quinta-feira, 28 de julho de 2011

Avaliação do ensino não terá prêmios nem castigos, diz governo



Proposta de avaliação dos professores coloca Cpers e governo em embate | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte no Sul21

O governo do Rio Grande do Sul pretende implantar, já no início do próximo ano, um novo sistema de avaliação do ensino público. A proposta, que será apresentada neste segundo semestre, desagrada ao Cpers, que não concorda em vincular questões quantitativas, como o resultado dos alunos, ao aumento salarial, além de ver riscos ao atual plano de carreira, que já pressupõe uma avaliação. Já o governo ressalta que o sistema a ser implantado não terá prêmios nem castigos.
“O governo fará mudanças na avaliação de mérito já existente no Estado e não irá implementar a meritocracia”, diz o secretário de Educação, José Clóvis Azevedo. Sem entrar em detalhes, Azevedo afirma que serão ampliados os itens de avaliação e serão construídos indicadores. “A pontuação é muito vaga hoje. Temos que fazer a diferenciação entre avaliação de mérito e meritocracia. Meritocracia envolve prêmios e castigos, não vamos andar nesta linha”, garante.
Os professores receberão pontos por cada curso de aperfeiçoamento que realizarem, enquanto o atual sistema restringe a apenas um certificado de formação. Não serão aplicadas provas como forma de ascensão dos professores no plano de carreira. “Os professores já estão concursados”, justifica o secretário.
Azevedo explica que o desempenho do professor em sala de aula será avaliado pelas comissões já existentes nas escolas, com a participação da comunidade escolar. “A criatividade dos professores para ensinar, a participação deles em projetos comunitários e as propostas para a escola serão avaliados”, exemplifica.
O governo ainda não definiu, mas a tendência é fazer um decreto para implantar o sistema no próximo semestre.

“Este governo está fora da lei”

O ato que vai reempossar a professora Rejane de Oliveira na presidência do Cpers, no próximo dia 19 de agosto, servirá de protesto da entidade contra “qualquer mudança no plano de carreira sem diálogo com a categoria e contra a meritocracia”. Segundo Rejane, o governo só muda o nome, mas a metodologia proposta segue a lógica mercantil.

Cpers critica avaliação quantitativa e que não respeite a realidade de cada escola | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

A presidente do Cpers critica a avaliação quantitativa, que aplica um mesmo método para toda a rede, sem respeitar a realidade de cada escola. “Um professor que atua na escola rural tem uma realidade. O que atua na escola urbana tem outra. E, muitas vezes, as condições estruturais não são as mesmas. Isso influencia no cotidiano do professor”, explica.
“Não é possível falar em qualidade sem falar em cumprir os 35% da receita líquida para investimentos em educação, previstos na Constituição Federal. E no cumprimento do piso nacional. Este governo está fora da lei”, critica a sindicalista. O Cpers defende a aplicação do piso nacional da categoria ao atual plano de carreira, sem a necessidade de pontuações para elevar os salários.
O Cpers usa como argumento um documento assinado pelo governo do Estado, após reunião com o sindicato. “Reafirmamos nossa posição contrária à meritocracia e ao modelo de avaliação efetivado por meio do SAERS (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande do Sul), que já foi extinto. Não estabeleceremos a política de diferenciar salário a partir de verificação de resultados, nem vamos promover competição entre escolas e professores, o que só aprofundaria a desigualdade”, diz o texto.

A experiência de Canoas

Nesta semana, em almoço com jornalistas no Palácio Piratini, Tarso Genro disse que considera bom o modelo de avaliação implementado em Canoas, na região metropolitana, mas aplicado a um número restrito de professores, o que dificultaria a transposição para o plano estadual.
O modelo de Canoas foi discutido com sindicatos e a comunidade escolar. A categoria, no entanto, está descontente. “O prefeito se comprometeu em rever alguns pontos, mas até agora não alterou nada”, diz o presidente do Sindicato dos Professores de Canoas, Jari Rosa de Oliveira. No último dia 14, cerca de 300 professores protestaram em frente à prefeitura.
Bruno Alencastro/Sul21
"Temos que fazer a diferenciação entre avaliação de mérito e meritocracia. Meritocracia envolve prêmios e castigos, não vamos andar nesta linha”, diz secretário da Educação | Foto: Bruno Alencastro/Sul21

Segundo Jari Oliveira, a principal queixa é quanto à gratificação pela Regência de Classe (domínio do professor em sala de aula). “Nós agregávamos 30% do salário. Agora foi criado um novo mérito: o Valor Pessoal Nominalmente Identificado (VPMI), onde acréscimos no salário ocorrem somente mediante qualificação na formação do professor”, explica. Outro fator é o controle das faltas por licença saúde. “Os professores que faltarem um dia perderão 30 pontos”, reclama o professor.

Avaliação por mérito e meritocracia

A coordenadora do Programa de Pós Graduação em Educação da Unisinos, Edla Eggert, considera positiva a polêmica, pois abre a possibilidade de que experiência de pesquisa cheguem ao conhecimento do poder público. “Teoria e prática precisam estar afinadas. Isso contribui com os governos para evitarem a lógica do ‘apagar incêndios’, já que os pesquisadores tem acúmulo”, defende.
Para a pesquisadora, a metodologia de avaliação do ensino deve respeitar a realidade de cada lugar. “Não adianta ver números para avaliar um processo que tem todo um caminho para a garantia da aprendizagem dos alunos. O produto final é apenas um dos aspectos para se aferir o ensino. Com elementos apenas quantitativos isso é ignorado. O simples olhar da régua é comprometedor”, alerta.
A professora lembra que avaliação não é algo novo e existem diversas experiências, como as realizadas pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), a instância máxima para avaliação da pesquisa cientifica no Brasil. “A avaliação feita por eles é muito consistente e o professor só recebe bolsa se tiver um projeto e defendê-lo. Então, já temos instrumentos de avaliação por mérito no Brasil. Não é algo novo”.
“Não podemos temer a avaliação que farão da gente. Temos uma cultura punitiva que vem da nossa tradição no Brasil, mas nem tudo que vem de cima é ruim. Temos que ter cuidado e se articular melhor”, diz a pesquisadora.
Edla Eggert  disse ainda que o Plano Nacional de Educação, em discussão no Congresso Nacional, prevê aspectos que vão ao encontro de melhorias da avaliação do ensino. “Apesar das emendas que foram acrescentadas e que não contemplam os professores, é uma importante bandeira para implementar as modificações e qualificações que os Estados também desejam”, afirma.

Colaborou Felipe Prestes.

Dilma mantém o "namorico" com a mídia

 André Barrocal, no sítio Carta Maior: via Blog do Miro

A presidenta Dilma Roussef concedeu, sexta-feira (22/07), entrevista a cinco grandes jornais brasileiros e deu recados importantes em política e economia. Disse que as trocas em cargos da área dos Transportes vão continuar e atingir quem for preciso. E que o crescimento não será sacrificado pela meta de inflação. Foram mensagens duras, dirigidas aos partidos e ao “mercado”.



Se tem endurecido com o Congresso e as finanças, que os veículos de comunicação presentes à conversa acham que tiveram boa vida no governo Lula, sobretudo no caso da classe política, Dilma tem procurado distensionar a relação com a grande imprensa, como mostra a própria entrevista.

Desde que assumiu, a presidenta faz gestos impensáveis para o antecessor, que dizia, sentindo-se orgulhoso, nunca ter tomado café, almoçado ou jantado com donos ou chefes dos grandes veículos em oito anos. Dilma tem recebido editores e colunistas no Palácio do Planalto e até na intimidade de sua residência oficial, o Palácio da Alvorada, para conversas informais, não apenas entrevistas.

Esteve na comemoração de 90 anos do jornal Folha de S. Paulo. Foi à sede da TV Globo participar de entrevista ao programa Ana Maria Braga e de almoço com dirigentes da emissora e membros da família Marinho. Agendara presença em evento do grupo O Estado de S. Paulo, no qual a agência do jornal entregaria prêmio a empresas. Na última hora, porém, antecipou viagem ao Paraguai, onde haveria reunião do Mercosul, e mandou o vice, Michel Temer, no lugar.

Nas palavras de um auxiliar, Dilma tenta estabelecer uma “relação mais madura” com a grande imprensa. E tem conseguido receber um tratamento mais respeitoso do que o antecessor. Segundo um repórter da sucursal brasiliense de um grande jornal, a presidenta inspira em seus chefes uma identificação que Lula não produzia, pois veio da classe média e gosta de ler, por exemplo. Contra ela, não há preconceito de classe.

Enquanto Dilma reformula a relação da Presidência com a grande imprensa, Lula briga. Em junho, ao participar do segundo encontro nacional de blogueiros progressistas, o ex-presidente acusou a grande imprensa de ser adepta do “pensamento único” e produzir “mentiras, má-fé e difamações” contra ele e seu governo.

Nos últimos dias, em discurso no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), atacou de novo. Disse que está “invocado” porque a imprensa não larga do pé dele e deu sua explicação para a má-vontade: “É que eu competia com o que eles falavam, e o povo acreditava em mim.”

Falta 'competição'

“Competir” com a imprensa foi a principal estratégia de comunicação do ex-presidente depois da guerra que enfrentara em 2005 e 2006 contra um noticiário carregado de “mensalão”. Em oito anos, Lula deu mil entrevistas, nas contas da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, sendo que quase 80% delas foram de 2007 em diante. No segundo mandato, ele falou com a imprensa dia sim, dia não, sempre “competindo” com o noticiário.

A frequência de entrevistas de Dilma assemelha-se ao Lula do primeiro mandato, mais ou menos uma por semana. Ao receber cinco jornais no Planalto sexta-feira (22/07), a presidenta totalizou 24 entrevistas no ano. Para um ministro, não é correto comparar o comportamento de Dilma com o Lula do segundo mandato. O certo seria a comparação com a primeira gestão, quando o ex-presidente também ainda estava se acostumando ao cargo, o que igualmente acontece com Dilma.

Como “compete” menos com o noticiário, Dilma produz uma certa angústia na Esplanada dos Ministérios em pessoas que gostariam de contar à sociedade o que estão fazendo e defender o governo. “O Lula dava a linha de todo o governo. A presidenta faz pouco isso e não deixa a gente fazer”, diz um secretário ministerial.

O símbolo do perigo que é expor-se no governo Dilma foi a demissão, logo em janeiro, do secretário Nacional de Justiça do ministério da Justiça Pedro Abramovay. Ele tinha dado uma entrevista opinando que pequenos traficantes de drogas não deveriam ser presos. Advogado que passara por cargos no governo Lula, Abramovay comportara-se como estava acostumado: falar e defender posições para abrir um debate no governo. Dilma ficou irritada, porque não gosta de ver expostos publicamente temas sobre os quais o governo ainda não tomou um decisão.

Demitido, Abramovay foi colaborar com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que tem defendido a descriminalização da maconha, na criação de uma página na internet de debates, chamado Observador Político, inaugurado na última sexta-feira (22/07).

A saída dele foi pedagógica sobre a postura presidencial. Técnicos, secretários e até ministros têm medo de entrevistas, inclusive sem se identificar - em off, no jargão jornalístico. Ainda mais com uma presidenta que dá bastante atenção ao que é publicado, especialmente em jornais, tipo de mídia mais afeita a bastidores.

Dilma faz questão de ler minunciosamente, inclusive nos finais de semana, uma síntese das notícias mais importantes preparada por assessores - Lula recebia o mesmo resumo, mas preferia se guiar mais pelo relato verbal dos auxiliares. Quando encontra algo sobre o intestino do governo, irrita-se. Se a informação é “em off”, costuma pedir uma caça às bruxas, para saber quem foi. “Os vazadores oficiais estão na muda”, diz um assessor de um ministério.

É uma diferença de estilo importante. Com Lula, o governo, que já era heterogêneo e composto de forças políticas variadas, via setores diferentes usando a comunicação para influenciar a decisão final do presidente. Com Dilma, não. Até que ela decida, falar é um grande risco.