quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Brasil: de devedor a credor...

“Nunca antes neste país”: o empréstimo brasileiro ao FMI

Editorial do sitio www.vermelho.org.br
 
O bordão do presidente Lula para descrever inúmeras realizações de seu governo - “nunca antes neste país” – talvez seja o mais apropriado para descrever a situação absolutamente nova, e altamente simbólica, das mudanças ocorridas nos últimos anos, e que tornaram o Brasil credor do FMI.

Durante décadas o FMI foi a praga que travou o desenvolvimento nacional com suas restrições intransigentes ao investimento. O crescimento do país nunca foi o foco da atuação do Fundo que, ao contrário, sempre foi a principal agência de articulação dos interesses do capital financeiro mundial, dos interesses do imperialismo.

Em todas as crises anteriores, desde as décadas de 1950 e 1960, suas imposições visavam à garantia desses interesses, e nunca ao fortalecimento da economia brasileira. Na crise de 1998, por exemplo, o FMI fez um acordo lesivo aos interesses brasileiros, aceito pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, e “emprestou” 40 bilhões de dólares para nosso país, dinheiro que nunca veio para cá mas ficou depositado no exterior como garantia justamente de pagamento da dívida brasileira com bancos estrangeiros, principalmente estadunidenses.

Esta situação mudou e, como “nunca antes na história”, hoje o Brasil está do outro lado do balcão. O presidente Lula já havia anunciado isso, e ontem (dia 5) o ministro da Fazenda, Guido Mantega confirmou, na reunião do FMI que ocorre na Turquia: o Brasil vai comprar US$ 10 bilhões em bônus do Fundo.

O país deixa a tradicional posição subalterna e dependente naquele organismo, e sua voz é fortalecida, reflexo do prestígio que vem alcançando pelo mundo afora, e que resulta da nova postura soberana e de defesa dos interesses nacionais.

Em vez de pagar juros – como ocorria antes de 2005, quando deixou de renovar aquele acordo lesivo feito por Fernando Henrique Cardoso em 1998 – agora o Brasil passa a receber juros.

Além de seu simbolismo, essa mudança reforça e reafirma a posição autônoma do país e a retomada do controle nacional sobre nossa economia, podendo soberanamente ignorar as recomendações de medidas econômicas feitas pelo FMI.

No passado, não eram recomendações, mas ordens. Nas décadas recentes, desde 1982, as missões do Fundo que vinham ao país humilhavam a soberania nacional e agiam como autoridades coloniais impondo determinações. Quem não se lembra do apagão elétrico de 2001, que resultou da falta de investimentos para a produção de energia elétrica? Naquela ocasião ficou exposta a situação vexatória de nosso país que, para fazer investimentos essenciais para o funcionamento normal da economia, precisava de autorização do Fundo pois os investimentos do governo eram contabilizados como “despesa” que comprometiam o superávit primário exigido como garantia do pagamento dos juros da dívida.

Mesmo tendo dinheiro para investir, o governo não podia fazê-lo pois isso comprometia aquilo que é o essencial para o Fundo: o pagamento dos juros. O FMI simplesmente não autorizava investimentos e o governo neoliberal de FHC se submetia às determinações desse poder estrangeiro.

Isso mudou, sinalizando a reafirmação da soberania nacional. É um acontecimento histórico que precisa ser comemorado, e lembrado pelos brasileiros na hora de comparar os desempenhos do governo atual com o comportamento subalterno dos governos neoliberais.

O dolar despenca....

A anunciada queda do dólar

por Mike Whitney [*]
Cotação do ouro na terça-feira. Robert Fisk disparou o detonador com o seu super-debatido artigo publicado terça-feira 6 no Independent britânico, o qual difundiu-se do dia para a noite por todos os cantos da Internet e disparou o preço do ouro para US$1.026 por onça. Agora todo sítio web do juízo final no ciberespaço põe em manchete a "história chocante" de Fisk e os blogs estão atulhados com comentários frenéticos daqueles que querem sobreviver abrigando-se em bunkers e de compradores ansiosos por ouro certos de que o mundo tal como o conhecemos está prestes a acabar.

Do artigo de Fisk:

"Na mais profunda alteração financeira da história recente do Médio Oriente, árabes do Golfo estão a planear – juntamente com a China, a Rússia, o Japão e a França – acabar com negócios de petróleo em troca de dólar, comutando para um cabaz de divisas incluindo o yen japonês, o yuan chinês, o euro, ouro e uma nova divisa unificada planeada para países do Conselho de Cooperação do Golfo, incluindo a Arábia Saudita, o Abu Dhabi, o Kuwait e o Qatar.

"Já foram efectuadas reuniões secretas de ministros das Finanças e governadores de banco central na Rússia, China, Japão e Brasil para tratarem do esquema, o qual significará que o petróleo não será mais apreçado em dólares.

"Os americanos, que estão conscientes das reuniões efectuadas – embora não tenham descoberto os pormenores – estão decididos a combater esta cabala internacional o que incluirá aliados até agora leais como o Japão e os árabes do Golfo. Contra o pano de fundo destas reuniões, Sun Bigan, o ex-enviado especial da China para o Médio Oriente, advertiu que há um risco de aprofundar divisões entre a China e os EUA acerca de influência e de petróleo no Médio Oriente. "Querelas bilaterais e choques são inevitáveis", disse ele à Asia and Africa Review. "Não podemos reduzir a vigilância contra a hostilidade no Médio Oriente sobre interesses energéticos e de segurança".

"Cabala internacional?" Por favor, Fisk, você se excedeu.

Os relatos sobre a morte do dólar são grandemente exagerados. O dólar pode cair, mas não entrará em crash. E, no curto prazo, está destinado a fortalecer-se quando o mercado de acções reentrar no campo gravitacional da terra após uma cavalgada de seis meses ano espaço exterior. O relacionamento entre acções em queda um dólar mais forte está bem estabelecido e, quando o mercado se corrige, o dólar saltará mais uma vez. Pode apostar nisso. Então porque todas estas asneiras acerca de homens no Médio Oriente reunidos em "reuniões secretas" a cofiarem as suas barbas enquanto conspiram contra o império?

Não é isto a essência do artigo de Fisk?

Sim, o dólar cairá (finalmente), mas não pela razões que a maior parte das pessoas pensa. É verdade que o salto em despesas deficitárias tem preocupado os possuidores estrangeiros de dólares. Mas eles estão mais preocupados acerca do programa de facilidade quantitativa (quantitative easing, QE) do Fed o qual aumenta a oferta monetária com a compra de títulos apoiados por hipotecas e Títulos do Tesouro (Treasuries). Bernanke está simplesmente a imprimir dinheiro e a despejá-lo no sistema financeiro para impedir o início do rigor mortis. Naturalmente, o Fed têve de quantificar exactamente quanto dinheiro pretende "criar a partir do nada" para aplacar os seus credores. E fez isso. (O programa está programado para finalizar no princípio de 2010). Dito isto, a China e o Japão ainda estão a comprar US Treasuries, o que indica que ainda não "saltaram do navio".

A razão real porque o dólar perderá o seu papel como divisa de reserva do mundo é que os mercados dos EUA, os quais até recentemente proporcionavam até 25 por cento da procura global, estão em declínio agudo. Países dependentes de exportações – como o Japão, China, Alemanha, Coreia do Sul – já viram o desastre inevitável. Os consumidores dos EUA estão enterrados sob uma montanha de dívida, o que significa que a sua profusão de gastos não será retomada tão cedo. No topo disto, o desemprego está em ascensão, a riqueza pessoal está em queda, as poupanças estão a subir e o viés anti-trabalho de Washington assegura que os salários continuarão estagnados no futuro previsível. Portanto, a classe média americana não continuará mais a ser a força condutora por trás do consumo/procura global como antes da crise. Uma vez que os consumidores são menos capazes de comprar novos Toyota Prius ou encherem-se no Walmart com as mais recentes tralhas fabricadas na China, haverá menos incentivo para governos e bancos centrais estrangeiros acumularem as notas verdes ou comerciarem exclusivamente em dólares.

Aqui está um recorte do Globe and Mail citado no Washington's Blog:

"Um relatório do Deptº de Investigação de Investimentos do UBS diz que apesar de ser errado cancelar o dólar como divisa de reserva global, o seu punho de ferro em tal posição durante quase 90 anos está a relaxar. 'A utilização do US dólar como uma divisa de reserva internacional está em declínio", afirmou o economista da UBS Paul Donovan.

"A fatia de mercado do dólar em transacções internacionais é provável que declina ao longo dos próximos meses e anos, mas provavelmente só persistentes erros políticos – ou considerável tensão fiscal – provocará a perda completa do estatuto de divisa de reserva.

"O relatório do UBS sustenta que o deslizamento gradual do US dólar está a ser conduzido não pelos bancos centrais do mundo, mas pelo sector privado, pois companhias individuais abandonam cada vez mais a nota verde como a sua divisa internacional preferida.

"A utilização de reservas do sector privado é mais importante do que as reservas oficiais dos bancos centrais – qualquer coisa como até 20 vezes a importância, dependendo da interpretação", afirmou o sr. Donovan. "Há evidência de que o movimento de afastamento do dólar como divisa de reserva do sector privado tem estado a acelerar-se desde 2000".

Quando a indústria privada se desvia para longe do dólar, os governos, investidores e bancos centrais seguem-na. A suave tirania da dominância do dólar desgastar-se-á e a paridade entre divisas e governos crescerá. Isto criará melhores oportunidades para consensos sobre questões de interesse mútuo. Um só país não será mais capaz de ditar a política internacional.

A chamada "hegemonia do dólar" aumentou grandemente o brutal desequilíbrio de poder no mundo de hoje. Ela colocou a tomada de decisão global nas mãos de um punhado de senhores da guerra em Washington cuja visão estreita nunca se estendeu para além dos interesses materiais deles próprios e dos seus clientes. Quando o dólar enfraquece e a procura do consumidor declina, os Estados Unidos serão forçados a restringir as suas guerras e a ajustar o seu comportamento para conformar-se aos padrões internacionais. Ou isso ou ser banido da paisagem política.

Então, qual é exactamente o aspecto negativo?

O status de super-potência repousa sobre o frágil fundamento do dólar e este começa a estalar. Fisk está certo neste nível, grandes mudanças estão a caminho. Apenas não ainda.



[*] fergiewghitney@msn.com

O original encontra-se em http://www.counterpunch.org/whitney10062009.html

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .