sábado, 26 de março de 2011

Há quarenta anos nascia a esquerda tolerante no Uruguai

Archivo/presidencia.gub.uy

Felipe Prestes no Sul21

No dia 26 de março de 1971, o general Líber Seregni comandou o primeiro ato público da Frente Ampla, em Montevidéu. Três anos antes, Seregni deixara o Exército, recusando-se a compactuar com a escalada repressiva do governo de Jorge Pacheco Areco contra movimentos grevistas. Naquela época o militante do PT Gustavo de Mello, superintendente da Funasa no RS, era uma criança que vivia no Uruguai. Seu pai, integrante do Partido Comunista do Uruguai, foi um dos tantos que ajudou a fundar a Frente que conseguiu reunir socialistas, comunistas, democratas cristãos, dissidentes blancos e colorados, militares, sindicalistas, estudantes. Para Gustavo, o espírito tolerante de um general que se recusa a reprimir grevistas simboliza a Frente Ampla. “A Frente Ampla é indissociável de Líber Seregni, um general que se negava a reprimir grevistas. Era uma espécie de síntese desta concertação política”, diz.
A ideia de busca por convergência, apesar das divergências, era tamanha que conseguiam conviver os comunistas, ainda adeptos dos conceitos da União Soviética, com socialistas, profundamente críticos do modelo político do Leste Europeu. Ao lado deles, conviviam políticos que eram apenas reformistas, contrários à dualidade blancos x colorados da política uruguaia. “A Frente Ampla era um lugar de grande tolerância em um período em que a esquerda se caracterizava por grande intolerância entre si e patrocinava sucessivos rachas em várias partes da América Latina”, afirma Gustavo.
Para o presidente da Assembleia Legislativa gaúcha, deputado Adão Villaverde (PT), a Frente Ampla serviu como um exemplo para as esquerdas em toda a América Latina. “O exemplo de como você se unifica em cima dos acordos principais que você tem, e as coloca acima das divergências”, diz.
General Líber Seregni se recusava a reprimir movimentos sociais (Foto: Divulgaçãoi/Frente Ampla)

Convulsão política

O professor de História da Ufrgs, Enrique Padrós, nascido no Uruguai, conta que a Frente Ampla surge em um período de convulsão política, mesmo que o país vivesse um período democrático. O presidente Jorge Pacheco Areco fora eleito vice-presidente de Oscar Gestido, em 1967. Gestido morreu um ano depois e Areco armou um governo formado essencialmente por estancieiros e grandes empresários. O governo de Areco instaurou um clima autoritário dentro da democracia, utilizando leis de exceção como regra, censurando veículos de imprensa, reprimindo os movimentos sociais.
Ao mesmo tempo em que Areco marchava para o autoritarismo, os Tupamaros surgiam como alternativa da esquerda armada. Por outro lado, a aglutinação de dissidentes dos partidos tradicionais do Uruguai com comunistas, socialistas, movimentos sociais se dá porque estes setores todos viam no poder um inimigo em comum, mas buscavam uma saída democrática – embora houvesse na Frente Ampla também o braço político dos Tupamaros, liderado pelo escritor Mario Benedetti. “A Frente Ampla surge como a esquerda que quer reforçar o campo democrático. Sua tendência majoritária era algo entre o socialismo e a social democracia”, afirma Padrós.
O momento vivido pelo Uruguai era de intenso debate político. Trabalhadores ocupavam fábricas, intelectuais se aglutinavam em semanários de grande audiência, como o “Marcha”. Os frenteamplistas começam a organizar comitês nos bairros populares de Montevidéu. Estudantes protestavam nas ruas, e o movimento armado chegava a contar com a simpatia de setores da população charrua. Neste contexto político, seriam realizadas eleições presidenciais, ainda em 1971, apenas alguns meses depois da fundação da Frente Ampla. A candidatura de Líber Seregni consegue reunir grandes comícios e faz quase 20% dos votos, tendo sua votação concentrada especialmente em Montevidéu. O novo partido consegue eleger um número significativo de senadores e deputados que se tornam os mais combatentes opositores do presidente eleito Juan Maria Bordaberry, do Partido Colorado.
No dia 5 de fevereiro de 1971, reunião institui o partido (Foto: Divulgação/Frente Ampla)

Sobrevivência no exílio

Apesar de o Uruguai já rumar para o autoritarismo desde antes da criação da Frente Ampla, o professor Enrique Padrós acredita que o partido assustou quem estava no poder e “ajudou” a fazer com que o golpe militar ocorresse, em 1973. Àquela altura, a frente já era a maior opositora de Bordaberry, uma vez que o poderio militar dos Tupamaros havia sido debelado ainda no primeiro semestre de 1972. “A força que a Frente Ampla mostrou era um novo fator, que assustava ainda mais. O golpe foi contra as organizações, em especial a Frente Ampla”.
O medo que o partido de esquerda provocou se tornou evidente, porque a ditadura militar tratou de acabar com a agremiação. O Congresso foi fechado; os partidos políticos, extintos.  Líber Seregni e os militares que o apoiavam ficaram presos por quase uma década. Dois dos parlamentares mais expressivos da Frente Ampla acabaram sendo assassinados. Em 20 de maio de 1976, o ex-senador Zelmar Michelini, um dissidente colorado, e o ex-deputado Gutierrez Ruiz, dissidente Blanco, são sequestrados e levados para Buenos Aires, onde são mortos. Até hoje o dia 20 de maio é lembrado ano após ano e conhecido como o “Dia do Silêncio” no Uruguai.
A repressão faz com que a luta pela democracia ocorra no exterior. Primeiro, em Buenos Aires, que se torna a segunda cidade com mais uruguaios no planeta. Com o golpe militar na Argentina, em 1976, a luta se transfere especialmente para a Europa, mas também para Venezuela, México e Estados Unidos. Neste combate, tiveram papel escritores como Eduardo Galeano e músicos como Daniel Viglietti, exilados blancos e frenteamplistas e, até, exilados de Argentina, Chile e Brasil, que se uniam para denunciar as ditaduras do Cone Sul. “O exílio uruguaio foi muito combativo”, conta Padrós.
Os frenteamplistas fazem comitês por cidades, e representações em cada país. O partido consegue, inclusive, realizar grandes encontros fora do Uruguai e age denunciando a ditadura na imprensa internacional e, em organismos de defesa dos Direitos Humanos, faz articulações políticas com exilados blancos, conseguindo, inclusive, influenciar no processo de abertura do país, de 1984 a 1985. “Mesmo sendo derrotada eleitoralmente, mesmo com o golpe militar, a Frente Ampla buscou se reorganizar com as mais variadas formas de resistência. Teve papel estratégico na redemocratização do Uruguai”, diz Adão Villaverde.
Villaverde conta que, em Porto Alegre, quando o Brasil já caminhava de forma “lenta, gradual e segura” para a democracia, ele e outros militantes petistas tiveram intercâmbio com frenteamplistas. “Eu e vários militantes do PT tivemos relação muito estreita com o conjunto de dirigentes que estão hoje à frente da FA. Foi muito importante albergarmos eles em Porto Alegre. Nós os ajudamos a criar condições para eles poderem se rearticular e fazer a resistência democrática, recompor a organização da Frente e voltar depois da anistia no Uruguai para se reestruturar”.

Da liberdade negociada ao poder

Em novembro de 1984, o Uruguai realiza eleições gerais, mas a democracia não está totalmente reinstalada no país cisplatino. Líber Seregni é impedido de concorrer à presidência. A Frente Ampla não volta com a mesma força, mas inicia um processo de crescimento – elege seis senadores e 21 deputados. Em 1989, a Frente Ampla chega à prefeitura de Montevidéu, com Tabaré Vazquez. A experiência na capital do país, segundo cargo político mais importante no Uruguai, foi fundamental para credenciar o partido a chegar à presidência. Em Montevidéu, a Frente Ampla nunca mais deixou o poder. Já são 22 anos comandando a capital uruguaia. “A Frente Ampla ganha credibilidade ao governar Montevidéu”, afirma Gustavo de Mello.
O deputado Adão Villaverde diz que a Frente Ampla na capital inverteu a lógica política de blancos e colorados, priorizando investimentos na periferia da cidade, especialmente em obras de infraestrutura, como habitação. “A frente recuperou uma das coisas mais importantes de Montevidéu: voltou a ser uma cidade alegre. Ao longo do regime militar, ela havia perdido isto”.
Enrique Padrós afirma que as diferenças entre a gestão frenteamplista na capital uruguaia e a dos dois partidos tradicionais foram a ética no exercício do poder e a articulação política nos bairros populares. “Os cidadãos passaram a ser consultadas por seus representantes”. Assim, a Frente Ampla melhorou significativamente o serviço de saúde da cidade, o transporte público e democratizou os espaços públicos.
Em 2004, coube a Tabaré Vazquez o pioneirismo novamente, sendo eleito presidente do Uruguai. No poder máximo do país, a Frente Ampla não fez reformas radicais, mas tratou de avançar na erradicação da pobreza, especialmente no interior do país. Investiu em habitação e nos assentamentos rurais, ampliou o acesso à saúde de qualidade. Avançou também nos Direitos Humanos, conseguindo punir alguns dos militares e civis envolvidos na ditadura militar. O programa de governo que ficou mais famoso, sendo exportado para outros países, foi o “Plan Ceibal”, que visa dar um laptop para cada aluno da escola pública no Uruguai. O plano já está sendo estendido para o ensino superior.
No poder, Frente Ampla tem as mesmas dificuldades que o PT para imprimir mudanças (Foto: Rooswelt Pinheiro/ABr)

Para Enrique Padrós a maior prova de êxito na condução da economia uruguaia é ter cessado, nos últimos dois anos, a fuga de jovens do país em busca de melhores oportunidades no exterior. Em 2010, inclusive, muitos uruguaios retornaram ao país – o governo tem ajudado os que desejam voltar. O professor pondera, contudo, que, em parte, isto também se deve à crise econômica que afeta a Europa, principalmente devido à crise na Espanha, país que costumava receber muitos imigrantes uruguaios.
Padrós afirma que, assim como o PT no Brasil, a Frente Ampla também precisou se aproximar do centro. “Para viabilizar a chegada ao governo, a Frente Ampla foi sinalizando para o centro. Os setores reformistas ganharam espaço. O partido está em sintonia com o Brasil. Faz um governo de muito diálogo, muito reformismo, concessões aos bancos”.
Gustavo de Mello acredita que a Frente Ampla não se aproximou do centro. Ele pondera que as dificuldades de implementar políticas mais arrojadas se devem ao fato de que, assim como no Brasil, a transição democrática uruguaia não se deu com ruptura, mas de forma negociada. A prova para ele, de que a Frente não deu uma guinada para o centro, foi a eleição de José Pepe Mujica, em 2009, para suceder Tabaré. Ex-guerrilheiro tupamaro, Mujica venceu nas prévias do partido o moderado Danilo Astori. “A maior prova de que a Frente Ampla não se aproximou do centro é a derrota de Astori. A frente é representada hoje por uma de suas figuras mais radicais em termos de pensamento. Um homem que não pode ser dito de centro, mas que governa com grande responsabilidade”, afirma.
Para Gustavo de Mello, a consolidação da Frente Ampla no poder já demonstra uma radical mudança no processo político do Uruguai. “Só o fato de que esta tradição (blancos x colorados) está morta prova que o Uruguai abriu novo caminho”, diz. Aos 40 anos, a Frente Ampla pode dizer que um dos grandes objetivos de sua criação está cumprido com louvor: a política tradicional uruguaia, com apenas dois grandes partidos, é coisa do passado.

Entenda o sistema político uruguaio

No Uruguai, partidos como o Colorado, a Frente Ampla e o Nacional (blanco) são, na verdade, federações de agremiações. O sistema político do país platino tem voto em lista para o Parlamento e permite que o mesmo partido lance várias listas. Os partidos também podem lançar quantos candidatos à presidência quiserem. O candidato mais votado do partido mais votado acaba se elegendo presidente (há a possibilidade de segundo turno entre os principais candidatos dos dois partidos mais votados).
Na Frente Ampla, por exemplo, há vários partidos que têm, inclusive, estatutos próprios, mas que se subordinam às decisões maiores da Frente. O Partido Socialista (de Tabaré Vazquez), o Partido Comunista, o Partido Democrata Cristão, a Assembleia Uruguay (de Danilo Astori) são todos como se fossem partidos dentro da Frente Ampla. Hoje, o Partido Socialista é dos segmentos mais importantes da Frente, junto com o Movimiento de Participación Popular, liderado por ex-tupamaros, como o presidente Pepe Mujica. Os tupamaros ingressaram na Frente Ampla em 1989.
Este sistema, por um lado, permite que as correntes partidárias atuem de forma mais livre, mesmo estando em conjunto. Por outro lado, gera contradições nos partidos. Segundo Enrique Padrós, a Frente Ampla sofre algumas contradições, mas tem conseguido mais consensos que colorados e blancos. A Frente nunca lançou vários candidatos à presidência, por exemplo, enquanto os outros dois partidos fazem isto com frequência. Padrós afirma que um grande consenso entre os frenteamplistas é quanto à necessidade de um estado que atua no desenvolvimento econômico. Entre colorados e blancos, segundo ele, é possível encontrar neoliberais e defensores da atuação forte do estado, o que tem causado problemas para estes partidos. Na Frente Ampla ocorre um problema pontual atualmente. O partido decidiu que todos seus senadores devem votar pelo fim da Ley de Caducidad (a anistia aos militares no Uruguai). Três senadores frenteamplistas, no entanto, ainda se recusam a fazê-lo.

O poder da imprensa e os abusos do poder



Por Bernardo Kucinski no Obsevatório da Imprensa
Prefácio de Regulação das comunicações – História, poder e direitos, de Venício A. de Lima, Editora Paulus, São Paulo, 2011; intertítulos do OI
Todos sabemos que a imprensa pode destruir reputações, derrubar ministros e às vezes um governo inteiro. Foi uma campanha de imprensa, liderada por um grande jornalista, Carlos Lacerda, que levou Getúlio ao suicídio em 1954. Vinte anos depois, nos Estados Unidos, o presidente Richard Nixon renunciou por causa de denúncias da imprensa.
Nos dois episódios, o poder havia recorrido a métodos criminosos para eliminar ou intimidar oponentes políticos. Ao revelarem esses abusos, derrubando a parede de segredo que os protegia, jornalistas exerceram uma das funções sociais que legitimam a imprensa como ator importante numa democracia.
Mas no Chile, em 1973, a grande imprensa contribuiu não para aprimorar a democracia ou denunciar abusos do poder, ao contrário, para derrubar o governo democraticamente eleito de Salvador Allende, abrindo caminho para a uma das mais abomináveis chacinas políticas da nossa história, sob a ditadura de Pinochet.
Esses três episódios comprovam o imenso poder da mídia tanto de fazer o bem – sob a ótica do aperfeiçoamento democrático – quanto de fazer o mal. E apontam para a questão crucial, objeto dos ensaios que compõem esta obra definitiva do professor Venício Lima: como regular o mercado da comunicação de massa numa sociedade em que a informação é uma mercadoria apropriada por empresas privadas portadoras de interesses políticos, de modo a preservar o potencial democrático da mídia e ao mesmo tempo impedir abusos de poder da própria mídia?
Critérios democráticos Essa questão é ainda mais crucial em sociedades de cultura autoritária, como as latino-americanas, nas quais predomina um cenário de polarização da renda e concentração da propriedade e do poder econômico, inclusive o dos conglomerados da indústria da comunicação.
É um cenário propício à instrumentação da mídia nas disputas de poder. Basta lembrar como se deu a eleição do primeiro presidente civil, ao fim do regime militar. Inventado do nada, endeusado pela revista Veja como condutor de uma luta implacável contra a corrupção e com o apoio da Rede Globo, que falseou o debate final decisivo da campanha, Fernando Collor tornou-se o primeiro presidente eleito, após os 25 anos de ditadura.
Depois, a mesma mídia que inventara sua candidatura conduziu a campanha que levou ao seu impeachment. Mas o resultado duradouro e nefasto do episódio não foi a autocrítica. Ao contrário, foi a percepção pelos principais grupos de mídia de massa do país de seu poder de eleger ou derrubar presidentes. Desde então, nossa mídia de massa não se limita a reportar a nossa história – quer determinar os rumos de nossa história.
Nas democracias mais avançadas, ou sociedades de cultura menos autoritária, abusos e instrumentação da mídia são dirigidos principalmente para fora, para objetivos de dominação mundial. O ataque americano ao Iraque em 1991 foi precedido por uma operação de mídia que iludiu a opinião pública com a falsa noção dos bombardeios cirúrgicos, que atingiriam instalações com precisão milimétrica, sem matar ninguém. No segundo ataque ao Iraque, esse seguido da invasão e ocupação, dezenas de jornalistas foram "embutidos" nos diferentes batalhões, disseminando a cada dia uma nova falsa informação de que haviam sido encontrados indícios dos meios de destruição de massa – o pretexto da invasão.
Nas grandes democracias representativas, as democracias de massa, como Brasil, Estados Unidos e Índia, a mídia substituiu as praças públicas como o espaço em que se dá a disputa pelo voto. Obviamente, se o grosso dessa mídia se alinha a uma determinada corrente política, gera-se um desequilíbrio fundamental na disputa democrática. Como garantir ao mesmo tempo a mais ampla liberdade de alinhamento político dos meios de comunicação, e impedir esse desequilíbrio?
A resposta, de novo, está numa regulação de mercado formatada por critérios republicanos e democráticos. Daí a importância desta obra do professor Venício Lima, em especial as referências às experiências de regulação em outros países.
Unidade de propósitos Estudos empíricos feitos em sua maioria nos Estados Unidos sugerem que os meios tradicionais de comunicação de massa conseguem determinar que temas serão objeto do debate público e que temas serão omitidos. No debate da regulação, vive-se no Brasil um paradoxo nefasto: os meios de comunicação de massa procuram excluir o debate da própria regulação, rotulando-o de ameaça à liberdade de imprensa. Assim, excluíram do debate público as propostas, apresentadas democraticamente pelo governo, de criação de um Conselho Federal de Jornalistas e a de criação de um novo sistema de estimulo ao audiovisual.
É na determinação da agenda pública de debates, de resultados seguros e duradouros, em especial na nomenclatura e forma de abordagem desses temas, que os grupos de interesses mais poderosos, como os bancos, por exemplo, concentram hoje seus esforços midiáticos.
Outro exemplo notável é a visibilidade dada às ocupações de terra do MST, retratando-o como organização violenta, nunca se referindo à Universidade dos Sem Terra, em Guararema (SP) ou às suas escolas primárias ou à escandalosa concentração da propriedade da terra no Brasil.
No plano internacional um bom exemplo de determinação da agenda é a insistência da mídia mundial em classificar certos países como "irresponsáveis", em cujas mãos nunca deveria estar a bomba atômica, quando o único país que ousou despejar bombas atômicas em cima de populações civis foram os Estados Unidos, e sem uma justificativa plausível, se é que poderia haver alguma.
Esses exemplos sugerem que ao agendar o que é discutido e o que é omitido, em especial a forma e a linguagem das discussões, os grandes jornais e redes de televisão, cada vez mais interligados e homogêneos, criam o ambiente em que se forma nossa visão de mundo.
Além disso, as simplificações inerentes à linguagem jornalística geram falsos consensos ou um senso comum simplificado ou grosseiro. Em alguns casos-limite, invertem sentidos e escamoteiam a realidade.
Os grandes jornais são também instituições da sociedade civil. A maioria deles foi criada em momentos cruciais da luta política em seus respectivos países. O Estado de S.Paulo, principal jornal brasileiro, foi lançado em 1875 manifestamente para defender a instauração de um regime republicano. O Le Monde nasceu da luta contra a ocupação alemã. O último desses grandes jornais, o espanhol El País, foi criado pela burguesia espanhola como parte do projeto de enterrar o vergonhoso passado do franquismo e levar a Espanha à União Europeia.
No Brasil, os três grandes jornais de referência nacional – Estadão, Folha de S.Paulo e O Globo, e mais alguns importantes diários regionais como o Correio Braziliense e o Zero Hora, de Porto Alegre, e ainda a revista Veja e os canais de televisão e rádio do grupo Globo – formam hoje um compacto político-ideológico em defesa dos fundamentos do modelo econômico chamado neoliberal: privatizações, terceirizações, flexibilização das leis trabalhistas e desrregulação do movimento de capitais. Também combatem em uníssono as principais políticas públicas do governo, como o Bolsa Família, o Plano Nacional de Direitos Humanos, as cotas nas universidades e a política externa. Tornaram-se assim substitutos de um grande partido político conservador e protagonistas centrais na cena político-eleitoral.
Não por coincidência essa unidade ideológica e de propósitos começou a tomar corpo com a fim da ditadura militar. É como se a grande mídia oligárquica tivesse assumido funções de controle social por meios ideológicos, em substituição ao exaurido controle social coercitivo.
Conceito de mercadoria Felizmente, já se foram os tempos em que os grandes jornais combinavam de modo tão explosivo o poder econômico com o poder político que se autodenominavam "o quarto poder." O advento da internet como principal meio hoje de comunicação – tanto interpessoal, como intergrupal e de massa – destruiu o monopólio da fala detido pelos jornais, pelos jornalistas, e pela indústria capital intensiva da comunicação.
Hoje os três grandes jornais de referência nacional não chegam a vender, somados, 900 mil exemplares. No período de duas décadas em que nossa população cresceu uns 25%, esses jornais perderam 25% de leitores.
A internet nasceu com vocação libertária, tornando-se o meio principal de comunicação livre e barata entre as pessoas organizações e movimentos sociais. Além de ferramenta poderosa de pesquisa, registro, processamento e guarda do conhecimento, é ao mesmo tempo uma nova mídia, um novo meio de transmissão, de articulação e de mobilização.
Pela primeira vez, com as novas tecnologias, baratas e livres do controle do grande capital, qualquer ser humano razoavelmente inserido num meio social pode materializar o direito de informar como distinto do direito de ser informado.
A mediação exclusiva dos meios de comunicação foi substituída pela interatividade, pela capacidade de cada leitor modificar, questionar, desconstruir os conteúdos jornalísticos no momento mesmo de sua emissão. Trata-se de todo um novo processo de elaboração coletiva do discurso midiático, um processo tão rico e sedutor, que está cativando até mesmo os jornalistas, cada vez mais dedicados aos seus blogs e twitters do que às suas colunas opinativas nos grandes jornais.
Essa revolução da comunicação está ainda no seu início. Uma de suas conseqüências é o declínio acelerado dos grandes jornais como indústria capital intensiva, que se utiliza de rotativas gigantescas, processando volumes imensos de papel.
Embora o hábito de ler diários seja arraigado, a lógica de produzi-los já morreu. Não tem mais sentido econômico plantar uma floresta inteira de eucaliptos, produzir toneladas de polpa e depois bobinas imensas de papel jornal, transportá-las a grande distância, levá-las até uma rotativa central, imprimir meio milhão de exemplares de jornais e depois distribuí-los em caminhões por vastas distâncias, para nos trazer de manhã uma notícia que já está velha, que já foi superada pelo noticiário online da internet.
Esse "modelo de negócios", como se diz na linguagem neoliberal, está superado. E a indústria dos grandes jornais ainda não conseguiu encontrar uma saída. Os grandes jornais continuam sendo a principal fonte produtora das informações, inclusive as veiculadas pela internet, e todos eles têm hoje uma versão digital, mas não sabem como cobrar por essa leitura e perdem publicidade e leitores pagos na versão tradicional impressa.
O meio internet é infenso ao lucro e ao conceito de mercadoria, fundamental no capitalismo. Na internet é possível "consumir" a matéria jornalística ou de entretenimento sem que com isso ela acabe. Ao contrário, ao mesmo tempo que é consumida, pode ser multiplicada, ao ser reenviada, com um simples comando, a inúmeros outros destinos.
Interesses antagônicos A maioria dos grandes jornais já reduziu suas redações à metade. Alguns já deixaram de circular e outros seguem o mesmo caminho. Embora mais lentamente, a revolução tecnologia está erodindo a indústria dos jornais da mesma forma como erodiu a indústria dos CDs.
Isso não significa que os jornais impressos deixarão de existir. Tanto jornais quanto revistas existirão para sempre, nas mais diversas formas. Mas não mais como uma poderosa indústria que comandava ao mesmo tempo lucros e poder político.
A revolução digital retirou dos jornais sua principal função, a noticiosa. Daí a exacerbação hoje da função ideológica que os marcou na era das revoluções republicanas, antes que a invenção das grandes rotativas fizesse deles também uma indústria de alto retorno.
Mas, sem poder econômico, os grandes jornais tendem a perder poder político. Na França já há subsídio estatal a alguns grandes jornais. As tevês, em ritmo mais lento, perdem poder pela força da fragmentação do meio e do rápido avanço da informação digital em outras plataformas, inclusive no celular.
O símbolo maior da nova era da comunicação é o celular, com o qual cada ser humano pode se comunicar com todos os demais, informar e ser informado. Vivemos hoje uma situação em que a comunicação como um todo assumiu estatuto antropológico nas nossas vidas, constituindo-se no ambiente no qual se formam as novas gerações, desde a infância.
Não há mais distinção nítida entre comunicação pública e privada, entre jornalistas e não jornalistas. O próprio jornalismo como um campo constituído de relações definidas, papéis pré-atribuídos, uma ética própria, foi destruído pela internet e ainda não sabe como se recompor.
O vazio jurídico provocado pelo advento da internet é imenso. Nos principais países, inclusive no Brasil, discutem-se novos marcos legais para a comunicação. Como preservar o direito autoral, se a cópia é tecnicamente acessível a todos e barata? Como preservar o direito à auto-imagem se uma matéria difamatória, mesmo se posteriormente corrigida, fica registrada para sempre nos arquivos digitais da internet? Deve haver direito de resposta na internet? Qualquer um tem o direito de enviar uma mensagem a outra pessoa? Com se define um atentado ao pudor pela internet? Como tipificar crimes de imprensa pela internet, se ela é ao mesmo tempo comunicação pública e privada? Como preservar a neutralidade da rede, ou seja, o princípio pelo qual nenhum acesso pode ser filtrado por interesses particulares?
Entre nós esse vazio jurídico agravou-se depois da extinção da Lei de Imprensa e da obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo pelo Supremo Tribunal Federal. A Lei de Imprensa estabelecia mecanismos específicos para o exercício do direito de resposta, que não afetavam a liberdade de expressão, mas garantiam às pessoas ou instituições injustamente agredidas pela mídia o direito básico à retificação.
Além disso, até hoje não foram regulamentados os artigos da Constituição "cidadã" de 1988, que tentam colocar um pouco de ordem na casa. Ou acabar com ilegalidades flagrantes como é a posse direta ou disfarçada de concessões de rádio e televisão por políticos com mandato.
A regulação é em si mesmo um campo de disputa entre forças de interesses antagônicos. Daí o paradoxo de termos uma Constituição "cidadã", na esfera do direito à informação, mas uma realidade de mercado autoritária e, a rigor, prosperando na ilegalidade. A Constituinte refletia uma correlação de forças efêmera.
Linha de frente Os proprietários da grande mídia identificam liberdade de expressão, um dos direitos humanos fundamentais, com liberdade da indústria de comunicação, que é um direito empresarial. Como se as empresas fossem as detentoras exclusivas do direito de expressão. Ou, em outras palavras, como se o direito de expressão só pudesse ser exercido na forma de uma mercadoria.
A liberdade de expressão tem como limites ou pontos de atrito o direito à auto-imagem e à privacidade, assim como a presunção da inocência. São conflitos delicados, em parte objeto de leis especificas de imprensa e em parte objeto de códigos de ética ou leis ordinárias. O espírito dessas leis em geral é o de não intimidar o jornalista ou o meio de comunicação a tal ponto que ele sinta inibição no seu trabalho, porque se reconhece o peso especial de uma imprensa livre na constituição da democracia. Mas, ao mesmo tempo, assegurar a imediata reparação de eventuais erros cometidos. Daí o direito de resposta.
O direito empresarial tem seus limites na formação de cartéis, oligopólios e monopólios – considerados crimes contra a livre concorrência. É nesse âmbito, principalmente, que incide a regulação nos países mais ricos, como mostra o professor Venício Lima neste livro. Além disso, a mercadoria comunicação tem dimensões próprias que exigem regulamentação específica, assim como a mercadoria medicamento tem regulamentação própria. Medicamento mexe com saúde. Tem faixa vermelha, tem faixa preta. Tem restrição de propaganda. Comunicação mexe com cultura, com educação, com interesse social e nacional. Com erotismo, com pornografia. Tem restrição de horário, faixa etária. Linguagem.
E há também que distinguir os meios oriundos de concessão pública, a partir de um espectro de freqüências necessariamente limitado, como rádio e tevê. Essas concessões devem ser regidas pelos princípios republicanos do serviço público e neutralidade política – além de critérios de regionalização, diversificação editorial, desconcentração do mercado e outras políticas públicas.
No nosso caso, predomina a desordem nas três esferas – na do direito de expressão em si, na do direito comercial e na das políticas públicas para a concessão de freqüências de rádio e tevê. Vivemos hoje no Brasil à mercê de uma grande mídia sofisticada e avançada em termos técnicos e estéticos, mas excessivamente concentrada, atrasada em relação aos direitos básicos da pessoa; que prospera na ilegalidade constitucional e ao mesmo tempo se insurge por antecipação à qualquer tentativa de regulação.
As empresas não querem que se legisle sobre das três esferas. É como se quisessem estender à indústria da comunicação todas as benesses da desrregulação neoliberal que a banca internacional conseguiu para o capital financeiro.
A batalha da regulação do mercado de comunicação no Brasil está hoje na linha de frente da luta pelo aperfeiçoamento democrático. Esta obra do professor Venício Lima é referência obrigatória nesse debate, que a despeito da resistência dos grandes meios de comunicação está destinado a ser um dos temas centrais da agenda pública deste início de um novo século.

EUA destinam US$ 30 milhões para projetos de liberdade de internet contra Cuba

Thaís Romanelli no operamundi
O Departamento de Estado dos EUA planeja destinar até 30 milhões de dólares para projetos na internet que façam apologia à liberdade de expressão em Cuba e outras nações. Em um anúncio oficial datado de 11 de janeiro, foram solicitadas ideias de organizações e pessoas físicas interessadas em desenvolver projetos para desestabilizar a política da ilha. O governo cubano criticou a iniciativa.

O objetivo, segundo o texto, "é reforçar o apoio aos ativistas digitais e as organizações da sociedade civil no exercício de seus direitos de liberdade de expressão e do livre fluxo de informação".

Os nomes das entidades que desenvolverão os projetos, porém, não foram divulgados após o dia 7 de fevereiro, data limite para as inscrições. Foi divulgado apenas que organizações sem fins lucrativos, universidades e centros de pesquisa da Ásia, incluindo China, Oriente Médio, Irã, África e América Latina, incluindo Cuba e Venezuela (opositoras ao regime norte-americano), são elegíveis para participar do projeto. A única exigência é que as organizações tenham experiência em trabalhos relacionados a internet.

Os financiamentos para os projetos vão de meio milhão a oito milhões de dólares, quantia que, segundo o site norte-americano Cuba Money Project (http://cubamoneyproject.org), é proveniente do orçamento federal de 2010, e não de 2011.

A ideia é que os candidatos realizem trabalhos sobre o uso da tecnologia "contra a censura", abordando temas como comunicações móveis, segurança digital e aumento da capacidade de ativistas digitais, possibilitando a criação de centros virtuais abertos e fundos de emergências.

Projetos que coloquem em pauta políticas públicas de internet, como a modificação de leis de meios ou novas regulações pela internet, também são vistos pelos EUA como estratégias para driblar as restrições governamentais de Cuba.

Os programas devem facilitar a criação de redes de apoio à sociedade de forma que os centros virtuais sejam criados em países seguindo a linha cultural da região. O objetivo é identificar e arquivar conteúdos vetados por governos e reintroduzi-los na internet por meio de ferramentas em desenvolvimento. Já o fundo de emergência financiaria internautas sob ameaça por ativismo na internet, cobrindo gastos com questões legais ou de manutenção da rede em caso de ataques de hackers.

Em resposta, o governo cubano condenou a proposta norte-americana e a considerou como uma forma de intervenção internacional em questões internas do país. Para o Ministério de Relações Exteriores cubano, o objetivo dos EUA é aumentar seu controle e acesso a informações sobre a ilha por meio de dispositivos tecnológicos para "desestabilizar o território nacional".

Em março, a TV cubana transmitiu o documentário "As razões de Cuba" denunciando "planos subversivos" dos EUA com o uso das novas tecnologias da informação e das comunicações. Segundo o vídeo, a ciberguerra aparece no atual cenário como uma nova modalidade de agressão, que "não é de bombas nem balas, mas de informação, comunicações".

O vídeo mostra imagens sobre os vínculos de blogueiros e ativistas cubanos com Washington e acusa os EUA de monitorarem o ciberespaço nacional durante 24 horas por dia.

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Professor, peça de fácil reposição

* Profa. Me. Ana Carolina Martins da Silva no Sul21

Nós nos sobrecarregamos com a discussão político-pedagógica de nosso ambiente de trabalho, com a discussão do mundo, com a salvação das baleias, dos afogados, dos desprotegidos, lutamos pela paz mundial, pelo bom aprendizado e pela construção das mais diversas áreas do conhecimento, por laboratórios, por merenda escolar. Nós nos dedicamos tanto a construir e ajudar aos nossos educandos a se construírem que nem nos lembramos de nós mesmos. A missão é o objeto, nós somos um soldado fundamental do bom combate. Quanta ilusão! Na verdade, o Sistema nos vê como uma peça necessária, mas de fácil reposição.
As negociações desta semana, tanto do CPERS com o Governo do Estado do RS, quanto do SINPRO, com o Sindicato patronal das Escolas Particulares, SINEPE, parecem comprovar o que no fundo sempre desconfiamos, somos importantes, fazemos um papel fundamental, mas de onde saímos, saem muitos, somos descartáveis. Ainda que venhamos a fazer greve, depois temos de pagar em dinheiro pela rebeldia de querer existir; Podemos nos revoltar e tentar abrir os olhos de nossa comunidade, em termos de contexto político, então somos considerados agitadores, inclusive pela própria comunidade na qual estamos inseridos.
É de se pensar o porquê disso. Eu fico com a velha hipótese da luta de classes. O educador é o marisco entre a luta do rochedo e do mar. A maior parte de nós vem de classes abaixo da classe média. Fizemos a graduação em docência por ser aquela “mais em conta”, como se diz. A educação, além de ser a nossa forma de querer salvar o mundo, é a nossa forma possível de subsistência, nosso trabalho. Assim, magistério não é apenas vocação, magistério é profissão. Uma profissão que pode de fato efetuar uma transformação social. Inverter a pirâmide, eliminar a pirâmide, ensinar a pensar. É óbvio que para quem está no topo não é vantagem nos dar condições dignas de vida. É óbvio que precisamos estar sob controle, submissos, em servidão, com medo de sermos demitidos, de termos nossa vida funcional atrasada por anos. O Sistema não gosta de sopa de letrinhas, o Sistema é um glutão que come pessoas.
Quanto a nós, temos de ver o alto status financeiro e social de profissões que não se dedicam a ideais tão fundos com elegância. Não devemos nos comparar com os outros. Comparemo-nos com nossa própria classe… que classe? Quando conseguimos unanimidade em greve? Quando conseguimos unanimidade em ações políticas? Apesar disso, quem consegue pagar o dentista, a modista, a diarista, a casa própria e outros-que-tais com um salário de professor? A classe é desunida ou está em perpétuo susto? Ficamos vendo os Governos economizar em nossos salários, as Escolas Particulares, em geral, ligadas a grandes instituições com estabilidade financeira, destaque social, economizando no salário de seus professores. Não temos como evitar pensar nas palavras escravidão, assédio moral, violência, exclusão porque o Sistema, na verdade, aterroriza. Eu já tive a experiência de não fazer uma greve por medo. Eu tinha voltado ao Magistério Público Estadual, estava no tal estágio probatório e tive medo. Eu sustentava minha família, eu não poderia ficar sem emprego. Conto isso porque não estou escrevendo com alguém que se coloca como superior. Eu tenho medo de não poder sustentar minha família com minha profissão. Saí da iniciativa privada humilhada por uma demissão. Diferenças da Escola com meu método de ensinar. Então, quando se fala em dinheiro, não é só dinheiro moeda, é dinheiro que gastamos em mais uma porção de batata frita, em doce, em paracetamol, em antidepressivo. É o conjunto da obra que ataca o coração do professor que é terrível. Se fosse para falar em desrespeito por parte dos alunos, humilhação perante pais mimados, coação por parte de colegas em posições de mando, desconsideração por projetos e idéias, sinceramente, quem iria querer ser professor?
Nós. Nós queremos ser professores. Nós que somos filiados ao CPERS, filiados ao SINPRO. Nós que delegamos aos nossos Sindicatos essa tarefa árdua de enfrentar essas feras em nosso nome. Nós que não desistimos de mexer na pirâmide. Nós que fazemos a diferença, nós para cujos espaços depois de abertos não existem peças de reposição porque somos únicos, cada um de nós, ímpares em seu universo de luta e pares dentre os seus.
SINEPE/RS (sindicatos do Ensino Privado), escuta! Queremos reajuste salarial com aumento real para a categoria, Já. 28 de março, segunda-feira, Dia do Aumento Real na Escola, manifestações nas instituições de ensino privado de todo o Estado reforçando a reivindicação por aumento real, e mais, limitação do número de alunos por turma (presencial e a distância); calendário escolar 2011 com a indisponibilidade do professor nas duas últimas semanas de julho; destinação de 30% da carga horária para atividades extraclasse; contratação de professores para as atividades extracurriculares.
Companheiro TARSO, o que é isso, companheiro? Aumento real em R$ 38,00 para quem ganha o básico? Essa proposta de reajuste salarial de 10,91% apresentada à direção do Cpers/Sindicato não satisfaz a categoria. Magistério Público Estadual, já! Assembleia Geral, dia 08 de abril e a luta continua!
E para não dizerem que não falei na UERGS, mais professores começam a se evadir de nossa Universidade por falta de condições profissionais compatíveis com suas formações. Precisamos estar sempre alertas em relação ao nosso Plano de Carreira, que ainda não está na pauta principal do Governo do Estado. Precisamos estar vigilantes a respeito de nossos colegas funcionários, cujos vencimentos, em determinados casos, estão abaixo de um salário mínimo. Precisamos socorrer nossos alunos, com sustentabilidade e assistência, como se espera de uma Instituição Pública. ADUERGS e ASSUERGS: Plano de Cargos e Salários e a abertura das vagas para atender o limite de 300 professores e funcionários, Já!
Políticas pedagógicas, paz mundial, construção das mais diversas áreas do conhecimento, missão e bom combate, que fácil reposição, que nada! O Sistema que se cuide, transformação de realidades e resistência é o nosso ramo de negócios.

* Mestre em Comunicação Social, Professora da UERGS

Eduardo Galeano homenageia militantes da água

Ao receber o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Nacional de Cuyo, na Argentina, o escritor uruguaio dedicou o mesmo aos militantes da água “que em Mendoza e muitas outras comunidades do mundo lutam contra as mineradoras que a contaminam, as empresas florestais que a secam e contra todos os que traem a natureza, convertendo a água em um negócio e não um direito de todos”.


O escritor Eduardo Galeano recebeu terça-feira (22) o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Nacional de Cuyo, na Argentina, e dedicou o mesmo aos militantes da água “que em Mendoza e muitas outras comunidades do mundo lutam contra as mineradoras que a contaminam, as empresas florestais que a secam e contra todos os que traem a natureza, convertendo a água em um negócio e não um direito de todos”. “A água é e quer seguir sendo um direito de todos”, disse Galeano.

O ato ocorreu no Salão de Grau da Universidade, cuja transmissão teve que ser exibida em outras duas salas pela grande quantidade de assistentes, a grande maioria deles estudantes, que não economizaram aplausos para celebrar a presença e as palavras do novo doutor.

Em sua exposição, Galeano fez uma referência aos bicentenários que diferentes países da América Latina celebram nestes anos. “A independência segue sendo uma tarefa inconclusa e é necessário memória para completá-la”. Falando sobre a memória, Galeano exaltou o “primeiro país independente e livre da América, o Haiti”. Ainda que os Estados Unidos tenham proclamado sua independência em 1776, “os 645 mil escravos seguiram sendo escravos”. Em troca, em 1804, no Haiti foi proclamada a independência e se libertaram os escravos. Esse fato “resultou imperdoável” para os antigos dominadores que “exigiram ao Haiti o pagamento, durante um século e meio, da dívida francesa e o condenaram, até hoje, à solidão, o desprezo e a miséria”.

Citou o Paraguai como outro exemplo. “Esse país desobediente e sem dívida foi destruído em nome da liberdade de comércio”, em cujo “prontuário” figura “a imposição do ópio na China e a destruição de ateliers na Índia por parte da rainha Vitória, da Inglaterra”. No marco do rio da Prata, evocou as figuras de Mariano Moreno e Juan José Castelli, membros da Primeira Junta, qualificados como “muito perversos” por aqueles que “sequestraram a Revolução” e defenestrados do processo.

Galeano também fez uma menção especial ao educador venezuelano Simón Rodríguez “El Loco”, a quem definiu como “o mais audaz e adorável dos pensadores latino-americanos”, apesar de ser “um perdedor” devido às perseguições que sofreu, mas não por isso menos importante, porque “na memória dos perdedores, ali está a verdade”. Ele lembrou algumas das iniciativas “proibidíssimas” do professor de Simón Bolívar – no contexto da década de 1820 – como seu princípio de que “sem educação popular não haverá verdadeira sociedade”, ou sua audácia de “mesclar rapazes e moças na escola e o ensino de artes manuais com as tarefas intelectuais”.

Recordou a famosa frase de Rodríguez: “Imitadores! Copiem dos Estados Unidos e da Europa sua originalidade” – e se perguntou: “Por acaso não está vivo esse “Loco” nas ânsias e ações de independência de nossos povos”.

O escritor finalizou sua exposição com a evocação do uruguaio José Artigas, “a voz mais profunda destas terras” e “primeiro a realizar uma reforma agrária na América”. Recordou com ironia que os chefes da última ditadura militar do Uruguai, ao erigir um mausoléu em honra a Artigas, buscaram em vão alguma citação dele para colocar no monumento. “Não conseguiram, porque todas as suas frases eram subversivas, Então só registraram datas de batalhas. “Artigas também é um perdedor profundamente ativo”, finalizou.

Fonte: http://www.uncu.edu.ar/novedad/item/eduardo-galeano-palabra-y-memoria-de-america-latina

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Escola carente está entre as de melhor desempenho do país


  Redação, com MEC - de Brasília 



Em 2005, a nota do índice de desenvolvimento da educação básica (Ideb) da escola estadual Dom Bosco, em Eirunepé, sudeste do Amazonas, era de 2,7, numa escala que vai de zero a dez. Quatro anos mais tarde, em 2009, a nota foi de 8,7. O aumento, de 322 pontos percentuais, é o maior registrado em todo o país. A escola atende a 340 estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental e lida com crianças em situação de risco social. Mais de 70% dos estudantes vêm de famílias que recebem Bolsa Escola.
A diretora Maria de Fátima Libânio da Silva aponta duas estratégias como as responsáveis pelo salto de qualidade da escola Dom Bosco. A primeira é o projeto Aula de reforço é compromisso de todos. O nome do projeto cai bem. Pais e professores se uniram para superar o principal obstáculo às aulas de reforço: a falta de merenda.
– O Estado manda a merenda para o turno regular, mas como eles viriam estudar no contraturno sem comer? –, questiona Maria de Fátima.
Com recursos dos próprios professores e frutas e verduras produzidas pelos pais dos estudantes, foi possível garantir o lanche.
– Até a saúde deles melhorou, porque muitos só se alimentam na escola mesmo –, relata.
A outra estratégia utilizada pela escola é a Brincando também se aprende, que, mais uma vez, se desenvolve no contraturno. Aulas de amarelinha e atividades lúdicas são utilizadas como forma de estudo. Assim, os professores driblam dificuldades com conteúdos formais como matemática, por exemplo.
– Temos um terreno grande aqui. Eles podem brincar à vontade –, explica.
O empenho dos servidores da escola foi reconhecido dentro e fora do estado. Todos os servidores receberam, do governo do estado, um 14º salário, em dezembro de 2010.
– Foi um prêmio pelo crescimento –, explicou a professora Sueli Pinheiro Neblina, coordenadora regional de educação da secretaria estadual de educação de Eirunepé.
A diretora Maria de Fátima, por sua vez, foi uma das dez educadoras condecoradas com a medalha da Ordem Nacional do Mérito pela presidente Dilma Rousseff, na segunda-feira, em cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília.

Os 35 anos do golpe argentino



Emir Sader na Carta Maior

O golpe militar na Argentina fechou o cerco dos regimes de terror no cone sul latino-americano, que havia sido iniciado com o golpe brasileiro de 1964. Diante do governo nacionalista de Velasco Alvarado no Peru e do socialismo cubano, o Brasil era a expressão mais clara da Doutrina de Segurança Nacional, que combinava “ordem” – quando “desordem” era identificado com grupos guerrilheiros – com expansão econômica – mesmo se concentrada de renda e marginalizadora socialmente.

A atração do modelo brasileiro era potencializado pela ação desestabilizadora dos EUA. Henri Kissinger tinha declarado que eles tinham “que salvar o povo chileno das suas próprias loucuras”, quando Allende recém havia sido eleito. Socialismo era questão de “loucura” e devia ser extirpado como uma infecção, na concepção da Doutrina de Segurança Nacional, para a qual as divergências, os conflitos, eram quistos que tinham que ser extirpados.

Depois do Chile e do Uruguai em 1973, a Argentina – onde o primeiro golpe, de 1966, tinha fracassado – se somou ao circulo de ferro do terror, em 24 de março de 1976 – há 35 anos. Da mesma forma que os outros golpes, com o espantalho de que a democracia estava em perigo, que se tratava de movimentos organizados do exterior, que se dava um golpe para salvar a democracia, mas instalaram brutais ditaduras militares.

Como o campo popular era mais forte que no Brasil, a repressão foi também muito mais forte. Se apropriou das experiências acumuladas especialmente no Brasil e no Chile, para a tortura e o fuzilamento dos detidos. Não houve Estádio Nacional, como no Chile, mas desaparecimentos e fuzilamentos maciços. Saíam, às quartas e aos sábados, os vôos da morte, com presos, que eram sedados, acompanhados de capelães do Exército e os corpos eram jogados no mar e no Rio da Prata. As vitimas são calculadas em várias de dezenas de milhares.

Também para a Argentina se fechava um ciclo, aquele iniciado em 1955, com o golpe que derrubou a Perón (que criou o nome “gorila”), o fracassado de 1966 e, finalmente, o de 1976, que implantou as políticas liberais de desregulamentação e de financeirização (época chamada de “plata Dulce”), destruindo o movimento popular e preparando o campo para a década neoliberal de Menem.

Só na década passada a Argentina foi se recuperando, lentamente, dos traumas que sofreu. Um país traumatizado pelo regime de terror, por duas crises de hiperinflação e pela implosão da paridade, que fez com que a Argentina tivesse um brutal retrocesso. (Hobsbawn disse que o maior retrocesso civilizatório da década de 90 se deu na Rússia; em seguida, se deu na Argentina).

O governo dos Kirchner teve uma politica clara de resgate da memória das vitimas e dos desaparecidos, de processos contra os responsáveis e de construção de espaços de memória para tudo o que tinha passado. O dia 24 de março ficou reservado para a reflexão sobre o que o país tinha vivido, para que nunca mais volte a ocorrer. Hoje, há 35 anos.