sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Nicarágua: saúde gratuita e de qualidade para todos




Manágua, (Prensa Latina) 

Em aproximadamente três anos e meio, a atenção sanitária na Nicarágua deixou de ser uma prática elitista e controlada pelas regras do mercado, e se converteu em uma prioridade governamental e um direito de toda a população. Os avanços conseguidos neste campo desde que os sandinistas assumiram pela segunda vez o governo desta nação centro-americana, em janeiro de 2007, são enormes e respondem a uma política de Estado concebida a partir do critério de que a saúde é um direito fundamental de toda a população e é uma obrigação governamental brindar uma atenção de qualidade, de maneira eficiente e gratuita.

Depois de 17 anos de governos neoliberais (1990-2006), uma das primeiras decisões adotadas pelo presidente Daniel Ortega foi decretar a gratuidade da atenção médica em hospitais e centros de saúde, incluindo os exames de laboratórios e com equipes de alta tecnologia, que depois se estendeu aos medicamentos prescritos nessas unidades.

Essa medida possibilitou o acesso à atenção médica de grande parte da população nicaragüense, sobretudo a de menores rendimentos, até então impedida de pagar os altos custos de hospitais privados e inclusive públicos.

Por exemplo, no Centro Nacional de Cardiologia realizaram-se, em 2007, 2.898 eletrocardiogramas, mas a cifra subiu a 7.932 em 2009 e só durante o primeiro semestre deste ano se reportaram 4.500.

Há três anos, os nicaragüenses deviam pagar por um eletrocardiograma o equivalente a uns 30 dólares por exame, mas desde 2007 realizam-se gratuitamente em todos os hospitais públicos e centros assistenciais controlados pelo Ministério de Saúde (Minsa).

Mas de pouco serve a gratuidade da atenção médica se são escassos os centros assistenciais e os que existem não dispõem de recursos humanos e técnicos necessários.

Concentrada principalmente em Manágua e em algumas outras cidades, a infra-estrutura de saúde pública que encontrou o governo sandinista em 2007 estava marcada pela corrupção e pelo abandono de três administrações neoliberais precedentes.

Não existiam máquinas de hemodiálise em nenhum dos hospitais públicos do país, e muito menos equipes para realizar tomografias, ressonâncias magnéticas, ecocardiogramas e outros exames especializados.

Tudo isso começou a mudar rapidamente, graças a importantes e sustentados investimentos governamentais e à ajuda brindada pelos países da Aliança Bolivariana dos Povos de Nossa América (ALBA), principalmente de Cuba e Venezuela.

A infra-estrutura
Em três anos e meio, foram consertados e acondicionados dezenas de hospitais e centros de saúde em todo o país e se construíram outros, principalmente em zonas do interior onde praticamente nunca antes houve atenção médica à população.

Na primeira semana de julho e em comemoração ao XXXI aniversário do triunfo da Revolução Sandinista, a ministra de Saúde, Sonia Castro, anunciou a inauguração, no mês, de 15 novas unidades sanitárias, entre elas quatro hospitais primários.

Há uma melhora na infra-estrutura e pouco a pouco estamos investindo num modelo de saúde que encontramos fracassado; sabemos que as necessidades são grandes, mas vamos avançando, disse a titular do Minsa.

Na aplicação de sua política sanitária, o governo sandinista tem outorgado a prioridade à prevenção e a partir desse conceito intensificou-se a atenção às grávidas e multiplicam-se os programas de vacinação, sobretudo à população infantil, o que permitiu eliminar ou reduzir a incidência de doenças como a poliomielite, o tétano neonatal, o sarampo, a rubéola e outras. Ao mesmo tempo trabalhou-se intensamente na formação de novos médicos, pessoal de enfermaria e técnicos da saúde, com vocação de serviço solidário e humanista, alheia a conceitos mercantilistas.

Ao pujante movimento de médicos sandinistas que se move por todo o país, unem-se pouco a pouco os graduados das universidades locais, bem como os mais de mil jovens que a Nicarágua enviou à Escola Latino-americana de Medicina (ELAM) de Havana, e os mais de 200 que estudam na Venezuela.

O esforço realizado ao longo de mais de três anos possibilitou que, no final de maio, o representante permanente na Nicarágua da Organização Panamericana de Saúde (OPS), Jorge Luis Prósperi, destacasse as conquistas do governo sandinista em matéria de saúde.

Nicarágua é um dos países com mais alta cobertura de vacinação no continente, disse o servidor público, e acrescentou que nem na América do Sul nem na Central atingem-se cifras acima de 95 por cento na maioria das vacinas como na Nicarágua e isso só se consegue com um compromisso político muito forte do governo.

A julgamento de Prósperi, as limitações são basicamente financeiras, mas para chegar a essa meta conta-se com uma forte política sanitária e o país tem um plano de saúde e um modelo de organização dos sistemas sanitários locais que são exemplos para a América.

A colaboração cubana
A colaboração cubana neste esforço é notável. A brigada Ernesto Che Guevara, integrada por uns 180 especialistas, opera em dois hospitais, um no município Muelle de los Bueyes, na Região Autônoma do Atlântico Sul (RAAS), e outro em Waspán, na Região Autônoma do Atlântico Norte (RAAN), zonas de assentamento tradicional dos povos originários.

O pessoal médico da Che Guevara está presente também nos departamentos de Matagalpa e Rio San Juan, e seus técnicos operam as equipes vindas da Venezuela para o Centro de Alta Tecnologia do capitalino hospital Lenin Fonseca.

Também integram essa brigada os 45 médicos e técnicos que operam os quatro hospitais oftalmológicos criados na Nicarágua como parte da Operação Milagro, instalados em Cidade Sandino, Matagalpa, Bluefields e Puerto Cabezas, onde, em conjunto realizaram-se até agora mais de 67 mil operações cirúrgicas em pessoas com problemas visuais.

A maior parte dessas operações foi realizada em pessoas afetadas por cataratas ou pterigium e foi totalmente gratuita, algo muito importante se se tiver em conta que uma operação desse tipo custa em um hospital privado da Nicarágua em torno de 900 dólares.

Outra colaboração cubana de grande impacto social é a que protagonizam os 64 especialistas e técnicos da Ilha que integram a Brigada Todos com Voz, que desde outubro de 2009 realiza o Estudo Psico-social, Pedagógico e Clínico-Genético das Pessoas com Incapacidades em todos os departamentos da Nicarágua.

Essa brigada, integrada também por 25 médicos nicaragüenses, completou já esses estudos em Masaya, Matagalpa, Chinandega, Managua, León, Jinotega, Nueva Segovia, Estelí e a princípios de julho estava a ponto de terminar em Chontales.

Até o dia 6 desse mês tinham estudado um total de 88.419 pessoas com diversos tipos de incapacidades, para o que visitaram mais de 131 mil moradias.

Esses estudos permitem registrar informação que antes não existia sobre as pessoas incapacitadas, o que possibilita ao governo elaborar e aplicar programas de atenção para melhorar a qualidade de vida desse vulnerável setor da população.

(*) O autor é co-responsável da Prensa Latina na Nicarágua.

A tendência à barbárie e as perspectivas do socialismo

  James Petras  no Correio da Cidadania   
 
As sociedades ocidentais e os Estados estão se deslocando inexoravelmente para condições semelhantes à barbárie; mudanças estruturais estão revertendo décadas de bem estar social e sujeitando o trabalho, os recursos naturais e as riquezas das nações à exploração bruta, à pilhagem e ao saque, rebaixando os padrões de vida e causando descontentamento num nível sem precedentes.
 
Inicialmente, descreveremos os processos econômicos, políticos e militares que vêm abrindo este caminho à decadência e à decomposição social, e a seguir mostraremos a reação das massas populares à deterioração de suas condições de vida. As profundas mudanças estruturais que acompanham a ascensão da barbárie constituirão a base para considerar as perspectivas para o socialismo no século XXI.
 
A crescente onda de barbárie
 
Nas sociedades antigas, a "barbárie" e os seus portadores – os "bárbaros" invasores – foram vistos como uma ameaça vinda das regiões periféricas de Roma ou Atenas. Nas sociedades ocidentais contemporâneas, os bárbaros vêm de dentro, da elite, com a intenção de impor uma nova ordem que corrói o tecido social e a base produtiva da sociedade, convertendo meios de subsistência estáveis em condições deterioradas e inseguras da vida cotidiana.
 
A chave para a barbárie contemporânea encontra-se nas estruturas internas do Estado imperial e da economia. Estas incluem:
 
1. A ascensão de uma elite financeira e especulativa, que tem saqueado trilhões de dólares dos poupadores, investidores, mutuários, consumidores e do Estado, subtraindo enormes recursos da economia produtiva e colocando-os nas mãos da camada parasitária aninhada no Estado e nos mercados financeiros.
 
2. A elite política militarista, que vem supervisionando um estado de guerra permanente desde meados do século passado. Terror de Estado, guerras intermináveis, assassinatos em zonas fronteiriças e a suspensão das garantias constitucionais tradicionais levaram à concentração de poderes ditatoriais, prisões arbitrárias, torturas e à negação do habeas corpus.
 
3. Em meio a uma profunda recessão econômica e estagnação, os altos gastos do Estado na construção de um império econômico e militar, às expensas da economia nacional e dos padrões de vida, refletem a subordinação da economia local às atividades do Estado imperial.
 
4. A corrupção desde o topo, visível em todos os aspectos da atividade do Estado - desde as aquisições de bens e serviços até a privatização e os subsídios para os super-ricos –, incentiva o crescimento do crime internacional de cima para baixo, a lumpenização da classe capitalista e um Estado onde a lei e a ordem se encontram em descrédito.
 
5. Resultantes dos elevados custos de construção do império e da pilhagem da oligarquia financeira, os encargos sócio-econômicos recaem diretamente sobre os ombros dos trabalhadores assalariados, aposentados e trabalhadores por conta própria, determinando uma grande mobilidade descendente na escala social ao longo do tempo. Com a perda de empregos e o desaparecimento das posições mais bem remuneradas, as retomadas de casas pelos bancos crescem exponencialmente e as classes médias, antes estáveis, encolhem, e os trabalhadores são forçados a alongar suas jornadas de trabalho diárias e a trabalhar durante um maior número de anos.
 
6. As guerras imperiais, que se espalham pelo mundo e são direcionadas a populações inteiras, que sofrem com os bombardeios e as operações clandestinas de terror, geram, em oposição, redes terroristas, que também atingem alvos civis nos mercados, transportes e espaços públicos. O mundo vai se parecendo ao pesadelo hobbesiano de "todos contra todos".
 
7. Um crescente extremismo etno-religioso ligado ao militarismo é encontrado entre os cristãos, judeus, muçulmanos e hindus, que substitui a solidariedade de classe internacional por doutrinas de supremacia racial e penetra as estruturas profundas dos Estados e das sociedades.
 
8.  O desaparecimento dos Estados europeus e asiáticos de bem-estar social coletivo – nomeadamente, a ex-URSS e a China – levantou as pressões competitivas sobre o capitalismo ocidental e o encorajou à revogação de todas as concessões de bem-estar social obtidas pela classe trabalhadora no período pós-II Guerra Mundial.
 
9. O fim do "comunismo" e a integração da social-democracia ao sistema capitalista levaram a um enfraquecimento severo da esquerda, que os protestos esporádicos dos movimentos sociais não conseguiram substituir.
 
10. Diante do atual assalto às condições de vida dos trabalhadores e da classe média, só se vêem protestos esporádicos, no melhor dos casos, e impotência política, no pior.
 
11. A exploração maciça do trabalho nas sociedades capitalistas pós-revolucionárias, como a China e o Vietnã, compreende a exclusão de centenas de milhões de trabalhadores migrantes dos serviços públicos elementares de educação e saúde. A pilhagem sem precedentes e a captura, por oligarquias nacionais e multinacionais estrangeiras, de milhares de lucrativas empresas públicas estratégicas da Rússia, das repúblicas da ex-União Soviética, dos países da Europa Oriental, dos Bálcãs e dos países bálticos, foram a maior transferência de riqueza pública para mãos privadas, em curto espaço de tempo, em toda a História.
 
Em resumo, a barbárie surgiu como uma realidade definida, produto da ascensão de uma classe dominante financeira parasitária e militarista. Os bárbaros encontram-se aqui e agora, presentes dentro das fronteiras das sociedades ocidentais e seus Estados. Eles governam e perseguem agressivamente uma agenda que está continuamente a reduzir os padrões de vida, a transferir a riqueza pública para os seus cofres privados, a pilhar recursos públicos, a violar direitos constitucionais no exercício de suas guerras imperiais, a segregar e perseguir milhões de trabalhadores imigrantes e a promover a desintegração e o desaparecimento do trabalho estável e de classe média. Mais do que em qualquer outro momento na história recente, o 1% mais rico da população controla uma parcela crescente das riquezas e das rendas nacionais.
 
Mitos e realidades do capitalismo histórico
 
A retirada, em grande escala e de forma sustentada, dos direitos sociais e previdenciários, da segurança no emprego, e as reduções de salários e aposentadorias, demonstram a falsidade da idéia do progresso linear do capitalismo. Essa reversão, produto do poder ampliado da classe capitalista, demonstra a validade da proposição marxista de que a luta de classes é o motor da História – na medida em que, pelo menos, a própria condição humana é considerada como sua peça central.
 
A segunda premissa falsa – a de que os Estados organizados em "economias de mercado" têm como pré-requisito a paz, tendo como corolário a ascendência dos "mercados" sobre o militarismo – é refutada pelo fato de que a principal economia de mercado – os Estados Unidos – tem permanecido em constante estado de guerra desde o início da década de 1940, estando ativamente engajada em guerras em quatro continentes, até os dias de hoje, e com perspectiva de novas, maiores e mais sangrentas guerras no horizonte. A causa e conseqüência da guerra permanente é o crescimento de um monstruoso "Estado de segurança nacional" que não reconhece fronteiras nacionais e absorve a maior parte do Orçamento do país.
 
O terceiro mito do "capitalismo avançado maduro" é o de que este sempre revoluciona a produção através da inovação e da tecnologia. Com a ascensão da elite financeira especulativa e militarista, as forças produtivas foram saqueadas e a "inovação" é em grande parte direcionada à elaboração de instrumentos financeiros que exploram os investidores, reduzem os ativos e acabam com o trabalho produtivo.
 
Enquanto o império cresce, a economia local se contrai, o poder está centralizado no Executivo, o poder legislativo é reduzido e aos cidadãos é negada uma representação efetiva, ou mesmo o poder de veto através de processos eleitorais.
 
A resposta das massas ao aumento da barbárie
 
A ascensão da barbárie em nosso meio tem provocado revolta pública contra seus principais executores. As pesquisas de opinião têm reiteradamente encontrado:
 
(1) Profunda aversão e revolta contra todos os partidos políticos.
 
(2) Grande desconfiança, nutrida pela maioria da população, contra a elite empresarial e política.
 
(3) Rejeição, também pela maioria, da concentração de poder corporativo e do seu abuso, principalmente por parte dos banqueiros e financistas.
 
(4) Questionamento amplo das credenciais democráticas dos líderes políticos que agem a mando da elite empresarial e promovem as políticas repressivas do Estado de segurança nacional.
 
(5) Rejeição, pela grande maioria da população, da pilhagem do Tesouro nacional para salvação dos bancos e da elite financeira, com a imposição de programas de austeridade regressivos sobre a classe média trabalhadora.
 
Perspectivas para o socialismo
 
A ofensiva capitalista teve certamente um grande impacto sobre as condições objetivas e subjetivas da classe média trabalhadora, empobrecendo- a e provocando uma onda crescente de descontentamento pessoal, que ainda não se traduziu numa movimentação anticapitalista massiva, ou mesmo numa resistência dinâmica e organizada.
 
As grandes mudanças estruturais requerem um melhor entendimento das atuais circunstâncias adversas e a identificação de novas instâncias e meios onde se desenvolvem a luta de classes e de transformação social.
 
Um problema-chave é a necessidade de se recriar uma economia produtiva e reconstruir uma classe trabalhadora industrial após anos de pilhagem financeira e desindustrialização, não necessariamente para as poluidoras indústrias do passado, mas certamente para novas indústrias que criem e utilizem fontes de energia limpa.
 
Em segundo lugar, as sociedades capitalistas altamente endividadas necessitam, fundamentalmente, sair do modelo de construção imperial militarista de alto custo em direção a um modelo de austeridade financeira baseado na classe e que imponha os sacrifícios e as reformas estruturais aos setores bancário, financeiro e comercial de grande varejo, que substitui a produção local pela importação de artigos de consumo de baixo custo.
 
Em terceiro lugar, o enxugamento do setor financeiro e do comércio retalhista exige a melhoria das qualificações dos trabalhadores que serão deslocados ou desempregados, bem como mudanças no setor de TI, de forma a acomodar as próprias mudanças econômicas. Exige, também, a mudança de um paradigma – da renda monetária para o rendimento social –, em que a educação pública e gratuita de alto nível, o acesso universal à saúde e as aposentadorias abrangentes substituirão o consumismo global financiado por dívidas. Isso pode se tornar a base para o fortalecimento da consciência de classe contra o consumismo individual.
 
Esta é a questão: como passar de uma posição em que a classe trabalhadora se encontra fragmentada e enfraquecida e os movimentos sociais em recuo ou na defensiva a uma posição em que seja possível lançar uma ofensiva anticapitalista?
 
Vários fatores subjetivos e objetivos já permitem o trabalho nesse sentido. Primeiro, há uma negatividade crescente contra a grande maioria dos atuais operadores políticos e, em particular, contra as elites econômicas e financeiras que estão claramente identificadas como responsáveis pelo declínio nos padrões de vida. Em segundo lugar, há o ponto de vista popular, compartilhado por milhões de pessoas, de que os atuais programas de austeridade são claramente injustos - com os trabalhadores a pagar pela crise que a classe capitalista produziu. Até o momento, no entanto, estas maiorias são mais "anti"-status quo do que "pró"-transformação. A transição do descontentamento privado para a ação coletiva é uma questão em aberto quanto a quem a desencadeará e como o fará, mas a oportunidade está presente.
 
Existem vários fatores objetivos que podem deflagrar uma mudança qualitativa do descontentamento, deslocando-o da raiva passiva rumo a um maciço movimento anticapitalista. Um "duplo mergulho" na recessão, o fim da atual recuperação anêmica e o início de uma recessão mais profunda e prolongada ou de uma depressão poderiam desacreditar ainda mais os governantes atuais e seus aliados econômicos.
 
Em segundo lugar, o aprofundamento interminável da austeridade poderá desacreditar a noção atual, difundida pela classe dominante, de que os sacrifícios atuais são necessários para se obterem ganhos futuros, abrindo as mentes e encorajando os corpos a se moverem à procura de soluções políticas, de forma a alcançar ganhos no presente e infligir dor às elites econômicas.
 
As inesgotáveis e "invencíveis" guerras imperiais que sangram a economia e a classe trabalhadora podem, em última análise, criar uma consciência de que a classe dominante oferece "sacrifícios" à nação sem nenhuma finalidade "útil".
 
Provavelmente, o efeito combinado de uma nova etapa da recessão, a austeridade perpétua e as estúpidas guerras imperiais acabarão por transformar o mal-estar atual e a difusa hostilidade das massas contra a elite econômica e política em favor dos movimentos socialistas, partidos e sindicatos.
 
James Petras é sociólogo, nascido em Boston, e publicou mais de sessenta livros de economia política e, no terreno da ficção, quatro coleções de contos.

Ana Amélia Lemos e a credibilidade



Por Marcelino Korst no RsUrgente

Ana Amélia Lemos passou décadas fazendo a cobertura política nos veículos de comunicação mais lidos, vistos e ouvidos do Rio Grande do Sul. Durante todo aquele tempo, sempre que qualquer dúvida se levantava sobre sua imparcialidade, a reação era imediata. Os críticos, invariavelmente, eram classificados como “patrulhas” ou “pessoas que não sabem lidar com a liberdade de imprensa”. Mas eis que Ana Amélia Lemos aparece nas páginas de política como candidata a uma vaga de Senadora pelo Partido Progressista batendo palmas para… Yeda Crusius.
O governo Yeda, e isso até os flocos de neve que decoram a Serra gaúcha sabem, é alvo de uma montanha de suspeitas de corrupção, algumas cabalmente comprovadas. Mais do que isso: até hoje Yeda mantém ao seu lado, com poder absoluto de contrastar e demitir, uma assessora que está indiciada por formação de quadrilha e corrupção; e até ontem, um Chefe de Gabinete que usou o aparelho do Estado para espionar adversários políticos e acompanhou delegados para avisar o pai de um traficante que o filho seria preso.
O governo Yeda, e disso sabem bem os trabalhadores em educação e os bancários, ordenou que a Brigada Militar disparasse balas de borracha, bombas de efeito moral e usasse cães ferozes para tentar dissolver protestos legítimos de cidadãos contra os desmandos evidentes da administração tucana.
O governo Yeda não permitiu a conclusão de uma sindicância aberta há mais de três anos para investigar o comportamento de um procurador do Estado acusado de fazer parte de uma quadrilha que roubou R$ 44 milhões do Detran.
O governo Yeda escolheu um Chefe para a Casa Civil que foi gravado pelo vice-governador confessando o loteamento de cargos do primeiro escalão para financiar partidos que, em troca, sustentaram a administração e impediram que se investigasse as responsabilidades políticas sobre as fraudes do Detran e das grandes obras.
O governo Yeda, bem… basta que se veja os altíssimos índices de rejeição da governadora mesmo quando ela despeja em obras eleitoreiras todo o dinheiro que deveria ter sido investido na educação, na saúde e da segurança do povo gaúcho…
Pois é este governo que não mais a jornalista imparcial mas a candidata Ana Amélia Lemos, aparece aplaudindo nas fotografias da campanha. Convenhamos. Cumprindo este papel, Ana Amélia não está propriamente prestando um serviço à credibilidade. Nem do jornalismo, nem da política.

Chávez não é tão feio quanto parece

  Luiz Eça - Correio da cidadania   
 
Nas últimas semanas, nossa grande mídia tem caprichado nos ataques ao general Chávez. Diariamente, sucedem-se matérias que, além das habituais críticas aos atritos com a imprensa oposicionista, anunciam uma crise terrível, que atestaria o fracasso talvez definitivo do governo venezuelano.
 
Baseiam-se em dados alarmantes. Em 2009, a inflação venezuelana foi de 25% e o crescimento de menos 3,3%, sendo que neste ano se prevê repetição do crescimento negativo e da inflação, a qual poderia chegar a 40%.
 
Os números são verdadeiros, mas, quanto à conclusão, há reparos a fazer.
 
Como se sabe, a economia da Venezuela depende, e muito, da exportação do petróleo (90% do total das exportações). Foi profundamente afetada pela recente crise mundial, que reduziu o preço do petróleo de cerca de 120 para 40 dólares o barril.

Diante dessa situação, o governo adotou uma política extremamente conservadora, tipo FMI. Ao invés de estimular os investimentos (como fez o Brasil com sucesso), tratou de cortar despesas, o que trouxe recessão. Some-se a isso uma grande seca, absolutamente sem precedentes, no país, que gerou falta de energia e graves paralisações das atividades industriais, mais uma política errada de supervalorização do bolívar (moeda local), que encareceu e reduziu as exportações, e o resultado foi crescimento negativo e aumento da inflação.
 
Apesar disso, estes dados estão longe de configurar uma crise de vastas proporções, semelhante à da Grécia.
 
De fato, enquanto os gregos gemem sob um débito público de 115% do Produto Interno Bruto, o índice do país de Chávez, em 2009, foi de apenas 19,9% - bem melhor do que o índice médio da União Européia, que chega a 79%. E esse bom estado das finanças venezuelanas garante ao governo a obtenção de empréstimos, se necessário, como aconteceu, recentemente, quando a China adiantou 20 bilhões de dólares, por conta de futuras entregas de petróleo.
 
Quanto à economia, as perspectivas de recuperação são positivas. O governo corrigiu sua política errada de contenção e volta a investir no desenvolvimento. Entre outras ações, iniciou um grande plano para aumento da geração de energia elétrica, aplicando 6 bilhões de dólares.
 
Com o fim da crise mundial, o preço do petróleo que era de 40 dólares/barril em 2009, neste ano subiu para 82 dólares, em julho. Isso dará maior fôlego para os planos de expansão da economia venezuelana. Espera-se que as previsões sombrias de crescimento negativo de 3,3% e de inflação entre 25 e 40% sejam, pelo menos, aliviadas.
 
A médio prazo, a Venezuela tem boas condições de deslanchar, voltando a apresentar taxas de crescimento semelhantes às dos 10 primeiros anos do governo Chávez, quando sua média superou 10% anuais. Recursos, parece que não faltarão. A U.S. Energy Administration projetou que os preços do petróleo deverão atingir 98 dólares/barril em 2020. Ótimo para a Venezuela, cujas reservas petrolíferas são, depois das últimas descobertas, as maiores do mundo, atingindo uma estimativa de 500 bilhões de barris. O governo Chávez, presentemente, estuda propostas de empresas estrangeiras para explorações em joint venture com o estado venezuelano.
 
Mesmo no período do segundo semestre de 2008/2009, em que o governo teve suas receitas minguadas pelos reflexos da crise mundial, a redução dos gastos não chegou à área do bem estar popular.
 
Chávez continuou aplicando 40% do orçamento (3 vezes mais do que o governo anterior) na área social.
 
Programas como construção em massa de casas populares, armazéns do povo, vendendo produtos mais baratos, expansão constante da assistência médica nas favelas e outros bairros carentes, criação acelerada de escolas na periferia – com 3 refeições para as crianças -, água tratada e saneamento básico foram levados a extensas massas populacionais.
 
Assim, contrapondo os sinistros números econômicos citados acima, o governo pôde apresentar números sociais bastante positivos.
 
O desemprego foi mantido sob controle, em 8,2%, índice muito bom se comparado com outros países da região como a Colômbia, tão elogiada pela grande mídia, que obteve 12,2% nesse índice.
 
A pobreza, que atingira 54% dos venezuelanos em 1999, início do governo Chávez, chegou a 23% em 2009, ano em que a pobreza extrema foi reduzida em 72%.
 
Ainda nesse crítico 2009, a Venezuela continuou com a melhor performance em termos de desigualdades sociais na América Latina : os 20% mais ricos detendo menos de 40% da riqueza nacional.
 
Em plena crise, o salário-mínimo continuou o mais alto da América Latina. E no mês que vem, subirá ainda mais, a 521 dólares, para recuperar o poder de compra da classe trabalhadora, afetado pela alta inflação.
 
Na Educação, com recessão e tudo, o governo não alterou os 6% do orçamento habitualmente gastos nessa área (nos países ricos, a média é 3,9%), responsáveis pelo índice de 93% da população alfabetizada – mais do que no Brasil, México e Colômbia.
 
Todos esses dados são animadores, mas não se pode subestimar a alta inflação e a recessão econômica que ainda não foram vencidas.
 
A grande mídia apontou incompetência, empreguismo e socializações desordenadas como causas da presente situação difícil. Talvez tenha alguma razão, embora haja dúvidas sobre alguns desses fatores ou pelo menos quanto às cores exageradas com que foram pintados. No entanto, ignorou os fatos positivos da realidade venezuelana e nega-se a admitir possibilidade da recuperação econômica do país de Chávez.
 
Elas, as grandes empresas jornalísticas, tão ciosas da liberdade de imprensa, deveriam lembrar que essa liberdade se justifica na medida em que seja cumprida sua missão de informar, sem omissões ou distorções. No caso de governo Chávez, passar um retrato fiel, evitando a tentação da caricatura ou de retoques que o façam ficar parecido com Frankestein.
 
Luiz Eça é jornalista.