Em 1997, aprovou-se a Lei de Telecomunicações, em atual vigência e
agonia agora que, a partir desta semana, o parlamento começará a debater
a lei que a substituirá, beneficiando o conjunto da população boliviana
e provavelmente promovendo o fim dos latifúndios midiáticos.
A lei ainda vigente, aprovada pelo governo neoliberal de então,
reordenou o espectro radioelétrico, ainda que na verdade tenha sido uma
genialidade para fazer desaparecer as emissoras sindicais, que eram as
únicas mídias opositoras. Desde então, todas foram igualadas a uma
licença de vinte anos, ao tempo em que se decretava a licitação de
freqüências.
O prazo de vinte anos terminará em 2017, mas para então estará
vigente a nova lei a ser analisada a partir de agora. As autoridades
adiantaram que a divisão das freqüências será de 33% para o setor
privado, 33% para o público (governo, províncias, municípios e
universidades públicas) e 34% para as rádios comunitárias e os povos
originários e camponeses.
Na atualidade, 98% das freqüências estão em mãos do setor privado,
cujo privilégio lhes permitiu construir verdadeiros “latifúndios
midiáticos” que garantiram a eles poder político para manipular a
opinião pública.
A lei a ser consensuada refere-se à repartição de freqüências em
rádio e televisão, mas só o seu anúncio mobilizou os donos desses meios
de comunicação, que acabam de “denunciar” as afetações a seus interesses
contidas no projeto.
A nova Lei de Telecomunicações regerá adequadamente a posse de
freqüências. Terá de evitar que banqueiros e grupos econômicos poderosos
acessem as mesmas, pois esses as utilizam para sustentar seu poder, uma
vez que a mídia é elemento estratégico que tampouco pode ficar nas mãos
de estrangeiros.
Nessa época de mudanças, os meios de comunicação deverão estar a
serviço e benefício geral de todos os bolivianos através de uma
comunicação livre, equitativa, participativa e inclusiva, que atenda às
aspirações dos povos, cujas lutas por verdadeiras mudanças vêm de muito
tempo atrás.
Se olhamos atentamente para a atualidade, nos convenceremos de que a
mídia serve às oligarquias. É seu instrumento de domínio e submissão em
benefício de seus próprios interesses, razão mais que suficiente para
confiar que a lei que logo será aprovada no parlamento terminará com o
patrimônio da oligarquia para passá-lo à posse de todos os bolivianos.
Os monopólios chegam a seu fim
A Lei de Telecomunicações substituirá a atual e regulará o
funcionamento técnico dos meios audiovisuais. Possivelmente e mais
adiante, se pensará em outra Lei de Mídia que poderia regular os
conteúdos e o exercício legal dos comunicadores, começando pelos donos,
que na atualidade e majoritariamente nada têm a ver com o jornalismo.
Desejamos um trabalho auspicioso aos legisladores que sem temores
deverão continuar com as consultas e assessorias necessárias.
Sendo aprovada com rapidez, a Lei de Telecomunicações acabará com a
lei neoliberal que em linhas gerais completará apenas 14 anos de
vigência e desordem nas freqüências divididas e nos conteúdos,
principalmente das rádios, que passam de mil, e das emissoras de TV, que
oscilam em torno de 500 canais.
As oligarquias midiáticas
Três redes de televisão acumularam enorme poder de manipulação da
opinião pública, posta a serviço de seus interesses políticos sectários e
em feroz oposição às verdadeiras mudanças inclusivas que se verificaram
pela primeira vez na Bolívia. Quem são seus proprietários e que
interesses representam? Aqui os temos:
Red Uno
Seu dono é o político e empresário croata Ivo Kuljis Fütchner. Atuou
em sociedade com Gonzalo Sanchez de Lozada (MNR – Movimento Nacionalista
Revolucionário), Carlos Palenque (CONDEPA – Consciência de Pátria),
Johnny Fernandez (UCS – União Cívica Solidariedade) e Manfred Reyes
Villa (NFR – Nova Força Republicana). Como político foi um fracasso, mas
conseguiu benefícios para suas empresas.
No campo empresarial, está ligado a exitosos negócios na banca, à
rede de supermercados Hipermaxi, ao frigorífico Fridosa, às indústrias
Kupel, à pecuária em grande escala, além de ser exportador de soja,
possuir bens imóveis e estabelecimentos educativos, entre outras coisas.
Red PAT
Começou como notável esforço de jornalistas associados para dar a
entender que entre os profissionais também se pode oferecer uma
televisão com menos alienação. Efetivamente, em seu momento a Red PAT
foi única em produção nacional.
Porém, as imparcialidades não parecem ter muito futuro neste país e a
rede foi se inclinando ao neoliberalismo, escorregando até acabar nas
mãos de um empresário de origens árabes, Abdalá Daher, cujos interesses,
entre outros, estão ligados às importações eletrônicas. Daher não é
conhecido no campo político e o único escândalo que se atribui a ele é o
de ter sido pressionado por Eduardo Rosza Flores a dar contribuições ao
contratado para liderar o separatismo em Santa Cruz.
Red UNITEL
Esta emissora é a mais radical dos latifúndios midiáticos, filial da
CNN estadunidense e propriedade da família Monasterios, cujo principal
representante é Osvaldo Monasterios Añez, ativo militante do MNR e
parlamentar em pelo menos duas ocasiões.
Sua rede midiática tem muito a defender, pois os Monasterios estão
ligados a enormes empresas da banca privada, fábricas de refrigerantes,
sorveterias, produção de álcool e derivados, estâncias pecuárias (com
criação de gado da raça Nelore), importação de móveis, administração da
Zona Franca Puerto Suarez, entre outros interesses.
Os interesses existem, claro que sim
Um poder econômico tão enorme é defendido por um grande conglomerado
de jornalistas através de programas habilmente estruturados para
executar uma inteligente oposição ao atual processo de mudança, com base
em pesquisas e enquetes claramente manipuladas, que não fazem outra
coisa que rechaçar suas pouco críveis pretensões de imparcialidade e
objetividade.
Os parlamentares que tratarão da nova Lei de Telecomunicações estão
obrigados a analisar se a mídia deve estar somente nas mãos de poderosos
empresários cujos interesses podem distorcer a opinião pública, caso
consigam a colaboração de escolhidos manipuladores, que sempre existem,
sim senhores.
Nota:
A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de Lei de Telecomunicações
que garante a distribuição equitativa das freqüências, e que deverá ser
enviado à Câmara Alta (Senado) para ser revisado e aprovado.
Fortunato Esquivel é jornalista e trabalha na Rádio Pátria Livre
Traduzido por Gabriel Brito, jornalista.
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