domingo, 10 de maio de 2015

NAKBA: 67 anos de limpeza étnica na Palestina

NAKBA: 67 anos de limpeza étnica na Palestina
Nabka 2015

Comemora-se em 15 de Maio o aniversário da NAKBA, que em árabe quer dizer Catástrofe, e que marca o princípio da tragédia que se abateu sobre o Povo Palestino, perseguido, massacrado e expulso da sua terra pelos novos ocupantes judeus.
A data será assinalada  com uma Sessão de Solidariedade com a Palestina em que será exibido o filme "A Terra Fala Árabe" e que contará com intervenções do Embaixador da Palestina, Dr. Hikmat Ajjuri, e de Jorge Cadima, dirigente do MPPM. 
É no Clube Estefânia, na sexta-feira 15 de Maio, a partir das 18.30 horas.
"A Terra Fala Árabe", da realizadora palestina Maryse Gargour, documenta as circunstãncias e os acontecimentos que levaram a implantação de um estado judaico na Palestina e à expulsão dos seus habitantes árabes.

Mário Scheffer: Com capital estrangeiro avança a privatização do sistema de saúde brasileiro – Blog da Saúde

Mário Scheffer: Com capital estrangeiro avança a privatização do sistema de saúde brasileiro

capital estrangeiro na saúde
 O capital estrangeiro e a privatização do sistema de saúde brasileiro 


Mário Scheffer, em Cadernos de Saúde Pública*
Os fundamentos políticos e econômicos do Sistema Único de Saúde (SUS) foram abalados no início de 2015, com a aprovação da Emen­da Constitucional n86 (EC 86), que cristaliza o subfinanciamento do SUS, e da Lei nº 13.097, que permite a participação de empresas e do capital estrangeiro, direta ou indiretamente, nas ações e cuidados à saúde.
Ao impor à União o financiamento de emen­das parlamentares individuais e ao vincular a despesa federal da saúde à receita corrente líqui­da, a EC 86 levará à diminuição de recursos em relação aos valores garantidos pela legislação vi­gente, que já eram por demais restritivos.
Assim, a norma legal potencializa restrições ao financiamento do SUS, que vêm desde o des­cumprimento da Constituição Federal, que desti­nava no mínimo 30% do orçamento da Segurida­de Social para a saúde, passando pela retirada do Fundo da Previdência Social da base de cálculo dos recursos, até o desvirtuamento da Contribui­ção Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), dentre outras subtrações.
Como agravante, a EC 86 inviabiliza politi­camente, pelo menos em curto prazo, o projeto de iniciativa popular, o Saúde+10, subscrito por mais de dois milhões de brasileiros, que alcan­çaria orçamento mais razoável com a aplicação de no mínimo 10% da receita corrente bruta da União para a saúde.
A atuação do capital estrangeiro na saúde – definido como aquele correspondente a em­presas multinacionais, no caso dos investimen­tos e do comércio, aos grandes bancos, no ca­so dos financiamentos, e aos fundos de pensão que operam o capital especulativo1  – foi vedada pela Constituição Federal e pela Lei Orgânica da Saúde, com as exceções de empréstimos de orga­nismos internacionais, de cooperação técnica ou vinculados às Nações Unidas.
Mas desde 1998 a Lei dos Planos de Saúde per­mitiu o capital estrangeiro nos negócios de assis­tência suplementar, o que levou à interpretação de que mesmo as empresas de planos de saúde proprietárias de hospitais poderiam se beneficiar do investimento exterior.
A saúde já estava, portanto, parcialmente aberta a investidores internacionais que torna­ram-se acionistas de empresas de planos de saú­de e de grupos hospitalares ligados a elas. Recur­sos de origem estrangeira também haviam sido aportados em laboratórios de exames diagnós­ticos, neste caso de modo não autorizado, mas consentido pelos órgãos governamentais.
A inconstitucionalidade da lei foi defendida pela Advocacia-Geral da União (AGU), que re­comendou, sem ser ouvida, o veto à permissão generalizada de capital estrangeiro em hospitais e clínicas, gerais e especializados, inclusive de natureza filantrópica.
Ações diretas de inconstitucionalidade já levadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) por entidades da sociedade civil enfatizam o disposi­tivo constitucional que prevê a vedação expressa à participação do capital estrangeiro na saúde, e levantam uma situação esdrúxula: conserva-se o texto original da lei do SUS mas acrescenta-se, após uma vírgula, conteúdo contrário. Na prática designa-se, por exceção, a possibilidade do capital estrangeiro entrar em toda e qualquer ação e serviço de saúde. Agora, a legislação bra­sileira sobre saúde traz duas políticas opostas na mesma norma.
Para além da controvérsia judicial, a constitu­cionalização do subfinanciamento público com­binada com a abertura irrestrita à participação do capital estrangeiro na saúde deverá impulsio­nar a privatização, na medida em que lideranças do setor privado afirmam seus objetivos imedia­tos de expandir a capacidade instalada de leitos e serviços para clientes de planos de saúde.
A privatização consiste na transferência das funções e responsabilidades do setor público, completamente ou em parte, para o setor priva­do2 . Aqui interessa também a privatização ati­va3 , ou seja, o processo no qual o governo toma decisões políticas que encorajam ativamente o crescimento da participação privada na saúde.
Em meio a uma série de orientações e inações que têm por resultado o desmonte do SUS, a am­pla abertura do sistema de saúde ao capital es­trangeiro foi uma medida tomada sem que suas reais motivações tenham sido anunciadas, e sem que suas consequências tenham sido discutidas abertamente pelo Congresso Nacional ou avalia­das pelos fóruns de participação social.
Trata-se de vitória da coalizão de interesses de hospitais privados, empresas farmacêuticas e operadoras de planos de saúde que, além da defesa do capital estrangeiro, pretendem am­pliar a participação do setor privado na formu­lação das políticas nacionais de saúde4, expan­dir o mercado privado e obter desonerações e reduções tributárias.
O aceno aos fundos que vêm de fora se presta também como álibi para justificar a redução de gastos públicos com saúde, em tempos de ajus­te fiscal e de perenidade do subfinanciamento do SUS.
O Governo Federal será o grande avalista do capital estrangeiro na saúde, seja por meio de desregulação e incentivos ao crescimento do mercado de planos de saúde, que se beneficia­rá diretamente da rede privada hospitalar e de diagnóstico expandida com recursos externos, seja comprando estes mesmos serviços para atenuar a insuficiência da oferta da atenção de média complexidade no SUS. Talvez resida aí o motor do programa Mais Especialidades, defini­do na campanha eleitoral de 2014 como “uma rede de clínicas com especialistas e exames de apoio diagnóstico”.
A experiência na educação é elucidativa. A atração dos fundos internacionais para investir em fusões e aquisições no mercado de ensino su­perior no Brasil está ligada aos créditos do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Su­perior (FIES) e do Programa Universidade para Todos (PROUNI), o que levou à profusão de cur­sos de graduação privados sem contrapartidas mínimas de qualidade.
Com volatilidade e vocação especulativa, in­vestimentos estrangeiros escolherão leitos, exa­mes e procedimentos que geram altos retornos financeiros, principalmente serviços baseados em valores e preferências particulares, e que pra­ticam a seleção adversa, afastando-se do atendi­mento a populações que vivem em áreas distan­tes de recursos assistenciais, do atendimento a idosos, crônicos graves, portadores de transtor­nos mentais e outros pacientes que demandam atenção contínua.
A expansão de rede privada com essas carac­terísticas fará aumentar a individualização das demandas, os pagamentos diretos em clínicas populares e o consumo de planos de saúde ba­ratos no preço mas com armadilhas contratuais e sérias restrições de coberturas. Mais uma vez o SUS, o fundo público, será utilizado como fiador e resseguro das operações privadas.
À proporção que gastos privados substituem as despesas públicas, aumentam os obstáculos para a justiça e a equidade. Sempre que presta­dores privados têm garantida a venda de seus serviços por produção, sem compromisso com os resultados de saúde, os riscos de desperdício de recursos e explosão dos custos do sistema de saúde são enormes.
Capitais que buscam caminhos de valorização dificilmente terão compromissos com necessi­dades de saúde, o que requer políticas voltadas à redução de adoecimentos e mortes, com atuação sobre os determinantes sociais da saúde.
O sistema universal, o sistema único para po­bres e ricos, baseado na saúde como direito, na redistribuição da riqueza, financiado por toda a sociedade por meio de impostos e contribuições sociais, cede, assim, espaço ao sistema segmen­tado, incapaz de assegurar o acesso a todos os níveis de atenção, em todas as regiões, inclusive nos vazios sanitários e para populações vulnerá­veis e negligenciadas, onde e para quem o setor privado não tem interesse em ofertar serviços.
O setor privado de saúde em mercados emer­gentes oferece retornos atrativos para os inves­tidores5 . Em contrapartida, investimentos es­trangeiros em estruturas privadas de saúde de países de renda média e baixa melhoraram pon­tualmente a qualidade de serviços hospitalares altamente especializados acessíveis à clientela restrita, mas também foram responsáveis pela disputa predatória por recursos humanos, agra­vando a falta de médicos e de outros profissio­nais de saúde nos estabelecimentos públicos e nas áreas remotas6 . No Brasil, os padrões atuais já sugerem que o uso excessivo do setor privado promove concorrência desleal com o setor pú­blico, drenando serviços, recursos humanos e financeiros do SUS7.
Apologistas do capital estrangeiro são os mesmos que financiam campanhas eleitorais e que dispõem de redes midiáticas para erigir o mito do setor privado apresentado como mais eficaz, e para promover a tese de que o sistema universal é insustentável. Empregam a palavra privatização o mínimo possível, atenuada por termos como parcerias público-privado, con­corrência, qualidade, eficiência. Contam com a oposição tranquila do movimento sanitário, o encurralamento dos conselhos e conferências de saúde, o silêncio dos sindicatos e trabalhadores organizados, e a omissão dos partidos políticos que, em ano eleitoral, eliminaram dos progra­mas dos candidatos qualquer menção ao capital estrangeiro na saúde.
As modalidades de financiamento da saúde exprimem os valores de uma sociedade8 . O prin­cípio de igualdade das pessoas face à doença e à morte, sejam quais forem suas condições sociais e suas origens, é compartilhado pelos ideais re­publicano, ético e humanitário.
Com o desfinanciamento do SUS e a supres­são de barreiras para atuação do capital estran­geiro, o Brasil segue o caminho inverso, das ini­quidades geradas pela comoditização da saúde e pela sua conversão em mercadoria. Cidadãos de­tentores de direitos transformam-se em clientes; serviços de saúde que poderiam comprometer-se com o sistema universal transformam-se em empresas concorrentes.
O capital estrangeiro na atenção à saúde é um tema pouco explorado pela literatura inter­nacional, na medida em que a presença de em­presas e fundos americanos, tanto no setor de seguro saúde quanto na assistência hospitalar, de diagnose e terapia, ficou limitada às fronteiras nacionais até os anos 2000. O tema também pas­sa à margem das produções sobre saúde global. Mas há referências sobre investimentos estran­geiros relacionadas ao turismo médico em países em desenvolvimento9.
O Brasil emerge como país que vem mobili­zando recursos privados de bancos comerciais e fundos internacionais para expandir a assis­tência à saúde para os que possuem capacidade direta ou indireta de pagamento dos cuidados.
Urge uma agenda nacional de pesquisas que ofereça terreno para acompanhar o impacto do capital estrangeiro no processo de privatização nos vários componentes do sistema de saúde: no financiamento, na prestação de serviços, na ges­tão e nos investimentos em saúde.
Sem a produção de novos conhecimentos à altura da complexidade da conjuntura atual da saúde no Brasil, e sem o engajamento democráti­co, ainda a ser despertado e construído, na ampla defesa do sistema universal inscrito naConsti­tuição Federal há mais de duas décadas, pode-se assistir passivamente a inflexão que impõe ao SUS condições cada vez mais desfavoráveis à sua legitimidade.
*Mário Scheffer é professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina, da USP. mscheffer@usp.br Este artigo foi publicado em Cadernos de Saúde Pública, Seção Perspectivas, edição de abril de 2015.
Referências
1.Guimarães SP. Capital nacional e capital estrangei­ro. Estud Av 2000; 14:143-60.
2.European Observatory on Health Systems and Policies. The observatory health system glossary. http://www.euro.who.int/en/about-us/partners/ observatory (acessado em 04/Mar/2015).
3.Muschell J. Privatization in health. Health eco­nomics technical briefing note. Geneva: World Health Organization; 1995.
4.Associação Nacional de Hospitais Privados. Livro Branco. Brasil Saúde 2015: a sustentabilidade do sistema de saúde brasileiro. Cadernos de propos­tas. http://www.antares-consulting.com/images/ LVBpropostas.pdf (acessado em 04/Mar/2015).
5. International Finance Corporation; World Bank Group. Guide for investors in private health care in emerging markets. http://www.banyanglobal. com/pdf/Guide_for_Investors_in_Private_Health_ Care_in_Emerging_Markets.pdf (acessado em 04/Mar/2015).
6.Organisation for Economic Co-operation and Development. DAC guidelines on poverty and health. http://www.oecd.org/development/ povertyreduction/33965811.pdf (acessado em 04/Mar/2015).
7. Marten R, McIntyre D, Travassos C, Shishkin S, Longde W, Reddy S, et al. An assessment of prog­ress towards universal health coverage in Brazil, Russia, India, China, and South Africa (BRICS). Lancet 2014; 384:2164-71.
8.Grimaldi A. Les différentes facettes de la privati­sation rampante du système de santé. https:// france.attac.org/nos-publications/les-possibles/ numero-1-automne-2013/dossier-protection-so ciale/article/les-differentes-facettes-de-la (aces­sado em 04/Mar/2015).
9. Bell D, Holliday R, Ormond M, Mainil T. Transna­tional healthcare, cross-border perspectives. Soc Sci Med 2015