domingo, 11 de janeiro de 2009

sobre a midia de esgoto gaucha...

Sobre fenômenos ópticos, sob uma certa ótica

do blog la vieja bruja

Volta e meia, a depuradora de melífluos sabores gaba-se de divulgar informações em primeira mão, ato mais conhecido entre o vulgo como "furo".



Que sentido há, todavia, em se falar em "furo" em um sistema comunicacional onde se detém tanto o monopólio do deslumbramento quanto o da bajulação, no qual o único feedback tolerado provém do exercício barato do auto-elogio e do auto-engano?












i) O Grupo RBS não está solito na comunicação gaúcha, é fato. Contudo, um histórico de sabujice ajudou a consolidar uma rede física de informação em mídia eletrônica e impressa que lhe garante, na prática, não só o monopólio de sua versão dos fatos como, também e por conseguinte, o monopólio do alumbramento.

A rede de jornalismo impresso e de retransmissores periféricos do que é produzido em rádio e tv pela sede do império RBS não é uma versão dos fatos, mas a versão gaúcha dos fatos. A empresa reforça cotidianamente essa imagem e o imaginário coletivo local lhe reconhece como "a emissora dos gaúchos". Um dos maiores méritos estratégicos do Grupo foi ter percebido, desde sempre, que a exploração de um certo telurismo ufânico guasca, apropriado de crenças e valores locais, solidificaria esse processo de identificação: "aqui, o Rio Grande se vê" é o espelho de narciso gaudério.

Trata-se da Alegoria da Estância, ilustrada acima pelo talento de Hupper. No latifúndio imaginário criado pelo Grupo RBS, o palhaço que se mira representa tanto o modo como a sociedade gaúcha é tratada pela empresa quanto todo gaúcho que acredita ser essencialmente aquilo refletido no espelho criado pelo Grupo, enquanto a imagem do símbolo maior da viril idiotia guasca - a estátua do laçador - nele refletida representa todas as crenças e valores locais enviesadamente apropriados pela empresa e apresentados como nossa identidade: a "gauchidade" reforçada diariamente no apelo do Grupo a fim criar um elo entre si e a comunidade.

Sim, somos todos palhaços apaixonados pela imagem refletida nas águas que também espelham o mais belo pôr-do-sol do mundo, vendo tanto o que o Grupo RBS quer que vejamos por conveniência mercadológica quanto, também, aquilo que queremos ver. Não esqueçamos que Narciso definhou porque se apaixonou pela imagem que tinha de si mesmo, que viu refletida nas águas. Quem "se vê" no espelho sirotskiniano tende a definhar intelectualmente até o ponto da total indigência mental. Não somos todos vítimas inocentes, portanto. Sem a colaboração de boa parte da sociedade gaúcha, o apelo da empresa não teria boleado nossa própria história.

E quem não quer ver refletida sua imagem nessas inebriantes águas? E quem, inclusive, sequer sendo nativo, mas tendo interesses sedutores e vontade de ser reconhecido como tal - vide o caso clássico de nossa atual governadora, de triste figura em um famoso programa da Rede Globo tentando "ser" gaúcha -, não faz hercúleos esforços para se encaixar nessa imagem pré-concebida?





ii) O monopólio do deslumbramento, entretanto, não é suficiente. O sistema comunicacional da Alegoria da Estância também necessita do monopólio da bajulação.

Não basta apenas o Rio Grande "se ver" nessas sedutoras águas. Também é preciso adulá-lo convenientemente. O Narciso gaudério, portanto, além de reconhecer-se como tal, também precisa manter-se convencido de que a imagem dele refletida corresponde efetivamente à sua auto-imagem, ao seu auto-engano.

Nada melhor, para isso, do que lhe ciceronear em viagens internacionais, conceder-lhe distinções e galardões, anunciar nascimentos, casamentos e doenças de filhos seus e servir-lhe de assessoria de imprensa, vez por outra, mesmo que isso vá de encontro ao conceito de jornalismo.

Pois quem precisa de jornalismo independente, quando o que se vê é o que se quer ver?

Nisso o Grupo RBS também revelou-se insuperável. Graças ao monopólio físico da informação e do alumbramento, esse consequencia daquele, manter Narciso hipnotizado é fácil: basta permanecer sabujamente ao seu lado e com ele trocar impressões estéticas baseadas no jogo de cena e no falso elogio mútuo. Ter seu telefone sempre a mão, a fim de correndo lhe alcançar uma escova ou um creme facial, por exemplo, é indispensável.





No contexto comunicacional de um sistema como o da Alegoria da Estância, portanto, falar em "furo" jornalístico por colunistas sociais políticos soa quase como uma piada. Jornalismo que se faz em ante-salas perfumadas e por trás de telefones, aliás, sequer merece tal epíteto.





(La Vieja agradece profundamente ao talento de Roberto Annes, mais conhecido como Hupper. Sem ele, a Alegoria da Estância jamais teria sido ilustrada com tamanho brilhantismo. Embora a idéia do palhaço diante do espelho que reflete a face de um dos ícones do gauchismo acéfalo ter sido de La Vieja, foi de Hupper a idéia de criar tal arte sobre o clássico "Narciso", de Caravaggio)

Créditos: msilvaduarte

Do observatorio da Imprensa

Guernica em Gaza

Luiz Weis



Há qualquer coisa de surrealista na matéria “Cobertura da imprensa desagrada a israelenses”, do enviado especial do Estado de S.Paulo, Gustavo Chacra, publicada na sexta-feira, 9.

Nada de errado com a reportagem. Tudo, francamente, com a reação de Israel, que ela descreve, ao noticiário sobre os seus atrozes ataques a Gaza.

Um jornal israelense, relata o repórter, “chegou a chamar a imprensa internacional de mentirosa” em matéria de primeira página.

”Mentirosa”? Relatório da ONU divulgado na mesma sexta diz que 257 crianças palestinas morreram e 1.080 ficaram feridas nos 14 primeiros dias da ofensiva.

Como escreve o brasileiro, “o cenário [midiático] poderia ainda ser pior [para Israel] se jornalistas estrangeiros tivessem permissão para entrar no território palestino”.

Ou, conforme o correspondente da revista britânica The Economist, Gideon Lichfield, escrevendo no diário israelense Haaretz, é difícil vencer a guerra de propaganda [se é que de “propaganda” se trata], quando os números mostram [mostravam, àquele altura] “600 palestinos mortos de um lado e 9 israelenses de outro”.

Impossível não lembrar da resposta de Picasso ao oficial alemão na França ocupada que lhe perguntara se ele é que tinha feito "isso" - o retrato da destruição da cidade basca de Guernica pela aviação alemã na guerra civil espanhola. "Não", respondeu o pintor. "Foram vocês."

"O que você não sabe sobre Gaza"

Sob esse título, o New York Times publicou na quinta-feira o seguinte artigo de Rachid Kahlidi, professor de Estudos Árabes da Universidade Columbia:

”Quase tudo o que você foi levado a crer sobre Gaza está errado. Abaixo, alguns pontos essenciais que parecem ausentes da conversação, muito da qual se desenrola na imprensa, sobre os ataques de Israel à Faixa de Gaza.

A maior parte dos habitantes de Gaza não está lá por escolha. A maioria do 1,5 milhão de pessoas que abarrotam os cerca de 360 quilometros quadrados da Faixa de Gaza pertencem a famílias que vieram de cidades e aldeias em outros lugares, como Ashkelon e Beersheba. Foram tocadas para Gaza pelo exército israelense em 1948.

Os gazenses têm vivido sob ocupação israelense desde a Guerra dos Seis Dias em 1967. Israel continua sendo considerado em ampla medida um poder ocupante, mesmo depois de retirar as suas tropas e colonos da Faixa em 2005. Israel continua controlando o acesso à área, as importações e exportações, e a entrada e saída das pessoas. Israel controla o espaço aéreo de Gaza e a costa marítima, e as suas forças entram na área ao seu bel-prazer. Como poder ocupante, Israel responde, sob a Quarta Convenção de Genebra, pelo bem-estar da população civil da Faixa de Gaza.

O bloqueio da Faixa por Israel, com o apoio dos Estados Unidos e da União Européia, tornou-se cada vez mais estrito desde que o Hamas venceu as eleições para o Conselho Legislativo Palestino em janeiro de 2006. Combustível, eletricidade, importações, exportações e o movimento pela fronteira têm sido lentamente sufocados, criando problemas devastadores de saneamento, saúde, suprimento de água e transporte.

O bloqueio sujeitou muitos ao desemprego, à penúria e desnutrição. Isso equivale à punição coletiva – com o apoio tácito dos Estados Unidos – de uma população civil por exercer seus direitos democráticos.

O levantamento do bloqueio, juntamente com a cessação dos lançamentos de mísseis, era um dos termos cruciais do cessar-fogo de junho entre Israel e o Hamas. Esse acordo reduziu o número de mísseis disparados de Gaza de centenas, em maio e junho, a um total inferior a vinte nos quatro meses seguintes (conforme dados do governo israelense). O cessar-fogo ruiu quando forças israelenses lançaram ataques por ar e terra no início de novembro; seis ativistas do Hamas foram mortos, ao que se divulgou.

Usar civis como alvo, seja pelo Hamas ou por Israel, é um crime de guerra em potencial. Toda vida humana é preciosa. Mas os números falam por si: cerca de 700 palestinos, a maioria civis, foram mortos desde que o conflito estourou no fim do ano passado. Em contraste, houve cerca de uma dezena de israelenses mortos, muitos deles soldados. A negociação é um meio muito mais efetivo de lidar com mísseis e outras formas de violência. Isso poderia ter acontecido se Israel tivesse cumprido os termos do cessar-fogo de Junho e levantasse o bloqueio da Faixa de Gaza.

A guerra ao povo de Gaza não é realmente sobre mísseis. Nem sobre “restaurar a capacidade dissuasória de Israel”, como a imprensa israelense quer levá-lo a crer. Muito mais reveladoras são as palavras de Moshe Yaalon, então chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel, em 2002: “Os palestinos devem ser levados a entender nos mais profundos recessos de sua consciência que são um povo derrotado.”

Duo Assad - Heitor Villa-Lobos: Obra Completa Para Violão Solo (1978)



download cd 1

download cd 2




Créditos: UmQueTenha