sábado, 11 de outubro de 2008

Miriam, a louca


por Miguel do Rosário, no Óleo do Diabo


Durante toda minha vida convivi com o medo da loucura. É uma coisa de família, uma paranóia horrível. No entanto, nunca surtei, nunca perdi um milímetro de minha lucidez. Devo ter perdido alguns milhões de neurônios com bebedeiras, ok, mas não faz tanta diferença para o conjunto de aproximadamente 14 bilhões de neurônios com que nasci, segundo a ciência. Convenci-me, por fim, que não era louco, nunca fui, embora não possa assegurar que nunca serei. Em momentos de depressão, todavia, a paranóia insiste em voltar. Hoje descobri quão ingênuo tenho sido. Doida é a Miriam Leitão. E se uma louca como ela pode ser a principal colunista econômica do país, eu, se eu for louco (e o Frank Sinatra dizia que todos o somos), também posso ter minhas ambições. Leiam a matéria abaixo:

O peso da máxi

Já é maxidesvalorização. De 26 moedas emergentes, o real foi que mais perdeu: 35%. Desde agosto, se a conta do PIB for feita em dólar, é como se o Brasil tivesse perdido US$ 309 bi. Parte é efeito dos derivativos dos exportadores, um problema que ninguém sabe a dimensão. Um exportador me disse o seguinte: “O BC pede serenidade como o capitão do Titanic mandava a orquestra tocar."

O Banco Central fez ontem várias operações no mercado de câmbio e não reduziu a pressão do dólar. Quanto mais o dólar sobe, mais os exportadores que fizeram operações especulativas com câmbio perdem dinheiro.

— O exportador estava apostando a favor da moeda brasileira. Quem está ganhando dinheiro são os bancos estrangeiros. Além disso, os exportadores não estão conseguindo se financiar para produzir; a exportação vai parar — disse o presidente de uma das maiores empresas brasileiras.

O BC, segundo me garantiu ontem um dos seus dirigentes, não tem qualquer compromisso em defender a queda do dólar. Não está fazendo leilões para evitar que o dólar suba, mas sim para suprir a falta das linhas de crédito internacionais para o comércio. O problema é que não tem adiantado.

Nathan Blanche, especialista em câmbio, acha que o BC tem que vender dólar líquido, em operações direcionadas aos exportadores. Com mais oferta, o dólar pode cair, reduzindo a cotação e o prejuízo das empresas.


Leram? Acreditam nisso? Durante seis anos, a senhora PIG vociferou contra o dólar baixo, dizendo que as exportações brasileiras seriam fortemente prejudicadas. Fazia, sistematicamente, previsões catastróficas para a balança comercial, que, segundo ela, não resistiria ao câmbio desfavorável. Os números sempre contradiziam suas previsões. O Brasil ampliou e ainda vem ampliando suas vendas externas mesmo com moeda forte. A razão é a enorme diversificação de nossos produtos, e a melhora da qualidade deles. Em muitos setores, como carnes, autopeças e aviões, produto brasileiro é sinônimo de excelência e o mundo aceita pagar um pouco mais caro.

Mas, como todos sabem, exportadores ganham em dólares. Quando o dólar cai, portanto, eles perdem. Eles têm resistido, nos últimos tempos, através do aumento da produtividade e redução de custo. Agora, com essa disparada do dólar, a senhora PIG quer nos convencer, na contra-mão de tudo que afirmou por anos a fio, que os exportadores terão prejuízo com a alta do dólar e cita empresários que teriam "especulado" com o câmbio.

Ora, senhora PIG, no mercado cambial existem diversas ferramentas para evitar riscos com o câmbio. São os chamados hedge, onde você faz um seguro para evitar sustos com dólar baixo ou alto. Os exportadores prudentes fazem hedge, os especuladores especulam. Há séculos que exportadores brasileiros que especulam com o câmbio acabam quebrando uma hora ou outra. Com isso, surgiu uma classe de empresários que prefere dispensar o lucro fácil e arriscado e fazer negócios de maneira mais segura e estável. Não se trata apenas de capitalismo, mas da própria vida. De valores. Concorrência. Pegue dois empresários que competem no mercado de exportação de um determinado produto. Um deles especula e procura, com o lucro, prejudicar seu concorrente, que não especula e, por isso, não pode oferecer os descontos que o outro oferece aos clientes. Quando ocorre uma crise cambial que dá prejuízo ao especulador, há uma justiça. No fundo de todo movimento, há uma justiça, uma busca pelo equilíbrio. A senhora quer defender os especuladores? E ainda afirmar que os exportadores estão perdendo dinheiro com o dólar alto? Ora, o dólar está pouco mais de R$ 2. Há seis anos era R$ 4!!!! O exportador que não especulou, ao contrário, poderá ganhar muito mais com o dólar alto, pela razão óbvia de que o preço de seu produto é cotado em dólar.

A ideologia vendida por nossa mídia é estarrecedora. Dinheiro para melhorar salários e assistência social é considerado "aumento de gastos". Mas sempre que o governo acena com empréstimos paternalistas (ou mesmo doações, sob o título de pacote anti-crise sistêmica), os mesmos colunistas e editorialistas reagem com indisfarçável entusiasmo.

E ontem (ou anteontem) Arnaldo Jabor comete mais uma fraude jornalística. Diz que o governo Lula não se preparou para a atual crise financeira americana. Naturalmente, sob patrocínio da família Marinha, usa o palanque para fazer propaganda ideológica do PSDB e do governo FHC. O país, sob a tutela de FHC, acumulou uma trilionária dívida pública externa e interna quase inteiramente atrelada ao dólar. Se a crise fosse hoje, o Brasil, literalmente, teria sua espinha dorsal rompida. Lula não só pagou inteiramente a nossa dívida externa, como desdolarizou a dívida pública interna. O que temos hoje são reservas internacionais em dólar, de forma que, com a alta da moeda americana, nossas reservas dispararam. Ou seja, estamos com mais dinheiro hoje do que antes da crise. A bolsa de SP despencou, mas bolsa é para isso mesmo, para subir e descer.

Sou contra qualquer ajuda a bancos, pequenos, médios ou grandes. Eles que se virem sozinhos. Se é para haver ajuda, então que se estatize ou se transfira ações e carteiras de clientes para o Banco do Brasil. É um absurdo que, num país onde existem ainda milhões de pessoas se alimentando mal e onde o principal programa assistencial, o Bolsa Família, distribui um valor irrisório para as famílias (máximo de 120 reais), de R$ 17 a R$ 107, uma ninharia tão acidamente criticada pelos segmentos conservadores, os mesmos segmentos agora venham defender ajuda para especuladores que se deram mal na bolsa de valores.

O dinheiro da bolsa não desaparece. Os valores migram para outros segmentos: para imóveis, terras, ouro, indústrias de base, para títulos públicos (ou seja para os governos). O estouro da bolha é sempre benéfico para as economias reais. Os fundamentos da economia global não são apostas financeiras, mas a produção de tecnologia, aço, soja, petróleo, alimentos, autopeças. A crise financeira global tem uma razão de ser e será benéfica para desmistificar o poder dos mercados. A civilização não pode depender de mercados de risco, não pode depender de bolsa. Precisamos de governos fortes. Precisamos de organizações internacionais fortes que não estimulem a especulação e sim os fundamentos de cada economia.

O Brasil seguramente sairá mais fortalecido dessa crise, porque a sua economia é diversificada e possui um mercado interno suficiente para viver autonomamente. Se o mundo inteiro acabasse e só restasse o Brasil, teríamos alimentos, petróleo, água, minério de ferro, suficientes para toda a eternidade. Teríamos um déficit de tecnologia que a necessidade nos obrigaria a superar rapidamente. A civilização humana evolui aos trancos, superando dificuldades. A crise financeira americana, para começo de conversa, representa um tremendo desgaste ideológico para o tipo de capitalismo lobbista, mafioso, privatista e concentrador, um capitalismo aqui defendido pelo PSDB e DEM, que produz monstros como Daniel Dantas. No capitalismo neo-con, bancos e especuladores têm cada vez mais liberdades e o cidadão comum cada vez menos. É uma fraude ideológica, assim como foi o governo FHC. Falavam em reduzir impostos, mas foram os tucanos, assim como Bush nos EUA, que patrocinaram o maior aumento da carga tributária da história recente do Brasil. A carga tributária brasileira passou de 25,09% em 1993, último ano do governo anterior à FHC, para 35,53% em 2002, último ano da gestão tucana. Um aumento de 42%! Já sob Lula, a carga tributária passou dos já citados 35,53% em 2002 para 37,37% em 2005 (último ano apurado pela Receita), aumento de 5%. Quem aumenta mais imposto?

Bush faz a mesma coisa. Prega o Estado mínimo e redução de gasto, e patrocinou o maior aumento de gastos públicos da história norte-americana, com a guerra contra o terror, e a guerra contra o Iraque. FHC fez aqui também. Os tucanos falam em redução de gastos públicos, mas o Estado nunca gastou tanto como em sua gestão - com a diferença que não gastavam com melhores salários, programas sociais, programas industriais, estradas, hidrelétricas, prospecção de petróleo no fundo do mar e financiamento à agricultura familiar, como faz Lula. Não, o governo gastava tudo com juros de dívida pública, doação aos bancos e para cobrir o rombo financeiro de sua política cambial incompetente. O neo-liberalismo é um capitalismo para enganar trouxas, leia-se classe média, que nunca sofreu tanto como sob sua batuta. A única vantagem que o neo-liberalismo proporciona à classe média é que ele ferra tanto mas tanto os pobres, que esses não têm condições de disputar com ela o mercado de trabalho, sobretudo as vagas no serviço público. Por outro lado, o neo-liberalismo não respeita o serviço público - veja a humilhação que o governo de São Paulo impõe a seus servidores, pagando-lhes os piores salários do país, mesmo sendo o Estado mais rico.

Muito boa essa resposta...

Carta aberta ao Wianey Carlet!

O jornalista Wianey Carlet, em uma de suas crônicas esportivas, pediu cadeia para os torcedores colorados que fizerem foguetório no hotel em que se hospedará o Boca Jrs, por ocasião do jogo da Sul-americana contra o INTER.
O colorado Ronald Miorin dirigiu essa carta a ele:

"Prezado Jornalista,
Tenho acompanhado, com atenção, tuas publicações a respeito da iniciativa de alguns torcedores colorados de arrecadar dinheiro para adquirir fogos de artifício que serão usados para perturbar o sono dos jogadores do Boca Juniors na véspera da partida contra o Internacional. Sou obrigado a confessar: fico triste ao ler sobre a tua pretensa indignação e mais triste ainda ao ver teu ridículo pedido de providências às autoridades policiais. Sim... fico triste... porque a hipocrisia me entristece, e a ignorância me entristece muito mais...Mas vamos ao que interessa:
Em primeiro lugar (e te digo como advogado que sou), perturbar o sossego alheio com fogos de artifício não é crime, nem contravenção. A contravenção só existe (e esse É o texto da lei de 1940) se a perturbação é feita no exercício de atividade profissional, com gritos e algazarra ou com emprego de aparelhos sonoros ou instrumentos musicais. Goste tu, ou não, atirar foguetes não é proibido pelas leis brasileiras.
Em segundo lugar (e agora te falo como torcedor), essas práticas fazem parte da cultura do futebol. Acordar o adversário na véspera do jogo, atrasar a entrada do time em campo, vaiar o toque de bola do time visitante, demorar a reposição da bola quando o time da casa está ganhando e todas as outras pequenas falcatruas futebolísticas fazem parte da cultura do futebol. Desde que não sejam violentas (e me parece que o barulho incomoda, mas não agride, nem machuca), essas condutas são socialmente aceitas.Te digo mais. É tudo isso que transforma o futebol (de simples esporte que é) nessa imensa emoção mundial. Emoção, aliás, que paga o teu salário.
"É verdade! Não é o Inter, o Grêmio, o Clemer, o Vítor, o Ronaldinho Gaúcho, o Fernandão ou o Dunga que te sustentam, mas os milhares de torcedores do Inter e do Grêmio que, todos os dias, compram o jornal em que tu escreves besteiras e escutam a rádio onde tu destilas tuas fracas opiniões. E só fazem isso porque o futebol emociona, alegra e perturba. É claro que tu sabes disso. O jornal em que tu escreves reserva uma página para as notícias mundiais. Uma página diária para tratar da fome, das guerras, das eleições, das melhores e das piores coisas que acontecem no mundo inteiro. Para o futebol, esse teu mesmo jornal dedica cinco ou seis páginas. Há um analista de economia e dez "comentaristas de futebol" como tu... pessoas que ganham salários para opinar se o Vítor saiu mal do gol, se o D'Alessandro é melhor que o Fernandão ou porque o Dunga deve cair ou ser mantido no comando da seleção. Acho que vais concordar comigo que precisa muito pouca inteligência para opinar sobre um assunto desses. Mas apesar de saberes tão pouco, tu ganhas bem, és reconhecido e, eventualmente, até respeitado. E tudo porque tratas do futebol.
Vamos ser sinceros: no dia em que o futebol perder o encanto, ninguém mais vai comprar Zero Hora, e tu vais ter que trabalhar. Então, aceite o conselho do Gordo: arrume outro assunto para preencher tua coluna... deixe o futebol ser como sempre foi... estás velho demais para carregar sacos no porto ou catar latas para reciclagem.
Do seu leitor e ouvinte, Ronald "Gordo" Miorin.
PS: Se tiveres oportunidade, peça ao Coronel Mendes explicar porque há tão pouco policialmento ostensivo em Porto Alegre, porque furtam e roubam tantos carros e porque faltaram brigadianos para policiar as eleições de São Francisco de Assis, se ele tem tempo e recursos para se preocupar com torcedores e foguetes. "

Silvério Pessoa - Bate O Mancá: O Povo dos Canaviais (2000)




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