terça-feira, 4 de outubro de 2011

O imbecil politicamente incorreto

No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação.

- Por Cynara Menezes, na CartaCapital

Em 1996, três jornalistas – entre eles o filho do Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, Álvaro –lançaram com estardalhaço o “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Com suas críticas às idéias de esquerda, o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois, vemos quem de fato era o perfeito idiota.

Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única referência intelectual do conservadorismo latino-americano como gerou filhos. No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação. Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles se dividem em três grupos:

1. O “pensador” imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgeneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na idéia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há “oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram contra a ditadura de “terroristas”, mas apoia golpes de Estado “constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge do debate de idéias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos sempre estão do lado oposto ao seu. Prega o voto nulo para ocultar seu direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios – os de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com escrever e falar corretamente o português.

2. O comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humor nonsense do Monty Python: o único humor possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios, gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de fazer rir.” Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4X4. Ri do office-boy e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”. Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.

3. O cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o resultados dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Hahaha. Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos” negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo brincadeira. É radicalmente contra o bolsa-família porque estimula uma “preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa: se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir ideias além das que propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.

“Há uma situação de abandono da educação nos assentamentos”, diz integrante do MST que participou de audiência com Haddad

Atenção, abrir em uma nova janela.
Para falar sobre a pauta da educação na Jornada Nacional de Lutas e a audiência realizada entre movimentos sociais e o ministro da Educação, Fernando Haddad, o Observatório da Educação entrevistou Maria Cristina Vargas, militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Observatório da Educação – Qual é a sua avaliação da jornada, no que se refere especificamente às pautas da educação?
 
Maria Cristina Vargas – A jornada refletiu os processos que vivenciamos há bastante tempo. Temos pautado questões especificas da educação no campo, e os movimentos que compõem a Via Campesina abraçaram esse debate. Há também outras pautas, questões agrárias, mas a educação foi um dos principais pontos da pauta nacional da Via.
O campo é um território onde a maioria nunca teve acesso à educação básica, são territórios alheios às políticas, onde estão os piores índices, como de alfabetização. Apenas 6% da população assentada tem ensino médio. Colocar isso como prioridade é um grande avanço, uma conquista de trabalhadores, um grande avanço a Via Campesina colocar tais questões na pauta e desenvolver atividades relacionadas a ela. As políticas educacionais devem estar relacionadas a várias outras, como de esporte e lazer, e à pauta geral de acesso à terra e o endividamento.
Mas apesar da importância de levar a escola ao campo, há hoje uma situação de abandono, que visualizamos na área da educação nos assentamentos, e fechamento de milhares de escolas. No governo Lula (2003-2010), houve avanços no âmbito do reconhecimento desse território, mas houve também, e ainda há, uma movimentação contrária, com o fechamento de escolas e dificuldade de se construir novas. São questões no âmbito da escola mesmo, não só no nível básico, o leque de demandas abrange desde a educação infantil até o ensino superior. Por isso fomos ao MEC.
 
OE – E como foi a audiência realizada no ministério?
 
Maria Cristina – Houve avanço. Fomos com todo acampamento em frente ao MEC antes da audiência. Nela, deixamos bem claro nossa insatisfação. Apesar da responsabilidade dos estados e municípios, entendemos que a responsabilidade da educação do País é também do MEC. Esse foi o principal recado que demos, mostrando que no âmbito dos estados e municípios, o MEC deve ter políticas que fiscalizem e deem retorno.
 
OE – Quais foram as conquistas da audiência?
 
Maria Cristina – O saldo é positivo. A primeira é dentro da campanha “Fechar escola é crime”, pois serão pensadas políticas para garantir debate sobre fechamentos, o MEC se comprometeu a realizar campanha de fortalecimento da educação no campo e a entrar nesse debate. Uma proposta é que conselhos de educação locais passem a ter de emitir parecer quando houver pedido fechamento de escola. Conquistar isso será importante.
Também será convidado para o Grupo de Trabalho de educação no campo o Ministério Público, para acompanhar processos. Avançamos bastante, pois o MEC sentiu-se responsável em dar retorno para a sociedade.
Quanto à construção das escolas, uma pauta antiga, há demanda emergencial só do MST de 286 escolas. Como a jornada era da Via Campesina, essa demanda emergencial foi ampliada para 350. O MEC já possui a lista onde devem se localizar essas escolas e se comprometeu a pautar essa questão nas suas ações. Há a tarefa de motivar municípios para que enviem a demanda a partir do que apresentamos. Está prevista a criação de Grupo de Trabalho entre Incra e MEC para agilizar esse processo e atender às demandas mais emergenciais.
Dentre as principais conquistas, está a proposta de alfabetização. A Secretaria Geral da Presidência se comprometeu com projeto específico, via Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), em parceria com o MEC. Será uma política específica de alfabetização dos camponeses. O Brasil Alfabetizado não tem dado esse retorno, não tem atendido a demanda, e os maiores índices de analfabetismo estão no campo.
Há também a demanda de ensino superior e técnico. A promessa do MEC e da Casa Civil é de 30 institutos federais, 20 deles até 2014. É um avanço, dado que, no campo, essa questão do ensino superior e técnico é muito importante. Há uma especificidade de cursos e os movimentos querem participar. Não basta ter cursos, estes devem atender as demandas concretas de formação.
 
OE – E como foi abordado o novo Plano Nacional de Educação?
 
Maria Cristina – Esse é o ponto político de nossa pauta que não teria retorno imediato, mas é demanda que fará parte da nossa pauta permanente: 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para educação. Estamos trabalhando com outros movimentos. Se observarmos, hoje não tem política especifica para educação no campo no orçamento previsto. O acréscimo [da educação no campo] justificaria o aumento da porcentagem.

Projeto quer ampliar acesso à banda larga no Rio Grande do Sul


Projeto do governo do Estado quer modernizar a rede para ampliar e qualificar o acesso, mas também criar um marco regulatório local | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte no SUL21

A maior operadora de telecomunicações no Rio Grande do Sul oferece internet a apenas 350 dos 496 municípios, enquanto os pequenos provedores chegam a 473 cidades. Os custos para levar internet a determinadas regiões se tornam elevados com a precariedade de infraestrutura disponível no Estado, o que contribui para a centralização dos serviços na mão de poucas operadoras de telecomunicações. Por esta razão, os poderes executivo e legislativo se uniram aos ativistas de internet e selaram um pacto pela banda larga de qualidade.
O pacto foi firmado quase dez anos depois da primeira tentativa do governo estadual em desenvolver um programa de modernização da rede. Chamado de Infovia, o projeto não foi viabilizado na gestão de Olívio Dutra pela incapacidade de retorno financeiro proporcional ao tamanho do investimento na época. De acordo com o vice-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul (Procergs), Cláudio Dutra, a nova versão do projeto, lançado na última semana, começará do mesmo estágio em que estava há dez anos. “A situação da rede gaúcha é a mesma do ano 2000. Não se avançou em tecnologia. Utilizamos a estrutura da antiga CRT em muitos lugares do Estado. Com o Infovia RS pretendemos investir R$ 203 milhões até 2014 e transformar o estado num indutor de criatividade”, prevê.
Com um investimento inicial de R$ 14 milhões para 2012, a primeira etapa do projeto atenderá inicialmente a 27 municípios da Zona Sul, com uma rede de fibra ótica entre Guaíba e Bagé, passando por Camaquã, Pelotas e Rio Grande. Outras três etapas do projeto contemplarão as demais regiões até o final de 2012, com linhas de transmissão que formarão um anel interligando todo o território do Rio Grande do Sul.
A proposta prevê a utilização de uma infraestrutura própria para os serviços de transmissão de voz, dados e imagem por todos os órgãos do governo estadual, com prioridade para as áreas da Saúde, Educação, Fazendária e Segurança Pública. “As 23 escolas de Bagé que receberão o programa Um Computador Por Aluno terão uma internet de 10 megabits/segundo e nossa meta é levar essa velocidade para todas as outras escolas do Estado”, projeta.
De acordo com o diretor de Inclusão Digital do governo gaúcho, Gerson Barrey, a intenção do governo é disponibilizar a rede de fibra ótica para ampliar e qualificar o acesso, mas também criar um marco regulatório local. “Existe uma dominação no mercado por parte das operadoras e o custo se torna elevado em determinadas regiões e onera os pequenos provedores responsáveis pela implantação da rede local”, afirma. Segundo ele, apenas em 11 cidades gaúchas chega o serviço de mais de uma operadora. “A maioria é da OI e apenas 17 municípios tem a NET”, diz.
Para Marcelo Branco (d), o principal erro do PNBL “é a tentativa de fazer com que as teles recebam dinheiro pelo volume de conteúdos acessados pelo usuário" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Monopólio das teles e o PNBL

O monopólio das grandes empresas de telecomunicações é uma realidade nacional. Na tentativa de democratizar o acesso à internet, o governo federal vem negociando há anos o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). A meta é expandir o acesso à banda larga a 40 milhões de pessoas no país. Mas as negociações do Ministério de Comunicações com as operadoras de telecomunicações têm causado mal-estar entre os defensores da neutralidade na internet. Entre eles, o ativista pela liberdade do conhecimento na rede, Marcelo D’Elia Branco, critica o “acordo” prévio do Plano Nacional de Banda Larga.
“O principal erro desse acordo é a tentativa de fazer com que as teles recebam dinheiro pelo volume de conteúdos acessados pelo usuário. Até hoje, dentro da lógica de funcionamento da internet, quem pode cobrar pelos conteúdos na rede é o gerador de conteúdo e não as operadoras. A partir do acordo firmado com o Ministério das Comunicações, as teles, além de ganharem pela largura da banda que oferecem, pela velocidade de transmissão, passarão a limitar a quantidade de conteúdo que o usuário pode baixar durante o mês”, explica. Segundo Branco, o limite será de 300 mega por mês, o  que não possibilita nem fazer download de um filme. “E isso irá fazer com o que o cara da periferia também gaste. Porque ele irá querer ter mais acesso. Mesmo porque, eles não querem só baixar conteúdo, querem subir conteúdos do que é produzido nas comunidades”, afirma.
O presidente da Associação dos Provedores de Serviços e Informações da Internet no RS (Internetsul), Rafael de Sá, vê a proposta do PNBL como uma ameaça de exclusão dos pequenos provedores de internet no mercado. “A competitividade já é desleal. Nós competimos com a operadora que nos vende o link hoje. Agora, com o Plano Nacional de Banda Larga, nos vemos ainda mais ameaçados. Desbravamos mercado com muito esforço e com esta proposta, haverá uma verticalização do mercado e seremos escanteados com a proposta do governo com as teles”, critica.
Para evitar os possíveis problemas oriundos do formato do Plano Nacional de Banda Larga, o ativista Marcelo Branco lembra de outro projeto de autoria do executivo com a participação da sociedade civil para regular a internet. “O Marco Civil da Internet que está para ser aprovado no Congresso Nacional garante a neutralidade da rede como um direito do usuário, evitando que as operadoras criem filtros para regular ou bloquear conteúdos”, falou.
O deputado estadual que articulou o pacto gaúcho pela banda larga de qualidade, Daniel Bordigon (PT), disse que o gesto dos gaúchos irá contribuir para acordar o próprio PT sobre a importância em avançar na tecnologia da informação. “Estamos atrasados neste tema aqui no RS. Assim como o direito à educação, à saúde, o acesso a internet e as tecnologias de comunicação já podem ser considerados produtos básicos para o desenvolvimento da cidadania. Por um bom tempo, o conhecimento estava na escola. Hoje ainda está, mas é preciso considerar que na internet há uma vareidade infinita de fontes de conhecimento. O acesso a banda larga para todos e sua democratização é fundamental nesse sentido.”