quarta-feira, 13 de março de 2013


“Pastor das trevas” e direitos humanos

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Por Altamiro Borges

Milhares de pessoas participaram ontem (9) de uma passeata em São Paulo – da Avenida Paulista até a Praça Roosevelt – em protesto contra a indicação de Marco Feliciano (PSC-SP) para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara Federal. A rejeição ao deputado – que já foi batizado nas redes sociais de “pastor das trevas” – saiu da internet para ganhar as ruas. De acordo com a Polícia Militar, o ato reuniu “entre 800 e 1.200 pessoas”. Já para os organizadores, ele contou com milhares de ativistas.

Segundo Igor Carvalho, da revista Fórum, “aos gritos de ‘racista, ladrão, cadê a solução’ e ‘se até o papa renunciou, Feliciano, sua hora já chegou’, representantes de diversos movimentos sociais, com forte predominância dos ativistas da causa LGBT, chegaram a deitar nas quatro faixas da Rua Consolação, parando o trânsito... ‘Somos, aqui, com certeza umas 20 mil pessoas protestando contra essa vergonha nacional, contra essa anomalia que é a eleição de Marcos Feliciano’, disse Daniel de Ogum, um dos organizadores”.

“Fatos novos” podem reverter a eleição

Também ocorreram protestos no Rio de Janeiro e Brasília. Pelas redes sociais, que coletaram 70 mil assinaturas numa petição contra a eleição do deputado/pastor em apenas um dia, novos atos estão sendo agendados para os próximos dias. Diante da forte resistência, até o presidente da Câmara Federal, deputado Henrique Eduardo Alves, já admitiu a hipótese de reverter a decisão, caso surjam “fatos novos... A Câmara poderá avaliar a situação da comissão, mas respeitando o direito de cada parlamentar e de cada partido”, afirmou.

O próprio Marco Feliciano já sentiu o baque da rejeição. Em entrevista hoje à Folha, ele tentou posar de vítima e anunciou que pedirá proteção policial. “A situação está tomando dimensões muito estranhas. É assustador, estou me sentindo perseguido como aquela cubana lá. Como é o nome? A Yoani Sánchez”, choramingou. Mesmo assim, ele garantiu que não renunciará ao cargo. “Não estou preocupado” com os protestos. Maroto, ele ainda jogou a culpa por sua eleição no PT, que abriu mão da presidência do CDHM.

Eleição tumultuada e STF

Marco Feliciano foi eleito presidente da CDHM na quinta-feira (7). Ele teve 11 votos dos 18 possíveis – um deputado votou em branco e outros seis abandonaram a sessão. A votação foi feita às portas fechadas, mas houve protestos de um grupo de ativistas a sua escolha. Quem saiu em sua defesa foi o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que na semana anterior ciceroneou a dissidente cubana Yoani Sánchez. Aos berros, ele extravasou seus instintos fascistas, chamando os manifestantes de “baderneiros” e gritando “vão para o zoológico”.

O pastor só chegou ao cargo devido ao rodízio entre os partidos nas várias comissões existentes na Câmara. O Partido Social Cristão bancou a provocação ao indicá-lo e agora é alvo de uma enxurrada de críticas. Diante da manobra do PSC e de uma parte da bancada evangélica, o deputado Domingos Dutra (PT-MA), que presidia a comissão, abandonou a reunião, juntamente com as parlamentares do PT, PSOL e PSB. O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) já anunciou que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a eleição.

Racista, homofóbico e direitista

A eleição de Marco Feliciano para presidir a CDHM é uma verdadeira aberração. O deputado é conhecido por suas posições racistas e homofóbicas. Pela sua conta na twitter, ele já escreveu que “os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé” e que “a podridão dos sentimentos dos homoafetivos leva ao ódio, ao crime, à rejeição”. Ele chegou a afirmar que a ex-senadora Marta Suplicy e a deputada Érica Kokay, defensoras do projeto de lei que criminaliza a homofobia, “são mulheres com sexualidade distorcida".

O pastor também é alvo de um processo por estelionato. Num culto gravado em vídeo, ele reclamou de um fiel que entregou o cartão do banco, mas não revelou a senha. Sua visão preconceituosa explica o apoio dado a José Serra nas eleições do ano passado. “Serra merece mais que respeito, merece admiração. É um guerreiro”, escreveu no twitter. Para ele, o tucano seria o único capaz de derrotar “a militância dos gays, a militância do povo que luta pelo aborto, a militância dos que querem descriminalizar as drogas”.

Um pacto nefasto: ruralistas e evangélicos rifando o meio ambiente e os direitos humanos



(Este texto vai ter exatamente o tamanho de 8% de bateria do notebook por conta da falta de energia elétrica que se abateu, novamente, sobre o meu bairro após a chuva da noite deste sábado.)

Com exceção dos fanáticos religiosos que enxergam sinais da primeira ou da segunda vinda do messias (dependendo se a religião em questão não permite comer X-Burguer ou abraça o consumismo para celebrar o nascimento do seu deus), apenas os mais míopes não percebem que o planeta está dando o troco.
Eu sei que já falei disso aqui antes, mas em tempos de fundamentalismo cristão no Congresso Nacional e de chuvas torrenciais na cidade de São Paulo, o assunto segue novo.
Não estou falando apenas do aquecimento global e das já irreversíveis mudanças climáticas através dos quais ajustamos o termostato do planeta para a posição “Gratinar os Idiotas Lentamente”, mas também dos crimes ambientais que fomos acumulando debaixo do tapete e que, agora, tornaram-se uma montanha pronta a nos soterrar. No campo e nas cidades.
Muitos falam de tragédias como se fossem situações desconectadas da ação humana, resultados da fúria divina e só. Não foi Deus quem colocou Marco Feliciano onde está, ao contrário do que parte de seus fieis acredita. Ele não foi ungido pelo divino, mas sim por milhares de votos paulistas, conscientes ou não.
Da mesma forma, um prefeito de uma cidade atingida pelas chuvas, anos atrás, disse que só restava a ele rezar para Deus controlar as águas. Bem-feito para a população que votou nele e viu o administrador do município “terceirizando” o trabalho para o plano superior, provavelmente dando continuidade ao que foi feito pelos que vieram antes dele.
A declaração é da mesma escola daquela de um assessor de George W. Bush quando questionado se a herança deixada às próximas gerações pelos gases causadores do efeito estufa da indústria norte-americana não poderia ser nefasta. Não me lembro da frase exata, porque lá se vão anos, mas foi algo do tipo: “não será um problema, porque Cristo voltará antes disso”. Salve, aleluia, salve!
Não é à toa que uma das mais estranhas e, ao mesmo tempo, mais brilhantes alianças políticas no parlamento brasileiro seja entre a bancada evangélica e a bancada ruralista. De um lado, os fieis ajudam a garantir a manutenção de um desenvolvimento a qualquer preço, passando por cima do meio ambiente, como se não houvesse amanhã. Do outro, os fazendeiros contribuem para que os direitos humanos sejam rasgados diante de uma visão distorcida de religião, garantindo que não haja mesmo um amanhã.
Tendo em vista todo esse negacionismo maluco, um renomado cientista declarou, pouco antes de uma das cúpulas do clima, que era melhor então deixar os fatos tomarem seu curso natural, o mundo aquecer, refugiados ambientais quadruplicarem, cidades nos países ricos serem invadidas pelo mar, a fome surgir no centro do mundo, guerras ambientais ocorrerem. Só assim pessoas e países tomariam atitudes reais. Situação que, no Brasil, é vulgarmente conhecida como “a hora em que a água bate na bunda”.
O problema é que, se nada for feito até lá, quando chegarmos nesse ponto, talvez não haja mais bunda para salvar.
É irônico que, de certa forma, o desespero diante do caos ambiental (fomentado pelos ruralistas ao derrubarem o Código Florestal), daqui a algumas décadas, irá contribuir para trazer mais fieis a igrejas. Pois só restará lamentar. Ou rezar.
Enquanto isso, a maioria segue escondida no conforto do anonimato, defendendo o seu, fazendo meia dúzia de ações insignificantes para dormir sem o peso da consciência e o resto que se dane. Não querem mudanças no modelo de desenvolvimento que impactaria o “American Way of Life” que importamos, apenas reciclar latinhas de alumínio e dar três descargas a menos no vaso sanitário por dia. Da mesma forma, não se importam com quem for eleito, desde que isso não atrapalhe o seu final de semana na praia. Afinal de contas, não precisam de um Estado que lhes garanta um mínimo de dignidade, uma vez que nasceram brancos, heterossexuais, ricos, enfim, o que convencionamos chamar de “cidadãos de bem”.
E seguem respondendo de boca cheia que fariam de tudo para ajudar o meio ambiente e defender a liberdades das pessoas.