A pior herança recebida pelo governo Lula do
governo FHC foi a desigualdade social. O Brasil era o país mais
desigual da América Latina que, por sua vez, era o continente mais
desigual do mundo. Essa desigualdade não era alterada nem em
democracia, nem em ditadura, nem em ciclos expansivos, nem nos
recessivos da economia brasileira. Era um fator estrutural, herdado da
colonização e da escravidão, da persistência do latifúndio, acentuado
pelas politicas da ditadura militar de arrocho salarial e favorecimento
do grande capital. Não bastasse isso, a década neoliberal dos 90 do
século passado, acentuou ainda mais as desigualdades.
As maiores transformações que o Brasil sofreu no governo Lula foram na
sua inserção internacional – do privilégio das relações com o norte,
para relações prioritárias com o sul – e na diminuição significativa da
desigualdade no plano interno.
A articulação entre a política econômica e as políticas sociais
promoveu um processo de distribuição de renda, estendendo e
aprofundando o mercado interno de consumo popular como nunca havia
acontecido na nossa história. A projeção feita pela empresa Data
Popular para a revista Carta Capital desta semana projeta para 2014 – o
ano do final do mandato atual da Dilma – uma classe C (no critério de
distribuição de renda) de 58,5% da população (era de 38,8% em 2002, ano
do começo do governo Lula). Os mais pobres, que eram 9,3% em 2002,
tornaram-se 4,9% em 2010 e seriam 2,7% em 2014.
Estaríamos numa situação praticamente de erradicação da extrema
pobreza, da miséria, com um resíduo muito difícil de chegar a reduzir a
zero. Hoje ainda convivemos com mais de 10 milhões de pessoas vivendo
(ou, sabe-se lá como, sobrevivendo) com até 39 de reais por mês.
Mesmo com essas transformações extraordinariamente positivas - maior
mérito do governo Lula -, não se pode pensar que nos tornamos um país
de classe média. A miséria acumulada ao longo de séculos da nossa
história não pode ser superada com a elevação do nível de renda em
alguns anos. As condições de habitação, de saneamento básico, de
educação, de saúde, de transporte, de segurança – para citar apenas
alguns problemas – são muito ruins e apenas começam a ser superadas –
pelo menos na habitação. Será necessária a continuidade por muitos anos
dessa elevação de renda, somada a politicas especificas que melhores
substancialmente as condições da educação e da saúde publicas, do
saneamento básico, da habitação, do transporte publico, as condições de
segurança, para que possamos realmente ter transformado
democraticamente a estrutura social brasileira de forma substancial e
irreversível.
No entanto, a miséria, a extrema pobreza, não se medem apenas por
cifras, por nível de renda. Ao que precisamos chegar é a uma sociedade
em que não existam mais pessoas abandonadas, sem amparo, nas ruas ou em
outros lugares, privados ou públicos. Uma sociedade a que todos
pertençamos, de uma ou outra forma, em que nos sintamos vinculados aos
outros por laços de solidariedade, de espirito comunitário, de
pertencimento a uma mesma sociedade. A miséria não é apenas uma
situação de precariedade material, é também o abandono, a falta de
apoio, de retaguarda, de cuidado. A isso temos que chegar, a que todos
tenham alguma forma de assistência do Estado, de forma a que ninguém se
sinta abandonado.
Fonte: Blog do Emir