo húngaro frisa constantemente que as formas de apropriação do
mundo que o capital controla não se dão somente na escola ou na
universidade, mas na vida como um todo. Por causa disso, a educação
revolucionária não pode visar apenas os ambientes formais de ensino, mas
sim se voltar para todas as outras atividades em que a interiorização
ocorre, a fim de produzir uma contra-interiorização (ou contra-consciência)
radical. Não mais hierárquica, fetichista, perdulária, destrutiva, e
sim sustentável, cooperativa, consciente, emancipada, numa palavra, socialista. Por tal razão, uma educação alternativa só pode ser bem fundamentada se estiver amparada por uma teoria política
concretamente produzida para fins específicos de confrontação de um
determinado sistema de relacionamento social. Isto deve estar claro para
os sujeitos envolvidos com atividades formais de ensino, pois eles
necessitam ser capazes de fazer com que a sua instituição específica se
abra para toda a sociedade, a fim de poder se articular com os
movimentos materiais que visam superar a ordem do capital rumo à "nova
forma histórica".
A teoria de Mészáros é, portanto, uma defesa intransigente e sem
concessões de que as instituições de ensino e seus participantes –
educadores, educandos, trabalhadores da educação, comunidade escolar –
entrem numa relação dialética com os processos políticos e sociais que,
em nosso tempo, visam à construção do futuro emancipado da humanidade.
Isto não significa, contudo, que tal teoria não diga algo digno de poder
ser utilizado para orientar ações dentro do âmbito da escola ou
da universidade. Por exemplo: se a atividade organizada pelo sistema
fetichista de exploração de trabalho excedente – isto é, o sistema do capital - é estruturada hierarquicamente,
a prática superadora de tal conjunto de relações precisa se ordenar de
modo diverso. Isto pode ocorrer tanto no que toca à própria estrutura
institucional como no interior da sala de aula: um movimento progressivo
de transcendência da forma da interiorização que se dá de acordo com a
lógica do capital (hierárquica), para uma outra, não fetichista, horizontal,
cooperativa, auto-determinada. É esse novo tipo de prática social que
torna possível a generalização do pensamento crítico e a formação da consciência socialista de massa de que fala Mészáros.
Uma forma revolucionária de educação é, pois, segundo o filósofo
húngaro, imprescindível para as classes trabalhadoras na sua luta contra
o capital. Não uma educação que, impregnada de retórica mistificadora,
contemporize com interesses escusos de partidos que desejam se perpetuar
nos postos mais altos do Estado a partir de uma engenharia política
hábil na conciliação entre as classes. Não uma educação que se dê
meramente no âmbito "público", mas que seja capaz de criticar os
próprios fundamentos da divisão entre o público e o privado. Não uma
educação que fetichize o Estado, considerando-o como panacéia
para todos os problemas, mas que combata suas contradições lá onde elas
se enraízam. Finalmente: não uma educação apenas contra o setor privado,
o neoliberalismo, o partido X ou Y, e sim uma educação contra o capital,
suas personificações e seus ideólogos de todos os tipos -
principalmente, os que exercem sua influência deletéria no interior da
própria esquerda...
Ficha
Título: A educação para além do capital
Autor: István Mészáros
Editora: Boitempo
Ano: 2008 (2ª edição)
Páginas: 124
Preço: R$ 25,00
Sobre o autor: István Mészáros nasceu em Budapeste, em 1930. Em
sua juventude, trabalhou em fábricas de aviões, tratores, têxteis,
tipografias e até no departamento de manutenção de uma ferrovia
elétrica. Aos dezoito anos, graças ao fato de haver se formado com notas
máximas, ganhou uma bolsa de estudos na Universidade de Budapeste, onde
pôde conhecer o filósofo György Lukács, de quem foi grande amigo e
discípulo. Da Hungria, Mészáros foi para a Itália, onde trabalhou na
Universidade de Turim. A partir de 1959, seu destino foi a Grã-Bretanha,
onde lecionou em vários lugares: no Bedford College da Universidade de
Londres (1959-1961), na Universidade de Saint Andrews, na Escócia
(1961-1966), e na Universidade de Sussex, em Brighton, na Inglaterra
(1966-1971). Em 1971, trabalhou na Universidade Nacional Autônoma do
México, e em 1972 foi nomeado professor de Filosofia e Ciências Sociais
da Universidade de York, em Toronto, no Canadá. Em janeiro de 1977,
retornou à Universidade de Sussex, onde veio a receber o título de
Professor Emérito de Filosofia em 1991. Afastou-se das atividades
docentes em 1995 e atualmente vive na cidade de Rochester, próxima a
Londres.
Demetrio Cherobini é cientista social (UFSM) e mestre em Educação (UFSC).
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
István Mészáros e a educação para além do capital
O início preocupante do governo Dilma
A decisão da presidenta Dilma Rousseff de promover um corte cirúrgico de
50 bilhões no Orçamento da União confirma que os tecnocratas
neoliberais estão com a bola toda no início do novo governo. Eles já
bombardearam a proposta de aumento real do salário mínimo, aplaudiram a
decisão do Banco Central de elevar a taxa de juros e, agora, festejam os
cortes nos gastos púbicos. Tudo bem ao gosto das elites rentistas e
para delírio da mídia do capital, que agora decidiu bajular a nova
presidenta.
Na justificativa para o corte dos gastos, o ministro Guido Mantega, tão duro contra o sindicalismo na questão do salário mínimo, mostrou-se dócil diante do “deus-mercado”. Sem meias palavras, ele afirmou: “Nós estaremos revertendo todos os estímulos que fizemos para a economia brasileira entre 2009 e 2010... Nós já estamos retirando esses incentivos e agora falta uma parte deles que estão sendo retirados do Orçamento de 2011, que são os gastos públicos, que ajudaram a estimular a demanda”.
Um triste regresso ao “malocismo”?
Numa linguagem empolada, típica de quem esconde as maldades, Mantega argumentou que “este ajuste, esta consolidação fiscal, possibilitará que nós alcancemos o superávit primário” – outro termo que causa orgasmos nos banqueiros e rentistas. A União, explicou o ministro, já teria reservado “quase R$ 81,8 bilhões” somente para o pagamento dos juros – isto é, o dobro dos investimentos orçamentários destinados ao Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC (de R$ 40,15 bilhões).
Na prática, as decisões recentes do governo parecem indicar um triste regresso ao “malocismo” – uma mistura de Pedro Malan, czar da economia no reinado de FHC, e Antonio Palocci, czar da economia no primeiro mandato de Lula. Os seus efeitos poderão ser dramáticos, inclusive para a popularidade da presidenta Dilma. De imediato, as medidas de elevação dos juros e redução dos investimentos representam um freio no crescimento da economia e, conseqüentemente, na geração de emprego e renda.
Suspensão de concursos e outras maldades
Além de reduzir o papel do Estado como indutor do crescimento, o corte drástico de R$ 50 bilhões no Orçamento da União terá impacto nos serviços públicos prestados à população. O governo já anunciou a suspensão dos concursos para a contratação de novos funcionários e protelou a nomeação de 40 mil servidores aprovados em seleções anteriores. Para Maria Thereza Sombra, diretora da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursados, estas medidas levarão ao “estrangulamento da máquina”.
Empolgado com a retomada de alguns dogmas neoliberais, O Globo diariamente dá manchete às medidas de “ajuste fiscal” do ministro Mantega. Na edição de 10 de fevereiro, o jornal festejou: “O corte de R$ 50 bilhões nas despesas do Orçamento de 2011 deixará alguns ministérios a pão e água”. No estratégico Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, o corte previsto é de R$ 1,3 bilhão. Até o sistema de vigilância ambiental, alardeado após a tragédia carioca das chuvas, corre sério risco de ser enterrado.
A ditadura do capital financeiro
Como se observa, as perspectivas no início do governo da presidenta Dilma Rousseff são preocupantes. Ainda é cedo para se fazer qualquer avaliação mais conclusiva, taxativa. Mas há indícios de que as velhas teses ortodoxas voltaram a ganhar força no Palácio do Planalto, sob o comando do todo-poderoso ministro Antonio Palocci. Na prática, a opção por retomar a desgastada ortodoxia neoliberal, com aumento dos juros e cortes dos investimentos, evidencia a força da ditadura financeira no Brasil.
Esta opção, porém, não tem nada de racional sob o ponto de vista dos trabalhadores. Foram exatamente as medidas heterodoxas de estímulo ao mercado interno, adotadas no segundo mandado de Lula, que evitaram que o país afundasse na crise mundial que abala o capitalismo desde 2008. Nas eleições de 2010, o povo votou na continuidade e no avanço daquele modelo econômico de desenvolvimento e não na regressão à ortodoxia neoliberal.
Na justificativa para o corte dos gastos, o ministro Guido Mantega, tão duro contra o sindicalismo na questão do salário mínimo, mostrou-se dócil diante do “deus-mercado”. Sem meias palavras, ele afirmou: “Nós estaremos revertendo todos os estímulos que fizemos para a economia brasileira entre 2009 e 2010... Nós já estamos retirando esses incentivos e agora falta uma parte deles que estão sendo retirados do Orçamento de 2011, que são os gastos públicos, que ajudaram a estimular a demanda”.
Um triste regresso ao “malocismo”?
Numa linguagem empolada, típica de quem esconde as maldades, Mantega argumentou que “este ajuste, esta consolidação fiscal, possibilitará que nós alcancemos o superávit primário” – outro termo que causa orgasmos nos banqueiros e rentistas. A União, explicou o ministro, já teria reservado “quase R$ 81,8 bilhões” somente para o pagamento dos juros – isto é, o dobro dos investimentos orçamentários destinados ao Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC (de R$ 40,15 bilhões).
Na prática, as decisões recentes do governo parecem indicar um triste regresso ao “malocismo” – uma mistura de Pedro Malan, czar da economia no reinado de FHC, e Antonio Palocci, czar da economia no primeiro mandato de Lula. Os seus efeitos poderão ser dramáticos, inclusive para a popularidade da presidenta Dilma. De imediato, as medidas de elevação dos juros e redução dos investimentos representam um freio no crescimento da economia e, conseqüentemente, na geração de emprego e renda.
Suspensão de concursos e outras maldades
Além de reduzir o papel do Estado como indutor do crescimento, o corte drástico de R$ 50 bilhões no Orçamento da União terá impacto nos serviços públicos prestados à população. O governo já anunciou a suspensão dos concursos para a contratação de novos funcionários e protelou a nomeação de 40 mil servidores aprovados em seleções anteriores. Para Maria Thereza Sombra, diretora da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursados, estas medidas levarão ao “estrangulamento da máquina”.
Empolgado com a retomada de alguns dogmas neoliberais, O Globo diariamente dá manchete às medidas de “ajuste fiscal” do ministro Mantega. Na edição de 10 de fevereiro, o jornal festejou: “O corte de R$ 50 bilhões nas despesas do Orçamento de 2011 deixará alguns ministérios a pão e água”. No estratégico Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, o corte previsto é de R$ 1,3 bilhão. Até o sistema de vigilância ambiental, alardeado após a tragédia carioca das chuvas, corre sério risco de ser enterrado.
A ditadura do capital financeiro
Como se observa, as perspectivas no início do governo da presidenta Dilma Rousseff são preocupantes. Ainda é cedo para se fazer qualquer avaliação mais conclusiva, taxativa. Mas há indícios de que as velhas teses ortodoxas voltaram a ganhar força no Palácio do Planalto, sob o comando do todo-poderoso ministro Antonio Palocci. Na prática, a opção por retomar a desgastada ortodoxia neoliberal, com aumento dos juros e cortes dos investimentos, evidencia a força da ditadura financeira no Brasil.
Esta opção, porém, não tem nada de racional sob o ponto de vista dos trabalhadores. Foram exatamente as medidas heterodoxas de estímulo ao mercado interno, adotadas no segundo mandado de Lula, que evitaram que o país afundasse na crise mundial que abala o capitalismo desde 2008. Nas eleições de 2010, o povo votou na continuidade e no avanço daquele modelo econômico de desenvolvimento e não na regressão à ortodoxia neoliberal.
Fidel a intelectuais: É preciso começar já a salvar a humanidade
O líder cubano Fidel Castro reapareceu nesta terça-feira (15), animado e bem disposto, em um encontro com intelectuais de vários países que participavam, em Havana, da Feira Internacional do Livro. No encontro, o ex-presidente da ilha advertiu a respeito dos riscos que a humanidade corre, diante de ameaças como uma eventual guerra nuclear e a crise alimentar provocada pela mudança climática. Do sitio Vermelho
Em seu primeiro ato público deste
ano, transmitido pela emissora de TV estatal, Fidel abordou assuntos
como a alta dos preços dos alimentos, a mudança climática e as revoltas
populares ocorridas no Egito e na Tunísia.
"Nossa espécie não aprendeu a sobreviver", afirmou durante o evento. Ele enfatizou que os intelectuais "podem ter um papel decisivo" na tomada da consciência mundial e pediu a eles que contribuam para "persuadir as criaturas mais autossuficientes e incapazes que já existiram: nós, os políticos" sobre perigos que ameaçam a sobrevivência da espécie..
"Não se trata de salvar a humanidade em termos de séculos ou milênios: é preciso começar a salvar a humanidade já", disse Fidel, agora com 84 anos, a escritores da Argentina, Venezuela, Peru, México, Espanha e Cuba.
O líder cubano ressaltou que as consequências da crise alimentar vão muito além de questões econômicas. Nesse sentido aludiu à influência da alta dos preços dos alimentos no desencadeamento das revoltas contra os governos do Oriente. Além disso, referiu-se ao aumento incessante da população mundial, o que acentua o problema.
Assim como na última de suas "reflexões", dedicada à revolução no Egito, Fidel definiu o ex-presidente Hosni Mubarak como "um grande estrategista" para esconder dinheiro, enquanto 80% dos egípcios vivem na pobreza.
Nesta quarta, Castro se encontra mais uma vez com os intelectuais e terá a transmissão da televisão estatal.
Leia abaixo a fala inicial de Fidel no encontro com intelectuais:
Soube que vários intelectuais de prestígio e amigos sinceros de Cuba
visitou nossa capital para participar da XX Feira Internacional do Livro
de Havana.
Esta feira é uma das modestas coisas boas que temos impulsionado. Os
livros e as ideias que vocês elaboram e promovem têm sido fontes de
alento e de esperança; graças a eles, conhecemos o que vale o enxerto
de talento e bondade. Seus nomes se familiarizam e se repetem ao longo
da vida, durante anos, que sempre nos parecem curtos.
Entre os fatores que ameaçam o mundo, estão as guerras. Os cientistas
foram capazes de colocar nas mãos do homem colossais energias, que estão
servindo, entre outras coisas, para criar um instrumento
autodestrutivo e cruel como a arma nuclear.
Os intelectuais podem, talvez, prestar um grande serviço à humanidade.
Não se trata de salvar a humanidade em termos de milênios, nem sequer em
termos de séculos. O problema é que nossa espécie se encontra ante
problemas novos, e não aprendeu sequer a sobreviver.
"Nossa espécie não aprendeu a sobreviver", afirmou durante o evento. Ele enfatizou que os intelectuais "podem ter um papel decisivo" na tomada da consciência mundial e pediu a eles que contribuam para "persuadir as criaturas mais autossuficientes e incapazes que já existiram: nós, os políticos" sobre perigos que ameaçam a sobrevivência da espécie..
"Não se trata de salvar a humanidade em termos de séculos ou milênios: é preciso começar a salvar a humanidade já", disse Fidel, agora com 84 anos, a escritores da Argentina, Venezuela, Peru, México, Espanha e Cuba.
O líder cubano ressaltou que as consequências da crise alimentar vão muito além de questões econômicas. Nesse sentido aludiu à influência da alta dos preços dos alimentos no desencadeamento das revoltas contra os governos do Oriente. Além disso, referiu-se ao aumento incessante da população mundial, o que acentua o problema.
Assim como na última de suas "reflexões", dedicada à revolução no Egito, Fidel definiu o ex-presidente Hosni Mubarak como "um grande estrategista" para esconder dinheiro, enquanto 80% dos egípcios vivem na pobreza.
Nesta quarta, Castro se encontra mais uma vez com os intelectuais e terá a transmissão da televisão estatal.
Leia abaixo a fala inicial de Fidel no encontro com intelectuais:
Texto
Introdutório do Comandante em Chefe Fidel Castro, em debate com
intelectuais, realizado na terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
Se conseguirmos que os intelectuais compreendam o risco que estamos
vivendo neste momento, em que a resposta não pode ser adiada, talvez
eles consigam persuadir as criaturas mais autossuficientes e incapazes
que já existiram: nós, os políticos.
Como?
Coube a mim, há quase 20 anos, a desagradável tarefa de advertir ao
mundo, na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e
Desenvolvimento, que nossa espécie está em perigo de extinção.
Argumentei então, ainda que o perigo não fosse iminente como agora, e
fui escutado com atenção, embora talvez seja melhor dizer que com
benevolência.
Houve aplausos. Um homem tinha percebido isso. Os super poderosos se
reuniram ali reunidos se deram conta que era verdade, mas um problema
que eles, naturalmente, se ocupariam de resolver nos séculos que tinham
pela frente.
A cara sorridente de Bush pai e a figura do chanceler alemão Helmut
Kohl, marchando rapidamente por um amplo corredor, à frente do grupo
após a última foto, propiciava a impressão de que nada poderia perturbar
o feliz sossego do nosso mundo esplêndido.
Tão tonto como os demais mortais, fiquei com a ideia de que talvez
tivesse exagerado. Passaram-se apenas 19 anos e vejo hoje as coisas
perturbadoras que já estão acontecendo e não admitem demora nenhuma.
Mais vale parecer louco que sê-lo e não parecê-lo. Se pensarmos que já
estamos a um passo do abismo, e nosso cálculo não fora exato, nenhum
dano faríamos à humanidade. Quando nos aproximamos já aos 7 bilhões de
habitantes, não é questão começar a filosofar sobre Malthus e as
possibilidades de soja, do trigo e do milho geneticamente modificados.
Os norte-americanos, que nisso são os mais avançados, sabem bem qual é o limite de suas possibilidades.
É hora de prestar atenção aos ambientalistas e cientistas, como Lester
Brown, a maior autoridade mundial nesta matéria e na produção de
alimentos.
Eminentes pensadores veem claramente que o sistema capitalista
desenvolvido marcha até um desastre inevitável. Ninguém teria sido capaz
de antecipar as situações novas que são criadas ao longo do caminho, e
nada é negado, pelo contrário, só se confirmam as crises que nos
converteram em revolucionários. Agora não se trata da inevitabilidade da
mudança na sociedade, mas do direito da espécie a uma vida diferente
para a qual nós não deixamos de lutar.
Nem mesmo entre as religiões que postulam o Apocalipse, uma idéia em que
muitos acreditam, ninguém, que eu saiba, sugeriu que seria neste
milênio e, muito menos, neste século.
Pensei muito estes dias nos eventos que estão acontecendo e lhes peço
que façam o mesmo, sem medo de estar pedindo um esforço inútil. Eu tenho
o hábito de ler quantas análises de ecologistas e cientistas chegam às
minhas mãos.
Ontem, quando eu refletia sobre o que aconteceu na Tunísia e no Egipto,
me chamou a atenção um recente artigo de Paul Krugman, famoso escritor e
economista sério, cujas análises sobre as medidas de Roosevelt, com a
Grande Depressão e a guerra, refletiam um especial conhecimento da
economia dos EUA e do papel desempenhado pelo autor do New Deal. Não é
marxista nem socialista. Ele recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 2008.
Vejam (aqui no Vermelho) o que escreveu sobre a crise alimentar a pessoa talvez mais autorizada a fazê-lo.
Passaram quase 19 anos desde a Cúpula do Rio de Janeiro e estamos diante
do problema. Ali estávamos levantando esses problemas, sem imaginar que
o fim da espécie pode acontecer dentro de um século ou de décadas, se
antes não ocorrer uma guerra.
O aumento dos preços dos alimentos agravará imediatamente, sem qualquer
dúvida, a situação política internacional. Se, como resultado disso tudo
se agravam os problemas, eu me pergunto: devemos ignorá-los?
Gostaria de focar nosso debate neste tema.
É preciso começar já a salvar a humanidade.
O Povo do Egipto derrubou Mubarak
Os Editores
O
derrubamento de Hosni Mubarak pelo povo egípcio será recordado pelo
tempo adiante como um dos grandes acontecimentos históricos do século
XXI.
A demissão e fuga do ditador que há três décadas oprimia uma nação
com 7000 anos de História, criadora de grandes civilizações, foram o
desfecho de uma luta épica das massas. Na Praça Tahrir do Cairo,
multidões que em algumas jornadas ultrapassaram um milhão de
manifestantes resistiram durante 17 dias a todas as tentativas da
engrenagem do poder, liderada por Mubarak, para as intimidar e
desmobilizar. À brutal repressão inicial, responsável por três centenas
de mortos, seguiu-se, já com a presença do exército, o ataque brutal de
esquadrões de polícias mascarados de partidários do ditador.
A violência e as ameaças foram impotentes contra a firmeza do povo
que respondeu com combatividade reforçada aos discursos de Mubarak e às
promessas dos seus ministros e generais.
Para onde caminha o Egipto? Qualquer previsão de momento seria pouco responsável.
Uma rebelião vitoriosa, mesmo com o carácter massivo da egípcia, não deve ser confundida com uma revolução social.
Embora o comportamento das massas tenha deixado transparecer uma
vontade de organização crescente, o movimento torrencial de contestação
assumiu um carácter espontaneista, inevitável, porque no país não existe
uma organização revolucionária com forte implantação popular.
Nestas circunstâncias, o imperialismo tudo fará para evitar que o
povo seja o sujeito do processo tomando nas mãos o futuro do país.
Para já o Conselho Superior das Forças Armadas assumiu transitoriamente o poder. Cabe lembrar que os seus membros foram todos nomeados por Mubarak e a maioria mantém estreitas relações com Washington.
Para já o Conselho Superior das Forças Armadas assumiu transitoriamente o poder. Cabe lembrar que os seus membros foram todos nomeados por Mubarak e a maioria mantém estreitas relações com Washington.
De assinalar também que o presidente Obama manteve desde o inicio da
rebelião uma atitude de grande ambiguidade. Não hesitou mesmo em
manifestar a esperança de que o vice-presidente Omar Souleiman – o chefe
dos serviços secretos, intimo colaborador da CIA - dirigisse «uma
transição pacífica para a democracia».
A baronesa britânica Ashton, falando em nome da União Europeia, usou
uma linguagem semelhante ao fazer votos para «uma transição com ordem
para a democracia».
O conceito de «democracia» dos líderes do Ocidente capitalista é
suficientemente conhecido para que haja ilusões sobre aquilo que
pretendem.
Os media ocidentais omitem que ainda há poucos meses o presidente
dos EUA elogiava Mubarak como um «aliado» e o felicitou efusivamente
quando do Cairo dirigiu ao mundo árabe um discurso farisaico.
A desorientação e o temor do imperialismo não surpreendem. A
rebelião do povo egípcio na sequência dos acontecimentos da Tunísia e a
vaga de contestação que alastra por todo o mundo árabe representa um
golpe demolidor para toda a sua estratégia na Região. Mubarak foi o
grande aliado de Israel. O sionismo neofascista é o outro derrotado na
insurreição que teve por cenário a milenária cidade do Nilo.
Nesta hora em que o povo do Egipto festeja nas ruas a vitória
alcançada, os editores de odiario.info compartilham a sua alegria.
Independentemente do amanhã imediato, essa vitória confirma que as
massas são irresistíveis e constroem história quando se levantam contra
aqueles que as oprimem.
OS EDITORES DE ODIARIO.INFO
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