quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Kiko Dinucci e Bando Afromacarrônico - Pastiche Nagô (2008)




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A reação dos donos e a IV Frota norte-americana – militares brasileiros prendem, torturam, estupram e matam no Haiti


Laerte Braga

Um dos principais centros norte-americanos de estudos de estratégias voltadas para a América Latina no Departamento de Estado dos EUA entende que não há necessidade de dar continuidade ao projeto “fábrica de imbecis”. Já atingiram a um patamar que basta manter. Vai ser o suficiente para manter também o controle da região.



“Fábrica de imbecis” é veiculado pela mídia comprada e moldada aos interesses dos principais grupos políticos, econômicos e militares dos EUA, o complexo militar/industrial a que se referiu o ex-presidente Eisenhower (por sinal general). Insere-se no conjunto de políticas daquele país para com países latino-americanos e se espalha por todos os setores de atividades.



A última ação efetiva e concreta dos norte-americanos foi um seminário para estudar formas de influenciar na reforma política anunciada pelo presidente Lula. Querem evitar surpresas como as que aconteceram na Venezuela, na Bolívia, no Equador e no Paraguai.



Veio em seguida à decisão do presidente George Bush de recriar a IV Frota. Atuou na década de 50 e até a metade da década de 60 do século passado, vigiando e assegurando a “democracia”, mesmo que travestida de ditaduras cruéis e sanguinárias como as que dominaram a região até a metade dos anos 80.



Num magnífico trabalho publicado no antigo JORNAL DO BRASIL, Marcos Sá Corrêa mostrou, com base em documentos liberados nos EUA, que a frota estava em águas territoriais brasileiras em 1964 para ajudar os nossos generais golpistas caso houvesse algum imprevisto, permitindo a eles “garantir a democracia” no golpe que prendeu, torturou e matou. Continuam impunes e Jobim, ministro de Lula, já garantiu que vão continuar impunes.



A preocupação agora é garantir que esse arremedo de democracia que temos seja mantido sem maiores atropelos e assim a bandeira do Tio Sam possa tremular em cada general heleno da vida, seja “ministro da defesa” da VALE, ou em cada gilmar mendes, na tarefa de garantir a ação de banqueiros e que tais no processo político brasileiro. Isso em relação ao Brasil.



Na Argentina, por exemplo, contam com a dedicação dos colonos ingleses que ocupam as ilhas Malvinas e lá constroem um aeroporto clandestino para o caso de operações destinadas a manter a tal “democracia”.



Há uma diferença visível a olho nu entre o presidente Chávez da Venezuela e o presidente Lula do Brasil. Chávez foi a Espanha, “fez as pazes” com o rei Juan Carlo, ganhou uma camisa com a inscrição “por que non te calas” e chegando a Caracas anunciou que vai recomprar o banco da Venezuela, privatizado nos idos de 90 do século passado, por governos semelhantes ao de FHV (Fernando Henrique Vende).



Com um detalhe. Quando o banco Santander (espanhol) soube do interesse do governo da Venezuela anunciou que não quer vender o Banco da Venezuela, ao contrário do que havia anunciado e assinado na bolsa de valores de Caracas.



Lula, aqui, pegou o telefone e ligou para Bush. Foi prestar contas do fracasso da chamada Rodada de Doha e dizer ao norte-americano que espera que resultados sejam alcançados na próxima reunião. O ministro Reinold Sthephanie, que criticou a política do presidente através do chanceler Celso Amorim na reunião dos 135 países que participaram da rodada, continua no cargo.



Diferença de atitude. E atitude em se tratando de presidentes de república quer dizer muita coisa.



A IV Frota é uma intervenção direta dos EUA na América do Sul. Uma ação golpista e militar.



A prática de cooptar militares de alta patente em países como o Brasil nos custa essa submissão quase que absoluta aos interesses norte-americanos e agora europeus (EUA e Comunidade Européia agem em comum nos interesses gerais dos dois grupos).



Interesses norte-americanos e europeus dizem respeito a política, economia e isso implica em controle dos movimentos sociais (criminalização). Imbecilização das pessoas através da mídia comprada e controlada (inclusive com participação societária, lei votada no governo FHV).



Pedro Bial já está pronto para o BBB-9.



Transformação do Estado em instituição inerte no processo de mudanças efetivas, em estrutura institucional privatizada, hoje com os pés e as mãos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário.



No caso específico do Brasil não temos o controle da Região Amazônica não é porque reservas indígenas estejam demarcadas, ou para ser demarcadas. É em função de latifundiários associados a grupos estrangeiros, com apoio de militares brasileiros, governos e policiais estaduais e empresas privatizadas como a VALE.



Lula já disse que quer fazer um acordo com os “principais desmatadores” da floresta Amazônica visando “diminuir o desmatamento e criar condições para o desenvolvimento sustentável”. Balela inventada para justificar a internacionalização da área. Não existe isso.



A principal força de defesa dos índios na Amazônia é o CIMI (Conselho Missionário Indígena), que não tem nada a ver com ONGs estrangeiras. O principal fator de dominação é o SIVAM (SISTEMA DE MONITORAMENTO DO ESPAÇO AÉREO AMAZÔNICO), por onde passeiam aviões norte-americanos no esquema do “Plano Colômbia”, denominação que deram ao produto intervenção e controle.



Foi o primeiro grande “negócio” do governo de FHV (Fernando Henrique Vende). Valeu chantagem, demissão de ministro, na esteira do favorecimento à “empresa” dos EUA que opera o sistema e permite que militares brasileiros varram, limpem e façam previsão do tempo no pressuposto da colaboração.



Têm, os norte-americanos, a chancela do comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, um dos conferencistas preferidos do sistema FIESP/DASLU.



O que os norte-americanos chamam de “fábrica de imbecis” é o que a mídia veicula diariamente no objetivo de transformar seres humanos em robôs e máquinas, dispostos a se deixarem encaçapar nas tacadas que começam em Washington e terminam nas mesas de torneios de sinucas com prêmio superfaturado em lojinhas de achaques do “quero o meu” cá embaixo. Ou nos hotéis que pilantras transformam em sedes enquanto vendem terrenos a cunhados.



É o modelo. O efeito cascata. Do que há quem faça e quem deixe fazer.



O sujeito acredita piamente que quando entra numa loja, ou vai trabalhar numa associação de pilantragem está sendo cidadão, cumprindo seu dever e vivendo a vida como a vida deve ser vida no mundo que se convencionou chamar de real, o mundo do tudo é normal. Tem bom dia, sorriso e dedicação. E por baixo dos panos tem as foto montagens da realidade. Tanto podem ser as armas químicas e biológicas que não existiam no Iraque, quanto a pornografia barata de figuras padrão Pastinha.



O jornal O GLOBO – THE GLOBE –, um dos principais porta-vozes desse modelo no Brasil, noticiou que o engenheiro Steve Norris criou um robô pufe. O robô segue o dono pelo calor que sai do corpo do suposto ser humano e se presta a servir de assento. Os mais espertos já estão colocando pequenas geladeiras no interior do robô pufe. Enquanto estão assentados bebericam.



A idéia do norte-americano surgiu quando percebeu o tédio, diz o jornal, de ficar esperando a mulher fazer compras.



O perigo está em algum especialista recomendar que todos voltemos a andar de quatro como forma de alcançarmos elevação e status e de repente, as ruas fiquem coalhadas de quadrúpedes.



Meu medo é numa situação dessas o Lula telefonar para Bush e pedir uma reunião. E Bush dizer que venezuelanos, bolivianos, equatorianos, paraguaios, cubanos e nicaragüenses não compreendem o espírito da modernidade e por isso precisam refletir e voltar aos “bons tempos”. Insistem em ser bípedes.



O chicote e o pelourinho neste momento têm outra forma. A “fábrica de imbecis”.



O professor universitário e arquiteto haitiano, dirigente da Central Sindical Ovrière, Didier Dominique, está no Brasil. Entregou a OAB (perda de tempo, ainda se imagina os tempos de Raimundo Faoro, já se foram), documentos que comprovam que militares brasileiros prendem, torturam e estupram mulheres haitianas e asseguram os privilégios das elites que sempre se valeram das ditaduras.



Uma das denúncias, dentre as muitas apresentadas diz respeito ao governo Lula (que carrega essa mancha inapagável). "O filho do vice-presidente José Alencar, que é empresário do setor têxtil, esteve no Haiti. Várias marcas, como Levis, Nike, estão disputando a instalação de fábricas numa zona franca, para aproveitar a mão-de-obra mais barata das Américas. Um operário haitiano custa, em média um dólar e setenta e cinco centavos por dia. Penso que a situação de miséria extrema a que o nosso povo está sendo submetido é proposital, para favorecer os interesses das empresas, forçando o trabalhador a aceitar qualquer pagamento".



O que tropas brasileiras garantem no Haiti é isso. Recolonização, negociatas, pilantragem. O general heleno foi comandante lá durante um período. Aliás, não completou o seu tempo por lá, fez besteira demais, teve que ser substituído.



E mais: "A miséria é extrema. Não há luz, a água é escassa, falta comida, não há coleta de lixo. E não vi uma única escola, um único posto de saúde, que tenha sido construído pela missão da ONU. É apenas uma missão militarizada. Afinal, que tipo de solidariedade é essa?"


> Laerte Braga é jornalista. Nascido em Juiz de Fora, trabalhou no Estado de Minas e no Diário Mercantil.

Ilustração: Táia Rocha

Abusos invisíveis

Cristovan Buarque

Nos últimos dias, o sistema judiciário fez duas
descobertas: existem algemas no Brasil e o uso
delas é um abuso, ainda mais grave quando na
frente da televisão.
A descoberta tem uma explicação: as algemas
eram invisíveis enquanto os presos eram pobres e
sem camisas. Descobriram que há abuso no uso
de algemas. Pena que não estejamos descobrindo
outros abusos, porque eles ainda não chegaram
aos ricos.
Durante séculos, nosso país utilizou o seqüestro
de africanos para servirem como trabalhadores
em nossa agricultura e ninguém via como seqüestro.
Se um único brasileiro branco e livre
fosse seqüestrado na África e levado para outro
continente, a elite empresarial brasileira daquele
tempo logo descobriria que havia um abuso na
retirada de uma pessoa de sua casa para levá-la
e vendê-la para o trabalho forçado. Esses mesmos
escravos eram sujeitos à tortura, às penas de
trabalho forçado, e à venda de seus filhos, como
também às chibatadas. Mas era com os pobres,
excluídos, que o abuso ficava invisível. Não era
visto. O sistema judiciário daquele tempo ainda
não tinha descoberto que isso acontecia.
No século 21 ainda existem prisões diferenciadas
para pessoas que cometeram o mesmo tipo
de crime. Quando, raramente, um criminoso rico
vai preso e fica preso, tem direito a uma prisão
especial, diferente das infernais prisões onde são
jogados os criminosos pobres. Por isso, não é visto
ainda como abuso colocar um preso pobre nas
condições das prisões comuns. Se algum dia, um
rico for preso e não tiver um diploma superior,
provavelmente o sistema judiciário brasileiro vai
fazer outra grande descoberta: o abuso da má
qualidade das prisões do brasileiro comum. *Senador
Cerca de 15 milhões de adultos não sabem ler e
outros 30 milhões não entendem o que lêem, porque
os analfabetos, todos eles, são filhos de famílias
humildes. Se um dia aparecesse um rico analfabeto,
certamente o sistema judiciário faria a grande
descoberta de que o poder público é omisso ao
deixar que isto aconteça no Brasil. Mas, os analfabetos
são pobres, invisíveis.
Estima-se que a cada minuto de ano letivo (200
dias, com 4 horas) 60 crianças abandonam a escola.
Isso não é visto como abuso. Porque o abuso
não é visto. Se uma única criança rica fosse impedida
de estudar, o abuso seria rapidamente descoberto
e provavelmente tratado. Como acontece
quando faltam remédios para as doenças que vitimam
os ricos e os pobres, mas sem qualquer
criminalização das autoridades quando os hospitais
públicos ficam superlotados.
As autoridades do Poder Judiciário têm duas
desculpas para explicar a invisibilidade dos abusos.
A primeira, é que só podem agir quando
provocadas por um advogado, e estes só trabalham
para os ricos. O Poder Judiciário, portanto estaria
isento. Não teria culpa de que os defensores
públicos sejam poucos, e de que os advogados mais
competentes não trabalhem para os pobres. Esquecem
de dizer que além da competência, influi também
a rede de conexões que o advogado tem. A
segunda justificativa é que a culpa é do Poder
Legislativo que faz leis imperfeitas.
A culpa é de todos nós que aceitamos um país
onde há dois tipos de pessoas: os incluídos,
beneficiários da lei, e os excluídos, vítimas da lei:
A culpa é de todos que toleramos os abusos invisíveis.