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quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Cantor Daniel Viglietti denuncia golpe de estado jurídico no Uruguai



Preso pela ditadura em 1972, Viglietti afirmou que a Suprema Corte de Justiça deu um golpe de Estado jurídico | Foto: Libertinus
Da Redação do SUL21
O cantor uruguaio Daniel Viglietti denunciou que a Suprema Corte de Justiça do Uruguai (SCJ) deu “um tipo de golpe de Estado jurídico” que pretende liquidar com os processos contra os criminosos da ditadura (1973 – 1985). Viglietti afirmou que a SCJ busca impedir que sejam julgados os “que torturaram, assassinaram e sequestraram”.
“Se, por um lado, o estado escavou a terra para encontrar os corpos, é preciso continuar escavando a sociedade para encontrar os responsáveis por tudo isso”, afirmou o cantor e compositor de 73 anos de idade à Prensa Latina.
Nesta sexta-feira (22), a Suprema Corte emitiu uma sentença considerando inconstitucional a lei aprovada em 2011 que permitia a investigação de crimes ocorridos durante a ditadura, antes abrigados sob a lei da anistia, aprovada em 1986. A decisão ganhou o apoio da direita e foi condenada pelo governo esquerdista.
Para o vice-presidente da coalizão governista Frente Ampla, Juan Castillho, a decisão foi “uma barbaridade”. “O recado que está sendo dado às vítimas e a suas famílias é aterrorizante”, lamentou o político. O partido do presidente José Mujica emitiu um comunicado na segunda-feira (25) afirmando que “a maioria da SCJ é responsável pela manutenção da impunidade”. O PVP, outro partido que integra a Frente Ampla, afirmou que irá denunciar a SCJ à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
A oposição direitista criticou o posicionamento do governo após a decisão: “Não respeitam o povo quanto vota, nem os juízes quando ditam sentença; acreditam estar por cima da Constituição”, escreveu o senador Ope Pasquet, do Partido Colorado, no Twitter.
O porta-voz da SCJ, Raúl Oxandabart, afirmou que “o destino de cada um dos procedimentos ou julgamentos sobre os crimes da ditadura dependem do juiz da causa, e nisso a SCJ não pode intervir”. Segundo o El País, a decisão determina que causas judiciais abertas nas quais não há militares processados por crimes na ditadura devem ser arquivadas. As causas nos quais já há processados, no entanto, poderão continuar a ser investigadas.

| Foto: Victor Farinelli/Opera Mundi
Protesto
Nesta segunda-feira (25), milhares de uruguaios, entre eles o escritor Eduardo Galeano, protestaram contra a decisão e exigiram o fim da impunidade pelos crimes da ditadura. Os manifestantes, convocados pela Frente Ampla e por várias organizações de defesa dos direitos humanos, se concentraram na Praça Cagancha, em frente à sede da SCJ. Ao redor da Coluna da Paz, monumento simbólico da Plaza Cagancha, em Montevidéu, havia pouco mais de 25 mil uruguaios em protesto. Após cinco minutos de silêncio, vieram os aplausos, abraços, lágrimas e o hino do país.
Terminada a parte protocolar do ato, os gritos passaram a ser variados, e direcionados a um dos flancos da praça, onde está o prédio da Suprema Corte de Justiça do Uruguai. Foi de lá que saiu, na última sexta-feira (22/02), a decisão que motivou o evento.
O tribunal de justiça do país declarou inconstitucionais os dois artigos centrais da chamada Lei de Interpretação, aprovada pelo Congresso do país em 2011, e que anulava os efeitos da Lei de Caducidade (similar à Lei de Anistia no Brasil), pela qual se determina a prescrição dos crimes da ditadura uruguaia (1973-1985).

A Cagancha, ontem | Foto: Victor Farinelli/Opera Mundi
Com informações da Radil Del Sur, Opera Mundi, Terra e O Globo

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Nunca uma ditadura teve tantos êxitos



Por Juremir Machado


Leitores me garantem que nossa ditadura foi um sucesso. Admito. Que linda ditadura tivemos! Dizem que se podia dormir de noite e sair à rua sem medo. Salvo os resistentes ao regime, que eram torturados ou mortos. Mas, explicam-me, a culpa era deles. Quando Nelson Rockfeller visitou o Brasil, em 1969, seis mil “baderneiros” foram “preventivamente detidos” só no Rio de Janeiro. Liberdade, liberdade! Como gosto de números, vou compartilhar alguns aqui, tirados de um dos capítulos mais consistentes que já li, intitulado “O milagre econômico”, do livro, “Estado e oposição no Brasil”, de Maria Helena Moreira Alves. É de arrepiar, o nosso êxito.
A inflação do período militar foi modesta, em torno de 20% ao mês. A dívida externa pulou de 3,9 bilhões de dólares, em 1968, para 12,5 bilhões em 1973. A turma dos camarotes rurais adorava, pois as exportações eram subsidiadas. Mário Henrique Simonsen, um dos intelectuais orgânicos do regime, soltou esta pérola aos porcos: “A partir de 1964, logramos alcançar razoável estabilidade política”. Uau! Tem cada charlatão neste mundo de Deus. Maria Helena Moreira Alves resume: “A política governamental elevou acentuadamente a participação dos membros mais ricos da população na renda global diminuindo a dos 80% mais pobres”. Sem dúvida, um mecanismo eficiente de redistribuição de renda. Para cima. Os números dão uma surra de realidade. Que sucesso. Em 1970, 50,2% dos brasileiros ganhavam menos de um salário mínimo. Em 1972, já eram 52,5%. Que milagre! Apenas 78,8% dos trabalhadores ganhavam até dois salários mínimos. Uma proporção, com certeza, pequena. Um decreto de 1938 estabeleceu o que o salário mínimo devia comprar.
Nossa bela ditadura alterou esses dados. Passamos de 12 para 14 horas de trabalho diário para poder comer. Em 1959, um trabalhador precisava de 65 horas e cinco minutos de trabalho para comprar a cesta básica fixada pelo decreto de 1938. Em 1963, eram 88 horas. Em 1974, 163 horas e 32 minutos. Nenhuma democracia faria melhor. Saltamos para 25 milhões de crianças passando fome. Uma pesquisa revelou que 60% das crianças entrevistadas trabalhava mais de 40 horas por semana. Chamava-se isso de educação pelo trabalho: 18,5% da população entre 10 e 14 anos de idade trabalhava. O efeito pedagógico foi espetacular: 63% das crianças entre 5 e 9 anos de idade, em 1976, fora das escolas. Nunca mais se foi tão longe. Era difícil um país nos bater em analfabetismo ou semianalfabetismo. Tudo isso pela segurança nacional.
A ditadura também mudou a composição dos orçamentos. Uma extraordinária revolução. O da Saúde passou de 4,29% do total, em 1966, para 0,99% em 1974. O da Educação despencou de 11,07% para 4,95% no mesmo período. Em compensação, os três ministérios militares, muito mais úteis à nação, abocanhavam 17,96% dos recursos. Fixamos pena de morte, prisão perpétua, banimento, fechamos o Congresso, controlamos os meios de comunicação, prendemos e arrebentamos, montamos, segundo o general Viana Moog, “a maior mobilização de tropas do Exército”, 20 mil homens para caçar 69 guerrilheiros do PCdoB no Araguaia. Entre 1977 e 1981, foram mortos apenas 45 líderes sindicais rurais. Tivemos míseros 12 mil presos políticos entre 1969 e 1974. Uma ditadura realmente admirável. Tão admirável que conseguiu se autoanistiar. Nenhum torturador foi julgado ou punido. Que êxito!

sábado, 11 de agosto de 2012

Brasil pode ter sido mais decisivo que EUA nos golpes latino-americanos


Documentos ultrassecretos provam que a ditadura brasileira chegou a exportar técnicas de tortura à militares da região

The National Security Archive/Reprodução
O Brasil pode ter tido um papel mais importante que os EUA nas ditaduras latino-americanas, embora a articulação estreita entre Brasília e Washington para perseguir militantes de esquerda nos anos 60 e 70 seja ainda quase desconhecida para a história oficial.
A missão de desvendar os meandros dessa cooperação e o verdadeiro papel que militares e civis brasileiros desempenharam em ditaduras como as do Chile, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia caberá à recém-instaurada Comissão da Verdade, diz o pesquisador norte-americano Peter Kornbluh em entrevista ao Opera Mundi.
[O ditador brasileiro Emílio Garrastazu Médici e o presidente dos EUA Richard Nixon]

Segundo Kornbluh – que esteve em maio em Brasília para reunir-se com membros da Comissão –, existem papéis ultrassecretos que provam que o Brasil exportou técnicas de tortura para os países vizinhos, além de fornecer respaldo político, ajuda financeira e suporte material para ditadores militares da região.
Leia mais:
"Comissão da Verdade brasileira tem de ser agressiva nas buscas", diz Peter Kornbluh

Nós sabemos, por exemplo, que o presidente (brasileiro Emílio Garrastazu) Médici e o presidente (dos EUA Richard) Nixon mantiveram um canal de comunicação ultrassecreto sobre a intervenção brasileira no Chile e, possivelmente, em outros países do Cone Sul no início dos anos 70”, diz Kornbluh, que é diretor dos Arquivos da Segurança Nacional. A organização de Washington, fundada em 1985, é especializada no requerimento, interpretação e publicação de documentos secretos norte-americanos liberados para consulta pública sobre os golpes na América Latina.

Documentos secretos obtidos pela organização de Kornbluh em agosto de 2009 revelam a cooperação estreita entre Nixon e Médici. Num dos memorandos revelados, o presidente norte-americano diz a seu colega brasileiro: "espero que possamos ter uma colaboração estreita, uma vez que há muitas coisas que o Brasil pode fazer, como país sul-americano, e nós, dos EUA, não podemos. A relação entre ambos era tão importante, diz a análise feita na época pela National Secutiry Archives, que ambos estabeleceram um canal privilegiado de contato, "como forma de manter a comunicação direta sem usar os canais diplomáticos formais".

Médici tinha como canal seu assessor direto, o chanceler Gibson Barbosa, mas "para assuntos extremamente privados e delicados", indicou o coronel Manso Netto. Do lado norte-americano, o contato era Henry Kissinger, conselheiro e confidente de Nixon. Toda a comunicação estabelecida por meio desse canal secreto permanece desconhecida.

Kornbluh começou a lidar com arquivos secretos na década de 60, quando investigou papéis do governo norte-americano sobre a crise dos mísseis em Cuba. Na época, a então União Soviética transportou para a ilha mísseis capazes de alcançar o território dos EUA em plena Guerra Fria. Kornbluh também mergulhou em arquivos do episódio que ficou conhecido como Irã Contras quando, em 1986, durante o mandato do então presidente Ronal Regan, figurões da CIA foram flagrados traficando armas para o Teerã, mesmo com o regime sob embargo. Ele publicou dois livros sobre o tema, além de um terceiro, mais tarde, sobre a ditadura no Chile, que recebeu do jornal americano Los Angeles Times a classificação de “livro do ano” de 1998.

O pesquisador norte-americano é figurinha fácil em programas de reportagem investigativa como o 60 Minutes, da rede CBS, e congêneres da CNN. Sua informações e análises sobre o papel dos EUA são conhecidas, mas o envolvimento com os arquivos brasileiros será algo novo, que pode revelar detalhes ainda desconhecidos – e desagradáveis – sobre o real papel brasileiro na história latino-americana.

Acusação direta

Em maio, o Opera Mundi publicou reportagem especial na qual fontes brasileiras e chilenas acusam a Embaixada do Brasil em Santiago do Chile de ter sediado as reuniões prévias ao golpe liderado pelo general Augusto Pinochet, além de ter facilitado o envio da primeira linha de crédito à ditadura chilena por empresários brasileiros, no valor US$ 100 milhões.

Arquivo pessoal

Peter Kornbluh: relutância das fontes militares brasileiras em liberar papéis é obstáculo para Comissão da Verdade do país

“O único brasileiro presente na noite em que a Junta Militar chilena prestou juramento, no dia 11 de setembro (dia do golpe), foi o então embaixador do Brasil no Chile (Antonio Castro do Alcântara Canto), em cuja residência foram feitas as reuniões-chave para que Pinochet se juntasse ao golpe", disse a jornalista e escritora chilena Mónica Gonzalez, autora do livro La Conjura – Os Mil e Um Dias do Golpe.

"Empresários de São Paulo financiaram o grupo de ultra-direita Patria y Libertad que perpetrou atividades terroristas para desestabilizar o governo [de Salvador] Allende. Torturadores brasileiros vieram ao Chile após o golpe para ensinar técnicas de tortura, interrogar e levar de volta ao Brasil ativistas brasileiros exilados no Chile", completou um dos assessores diretos de Allende, o atual diretor do PNUD (Programa da ONU para o Desenvolvimento), Heraldo Muñoz.

Para Kornbluh, declarações como as de Mónica e Muñoz podem ser provadas por documentos ainda desconhecidos. O pesquisador é um grande conhecedor do poder de certos papéis empoeirados. Em 1998, quando o democrata Bill Clinton era presidente, ele conseguiu a liberação de 24 mil documentos secretos da CIA, do Departamento de Defesa, do Departamento de Estado, do Conselho de Segurança Nacional e do FBI sobre a participação dos EUA no golpe de 11 de setembro de 1973, no Chile. Pouco tempo depois, Kornbluh aplicou o mesmo modelo de busca para o caso argentino, onde conseguiu acesso a mais de 5 mil informações até então reservadas da ditadura militar.

“A ironia poética do envolvimento dos EUA na América Latina é que isso criou um rico acervo que pôde ser usado para revelar quais violações dos direitos humanos foram cometidas no passado e quem as cometeu. Esperamos conseguir informações semelhantes no Brasil nos próximos meses”, disse.

Jogo duro

Kornbluh diz que um dos obstáculos ao trabalho da Comissão da Verdade no Brasil ainda é a relutância das fontes militares em liberar papéis, por exemplo, sobre a Guerrilha do Araguaia – movimento de resistência armada à ditadura que foi aniquilado pelo Exército Brasileiro em seguidas investidas, entre 1972 e 1975, na região norte.

Roberto Stuckert Filho/PR

Presidente Dilma Rousseff durante cerimônia de instalação da Comissão Nacional da Verdade, no Palácio do Planalto, em Brasília

Os documentos relativos à operação nunca foram revelados pelos militares, mesmo depois da condenação do Estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em dezembro de 2010, pela “detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região” do Araguaia. Eles dizem que os papéis foram todos destruídos.

Kornbluh diz que o argumento é comum e já foi usado em outras ditaduras da região. "Na Guatemala, a Comissão transformou num assunto o fato de os militares negarem informações, esconderem documentos. A publicidade disso fez com que alguns militares guatemaltecos dessem passos significantes adiante, liberando mais documentos sobre o papel do alto comando nas atrocidades massivas”, conta. “A Comissão de Verdade do Brasil deveria ser agressiva na busca por registros militares e, se os militares não cooperarem, deveria então estar preparada para dar publicidade geral, responsabilizando os que obstruírem os registros desta história negra.”

A sugestão foi, aparentemente, feita por Kornbluh aos membros da Comissão da Verdade no Brasil, embora o pesquisador tenha se negado a dar detalhes sobre o encontro realizado em Brasília, em junho.

sábado, 30 de junho de 2012

Fundamentalismo: muçulmano, judeu ou cristão?

Quem é o fundamentalista?


 
Definitivamente a mídia continua tratando seus leitores como idiotas.
Insiste em criar slogans usurpadores para catequizar os incautos.
De um lado temos o Ocidente Cristão “tolerante e democrático”.
De outro o Oriente muçulmano  “intolerante e fundamentalista”.
O Ocidente é representado por Estados Unidos e Europa.
O Oriente por Iraque, Líbia e Afeganistão ( não por coincidência nações invadidas, ocupadas e saqueadas”).
E a estes três últimos querem acrescentar a Síria e Iran e em quem mais eles estiverem cobiçando.
Enfim, de um lado temos os “tolerantes cristãos” e de outro os “fundamentalistas muçulmanos”.
Mas espera aí.
O Iraque de Saddam Hussein tinha como vice-presidente um cristão.
Em que país cristão há algum vice-presidente muçulmano?
No Afeganistão dos Talibãs  havia uma Mesquita de Maria.
Alguém conhece alguma igreja ou templo no Ocidente democrático de nome Muhamad?
Isso, claro, para ficar na superfície do texto.
Alguém pode dizer quando o Iraque, a Líbia, o Afeganistão, a Síria ou Iran invadiram o Ocidente Cristão?
Não preciso perguntar quantas vezes o Ocidente cristão invadiu aqueles países.
Qualquer leitor minimamente ilustrado sabe  que o Ocidente Cristão fez e ( e continua fazendo) de sua razão a invasão, ocupação e saque de nações.
E não precisa ir longe.
A nossa maltratada America é um excelente exemplo.
Claro também que posso citar a África e a Ásia.
Agora falemos de Israel que, segundo seus psicopatas dirigentes, estaria ameaçado pelo muçulmano Iran.
Porque um dirigente iraniano “teria ameaçado os judeus de extinção”.
O interessante é que no Iran vivem mais de 35 mil judeus que vivem de acordo com os preceitos da religião judaica.
E jamais foram perseguidos ou maltratados.
Mas falemos de Israel, lamentavelmente, um posto militar euro-ocidental a serviço dos Estados Unidos.
Como os “judeus” foram parar ali?
Fugindo dos cristãos ocidentais.
Que jamais cessaram de persegui-los.
Basta consultar menos a mídia e mais a História para verificar essa verdade.
Foram os ocidentais cristãos que perseguiram  e maltrataram os judeus durante séculos.
Ao contrario dos muçulmanos, que sempre os abrigaram.
A lista é longa, longuíssima, mas esse é um simples blog e não uma defesa de tese.
Mas se você tiver algum tempo consulte a História e veja como Ocidente Cristão manipula vergonhosamente os fatos.
E veja quem é o fundamentalista.
E como a mídia trata os seus leitores como idiotas.
Depende apenas de você.
E abaixo você ouve Moshe Habusha, acompanhado por Ariel Cohen, cantando em árabe Ya Jarat Al Wadi, do egípcio Mohamad Abel-Wahab. Ressalte-se que Moshe possui um conjunto musical especializado em canções clássicas árabes. Muitas delas ele verteu para o hebraico. Eu o considero um dos melhores interpretes de musica árabe em todo o Oriente Médio.
 
 

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Escracho, um instrumento de luta



Nascidos na Argentina na década de 1990 para denunciar os agentes da ditadura civil-militar responsável por um saldo de 30 mil mortos e desaparecidos no período, os escrachos criaram condenação social e abriram caminho para a abertura dos processos judiciais contra militares e civis envolvidos na repressão
por Dafne Melo no LeMondeBrasil
(Ação da Frente de Escracho Popular, no dia 7 de abril em São Paulo, denuncia o legista Harry Shibata, que assinava laudos falsos para encobrir torturas)

Na manhã de 25 de março de 2006, quem passava pela Avenida Cabildo, número 639, no bairro portenho de Belgrano, via a parte externa de um prédio residencial, precisamente na altura do sexto andar, manchado de tinta vermelha, além de placas e pichações na rua. “Aqui vive um genocida”, diziam algumas das mensagens. Nesse endereço vivia Jorge Rafael Videla, um dos líderes da Junta Militar que tomou o poder por meio de um golpe de Estado em 24 de março de 1976.
Quem tivesse passado no dia anterior teria visto 15 mil pessoas em uma manifestação diante da casa do repressor, na ocasião em prisão domiciliar (hoje cumpre a pena em um presídio). Tratava-se de um escracho, como ficou conhecido na Argentina e no Uruguai um determinado tipo de mobilização em que se evidencia publicamente um fato condenável em relação a uma pessoa ou lugar.
As semelhanças com os atos realizados por jovens brasileiros nos meses de março e abril não são meras coincidências. No comunicado da organização Levante Popular da Juventude, que organizou seis escrachos a repressores brasileiros em seis cidades simultaneamente, no dia 26 de março, é feita referência à experiência do país vizinho e à chilena, onde esse tipo de mobilização recebe o nome de “funa”.
Há consenso, porém, que o escracho nasceu na Argentina. “É uma ferramenta de luta que criamos em determinado período de nossa história”, conta Julio Avicento, da Hijos (sigla em espanhol para Filhos e Filhas pela Identidade, Justiça e contra o Esquecimento e o Silêncio, que forma a palavra “filhos”), da cidade de La Plata, organização à qual se atribui a criação do escracho.
O período a que se refere Avicento é a década de 1990, quando vigoravam as chamadas “leis de impunidade”. Após o fim da ditadura civil-militar, em um contexto de denúncias feitas pelas organizações de direitos humanos, crise econômica e desmoralização em razão da derrota na Guerra das Malvinas, os integrantes das juntas militares que chefiaram o país entre 1976 e 1983 foram julgados, em 1985. O resultado foi a condenação de Videla e Emilio Eduardo Massera à prisão perpétua, e de outros três chefes da Junta a penas menores. Outros quatro foram absolvidos.
 
Nova geração e impunidade
A Argentina era então governada por Raúl Alfonsín, que depois do Julgamento às Juntas sancionou duas leis: Ponto Final e Obediência Devida. Juntas, concediam anistia a todos os outros militares e policiais com a justificativa de que haviam cumprido ordens de seus superiores. Portanto, estes já haviam sido julgados e o assunto estava encerrado. Para completar, em 1990 o então presidente Carlos Menem concedeu um indulto aos condenados, colocando em liberdade os chefes militares.
 Para Julio Avicento, nesse momento houve um ponto de inflexão em que essas leis passaram a ser questionadas pelas quatro gerações de lutadores: as mães, pioneiras na luta contra a impunidade; as avós, que questionavam o paradeiro de seus netos (a ditadura civil-militar argentina roubou cerca de 500 filhos de desaparecidos); a própria geração dos desaparecidos, representada pelos sobreviventes; e os filhos, que nessa época estavam entre a adolescência e a vida adulta.
Em um contexto de impunidade total, no qual era impossível avançar judicialmente, a organização Hijos passou a sugerir a possibilidade de um avanço em outro tipo de condenação. “O caminho era a condenação social, já que não se podia contar com a Justiça, cúmplice do genocídio. Quanto mais a sociedade condena, mais fácil é romper a impunidade, inclusive judicialmente”, resume Agustín Cetrangolo, também militante da Hijos, na capital Buenos Aires. De fato, foi o que ocorreu no país. Em 2003, Néstor Kirchner derrubou as leis, o que permitiu o início do julgamento judicial de vários repressores. “Quase todos os processados ou julgados foram escrachados antes”, conta Cetrangolo.
Julio Avicento revela que diversas organizações participavam do escracho, não apenas a Hijos. “Usávamos as chamadas ‘mesas de escrachos’, nas quais participavam distintas organizações; havia muitas tarefas para dividir e muito a aprender durante o caminho”, lembra. O militante explica que um trabalho prévio ao escracho era feito, não só de investigação para comprovar a participação do repressor, mas também com os vizinhos. “Passávamos casa por casa conversando, explicávamos que íamos fazer uma atividade, entregávamos um texto explicando o porquê”, explica. A chamada “mesa de escracho” era geralmente feita em um centro cultural ou na sede de alguma organização, que cedia o espaço. Os militantes faziam então um diálogo com o bairro e com as organizações a partir do eixo da denúncia aos repressores.
A lógica não era necessariamente gerar a surpresa e um incômodo no repressor no momento do escracho, mas instalar um desconforto permanente por meio do trabalho com os vizinhos. “Queríamos que as pessoas se recusassem a entrar no elevador com eles, que o padeiro do bairro se recusasse a vender pão. Dizíamos: se não vai para a cadeia, que sua casa seja uma cadeia. Que na rua sejam repudiados pela sociedade.”
 
Filhos da luta
As organizações que aderiam ao escracho a um genocida (na Argentina, alguns juízes afirmam que os crimes de lesa-humanidade cometidos na ditadura se deram dentro de um plano sistemático de extermínio, que pode ser classificado como genocídio) não eram apenas formadas por familiares. A Hijos, por exemplo, é aberta à participação de toda a sociedade. Explica Avicento: “Não sou filho de desaparecido, mas há quatorze anos milito no âmbito dos direitos humanos, conheci muitos companheiros [filhos e parentes] e me envolvi. O rico dessa luta é que toda a sociedade pode se envolver”. Não somente pode, como deve. “Toda a sociedade foi vítima do terrorismo de Estado, todos sofreram com o terror e o medo”, completa.
Agustín Cetrangolo é filho de Sergio Cetrangolo, desaparecido em 1978. A mãe, também presa e torturada, é da geração de sobreviventes. “Não entendemos que a reparação é apenas com os familiares, mas deve-se reparar toda uma sociedade”, defende. “Na Hijos dizemos que todos somos filhos da mesma história. Seria um erro dizer que o genocídio pretendeu apenas exterminar as organizações políticas e seus militantes. A violência do genocídio extrapola isso. Se entendemos que toda a sociedade foi vítima desse terrorismo de Estado, por que não podemos organizar qualquer setor para lutar contra isso?”, completa.
Para Julio Avicento, quem usa o argumento de que os jovens de hoje não “têm nada a ver” com a repressão “esconde na verdade uma posição que procura manter a impunidade em relação aos repressores”. Os militantes também lembram que o aparato repressivo da ditadura persiste até hoje, com os casos de assassinatos de jovens pela polícia ou a perseguição e espionagem dos movimentos sociais. Também por isso os escrachos continuam sendo usados. “O escracho transcendeu a Hijos, para além do que entendíamos como escracho. Em 2001, por exemplo, escrachou-se tudo, bancos, McDonald’s”, recorda Cetrangolo.

Dafne Melo
Jornalista e historiadora


Ilustração: Igor Ojeda

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Delegado do DOPS revela em livro detalhes da repressão, tortura e assassinatos

Kikodmachado em seu blog


Foto:

Capa do livro de Cláudio Guerra


O site IG publica, nesta quarta-feira (2), matéria sobre o lançamento do livro de delegado do DOPS Cláudio Guerra com revelações bombásticas sobre a tortura, incineração de corpos de prisioneiros políticos e assassinatos cometidos pelas forças de repressão durante o regime militar brasileiro. Confira:

“Militantes de esquerda foram incinerados em usina de açúcar”

Delegado revela em livro que viraram cinzas os corpos de David Capistrano, Ana Rosa Kucinski e outros oito opositores da ditadura

Ele lançou bombas por todo o país e participou, em 1981 no Rio de Janeiro, do atentado contra o show do 1º de Maio no Pavilhão do Riocentro. Esteve envolvido no assassinato de aproximadamente uma centena de pessoas durante a ditadura militar. Trata-se de um delegado capixaba que herdou os subordinados do delegado paulista Sérgio Paranhos Fleury nas forças de resistência violenta à redemocratização do Brasil.

Apesar disso, o nome de Cláudio Guerra nunca esteve em listas de entidades de defesa dos direitos humanos. Mas com o lançamento do livro “Memórias de uma guerra suja”, que acaba de ser editado, esse ex-delegado do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) entrará para a história como um dos principais terroristas de direita que já existiu no País.

Mais do que esse novo personagem, o depoimento recolhido pelos jornalistas Marcelo Netto e Rogério Medeiros, ao longo dos últimos dois anos, traz revelações bombásticas sobre alguns dos acontecimentos mais marcantes das décadas de 70 e 80.

Revelações sobre o próprio caso do Riocentro; o assassinato do jornalista Alexandre Von Baumgarten, em 1982; a morte do delegado Fleury; a aproximação entre o crime organizado e setores militares na luta para manter a repressão; e dos nomes de alguns dos financiadores privados das ações do terrorismo de Estado que se estabeleceu naquele período.

A reportagem do iG teve acesso ao livro, editado pela Topbooks. O relato de Cláudio Guerra é impressionante. Tão detalhado e objetivo que tem tudo para se tornar um dos roteiros de trabalho da Comissão da verdade, criada para apurar violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar (1964-1988).

David Capistrano, Massena, Kucinski e outros incinerados

Cláudio Guerra conta, por exemplo, como incinerou os corpos de dez presos políticos numa usina de açúcar do norte Estado do Rio de Janeiro. Corpos que nunca mais serão encontrados – conforme ele testemunha – de militantes de esquerda que foram torturados barbaramente.

“Em determinado momento da guerra contra os adversários do regime passamos a discutir o que fazer com os corpos dos eliminados na luta clandestina. Estávamos no final de 1973. Precisávamos ter um plano. Embora a imprensa estivesse sob censura, havia resistência interna e no exterior contra os atos clandestinos, a tortura e as mortes.”

Os dez presos incinerados

João Batista e Joaquim Pires Cerveira > presos na Argentina pela equipe do delegado Fleury.
Ana Rosa Kucinsk e Wilson Silva > “A mulher apresentava marcas de mordidas pelo corpo, talvez por ter sido violentada sexualmente, e o jovem não tinha as unhas da mão direita”.
David Capistrano (“lhe haviam arrancado a mão direita”) , João Massena Mello, José Roman e Luiz Ignácio Maranhão Filho > Dirigentes históricos do PCB.
Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira e Eduardo Collier Filho > Militantes da Ação Popular Marxista Leninista (APML).

O delegado lembrou do ex-vice-governador do Rio de Janeiro Heli Ribeiro, proprietário da usina de açúcar Cambahyba, localizada no município de Campos, a quem ele fornecia armas regularmente para combater os sem-terra da região. Heli Ribeiro, segundo conta, “faria o que fosse preciso para evitar que o comunismo tomasse o poder no Brasil”.

Cláudio Guerra revelou a amizade com o dono da usina para seus superiores: o coronel da cavalaria do Exército Freddie Perdigão Pereira, que trabalhava para o Serviço Nacional de Informações (SNI), e o comandante da Marinha Antônio Vieira, que atuava no Centro de Informações da Marinha (Cenimar).
Afirma que levou, então, os dois comandantes até a fazenda:

“O local foi aprovado. O forno da usina era enorme. Ideal para transformar em cinzas qualquer vestígio humano.”

“A usina passou, em contrapartida, a receber benefícios dos militares pelos bons serviços prestados. Era um período de dificuldade econômica e os usineiros da região estavam pendurados em dívidas. Mas o pessoal da Cambahyba, não. Eles tinham acesso fácil a financiamentos e outros benefícios que o Estado poderia prestar.”

Do porão para o púlpito

Cláudio Guerra foi um dos policiais mais poderosos dos anos 70 e início dos anos 80. Circulava no eixo Rio-São Paulo-Minas Gerais-Espírito Santo com a desenvoltura de uma autoridade anônima consciente de seu poder de destruição humana. Hoje é um pastor evangélico que passa boa parte das manhãs de domingo estudando hebraico, e grande parte de seu tempo estudando a Bíblia. Também desenvolve atividades sociais sob a supervisão da Justiça, já que ainda cumpre pena de prisão, recolhido numa instituição para idosos. E vive pedindo por suas ovelhas: o tratamento difícil para alguma criança, uma cirurgia de emergência, um olhar mais técnico sobre um promissor jovem atleta de sua comunidade. Ex-policial experiente, ele sabe que sua vida sofrerá graves mudanças a partir da divulgação das informações constantes em Memórias de uma Guerra Suja.

O site memoriasdeumaguerrasuja.com.br apresenta o livro, os autores e o protagonista, além de indicar personagens da comunidade de informações, cemitérios clandestinos e desaparecidos políticos.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

A Revolução dos Cravos: “Foi bonita a festa, pá!”

Luis Alves no A VERDADE

Revolução dos Cravos - 25 de Abril 
Músicas e flores marcaram no 25 de abril de 1974 aquela que ficou conhecida como a Revolução dos Cravos.
Às 23h do dia 24, o locutor das Emissoras Associadas anunciou a canção “E depois do Adeus”. Era a senha para o décimo Grupo de Comando tomar a RádioClube Portugal (RCP). E a meia-noite e meia, a Rádio Renascença tocou “Grandola, vila morena, terra da fraternidade, o povo é quem mais ordena dentro de ti, ó cidade”! Era a senha para as demais ações militares que vieram a seguir: ocupação da Central Telefônica, dos ministérios, da Rádio e Televisão Portuguesa (RTP).
Quando o sol já brilhava, os capitães de abril tomaram o Banco de Portugal e logo chegaram ao Quartel do Carmo, onde se refugiara Marcello Caetano, primeiro-ministro que sucedeu o arquifascista general Antônio de Oliveira Salazar. Caía quase meio século (48 anos) de ferrenha ditadura.
Não houve resistência. Os tanques passearam pelas ruas até os pontos estratégicos que deveriam ser ocupados. Até paravam nos sinais vermelhos e o povo, que se aglomerou para apoiar e aplaudir, distribuía flores com os soldados, os famosos cravos que enfeitaram os fuzis e se tornaram símbolo do movimento revolucionário. O 25 de abril não entusiasmou apenas o povo português, mas as forças populares do mundo inteiro. No Brasil, por vivermos ainda uma ditadura militar do mesmo quilate da portuguesa, e pela ligação histórica Brasil-Portugal, ele foi saudado com muito entusiasmo. Chico Buarque, com sua música denunciadora e profética, escreveu: “Sei que estás em festa, pá! Fico contente e enquanto estou ausente, guarda um cravo para mim” (Tanto Mar).
Mas para entendermos o levante vitorioso de abril e os fatos que ocorreram a seguir precisamos recuar bastante no tempo. Paciência, que na história humana nada acontece por acaso.
De dominado a dominador
Portugal formou-se provavelmente na Idade do Bronze (2.000 a.C.- 8.000 a.C.), quando povos de origens diversas, em fluxo migratório, pararam diante do mar na Península Ibérica e se miscigenaram. Depois vieram as invasões, sucessivamente dos romanos, bárbaros e muçulmanos.
Não há uma data que marque a independência do território português e sua constituição enquanto nação soberana. Foi um processo que se deu a partir do século XII. Há historiadores que identificam como momento decisivo as batalhas de 1383/1385, que tiveram ampla participação popular e derrotaram definitivamente os exércitos de Castela (Espanha).
Os portugueses desenvolveram no litoral intensa atividade pesqueira e aprenderam muito bem a arte da navegação. Já em 1415, realizou-se a 1ª expedição ao norte da África, conquistando Ceuta,  porta de entrada para uma região rica em cereais. A busca de novas terras é vista como forma de solucionar os graves problemas econômicos que atingem o país: desorganização da sociedade rural, domínio da burguesia comercial, expansão da economia europeia e de seu mercado consumidor. Para o povo português, representava também a oportunidade de emigrar para conseguir riqueza em outras terras.
Em 1448, as expedições chegaram à Índia, firmando Portugal como potência naval e comercial. Portugal, entretanto ,não investiu os lucros obtidos no desenvolvimento industrial, tornando-se um entreposto comercial da Europa e constituiu-se enquanto império periférico, mantendo uma relação de dependência com o seu principal cliente, a Inglaterra. Quando se consolida a Revolução Francesa e a França passa a disputar com os ingleses a supremacia no continente europeu, Portugal está inteiramente alinhado com a Inglaterra, com quem mantém intenso comércio com base na produção agrícola brasileira.
O declínio do império
Em 1807, as tropas francesas (napoleônicas) invadem Portugal e a Corte se refugiou no Brasil, vivendo o império português a sua 1ª grande crise.
Com a derrota de Napoleão (1814), Portugal passou a ser governado por uma Junta de Governadores que recebia instruções do Rio. A Corte permaneceu no Brasil até 1820 quando se deu a revolução do Porto, que reduziu os poderes do rei, estabelecendo uma monarquia constitucional, e exigiu o retorno do Dom João VI.
A emancipação do Brasil (1822) destruiu os pilares do comércio português. Para compensar as perdas, o império volta-se para suas colônias na África.
Com escassa industrialização e extrema dependência dos mercados externos a crise se agrava a cada dia. Incapaz de solucioná-las, a monarquia abre espaço para a articulação republicana, que unia setores médios (intelectualidade, militares) e setores das massas urbanas.
A república foi proclamada em 5 de outubro de 1910, por meio de um golpe de Estado, desencadeado a partir de um atentado que vitimou o rei, D. Carlos e o príncipe Luís Felipe, herdeiro do trono.
A era republicana começa com a disseminação das greves operárias contra o alto custo de vida e os baixos salários. O novo regime respondeu com uma lei de greve patronal e com repressão ao movimento. A classe operária foi posta à margem da vida republicana, uma vez que sua proclamação fora obra das elites, fazendo apenas circular o governo entre frações das classes dominantes. A primeira república durou até 1926, quando um golpe militar pôs fim à instabilidade política.
Em 1928, o Governo do general Carmona convidou para pôr ordem na economia um professor da Universidade de Coimbra, Antônio Oliveira Salazar. Este acabou assumindo a chefia do Estado. Com a implantação de rigorosa ortodoxia econômica e implacável repressão política, o salazarismo unificou as classes dominantes e impôs uma ditadura de quase meio século (48 anos).
A relação da ditadura salazarista com as Forças Armadas nunca foi tranqüila, especialmente após a Reforma Militar de 1937, que subordinou a instituição militar ao chefe do executivo (Salazar). Várias conjuras militares aconteceram e foram derrotadas nos anos 50 e 60.
No meio popular, a luta se desenvolvia em rigorosa clandestinidade. A repressão dizimou centenas de quadros do Partido Comunista Português (PCP) e de outras organizações de esquerda.
A queda do salazarismo começou na África com a derrocada do que restava do império colonial português. A exploração econômica já não compensava mais os custos sempre crescentes que o Estado português tinha de fazer para enfrentaras guerrilhas de libertação nacional que impunham cada vez mais derrotas ao império, especialmente em Moçambique, Angola, e Guiné-Bissau. Em 24 de setembro de 1973, foi proclamada a independência da Guiné, com o reconhecimento diplomático de 86 países, fato que demonstrou o isolamento da ditadura colonialista portuguesa, a essa altura já condenada pela ONU.
A relação deficitária entre a metrópole e as colônias africanas aguçou a crise econômica interna e a insatisfação popular com o regime e o colonialismo, identificados como responsáveis pelo desemprego, os baixos salários e o esvaziamento do campo. Apesar da ditadura, os trabalhadores não deixaram de lutar e se organizar, criando as comissões clandestinas nos locais de trabalho e intervindo também nos sindicatos oficiais. No seio das Forças Armadas, o descontentamento crescia diante da redução dos gastos, a contabilização de milhares de soldados mortos no continente africano e a certeza que se instalava entre os oficiais de que seria impossível uma vitória militar.
O falecimento de Salazar em 1968, substituído por Marcello Caetano, ex-reitor da Universidade de Lisboa, não alterou o quadro.
A década de 1970 se inicia com o impulso das lutas operárias, especialmente a partir da 1ª metade de 1973. Daí, até abril de 1974, mais de cem mil trabalhadores participaram de greves nos centros industriais, nas grandes, pequenas e médias empresas e nas zonas agrícolas de Alentejo e Ribatejo. Numerosos sindicatos se libertaram de direções pelegas, havia um movimento em ascensão, que preparava um grande ato público para o 1º de maio em Lisboa e outros centros do país, marcando uma jornada de lutas por melhores salários, contra a carestia, mas também por liberdades democráticas,contra as guerras coloniais, por independência e paz. Por seu lado, o governo fascista articulava uma operação preventiva que no dia 30 de abril levaria para a prisão ativistas sindicais e populares. Não teve tempo.
Os capitães de abril
Em 9 de setembro de 1973, numa chácara nos arredores de Évora, nasceu o Movimento dos Capitães ou Movimento das Forças Armadas (MFA), que propunha o fim do colonialismo e a democratização da sociedade portuguesa.
Setores mais conservadores das Forças Armadas planejaram tomar a bandeira dos capitães. Para isso, o general Antônio Spínola lança o livro Portugal e o Futuro em que defende a independência progressiva das colônias e sua união em uma “comunidade lusíada”, com a realização de eleições democráticas.
Os dois grupos acabam se compondo. Isto garantiu, por um lado, a neutralidade do alto oficialato, permitindo uma ação incruenta, mas por outro, exigiu concessões no programa político, como explicou o major Otelo Saraiva de Carvalho: “O General (Spínola) travava o movimento de abril; os oficiais do movimento acertaram o programa com o general porque precisavam dele. Então foram feitas muitas concessões. O programa não saiu como queríamos” (JB, 11/10/74)
Avanços e Recuos
A ação militar vitoriosa de 25 de abril não foi articulada com o movimento de massas, mas incorporou em parte seus anseios. Por isso, foi defendida e apoiada, como relatamos no início, e mais ainda, no Dia do Trabalho. “Foi o maior dos maios. Só possível por causa de abril. Ali estiveram quase um milhão de portugueses, sem contar com as muitas centenas de milhares que estiveram no Porto, Braga, Aveiro, Coimbra, Santarém, Barreiro, Alentejo e outras centenas de localidades… A palavra de ordem era “O povo, unido, jamais será vencido”. As exigências eram o fim da guerra colonial, a restauração das liberdades democráticas e a justiça social”.
O primeiro Governo Provisório, pós-abril, contemplou todas as forças, sendo palco de disputas e contradições, mas tomou medidas importantes: congelamento de preços dos bens de primeira necessidade, instituição do salário mínimo nacional, reconhecimento do direito de greve e associação. Depois de uma tentativa de golpe direitista em 11 de março de 1975, Spínola renunciou à presidência e Vasco Gonçalves assumiu a chefiado Conselho de Ministros.
A esquerda assume o comando da Revolução. O novo governo toma medidas que implicam profundas mudanças econômico-sociais: estatização dos bancos e setores estratégicos da economia como energia, telecomunicações e transporte, além da construção civil, regulamentação do mercado, realização da reforma agrária no Alentejo e no Ribatejo.
O patronato promove sabotagens, desorganiza a atividade econômica, enquanto o Movimento Operário, apesar de não se desmobilizar, reduz o número de greves. Isso ocorre, segundo Álvaro Cunhal, secretário Geral do Partido Comunista Português (PCP), em razão da “elevada consciência política da classe operária e dos demais trabalhadores”.
Enquanto isso, no interior das Forças Armadas, a direita se articula. Um grupo de oficiais elabora o documento dos nove em que condena o radicalismo. Em 2 de setembro de 1975, uma assembleia do MFA define que a presença de Vasco Gonçalves no governo é incompatível com a coesão das Forças Armadas. Vasco é demitido.
Em 25 de novembro de 1975, um grupo de pára-quedistas se subleva, num episódio que nunca foi devidamente esclarecido. Adireita caracterizou-o como insurreição de esquerda para tomar o poder. Mas a esquerda define-o como manobra da direita para justificar a direitização do regime. O fato é que o 25 de novembro marcou a exclusão da esquerda do MFA. Oficiais e soldados considerados radicais foram expulsos, licenciados, presos e transferidos para a reserva.
Em 26 de fevereiro de 1976, eliminado a componente radical da revolução, novo acordo MFA- partidos políticos pôs Portugal na senda da democracia burguesa. Aos poucos, as conquistas da revolução dos Cravos foram eliminadas e o país integrou-se como sócio menor à União Europeia, sob a dependência dos monopólios capitalistas.
A ferrenha censura proibiu a música de Chico Buarque em homenagem à Revolução de Abril em 1974. Quando foi liberada na vigência da “abertura lenta, gradual e segura”, ele teve que refazer a letra que se imortalizou: “já murcharam tua festa, pá, mas certamente esqueceram uma semente nalgum canto do jardim.”


Luiz Alves
(Publicado no Jornal A Verdade, nº 60)

quarta-feira, 18 de abril de 2012

O 'Schindler' italiano que salvou centenas de vidas na Argentina


O diplomata italiano Enrico Calamai foi um herói silencioso que atuou no Consulado em Buenos Aires durante a ditadura, quando arriscou sua vida e sua carreira para facilitar a fuga de centenas de dissidentes políticos e partidários que pegaram em armas contra o experimento neonazista dos generais argentinos. Em conversa com a Carta Maior, em Roma, Calamai fala sobre a Operação Condor, sobre o envolvimento de diplomatas e da ditadura brasileira em assassinatos e sobre a cumplicidade do Vaticano com a ditadura argentina.


Roma - Se a Itália fosse uma Meca do cinema político como o era nos anos 60 e 70, seguramente os estúdios romanos de Cinecittá teriam filmado algo parecido à Lista de Schindler, aquela produção de Hollywood sobre um magnata alemão que resgatou cerca de mil judeus condenados a morrer em Auschwitz. O protagonista do filme que nunca se realizou seria o diplomata italiano Enrico Calamai, um herói silencioso que atuou no Consulado em Buenos Aires durante a ditadura, quando arriscou sua vida e sua carreira para facilitar a fuga de centenas de dissidentes políticos e partidários que pegaram em armas contra o experimento neonazista dos generais argentinos.

"Nunca me detive a contar as pessoas que passaram pelo Consulado. Em um programa da RAI (TV italiana) disseram que foram mais de 400, sinceramente não sei se esse número é correto, não sei quantos receberam nossa ajuda para poder sair com vida da Argentina".

A biografia de Calamai é a de um diplomata incomum no outono portenho de 1976 quando a chegada ao poder do general Videla era bem acolhida pela maioria das embaixadas ocidentais e comemorada secretamente pela do Brasil, como consta na intensa comunicação gerada pelo então embaixador João Batista Pinheiro.

DESAFIANDO A OPERAÇÃO CONDOR
 
"Nós sabíamos que a Operação Condor estava atuando, ainda não a conhecíamos por esse nome, mas tínhamos notícias de que os militares brasileiros e argentinos estavam articulados para deter quem fugia da matança em Buenos Aires, por isso decidi viajar com dois ítalo-argentinos, Piero Carmelutti e Santiago Camarda, até o Rio de Janeiro. Era arriscado que fossem sozinhos. Foi no carnaval de 1977".

“Estes rapazes estiveram um tempo ocultos no Consulado, um deles tinha uma destreza artesanal para falsificar documentos e confeccionou uns que de autênticos tinham apenas as fotos”.

“Fez isso com meu auxílio, utilizando alguns carimbos que lhe facilitei, era um método não formal de fazer documentação para sair do país, não tínhamos apoio institucional, fizemos tudo às costas da Embaixada, que não me apoiava nisto”.

“Também não obtive apoio de um funcionário da Alitalia a quem propus que fizesse vista grossa e nos desse passagens diretas até Roma, o que ele recusou, escandalizando-se. Finalmente conseguimos as passagens diretas, graças ao representante da Varig na Argentina, um ítalo-brasileiro robusto e cordial".

"Nossa premissa era evitar que fossem interrogados no Rio, porque ali possivelmente havia gente do aparato de inteligência militar, e minha função era estar junto a eles para fazer valer minha condição de diplomata denunciando um eventual sequestro, como ocorreria em 1980 com o ítalo-argentino Domingo Campiglia, capturado precisamente no Rio de Janeiro" conta Calamai, com o rigor próprio de um historiador.

"Eles não podiam permanecer em Buenos Aires, mas por sua vez tinham que atravessar o cerco da Operação Condor no Rio, a única forma para que chegassem com vida à Itália".

A resistência à ditadura havia sido fraturada militarmente em 1977, ano de intenso intercâmbio entre os serviços de inteligência dos ditadores Ernesto Geisel e Jorge Videla.

Documentos a que Carta Maior teve acesso, datados daquele ano, confirmam a prioridade dada por Brasília à localização e detenção de "elementos Montoneros e do ERP (Exército Revolucionário do Povo)", para serem entregues à Buenos Aires.

Os aparelhos repressivos trabalhavam em notável sintonia. Tanto que as agências de inteligência brasileiras recebiam informações sobre as atividades da resistência argentina na Itália.

Dentro da documentação até agora secreta, obtida por Carta Maior, consta um dossiê do Estado Maior do Exército brasileiro, originado na Itália em junho de 1978, intitulado como “Movimento Peronista Montonero no exterior, Acionar, Contatos, Conexões com Grupos Terroristas, Antecedentes”.

CONSPIRAÇÃO DIPLOMATICA
 
As centenas de argentinos que escaparam do genocídio graças ao trabalho de Calamai não lhe valeram muito para obter uma promoção em sua carreira diplomática, dado que após haver trabalhado cinco anos na Argentina, um destino considerado de relativa importância, foi enviado a outro considerado irrelevante: o Nepal.

Diferente foi a sorte do embaixador brasileiro João Batista Pinheiro que, após seus bons ofícios diante da Junta Militar portenha, foi promovido a chefe da missão diplomática em Washington.

Pouco depois da derrubada do governo civil argentino, Pinheiro trabalhou para que Geisel enviasse, em abril de 1977, um representante a Buenos Aires, um gesto crucial para Videla, que temia sofrer o isolamento diplomático do qual padecia seu colega chileno Augusto Pinochet.

"Até agora não se estudou a fundo como atuaram os serviços diplomáticos em geral frente à ditadura", afirma Calamai durante a conversa com a Carta Maior em Roma.

E amplia: "não digo só pela Itália, me refiro à maioria dos países ocidentais, que foram completamente omissos ante as violações dos direitos humanos na Argentina".

Como nos pactos mafiosos, o grosso dos diplomáticos instalados em Buenos Aires, salvo os da embaixada do México, onde o ex-presidente democrático Héctor Cámpora recebeu refúgio durante anos, optou por omitir-se.

"Direta ou indiretamente, as principais embaixadas, inclusive aqui as da Itália, e acho lógico que também a do Brasil, embora não tenho informação concreta, foram informadas de que viria o golpe de Estado".

"Estes avisos sobre a eminente derrubada do governo civil eram também uma forma de advertir que não aceitariam que as embaixadas recebessem refugiados, como havia feito nossa embaixada e outras depois do golpe do Chile. E quase todos os países que receberam o aviso dos militares argentinos, pelo visto, entenderam o recado e o aceitaram".

"Agora, com o passar do tempo, compreendo que em torno da Operação Condor havia uma colaboração estreita das embaixadas e dos militares argentinos, e das embaixadas e seus próprios agregados militares. A diplomacia é algo muito próximo ao poder, e o foi durante as ditaduras, os diplomatas sabem que se se opuserem ao poder serão ou marginalizados, ou eliminados. Nessa época isto era um risco real".

SANTA CUMPLICIDADE
 
Antes da entrevista, Calamai nos mostra o Antico Café do Brasile, a poucos metros de sua casa: "antes de ser papa, João Paulo II, quando era seminarista, vinha habitualmente a este café, é um lugar simples, como podem ver".

As exéquias de João Paulo I, antecessor do papa polaco que frequentava o bairro de Calamai, foram um pretexto para estreitar as relações entre o Vaticano e Videla, que foi um dos chefes de Estado convidados. As gestões para a viagem de Videla e seu encontro com o então primeiro ministro italiano, foram realizadas pela loja maçônica Propaganda Due (P2), segundo consta em um livro lançado este ano na Universidade Roma Três.

"A loja P2 se movia como um poder oculto e gozava de uma notável influência no serviço exterior italiano e no Vaticano, e um de seus principais homens, Licio Gelli, mantinha boas relações na Igreja".

"O Vaticano esteve muito próximo do regime argentino, não só porque coincidia com seu anticomunismo, mas porque contribuía na decisão de Roma de terminar com a teologia da liberação na América Latina. Dizia-se que o núncio apostólico jogava tênis com o almirante (Emilio) Massera", um dos membros da Junta, a quem correspondia o controle do Ministério do Exterior argentino.

"Mas também é preciso lembrar que os motivos ideológicos que levaram o Vaticano a apoiar os militares eram tão importantes como os interesses econômicos de empresas ligadas à Igreja que estavam radicadas na Argentina".

Estas razões contribuem para explicar, segundo Calamai, porque o Estado do Vaticano omitiu-se durante anos em denunciar o genocídio argentino e negou ajuda aos familiares dos desaparecidos e prisioneiros.

"Existem muitas coisas que escaparam da minha memória, mas o que lembro é que, quando falava com diplomatas de outros países sobre as violações dos direitos humanos, praticamente todo mundo dizia que ninguém ia à Nunciatura porque não os recebiam".

Tradução: Libório Junior

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Na terra de Médici, ato público homenageia vítimas da ditadura e denuncia ditador



Um grupo de estudantes, professores, artistas, jornalistas e de outras categorias de trabalhadores promove um ato público nesta quarta-feira (11), às 18 horas, em Bagé, para homenagear a memória dos desaparecidos, torturados e mortos pela ditadura militar. O grupo se reunirá na praça de esportes e dali seguirá até o Clube Comercial, na avenida 7 de setembro, onde será realizado o ato. A escolha do dia, hora e local não é casual. Nesta mesma quarta, às 19h, será lançado no Clube Comercial o livro “Médici, a verdadeira história”, de autoria dos coronéis reformados Claudio Heráclito Souto e Amadeu Deiro Gonzalez.
“Vamos romper o silêncio que paira sobre esta cidade e mostrar aos saudosistas da ditadura que a população de Bagé NÃO tem orgulho dos tempos do Médici, o governo mais nebuloso da história do Brasil! Nosso ato é pacífico, sensibilizador e formativo. Todos que quiserem somar nessa manifestação ou procurar esclarecimentos podem nos encontrar durante a manifestação” dizem os organizadores.
Contra a visão da história apresentada pelos militares aposentados, os manifestantes pretendem chamar a atenção para a memória dos presos políticos, dos desaparecidos e mortos pela ditadura do Médici. Além disso, querem “chamar a atenção da população bageense, que convive silenciosamente com esse câncer histórico, para a importância da abertura dos arquivos da ditadura e pelo julgamento dos torturadores”. “A abertura dos arquivos da ditadura corresponde a um direito que as pessoas têm de saberem do paradeiro de seus familiares, aqueles que se opuseram ao regime militar em defesa da justiça e da liberdade”, acrescentam.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Militares ameaçam jovens que protestaram contra comemoração do golpe de 1964


Site de coronel da reserva exibe vídeo e troca informações sobre jovens que participaram de protesto no Rio de Janeiro | Arte: Ramiro Furquim/Sul21

Samir Oliveira no SUL21

Cinco jovens do Rio de Janeiro que protestaram contra a comemoração do golpe de 1964 feita por militares da reserva no dia 29 de março estão sendo ameaçados e tendo suas vidas expostas. O site A Verdade Sufocada, mantido pelo coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra, publicou fotos com o nome de cinco manifestantes e os locais onde eles trabalham. A ira da caserna recaiu com mais força sobre Luiz Felipe Garcez, que foi flagrado numa fotografia cuspindo no coronel-aviador Juarez Gomes enquanto ele deixava o Clube Militar no Rio de Janeiro.
O site de Ustra, ex-comandante do DOI-CODI de São Paulo e torturador reconhecido pela Justiça, informa o e-mail e os perfis no Twitter e no Facebook de Luiz Felipe. Os dados se espalharam por sites e blogs mantidos por militares, que estão postando diversas ameaças aos cinco jovens pela internet.
No blog do coronel da reserva Lício Maciel – que participou da repressão à Guerrilha do Araguaia – há um vídeo de 3 minutos, que já foi retirado do YouTube, com o título de “maloqueiros alucinados”, em referência aos manifestantes. Os jovens são tratados o tempo inteiro como criminosos e agressores de idosos e os militares fazem questão de expor informações sobre eles.
No post que exibe o vídeo, o comentário de um sujeito identificado como Eduardo Cruz demonstra que a vida desses cinco jovens – especialmente a de Luiz Felipe – foi investigada. “Após um levantamento preliminar, obtive algumas informações importantes sobre o covarde que agrediu aquele senhor idoso no dia 29. O nome completo do meliante é Luiz Felipe Monteiro Garcez, vulgarmente conhecido como Pato, estudante do curso de Produção Cultural do IFRJ (Instituto Federal do Rio de Janeiro) desde 2010. Tem 25 anos de idade, frequenta o Diretório Estadual do PT no Rio de Janeiro e não trabalha”, escreveu o comentarista, que fornece informações dos empregos que o jovem já teve.
Eduardo Cruz vai além em seu comentário no blog de Lício Maciel. Ele dá informações sobre a família de Luiz Felipe e ainda faz juízo de valor sobre sua criação. O comentarista cita o nome da “namoradinha” de Luiz Felipe, informa que ele tem uma filha, publica o nome dos pais do jovem e ainda comenta que eles “visivelmente falharam na educação do moleque”.
Site mantido por Carlos Alberto Brilhante Ustra instiga militares a procurarem informações sobre jovens que participaram do protesto | Foto: Brasil247

Eduardo Cruz finaliza o comentário dizendo que “por enquanto é isso” e assegurando que irá prosseguir com a “averiguação” e que voltará “em breve com informações sobre os outros agressores presentes naquele episódio”.
Nesse mesmo post do blog do coronel Lício Maciel há um link para uma pasta no site de compartilhamentos 4Shared com informações sobre a vida de Luiz Felipe Garcez. São exibidas fotos dele, de sua mulher e até de sua filha. Uma das imagens mostra o jovem com a filha recém-nascida no colo, com as devidas identificações.

“Não podemos nos permitir ter medo”, diz jovem ameaçado

Em conversa por telefone com o Sul21, Luiz Felipe Garcez conta que já recebeu mais de 150 ameaças por Facebook e por e-mail. Ele assegura que o vídeo feito com informações sobre sua vida, de seus amigos e de sua família – que chegou a ter mais de 11 mil acessos até ser retirado do ar – foi produzido por um jovem “infiltrado” no protesto do dia 29 de março e diz que vai entrar com processos judiciais contra as pessoas que estão expondo sua vida. “Estamos tomando medidas preventivas, documentando as ameaças e vamos entrar com um  processo por incitação ao ódio. Não podemos ter medo, senão vão entender que esse tipo de intimidação funciona”, comenta.
Pasta criada em site de compartilhamento exibe fotos e informações de Luiz Felipe e da sua família | Arte: Ramiro Furquim/Sul21

Ele acredita que os ataques venham de grupos organizados de extrema direita – com a presença ou não de militares. “São grupos organizados politicamente que podem ter militares da ativa. Mas não é a instituição Exército que está nos atacando, são fascistas que se organizam internamente”, explica.
Luiz Felipe garante que continuará denunciando os abusos e não se intimidará com as ameaças. “Sabemos que é isso que eles fazem, não podemos esperar nenhum tipo de reação diferente. São filhotes de uma ditadura que matou, perseguiu e torturou, ainda tem muita gente que acredita nisso. Muitos dos que eles mataram deram a vida para que pudéssemos estar hoje protestando. Não podemos nos permitir ter medo”, defende.
Outro manifestante exposto por Ustra, Rodrigo Mondego, também conversou por telefone com o Sul21 e disse que também vem sofrendo ameaças. “Se identificam como militares e nos ameaçam de morte. Entramos em contato com o ouvidor da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, com a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, com a OAB-RJ e vamos conversar também com Ministério Público Federal”, avisa.
Rodrigo explica que o principal objetivo é retirar a exposição de seus dados e dos seus amigos dos sites dos militares. “Podemos ver que vários blogs de militares nos citam, basta colocar nossos nomes no Google”, lamenta.
Ele acredita que há policiais da PM do Rio de Janeiro atuando para ajudar na apuração de informações sobre sua vida e a dos outros jovens expostos. E lembra que havia diversos agentes disfarçados da P2 – o setor de investigações da Polícia Militar carioca – durante a manifestação contra a comemoração do golpe no dia 29 de março. “Eles são organizados e muita gente simpatiza com a lógica da ditadura. As ameaças são virtuais, mas vindo de onde estão vindo, tememos que se transformem em realidade”, considera.
Rodrigo diz que está tomando precauções quanto à sua segurança e admite que as ameaças afetam o seu cotidiano. “A tortura psicológica está funcionando”, desabafa.
Dentre as centenas de pessoas que participaram do protesto no dia 29 de março, apenas cinco jovens foram expostos por Ustra. Rodrigo Mondego acredita que foram escolhidos por estarem envolvidos na organização do ato, além de serem todos amigos de Luiz Felipe Garcez. Além disso, todos militam na juventude do PT do Rio de Janeiro.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Europa: até a prostituição em crise


Empobrecimento no Leste multiplica casos de tráfico de mulheres, levando violência até a países onde profissão foi regulamentada, como Holanda

Por Antonio Barbosa Filho*, de Amsterdã para o PASSA PALAVRAS

Em pelo menos nove países da Europa a prostituição é legalizada, e as profissionais do sexo têm direitos trabalhistas, tratamento médico preventivo e proteção contra a exploração por gigolôs. Nem sempre tudo que está nas leis é obedecido, mas o fato é que em países como a Holanda a criminalidade que cerca a prostituição em outras partes do mundo é bastante reduzida.

A relativa tranquilidade do chamado Red Light District (Bairro da Luz Vermelha), onde encontram-se dezenas de bordéis e centenas das famosas vitrinas onde as prostitutas se exibem e tentam atrair seus clientes, está sendo abalada nos últimos dois anos pela crise econômica que atinge a Europa. Segundo as autoridades, aumenta a presença do crime organizado no tráfico de mulheres que buscam fugir dos países mais pobres (especialmente os da antiga União Soviética, como Moldova, Ucrânia, Belorússia, Romênia, Bulgária, República Tcheca e outros). Trazidas para os países mais adiantados, como a Holanda, Alemanha, Bélgica, Inglaterra e França, além da Escandinávia, muitas delas são escravizadas através de dívidas que são obrigadas a assumir, ou da violência pura e simples. Muitas vezes, elas passam antes por um “estágio” em países intermediários como a Macedônia (parte da antiga Iugoslávia), onde sofrem torturas e humilhações para ficarem “dóceis” aos seus “donos”.
É impossível verificar os números envolvidos no tráfico de mulheres e nas redes de prostituição, mas a polícia calcula que entre 200 mil e 400 mil mulheres e garotas sejam retiradas anualmente dos países do Leste, e pelo menos a metade delas acaba sendo prostituída no Oeste – um quarto iria para os Estados Unidos. Organizações de direitos humanos e combate à escravidão lutam para que as polícias dos vários países ajam, mas a corrupção neste setor é grande. O chefe de polícia encarregado de combater este crime em Velesta, na Moldova, Vitalie Curarari, por exemplo, chega a culpar as próprias mulheres: “Cinquenta por cento de nossas mulheres vão para o estrangeiro procurar outros homens e depois voltam apenas para se divorciarem de seus maridos”… Ele também culpa a imprensa por fazer “sensacionalismo” ao denunciar as máfias do tráfico humano e as crueldades praticadas contra mulheres prostituídas.

A situação econômica influencia na prostituição de várias maneiras.
Em primeiro lugar, força mulheres dos países pobres a aceitarem convites ou atenderem a anúncios oferecendo empregos em países distantes. Há casos, por exemplo, de jovens que pensavam estar embarcando para um emprego de garçonete na Itália, mas depois de entregarem seus passaportes ao “agente de empregos” foram embarcadas para outros países, presas nos fundos de prostíbulos, espancadas e obrigadas a praticarem serviços sexuais sob ameaça e em troca de comida.
Também muitas jovens estudantes nas principais cidades de toda a Europa, diante dos elevados preços das escolas (os governos cortam gastos com Educação como parte de seus “ajustes fiscais e orçamentários”), dos aluguéis e demais despesas, acabam recorrendo à prostituição através de agências de acompanhantes. Este trabalho lhes permite horários flexíveis, boa remuneração, e visitas a hotéis e restaurantes que uma estudantes jamais poderia frequentar.

Já no Bairro da Luz Vermelha, em Amsterdã, as prostitutas reclamam que o volume de clientes tem diminuído, e que eles passaram a pechinchar muito mais pelos serviços. Fora desta área organizada e mais protegida, há muitas mulheres se prostituindo por valores mínimos, como no Theemsweg, uma área do tamanho de um campo de futebol, onde a Prefeitura instalou vários pontos de ônibus. As mulheres se abrigam neles, e os carros as apanham para uma relação rápida, dentro dos automóveis mesmo. Um policial nos informa que ali 70% das mulheres estão no país ilegalmente, e a maioria veio dos países do Leste europeu.

Tudo isso vem preocupando as autoridades holandesas, que legalizaram a prostituição no ano 2000 para evitar a superexploração, a prostituição de menores, a violência dos gigolôs, e a disseminação das drogas neste meio. A legalização funcionou razoavelmente por vários anos, mas nada fica imune diante da grave crise do capitalismo que atinge profissionais de todas as áreas – inclusive as que comercializam o sexo.

* Antonio Barbosa Filho é jornalista e escritor, autor de A Bolívia de Evo Morales e A Imprensa x Lula – golpe ou sangramento? (All Print Editora). Em viagem pela Europa, acompanha as consequências da crise financeira pós-2008 e da onda corte de direitos sociais (‘políticas de austeridade’) iniciada em 2010

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Golpe de 64: 31 de março ou 1º de abril?

Deflagrado há 48 anos e encerrado há 27, o Golpe Civil-Militar de 1964 continua suscitando divergências no Brasil. Como todos os golpes e todas as ditaduras no mundo, teve seguidores e adversários e, ainda hoje, continua tendo defensores e detratores acerbos. Nesta semana, quando transcorre mais um de seus aniversários, têm ocorrido manifestações em diferentes lugares do país, umas comemorando seus feitos, outras os deplorando. Este jornal se coloca entre os que os deploram e registra aqui sua posição de modo claro.

Os anos de 1960 e 1970 foram um período de acirramentos das tensões políticas internacionais, com a guerra-fria chegando ao seu auge. A partir do muro de Berlim, EUA e URSS dividiam o mundo e o disputavam, perfilando nações e populações sob os rótulos da democracia liberal e do comunismo marxista. Dois grandes sistemas de organização social, econômica e política estavam em confronto aberto, ainda que não se estabelecesse um litígio armado direto entre as nações que se colocavam como líderes de suas expansões e campeãs de suas defesas.

Na impossibilidade do confronto direto das duas novas grandes potências, pois o equilíbrio de forças então existente fazia com que elas se temessem mutuamente e se armassem desesperadamente, os embates foram transferidos para a periferia do sistema mundial, no então chamado Terceiro Mundo: América Latina, Sul da Europa, Oriente Médio, Ásia e África. Ditaduras se estabeleceram em todos os continentes, principalmente nos países mais pobres e/ou nos social e economicamente mais desiguais.

Eram tempos também de efervescência, com os avanços social-democráticos e dos direitos civis dos negros, a explosão da juventude e do rock ‘n roll, a disseminação da pílula anticoncepcional e o início da afirmação do poder feminino. Nas Américas, ocorria a Revolução Cubana e a possibilidade de sua expansão por todo o continente, com a emergência de governos nacionalistas e progressistas. Em contrapartida, as ditaduras começaram a eclodir na região, iniciando-se pelo Brasil e expandindo-se, posteriormente, por toda a América do Sul e Central, quase sem exceção de países.

Em 31 de março/1º de abril de 1964, o general Olímpio Mourão Filho parte com suas tropas de Minas Gerais em direção ao Rio de Janeiro e dá início ao Golpe que iria manter os militares no poder durante 21 anos. O governo João Goulart, progressista e que pretendia promover as então chamadas “reformas estruturais”, como a reforma agrária, a reforma fundiária urbana, a industrialização independente e a distribuição de renda no país, foi deposto sob a acusação de se alinhar com as forças e a ideologia comunista.

Convocados pelas “marchas com Deus e pela família”, realizadas nas principais cidades brasileiras e lideradas por representantes da UDN (União Democrática Nacional), por bispos e padres católicos e lideranças conservadoras, os militares depuseram o presidente da República constitucionalmente eleito prometendo “restabelecer a ordem” e rapidamente devolver o comando do país aos civis, mas se encastelaram no poder. Promoveram desenvolvimento econômico acelerado, durante os anos do chamado “milagre econômico brasileiro” (1968/1973), com crescimento do PIB na casa dos 10% ao ano, mas prenderam, torturaram e mataram quem se atrevesse a oferecer qualquer tipo de resistência às suas atividades e aos seus comandos.

A violência começou, na verdade, antes do desenvolvimento econômico e se estendeu por muito tempo depois de o país ter caído em estagnação. Desde as primeiras semanas do governo golpista, políticos legalmente eleitos, bem como lideranças sindicais, estudantis e sociais foram presas e submetidas a inquéritos policiais-militares, tiveram seus direitos políticos cassados e foram proibidas de atuar politicamente pelo prazo de 10 anos. Foi inicialmente desmantelada a estrutura sindical de trabalhadores no país, que começara, nos anos de 1960, a sair da tutela do Estado e tornar-se independente. Desmantelou-se, a seguir, o movimento estudantil, com a invasão do Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), a prisão de todas as suas principais lideranças e a proibição de ações políticas nas escolas e faculdades, com a extinção dos Centros Acadêmicos e a promulgação do Decreto 477, que punia com a expulsão e o impedimento de se matricular em escolas públicas no país durante três anos para os que se envolvessem em atividades políticas.

Sem alternativas de ação legal, a juventude, principalmente, começou a agir na clandestinidade. Muitos partidos políticos e organizações paramilitares de esquerda foram criadas, quase todas dissidentes do antigo Partido Comunista, já dividido, naquele momento em PCB e PCdoB. Multiplicaram-se grupos armados, de guerrilha urbana e rural. A repressão se sofisticou. No âmbito militar foram criados os órgãos de investigação e tortura policial-militar, com a Operação Bandeirantes (OBAN), em São Paulo, e as agências no interior de cada uma das forças armadas: o DOI-CODI, do Exército, o PARASAR, da Aeronáutica, e o CENIMAR, da Marinha, todos eles órgãos especializados na repressão à “subversão e ao terrorismo”. A Escola Superior de Guerra, sob inspiração norte-americana, elaborou a “ideologia de segurança nacional”. Criou-se a Operação Condor, para ação conjunta dos aparelhos repressivos de todas as ditaduras do Cone Sul.

Os que detinham o poder político e das armas prenderam e arrebentaram. Os que se encontravam na oposição defenderam-se como puderam. Uns, no exercício de um poder ditatorial, afirmavam que estavam salvando o país do perigo comunista e que produziam o desenvolvimento. Outros, na resistência à ditadura, se esforçavam para construir uma alternativa econômica, social e política ao capitalismo e sonhavam como o socialismo. Os primeiros reinaram soberanos durante 21 anos, sem prestar contas dos seus atos, fossem eles políticos, econômicos ou sociais. Nunca se apurou a corrupção no período, pois a imprensa estava sob censura e os partidos políticos e as organizações da sociedade civil foram impedidos de se manifestar livremente. Os segundos foram presos, se esconderam, se exilaram ou foram mortos.

Com a crise econômica do final dos anos de 1970 e do início dos anos de 1980, ocorre o desgaste do governo militar e de suas políticas, permitindo que a sociedade civil se reorganize. Conquista-se, primeiro, a partir de uma ampla mobilização nacional, a anistia para os presos e exilados políticos (1979) e, depois, com a Campanha das Diretas-Já e a votação no Colégio Eleitoral, elege-se Tancredo Neves e inicia-se (1985) a Nova República. Em 1988, com a nova Constituição Federal, instaura-se, efetivamente, um novo período democrático que ainda perdura.

Mesmo sob a democracia, nunca foram abertos os arquivos da ditadura e dos seus órgãos de repressão. Os que abusaram do poder ditatorial, que prenderam ilegalmente, que bateram, torturaram, mataram e desapareceram com corpos nunca foram julgados nem punidos. A anistia de 1979, na verdade, além de conquista dos movimentos de resistência à ditadura, foi também um ardil dos ditadores para se autoproteger, pois que anistiou também os que, protegidos pela força do arbítrio, se excederam na repressão dos que lhes faziam oposição.

Em todos os países do Cone Sul nos quais houve ditaduras igualmente repressoras durante os anos da guerra-fria já foram instaurados inquéritos para apuração de responsabilidades e recuperação da memória histórica. Apenas no Brasil as resistências perduram. Os militares da reserva e da ativa ainda barram a instalação da Comissão da Verdade. É este o motivo pelo qual se valeram do Clube Militar para divulgar um documento de críticas ao governo Dilma Rousseff e a duas de suas ministras (Maria do Rosário, dos Direitos Humanos e Eleonora Menunicci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres). Mesmo repreendidos, os agentes da antiga repressão contra-atacaram. Divulgaram um segundo documento, que já detêm mais de duas mil assinaturas e que conta, inclusive, com o apoio explícito de generais da ativa.

Os militares que atuaram na repressão e aqueles que lhes são solidários por ideologia e/ou por espírito de corpo (corporativismo) não se conformam com a possibilidade de terem suas ações vasculhadas. Temem serem colocados no ridículo de terem que explicar as violências que cometeram. Argumentam que se vivia em um “estado de guerra” e que “houve baixas de ambos os lados”. Esquecem-se, no entanto, que eles detinham a força e o poder de Estado e que a maioria de seus opositores só detinha o poder da persuasão, sendo ínfima a minoria que possuía armas, quase todas obtidas por meio das ações clandestinas que deflagravam. Estes já foram punidos, além disso, pelas prisões, pelas torturas, pelos abusos a que foram submetidos e até pela morte. O desequilíbrio de forças era enorme, quase incomensurável. Os agentes repressores contavam com a impunidade e a cobertura “legal” e do sistema, o que os torna terroristas de Estado e, por este motivo, ainda mais imperiosa a necessidade de que seus atos sejam revelados. Um país que não purga os seus erros vive sob o risco permanente de repeti-los.

Não há porque comemorar o 31 de março/1º de abril. O ato realizado no Rio de Janeiro na quinta-feira (29), na porta do Clube Militar e a repressão policial que desencadeou, com antigos militares, de um lado, querendo exaltar o Golpe Militar de 1964, e estudantes e ativistas de partidos de esquerda, de outro, vilipendiando a ditadura, é exemplar da exacerbação de ânimos no Brasil hoje. Os militares precisam ser contidos, pois estão se insubordinando à presidenta Dilma Rousseff, sua comandante suprema e a quem devem obediência. Se não o forem, os atos de provocação aumentarão e, muito provavelmente, os confrontos se intensificarão, gerando um clima de insegurança que em nada contribui para a estabilidade democrática. Cabe, inclusive, aqui, uma pergunta: a desestabilização da democracia não será a intenção dos antigos agentes da força e do arbítrio?