domingo, 25 de novembro de 2012

O Fórum Palestina Livre e o movimento sionista

 

 
Se há extremistas na Palestina, são os colonos judeus vindos da Eurásia e seus descendentes, que atacam os palestinos
 
Baby Siqueira Abrão no BRASIL DE FATO
 
Representantes do movimento sionista no Brasil tentam por vários meios impedir o brilho do Fórum Social Mundial Palestina Livre (FSMPL), que será realizado entre 28 de novembro e 1º. de dezembro de 2012 em Porto Alegre, RS. O embaixador de Israel no Brasil e uma comitiva da Federação Israelita do Rio Grande do Sul chegaram a dizer, numa reunião com Tarso Genro, temer o ataque de “extremistas” palestinos a propriedades de judeus no Brasil.
O argumento é falso e os sionistas sabem disso. Sabem também que, se há extremistas na Palestina, são os colonos judeus vindos da Eurásia e seus descendentes, que atacam os palestinos, suas casas, plantações, rebanhos, com o apoio de soldados do Exército israelense. Sabem, igualmente, que o povo palestino há muito optou pela resistência não-violenta à ocupação – esta sim, violenta – militar a que Israel o submete. O objetivo tácito das declarações dos sionistas é criminalizar mais uma vez os palestinos, para justificar os crimes que os governos de Israel cometem contra o povo nativo, semita, da Palestina.
Seja como for, os sionistas venceram em alguns pontos. Persuadiram o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, a retirar o apoio que prometera dar ao Fórum. Até mesmo o local, a Usina do Gasômetro, foi negado. O Fórum só poderá usar um andar, o térreo. Esta semana foi a vez do presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, Alexandre Postal, impedir que o FSMPL utilizasse espaços do prédio da Assembleia para a realização de algumas das mais de 100 atividades inscritas no Fórum por organizações de 36 países. O governador Tarso Genro, porém, manteve seu apoio à realização do Fórum.
Por isso mesmo, tornou-se alvo das críticas de um raivoso colunista, conhecido por suas ligações com o movimento sionista, em seu blogue numa revista que chegou a ser pautada pelo crime organizado. O colunista chegou a citar a Constituição brasileira, afirmando que Genro teria violado seu artigo 4o, sem se dar conta de que os princípios citados defendem tudo aquilo que os governos sionistas de Israel nunca observaram em relação aos palestinos: independência nacional, prevalência dos direitos humanos, autodeterminação, não intervenção, igualdade entre os Estados, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos; repúdio ao terrorismo e ao racismo, cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, concessão de asilo político. Vejam-se as resoluções das Nações Unidas sobre Israel – resoluções que o Estado sionista jamais cumpriu – e os vídeos e fotos feitos na Palestina que estão na internet para conferir as violações de Israel ao direito internacional.
A veiculação de comentários falaciosos sobre o Fórum tem o objetivo de, ao desinformar a população, tecendo críticas insensatas ao evento e ao povo palestino, colocar parte da opinião pública brasileira contra a causa palestina e suas iniciativas, bem como impedir que a narrativa palestina sobre a destruição de seu país, sobre o genocídio e a expulsão sofridos por sua população para que os sionistas pudessem criar ali um Estado, seja divulgada e conhecida pelos brasileiros.
Por ter o controle dos meios de comunicação dominantes, o movimento sionista vem divulgando há mais de 60 anos apenas a sua versão sobre a criação de Israel. A verdade, porém, é que essa versão é falsa, constituída sobre uma base histórica fantasiosa e distorcida, como provam os documentos dos próprios sionistas que foram desclassificados (liberados para conhecimento público) em meados dos anos 1970 e que corroboraram tudo aquilo que os palestinos já vinham contando sobre a catástrofe, a Nakba, que se abateu sobre eles com a chegada dos sionistas à Palestina. Um dos objetivos do FSMPL é, precisamente, dar voz à narrativa palestina, para reafirmar a justeza de sua causa: pôr fim à ocupação militar israelense e à violência que a caracteriza; ter de volta um país independente e soberano; reaver os direitos humanos básicos que lhes foram retirados por sucessivos governos de Israel; controlar seus recursos naturais e impedir a continuidade da devastação e do envenenamento de seu ambiente, hoje submetido à exploração comercial israelense e às substâncias tóxicas que o Exército de Israel atira em território palestino com mísseis e bombas que vitimizam civis inocentes; evitar a destruição de sua base econômica e de seu meio de vida – as plantações e as oliveiras –, alvos frequentes das violentas ações de colonos que vivem ilegalmente em território palestino; incrementar sua agricultura sem agredir a Natureza e buscar, de modo independente, outras formas de desenvolver sua economia, sufocada pelo controle exercido pelos governos sionistas; evitar que seu território e suas fontes de água sejam confiscados pelo governo israelense para a construção de colônias – ilegais, conforme entendimento do Tribunal Internacional de Justiça – exclusivamente habitadas por judeus, grande parte deles extremistas vindos de outros países.
Os palestinos, enfim, não exigem nada além daquilo que é garantido a todos os seres humanos – que, pelo simples fato de existirem, são portadores de direitos, assegurados pela legislação internacional. A diferença entre os palestinos e outros povos do mundo é que, no caso palestino, esses direitos são negados pelos governos sionistas de Israel. É por esse motivo que eles se mobilizam e lutam, com firmeza e dignidade, por autonomia, justiça e liberdade.
A causa palestina é hoje defendida por milhões de pessoas em todo o mundo, num movimento crescente de proteção da vida humana e da própria espécie, contra interesses financeiros que têm levado o planeta ao caos social, econômico, climático e ambiental. A sociedade civil internacional não aceita que, em pleno século XXI, um povo – o palestino – seja submetido a um regime de apartheid e de destruição de suas raízes sociais, históricas e culturais. Indivíduos e movimentos organizados em torno dos temas da paz, da justiça social, da igualdade de direitos e da autodeterminação dos povos decidiram organizar o Fórum Social Mundial Palestina Livre para pensar conjuntamente estratégias não-violentasque levem mais rapidamente ao fim da ocupação militar sionista da Palestina. Entre esses indivíduos e movimentos há judeus e israelenses inconformados com a violência e a repressão a que os governos sionistas de Israel submetem o povo palestino. O objetivo dessas estratégias é levar a uma convivência, entre os habitantes daquela parte do mundo, baseada no respeito, na tolerância, na diversidade e na paz.
Quaisquer outras coisas que digam os detratores do FSMPL não passa de propaganda sionista – a hásbara –, que procura por todos os meios deslegitimizar a causa palestina e seus milhões de apoiadores ao redor do mundo para justificar os crimes cometidos pelos governos israelenses contra a população palestina. É preciso mostrar aos sionistas que o povo brasileiro não permitirá que o Brasil seja transformado em palanque para sua pregação – uma pregação que procura criminalizar aqueles que, por estarem ao lado da justiça, dos direitos humanos, do respeito à multiculturalidade, à multietnicidade, à diversidade de crenças religiosas (e da não crença), apoiam sem restrições a causa palestina.

Baby Siqueira Abrão é correspondente do Brasil de Fato no Oriente Médio

Israel e a Operação Chumbo Impune

 



Por Eduardo Galeano, no sitio da Adital:
Para justificar-se, o terrorismo de Estado fabrica terroristas: semeia ódio e colhe álibis. Tudo indica que essa carnificina de Gaza que, segundo seus autores, quer acabar com os terroristas, conseguirá multiplicá-los.


Desde 1948, os palestinos vivem condenados à humilhação perpétua. Não podem nem respirar sem permissão. Perderam sua pátria, suas terras, sua água, sua liberdade, seu tudo. Nem sequer têm direito a eleger seus governantes. Quando votam em quem não devem votar são castigados. Gaza está sendo castigada. Converteu-se em uma ratoeira sem saída desde que o Hamas ganhou limpamente das eleições, em 2006. Algo parecido havia acontecido em 1932, quando o Partido Comunista triunfou nas eleições de El Salvador. Banhados em sangue, os salvadorenhos expiaram sua má conduta e desde então viveram submissos a ditaduras militares. A democracia é um luxo que nem todos merecem.

São filhos da impotência os foguetes caseiros que os militantes do Hamas, encurralados em Gaza, disparam com desajeitada pontaria sobre as terras que haviam sido palestinas e que a ocupação israelita usurpou. E o desespero, à beira da loucura suicida, é a mãe das bravatas que negam o direito à existência de Israel; gritos sem nenhuma eficácia, enquanto a muito eficaz guerra de extermínio está negando, há anos, o direito à existência da Palestina.

Já resta pouca Palestina. Passo a passo, Israel vai apagando-a do mapa.

Os colonos invadem, e atrás deles os soldados vão corrigindo a fronteira. As balas sacralizam o despojo, em legítima defesa.

Não há guerra agressiva que não diga ser guerra defensiva. Hitler invadiu a Polônia para evitar que a Polônia invadisse a Alemanha. Bush invadiu o Iraque para evitar que o Iraque invadisse o mundo. Em cada uma de suas guerras defensivas, Israel ‘tragou’ um pedaço da Palestina, e os ‘almoços’ continuam. A ‘devoração’ se justifica pelos títulos de propriedade que a Bíblia outorgou; pelos dois anos de perseguição que o povo judeu sofreu e pelo pânico que os palestinos geram à espreita.

Israel é o país que jamais cumpre as recomendações e as resoluções das Nações Unidas; é o que nunca acata as sentenças dos tribunais internacionais; o que se ri das leis internacionais; e é também o único país a legalizar a tortura dos prisioneiros.

Que lhe deu o direito de negar todos os direitos? De onde vem a impunidade com que Israel está executando a matança em Gaza? O governo espanhol não teria podido bombardear impunemente o País Basco para acabar com o ETA, nem o governo britânico teria podido arrasar a Irlanda para liquidar a IRA. Por acaso a tragédia do Holocausto implica em uma apólice de eterna impunidade? Ou essa luz verde provém da potência ‘manda chuva’ que tem em Israel o mais incondicional de seus vassalos?

O exército israelense, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe a quem mata. Não mata por erro; mata por horror. As vítimas civis são denominadas ‘danos colaterais’, três são crianças. E os mutilados são milhares, vítimas da tecnologia do esquartejamento humano, que a indústria militar está ensaiando exitosamente nessa operação de limpeza étnica.

E, como sempre, sempre o mesmo: em Gaza, cem a um. Para cada cem palestinos mortos, um israelense.

Gente perigosa, adverte o outro bombardeio, a cargo dos meios de comunicação em massa de manipulação que nos convidam a acreditar que uma vida israelense vale tanto quanto cem vidas palestinas. E esses meios também nos convidam a acreditar que são humanitárias as duzentas bombas atômicas de Israel e que uma potência nuclear chamada Irã foi a que aniquilou Hiroshima e Nagasaki.

A chamada comunidade internacional existe?

É algo mais do que um clube de mercadores, banqueiros e guerreiros? É algo mais do que o nome artístico que os Estados Unidos assumem quando fazem teatro?

Ante a tragédia de Gaza, a hipocrisia mundial brilha uma vez mais. Como sempre, a indiferença, os discursos vazios, as declarações ocas, as declamações altissonantes, as posturas ambíguas rendem tributo à sagrada impunidade.

Ante a tragédia de Gaza, os países árabes lavam as mãos. Como sempre. E como sempre, os países europeus esfregam as mãos.

A velha Europa, tão capaz de beleza e de perversidade, derrama uma ou outra lágrima enquanto secretamente celebra essa jogada mestra. Porque a caça de judeus sempre foi costume europeu; porém, há meio século essa dívida histórica está sendo cobrada aos palestinos, que também são semitas e que nunca foram,nem são, antissemitas. Eles estão pagando, com sangue constante e sonante, uma conta alheia.

(Este artigo é dedicado a meus amigos judeus assassinados pelas ditaduras latino-americanas assessoradas por Israel).