sábado, 3 de outubro de 2015

Brasileiros têm de entender que estudar não é chato; chato é ser burro* | coração filosofante


Brasileiros têm de entender que estudar não é chato; chato é ser burro*




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A história da educação no Brasil é um acúmulo de omissões e até mesmo
de ações propositais que resultaram numa situação de extrema
desigualdade social, com um analfabetismo ou um analfabetismo funcional
endêmicos, um vergonhoso estado geral de ignorância e de desprezo pelo
conhecimento.


Para quem analisar nossa história, fica claro que a proibição do voto
aos analfabetos sempre foi intencional, pois o governante somente tinha
de prestar satisfações a uma minoria privilegiada, da qual esse mesmo
governante provinha. Como a maioria era analfabeta, e não tinha voz nem
voto, o governante só poderia ser alijado do poder pela ínfima minoria
para quem governava, e podia desprezar solenemente as necessidades da
imensa maioria dos brasileiros, aumentando assim, ano a ano, século a
século, o abismo social que nos define.


A exclusão brasileira foi criada propositalmente pela reserva do
acesso à educação somente a uma parcela dos brasileiros, porque só há
uma riqueza a distribuir, e essa riqueza é o acesso a uma educação de
qualidade.


Felizmente, depois de três séculos de domínio e de espoliação
colonial, mais quase outros dois séculos de manutenção do mesmo estado
de exclusão, primeiro imperial, depois de republiquetas e/ou de
ditaduras em que a reserva da educação para poucos continuava a ser
usada com fator de “proteção” da elite, o Brasil vem tentando construir
um estado democrático há cerca de trinta anos.


Pela primeira vez em nossa história, o voto foi estendido a todos os
brasileiros, e o direito à escolarização tornou-se universal, com a
oferta de vagas no ensino fundamental a todas as nossas crianças. Agora,
em pleno século 21, consolidar essa democracia afinal conquistada é um
trabalho hercúleo, uma obrigação de todos os brasileiros. Sabemos que,
mais que nunca, o passaporte para um futuro feliz e realizado é o acesso
a uma educação de qualidade.


Agora, finalmente, conseguimos oferecer vagas na escola pública para
cada criança, mas essa cultura do atraso faz com que os despossuídos
encarem a frequência escolar não como um direito libertador, mas como
uma obrigação. Tantos séculos de atraso acabaram por fazer com que a
maioria de nós, os despossuídos da história, sequer tenhamos ganas de
reivindicar nosso direito à educação.


Muitas famílias enviam seus filhos à escola de má vontade, alguns
somente para cumprir as exigências das bolsas-família, e as próprias
crianças festejam quando algum professor falta à aula e elas podem ficar
brincando à vontade no recreio. Séculos de exclusão não criaram um
anseio por este direito por parte dos próprios excluídos!


A maioria dos pais dessas crianças está disposta a fazer sacrifícios
para comprar um tênis de grife para seu filho, mas protesta quando tem
de gastar qualquer quantia para comprar-lhe um livrinho sequer. Isso
significa que a família brasileira acha mais importante investir no pé
do que na cabeça do seu próprio filho…


Como reverter esse quadro? Como incutir na consciência das famílias
que a felicidade e a riqueza só podem ser conquistadas pelo
conhecimento, pelo acesso à ciência, à tecnologia? Como poderemos
obrigar o brasileiro a ser feliz?


Acredito que obrigar é impossível. Enquanto tentarmos enfiar o
conhecimento goela abaixo de nossas crianças como um purgante,
utilizando as punições, as suspensões e as reprovações como instrumentos
de persuasão, só teremos fracassos pela frente.


Nossa escola tem de ser fascinante, atraente, cheirosa, utilizando
como fator de atração a literatura infantil e juvenil hoje produzida por
centenas de ótimos autores, para que os sonhos e a alegria desses
livros possam fazer com que os alunos anseiem por estar na escola, não
comemorem os feriados. Não basta que tenhamos criado vagas para todo
mundo. É preciso que a porta da sala de aula seja o pórtico da
felicidade.


Os brasileiros têm de compreender que estudar não é chato; chato é ser burro!


  • Escrito por Pedro Bandeira*, colunista do site UOL.
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http://noticias.uol.com.br/opiniao/coluna/2015/09/30/brasileiros-tem-de-entender-que-estudar-nao-e-chato-chato-e-ser-burro.htm