sexta-feira, 30 de abril de 2010

O agronegócio e a exploração da terra....

O monopólio da terra e a produção de agrocombustíveis
 
A principal mudança na oligarquia rural no Brasil tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis
 
Por Maria Luisa Mendonça na Caros Amigos
 
Os velhos usineiros, agora travestidos de empresários “modernos”, em conseqüência da propaganda sobre as supostas vantagens do etanol brasileiro, intensificam suas campanhas internacionais para vender o produto. Recentemente, ganharam um reforço especial com o anúncio do governo sobre acordos trabalhistas e de zoneamento ambiental. Porém, um breve relato sobre as principais tendências do setor é suficiente para mostrar que essas são apenas medidas de fachada.
 
As características que historicamente marcaram a oligarquia rural no Brasil permanecem inalteradas. Ou seja, o monopólio da terra, a exploração do trabalho e de recursos naturais estratégicos. A principal mudança tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis. Há alguns anos, verifica-se um aumento do ritmo de aquisições no setor sucro alcooleiro, com crescimento na participação de empresas estrangeiras e aumento na concentração do poder econômico de determinados grupos.
 
Dados do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool e Açúcar de Minas indicam que a participação de empresas estrangeiras na indústria da cana no Brasil cresceu de 1% em 2000 para 12% na safra 2007/2008. Outro levantamento da Pricewaterhouse Coopers revela que existem cerca de 450 usinas no Brasil, controladas por 160 empresas nacionais e estrangeiras, e que o controle estrangeiro chegaria a 15%, incluindo participação acionária em grupos nacionais. De acordo com estudo do grupo KPMG Corporate Finance, de 2000 a setembro de 2009, ocorreram 99 fusões e aquisições de usinas no Brasil. Entre estas, 45 negociações aconteceram no período de 2007 a 2009 e em 22 casos ocorreu a compra de uma usina nacional por um grupo estrangeiro.
 
Maiores produtores
Em outubro de 2009, a empresa francesa Louis Dreyfus Commodities anunciou a compra de cinco usinas da Santelisa Vale, de Ribeirão Preto (SP), para aumentar sua produção de cana no Brasil. A fusão criou o grupo LDC-SEV Bioenergia, tornando-se o segundo maior produtor mundial de açúcar e etanol. O grupo pretende produzir 40 milhões de toneladas de cana-deaçúcar por ano e tem participação acionária das famílias Biaggi e Junqueira, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do banco Goldman Sachs. Essa fusão aumenta para 20% a participação de empresas estrangeiras no setor.
 
Uma nova característica da indústria do etanol, se comparada ao Pró-Alcool da década de 1970, é a aliança entre setores do agronegócio com empresas petroleiras,  automotivas, de biotecnologia, mineração, infra-estrutura e fundos de investimento. Nesse cenário, não existe nenhuma contradição desses setores com a oligarquia latifundista, que se beneficia da expansão do capital no campo e do abandono de um projeto de reforma agrária.
 
Em 2009, a empresa petroleira britânica British Petroleum (BP) anunciou que irá produzir etanol no Brasil, com investimento de US$ 6 bilhões de dólares nos próximos dez anos. A BP irá atuar por meio da Tropical Bioenergia, em associação com o Grupo Maeda e a Santelisa Vale, em Goiás, que contam com uma área de 60 mil hectares para a produção de cana no estado.
 
Em julho de 2009, a Syngenta divulgou a aquisição de terras para produzir mudas de cana-deaçúcar na região de Itápolis (SP). O projeto inclui a produção de mudas transgênicas e pretende se expandir para outros estados, como Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul.
 
Concentração empresarial
No início de 2010, ocorreram novas fusões. Em janeiro, a multinacional agrícola Bunge anunciou a compra de quatro usinas do Grupo Moema, incluindo a usina Itapagipe, que tinha participação acionária de 43,75% da empresa norte-americana Cargill. Com a negociação, a Bunge passará a controlar 89% da produção de cana do Grupo Moema,
estimada em 15,4 milhões de toneladas por ano.
 
Em fevereiro, foi anunciada a fusão da ETH Bioenergia, do grupo Odebrecht, com a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), que pretende se tornar a maior empresa de etanol no Brasil, com capacidade para produzir três bilhões de litros por ano. Alguns dos acionistas da Brenco são Vinod Khosla (fundador da Sun Microsystems), James Wolfensohn (ex-presidente do Banco Mundial), Henri Philippe Reichstul (ex-presidente da Petrobras), além da participação do BNDES. Já a Odebrecht tem sociedade com a empresa japonesa Sojitz. O novo grupo irá controlar cinco usinas: Alcídia (SP), Conquista do Pontal (SP), Rio Claro (GO), Eldorado (MS) e Santa Luzia (MS).
 
O conglomerado ainda participa da construção de um alcoolduto entre o Alto Taquari e  o porto de Santos, e pretende instalar usinas na África. A empresa pretende captar R$ 3,5 bilhões até 2012, dos quais pelo menos 20% virão do BNDES, além de outros R$ 2 bilhões que o banco já investiu anteriormente na Brenco.
 
Nessa mesma linha, em fevereiro de 2010, a gigante petroleira holandesa Shell anunciou uma associação com a Cosan para a produção e distribuição de etanol, com o objetivo de produzir quatro bilhões de litros até 2014. Ao divulgar a operação, a nota da Shell afirmava que pretende criar “um rio de etanol, correndo desde as plantações no Brasil até a América do Norte e a Europa”. Apesar da repercussão internacional da prática de trabalho escravo na Cosan, a empresa segue como líder no setor.
 
Seguindo essa tendência, a Vale anunciou que pretende produzir diesel a partir do óleo  de palma na região amazônica a partir de 2014, por meio de uma parceria com a empresa Biopalma da Amazônia S.A. A intenção é produzir 500 mil toneladas de óleo de palma por ano. Parte do combustível será utilizada nas locomotivas da estrada de ferro e nas minas de Carajás, no Pará.
 
Monocultivo da cana
Em relação ao avanço territorial do monocultivo de cana, dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) mostram que, em 2006, eram 4,5 milhões de hectares e, em 2008, chegaram a 8,5 milhões de hectares. Na safra de 2009 houve um aumento de 7,1% em relação a 2008.
 
Essa expansão é estimulada por recursos públicos. Entre 2008 e 2009, estima-se que o setor sucroalcooleiro tenha recebido mais de R$ 12 bilhões do BNDES. Essa verba é extraída, em grande medida, do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Segundo a CONAB, 45,08% da safra foi destinada à produção de açúcar e 54,9%, à produção de etanol, que resultou em 25,87 bilhões de litros do produto. A expansão da área plantada foi de 6,7%, ou cerca de 473 mil hectares. A maior expansão ocorreu na região do Cerrado, principalmente em Mato Grosso do Sul (38,80%) e Goiás (50,10%).
 
Dados do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da Universidade Federal de Goiás, indicam que o ritmo atual de desmatamento do Cerrado poderá elevar de 39% para 47% o percentual devastado do bioma até 2050. A pesquisa demonstra ainda que a destruição do Cerrado coloca em risco a disponibilidade de recursos hídricos para o Pantanal e a Amazônia, pois esses biomas estão interligados.
 
Trabalho escravo
As usinas de cana se tornaram campeãs em trabalho escravo nos últimos anos. De acordo com dados da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2007, dos 5.974 trabalhadores resgatados da escravidão no campo brasileiro, 3.060 ou 51%, foram encontrados no monocultivo da cana-de-açúcar. Em 2008, dos 5.266 resgatados, 2.553, ou 48% dos trabalhadores mantidos escravos no país estavam em plantações de cana. De janeiro a junho de 2009, o número era de 951 trabalhadores, que representavam 52% do total. Ao final de 2009, o Ministério do Trabalho registrou a libertação de 1.911 trabalhadores nas usinas de cana nos estados de Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
 
Em 2009, o Ministério do Trabalho inclui grandes usinas na chamada “lista suja” do  trabalho escravo. Uma delas foi a Brenco, que tem participação acionária de 20% do BNDES. Entre 2008 e 2009, o BNDES liberou R$ 1 bilhão para usinas da Brenco em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Ao mesmo tempo, o Grupo Móvel expediu 107 autos de infração contra a empresa, que é presidida pelo ex-presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul. Apesar da prática de trabalho escravo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, anunciou a continuidade do financiamento para a Brenco.
 
Em 31 de dezembro de 2009, foi a vez do grupo Cosan – a maior empresa do setor sucroalcooleiro do país, com produção anual de 60 milhões de toneladas de cana. Apesar da prática de trabalho escravo, a Cosan recebeu R$ 635,7 milhões do BNDES em junho de 2009, para a construção de uma usina de etanol em Goiás. O BNDES manteveo financiamento para a Cosan, mesmo após a evidência de trabalho escravo. A Cosan possui 23 usinas, controla os postos da Exxon (Esso do Brasil) e teve um faturamento de R$ 14 bilhões de reais em 2008.
 
Em outubro de 2009, o Grupo Móvel libertou 55 trabalhadores escravizados na Destilaria Araguaia (chamada anteriormente de Gameleira), no Mato Grosso. Segundo o auditor fiscal Leandro de Andrade Carvalho, que coordenou a operação, os trabalhadores estavam sem receber salário há três meses. Essa foi a terceira libertação realizada em oito anos na mesma usina. A Destilaria Araguaia pertence ao Grupo Eduardo Queiroz Monteiro (EQM) – um grande conglomerado econômico com sede em Pernambuco. O grupo controla outras usinas em Pernambuco, Tocantins e Maranhão,
além de participar como acionista em veículos de comunicação, como o jornal Folha de Pernambuco, a Rádio Folha de Pernambuco, Folha Digital de Pernambuco e Agência Nordeste.
 
Em junho de 2009, fiscais do Ministério do Trabalho e do Ministério Público  detectaram irregularidades em usinas fiscalizadas na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, entre elas a Bazan, Andrade, Central Energética Moreno Açúcar e Álcool, e Nardini Agroindustrial. As usinas não forneciam equipamento adequado (como luvas, sapatos e caneleiras) e foram constatadas irregularidades no pagamento da jornada de trabalho.
 
Os trabalhadores declararam que cortam cerca de 20 toneladas de cana por dia. Os fiscais também registraram condições precárias de moradia, como superlotação, locais com risco de incêndio e falta de condições de higiene.
 
Ainda em 2009, o Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu uma liminar que obriga a usina São Martinho, em Limeira (SP), a corrigir irregularidades trabalhistas. Durante fiscalizações nas safras de 2007 e 2008, o MPT constatou a falta de equipamentos de proteção, de segurança no trabalho, de cuidados médicos, de condições de higiene e de alimentação adequadas. A ação judicial inclui ainda a condenação da empresa ao pagamento de R$2 milhões aos trabalhadores por dano moral.
 
Para ler a reportagem completa e outras matérias confira a edição de abril da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.


 

Cidadão Boilesen (2009)



Do Blog DocVerdade


(Brasil, 2009, 92min - Direção: Chaim Litewski)
Finalmente na Web!
 
Estivemos presentes no festival "É Tudo Verdade", no CCBB em Brasília, e vimos o ganhador do prêmio de melhor documentário nacional - "Cidadão Boilesen", que conta o envolvimento da classe empresarial brasileira com o pior dos anos de chumbo da ditadura Brasileira.
Henning Boilesen, figura representativa na alta roda paulistana, carismático, presidente do grupo Ultra (Ultragás) participou ativamente (inclusive presencialmente) na OBAN (Operação Bandeirante) que visava aniquiliar qualquer forma de pensamento que discordasse da ditadura.
O filme mostra que ele, assim como empresários da Camargo Correa, Folha de São Paulo, entre muitos outros, financiaram a repressão, que torturou e assassinou estudantes, professores e militantes de esquerda no Brasil.
Boilesen, diferentemente de quase todos, foi punido, sendo assassinado pelos militantes do MRT e ALN.

Um documentário excepcional e imperdível.
(Sinopse original do docverdade)


Torrent

Agradecemos a Diego P. pela indicação do Link do torrent

O Irã, o Brasil e ‘a bomba’

Pepe Escobar: O Irã, o Brasil e “a bomba”

30/4/2010, Pepe Escobar, “The Roving Eye”, Asia Times Online
http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/LD30Ak01.html

tradução de Caia Fittipaldi no Viomundo

O ministro das Relações Exteriores do Brasil Celso Amorim foi tão polido quando preciso e claro, em conferência conjunta de imprensa, ao lado de seu contraparte Manouchehr Mottaki em Teerã nessa 5ª.-feira. Amorim disse que “o Brasil está interessado em participar de uma solução apropriada para a questão nuclear iraniana.”
“Apropriada” é palavra em código para “dialogada” – não uma quarta rodada de sanções lançada pelo Conselho de Segurança da ONU, muito menos a opção militar, que o governo Barack Obama insiste, com estridência, em manter à mesa. Assim, ao posicionar-se como um mediador em busca de solução pacífica, o governo brasileiro põe-se em rota de colisão “soft” com o governo Obama.
O presidente Luiz Inacio Lula da Silva do Brasil estará em visita a Teerã, mês que vem. Aos olhos dos falcões do “pleno espectro de dominação” nos EUA, é anátema. Tanto quanto para a ‘mídia’ ocidental de direita, veículos brasileiros inclusos, que não se cansam de martelar Lula, non-stop, por sua iniciativa de política exterior.
Pouca diferença faz que, mais uma vez, Amorim tenha repetido, com destaque, que absolutamente não há consenso na chamada “comunidade internacional” quanto a isolar Teerã. “Comunidade”, mais uma vez nesse caso significa Washington e uns poucos países europeus. O Sul global vota pelo diálogo. O Movimento dos Não-alinhados [ing. Non-Aligned Movement (NAM)] é unanimemente contrário a mais sanções. O Grupo dos 172 (todos os países exceto o Grupo dos 20) é também contra mais sanções.
O Brasil e a Turquia, ambos contrários a novas sanções, ocupam atualmente lugares não-permanentes no Conselho de Segurança da ONU. A posição de ambos é idêntica, em essência, à de China e Rússia – que são membros permanentes do Conselho de Segurança. A tática russa de nada deixar transpirar, e a da China, que concordou com “discutir” pacotes de sanções, têm sido distorcidas e mal interpretadas pela mídia corporativa e vendidas como se esses países estivessem aceitando as exigências de Washington.
Não aceitaram. No encontro dos BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) em Brasília, há menos de duas semanas, esses países mais uma vez definiram que a ‘solução’ de novas sanções não é solução, e repetiram que toda a questão deve ser decidida pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA).
Em Teerã, Mottaki e Amorim também discutiram a proposta iraniana de troca de combustível nucelar, como “medida para construir confiança” que beneficiaria o Irã, em relação a Washington e capitais europeias. O Brasil ofereceu-se para enriquecer urânio para o Irã.
O problema é que a nova rodada de sanções está sendo discutida em New York exclusivamente entre os cinco membros permanentes mais a Alemanha – e só depois dessa fase a discussão será aberta aos membros não permanentes, como Brasil, Turquia e Líbano, que mês que vem assumirá o assento rotativo do Conselho de Segurança.
O xis da questão
Cada ator tem suas próprias razões para opor-se às sanções. Moscou – que já fornece ao Irã tecnologia de reatores nucleares, além de armas –, sabe que, mais cedo ou mais tarde Washington terá de aceitar o óbvio; que o Irão, produtor chave de energia, é uma potência regional natural. Para Pequim, o Irã é assunto de segurança nacional energética; mais sanções põem sob risco a estabilidade regional e caem na categoria de delírios-desejos da secretária de Estado Hillary Clinton.
Nova Delhi dificilmente não terá visto, até agora, que, no Afeganistão, Washington embarcou em aliança sem volta com Islamabad; a Índia, portanto, precisa de um Irã estável como contrapoder, para enfrentar a influência do Paquistão no Afeganistão, onde o Paquistão pode, outra vez, reengajar os Talibã. Brasília quer expandir os negócios com Teerã; e Lula, por sua vez, não abre mão da ideia de que mais sanções só farão abrir caminho para mais guerra, não para evitar guerras.
Os diplomatas, na mais recente reunião dos BRICs, tocaram no xis da questão. Os líderes dos BRICs – o poder atual, novo, multipolar que seriamente se tem dedicado em manter sob xeque as ambições de hegemonia dos EUA – avaliaram atenta e cuidadosamente todos os sinais complexos, desde a carta “secreta” do supremo do Pentágono Robert Gates a Obama, em janeiro passado, na qual revisa as opções militares “que continuam à mesa” contra o Irã, até o discurso do almirante Mike Mullen, da Junta de Comando do Estado-maior, na Columbia University, que disse que o ataque sempre seria sua “última escolha”. Avaliaram o nível de ansiedade de Washington. E concluíram que os EUA não atacarão o Irã.
Talvez estejam errados. Por trás de espessa cortina de espelhos e fumaça na mídia corporativa, há furiosa luta de gatos em curso em Washington, entre os ativistas do “espectro de plena dominação” – desde is militares ao pessoal do Instituto “American Enterprise”. Mas só discutem uma coisa: quando atacarão o Irã, ou mais cedo, ou mais tarde.
Entre os falcões está decidido que Washington jamais permitirá ao Irã “adquirir capacidade nuclear”. É o mesmo que falar de guerra preventiva. O “crime” do Irã, até aqui, teria sido já ter um programa de energia nuclear aprovado pelo Tratado de Não-proliferação e inspecionado como se ante o juiz do Juízo Final.
Nesse cenário de ansiedade altíssima, não importa que o Líder Supremo do Irã aiatolá Ali Khamenei tenha recentemente pregado o total desarmamento global e repetido sua fatwa, contra, até, o uso de armas de destruição em massa. São haram (proibidas) nos termos da lei islâmica.
O Pentágono, via Gates, insiste na ofensiva – ameaçando o Irã com uma explícita “todas as alternativas continuam à mesa”, quer dizer, bomba atômica incluída; e Obama, em obra prima de duplifalar orwelliano, acrescentou que os EUA “manteremos nosso [poder nuclear] de contenção”, como “incentivo” para Irã e Coreia do Norte. Incentivo ao suicídio seppuku, quem sabe?
Assim sendo, o que acontecerá?
Mês que vem, em New York, haverá nova revisão do Tratado de Não-proliferação. O governo Obama já começou a pressionar o Brasil para que aceite um protocolo adicional. O Brasil recusou.
Na essência, o Tratado de Não-proliferação é extremamente assimétrico. Nações que pertençam ao clube da bomba atômica recebem tratamento VIP, em relação aos demais. O protocolo adicional aumenta ainda mais essa discriminação – e dificulta até a pesquisa para finalidades pacíficas, nas nações não-nucleares.
O Brasil que – diferença crucial nesse contexto – ostenta tradição pacifista – defende o direito de qualquer país soberano adquirir “capacidade de tecnologia nuclear”. Foi onde o Irã subiu ao barco, conforme todas as evidências disponíveis. Assim sendo, o Brasil está em evidente rota de colisão com Washington, no que tenha a ver com o Tratado revisto de Não-proliferação. Para Brasília, seria submeter-se à interferência estrangeira.
Quanto às sanções, Washington precisa cair na real. Acreditar que os BRICs ou países da Ásia ou Europa deixarão de comprar gás e petróleo do Irã; que não venderão gasolina ao Irã, e que os bancos iranianos não encontrarão meios de continuar a operar na economia global (eles têm parceiros, por exemplo, nos Emirados Árabes Unidos e na Venezuela) é viver no País das Maravilhas.
As majors chinesas do petróleo já vendem gasolina diretamente ao Irã. Em 2012, o Irã terá dobrado a produção de gasolina, depois de expandir 10 refinarias, e está investindo cerca de 40 bilhões na construção de sete novas refinarias. O Irá continuará no negócio dos produtos do petróleo – principalmente com as “stans” da Ásia Central. O que mostra, por exemplo, que pode importar gasolina contornando o sistema bancário internacional.
E, sobretudo, há o mercado negro. Jordânia e Turquia contrabandeiam rios de petróleo para fora do Iraque ‘sancionado’ durante os anos 90s. Com novas sanções sobre o Irã, será a vez de uma nova geração de iraquianos ganharem a sorte grande. Quanto à ditadura militar do mulariato em Teerã, os mulás adorarão consumir seus lucros de energia para reforçar seu escudo protetor.
Os líderes dos BRICs – Lula entre eles – podem, sim, ter visto a estrada por trás da cortina de espelhos e fumaça. Bomba? Mas que bomba? Todos sabem que o Irã não pode fabricar uma bomba, por exemplo, em Natanz, não, com certeza, enquanto as instalações forem inspecionadas até o esqueleto descarnado pela IAEA. Suponha-se que o Irã supere a Coreia do Norte, engane todos os inspetores, dê um chapéu no Tratado de Não-proliferação e decida fabricar uma bomba em local secreto. Precisariam de quantidades enormes de água e energia – e os satélites lá estão, para ver qualquer movimentação desse tipo.
Os líderes dos BRICs já concluíram, isso sim, que Washington nada pode fazer quanto a o Irã adquirir “capacidade nuclear”, além de invadir o país, em edição conjunta remix das operações Tempestade no Deserto + Choque e Pavor, e provocar um banho de sangue para troca de regime.
Nem rodadas e mais rodadas de sanções conseguirão excluir essas opções. Bombas “de precisão” israelenses, dos EUA ou híbridas, poderão, no máximo, atrasar um pouco o processo iraniano – e, isso, sem considerar as muitas possibilidades de retaliação. Tudo isso considerado, só há uma solução viável.
Washington tem de sentar-se à mesa com Teerã com o tal “punho aberto” realmente aberto e examinar todas as opções diplomáticas, à busca de um pacote abrangente de segurança para o Oriente Médio – pacote o qual, é claro, terá de incluir a total desnuclearização; quer dizer, fim, também, para as bombas atômicas “secretas” de Israel.
Difícil, só, saber se o governo Obama – acossado pelos falcões da guerra por todos os lados – sobreviverá a esse desafio.