quinta-feira, 13 de maio de 2010

A Função Social da Terra....

A Constituição e a função social da propriedade


O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. O artigo é de Alberto Broch e de Willian Clementino.

Os latifundiários sempre se valeram da força bruta contra a luta pela terra e, sob o argumento da defesa da propriedade privada, praticam toda a sorte de violência, que, inclusive, resultou no assassinato de milhares de sindicalistas, religiosos e lideranças populares. Agora, eles incorporaram novas formas de reação à reforma agrária.

A criação de um “observatório de inseguranças jurídicas” é um dos instrumentos institucionais lançados para defender um suposto direito de propriedade que estaria sendo usurpado por quadrilhas de invasores de terra. Os representantes dos ruralistas também estão desenvolvendo campanhas de mídia e financiando uma rede de assistência jurídica em defesa de suas propriedades. Eles chegaram a reivindicar o emprego de tropas da Força Nacional para sustentar um plano nacional de combate às “invasões” de terras.

A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) justifica estas ações com o argumento de que “a garantia à propriedade é direito garantido pela Constituição Federal como direito fundamental”. Essa afirmação é de um cinismo exacerbado e uma desleal tentativa de confundir a opinião pública. Os ruralistas utilizam a previsão constitucional sobre o direito de propriedade como se esse fosse absoluto e incondicional. Isso não é verdade, pois os dispositivos constitucionais exigem o cumprimento integral da função social como requisito indispensável ao direito de propriedade e como componente do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais.

O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. O contexto legal em que se insere a propriedade não justifica um empreendimento rural que, mesmo possuindo modernos instrumentos tecnológicos ou altos índices de produtividade e lucro, negue direitos trabalhistas ou explore o trabalho escravo, comprometa os recursos hídricos e a biodiversidade, não crie emprego ou ocupação produtiva e não contribua para a soberania alimentar do povo. Uma propriedade com esse perfil não serve aos direitos da coletividade, não atende aos predicados do bem-estar social e do Estado de Direito e não assegura o direito à vida.

A segurança jurídica da propriedade está condicionada ao cumprimento da função social e não constitui crime a ocupação de propriedades inexistentes perante a lei. É por isso, inclusive, que se diz ocupação e não invasão. É a ocupação de um espaço de terra não protegido pela lei e que, por isso, deve sofrer a intervenção do Estado, para fazer que ali sejam gerados direitos, bem-estar, dignidade e produção para seus ocupantes e para a coletividade.

Assim deve agir o Estado, por exemplo, nas terras onde, segundo denúncias na imprensa, a sra. Kátia Abreu protagonizou uma invasão de área pública, expulsando dezenas de antigos posseiros para constituir uma fazenda, mantida improdutiva. Esse comportamento, como outros semelhantes, não gera direitos ao dito proprietário. É um crime contra a coletividade e, para ser restabelecido o Estado de Direito, as terras precisam ser retomadas pelo Estado e devolvidas às famílias de sem-terras, que dependem daquela terra para viver.

A função social é um princípio instituído para determinar limites ao direito de propriedade, para que o direito de uns não seja exercido em detrimento dos direitos de outros. Toda propriedade deve ter uma função social e, sobretudo, as propriedades sobre a terra, pois essas são meios originários de vida e têm a natureza como bem de produção indispensável à sobrevivência humana. Esse princípio responde aos fins gerais e sociais atribuídos aos Estados modernos, faz parte da vontade do legislador constituinte de 1988, e está consagrado por inúmeros julgados do Poder Judiciário brasileiro.

A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. Essas ações de arbítrio e privilégios sempre se valeram das benesses do Estado de outros artifícios desprovidos de base legal e ética.

Para assegurar a segurança jurídica no campo, o Estado tem a obrigação de exercer seu papel constitucional de fiscalizar e exigir o dever positivo dos proprietários de cumprir a função social da terra. Ele também precisa intervir nas áreas onde houver descumprimento da lei, desapropriando as terras e fortalecendo a reforma agrária para gerar direitos ao povo e desenvolvimento sustentável para o País.

(*) Alberto Broch é presidente da Contag. Willian Clementino é secretário de Política Agrária da Contag

Um freio à exploração das teles....

Decreto autoriza Telebrás a entrar no mercado de banda larga

O Diário Oficial da União desta quinta-feira (13) publica o decreto presidencial que cria o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Por meio dele, o governo pretende baixar o preço do acesso à internet de alta velocidade e triplicar o número de domicílios conectados à rede, passando dos atuais 15 milhões para 35 milhões até 2014. Pelo decreto, o governo autoriza a Telebrás a entrar no mercado de acesso a internet em alta velocidade em localidades onde inexiste oferta adequada destes serviços.

Além desses, há outros três objetivos delegados à estatal: 1) implementar a rede privativa de comunicação da administração pública federal; 2) prestar apoio e suporte a políticas públicas de conexão à internet em banda larga para universidades, centros de pesquisa, escolas, hospitais, postos de atendimento, telecentros comunitários e outros pontos de interesse público e 3) prover infraestrutura e redes de suporte a serviços de telecomunicações prestados por empresas privadas, Estados, Distrito Federal, municípios e entidades sem fins lucrativos.

De acordo com o decreto, o programa tem, entre os objetivos, massificar o acesso à internet de alta velocidade, acelerar o desenvolvimento econômico e regional, promover a inclusão digital, reduzir as desigualdades sociais regionais, promover a geração de emprego e renda e aumentar a competitividade das empresas brasileiras.

Para alcançar esses objetivos, o PNBL atuará regulamentando e desenvolvendo a política industrial e a infraestrutura da rede. Além disso, prevê incentivos fiscais e financiamentos para o setor. A definição das metas e prioridades do plano ficará a cargo do Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital (CGPID), que é presidido pela Casa Civil e composto por 12 órgãos federais – entre eles os ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento, da Saúde e da Secretaria de Assuntos Estratégicos.

A próxima etapa prevista para o PNBL é a criação do Fórum Brasil Digital, que terá representantes do governo, de empresas e de usuários para debater questões que precisem ser equacionadas e novos temas que surjam durante a implementação do plano. A expectativa do governo é de que esse fórum seja instalado em junho.

Inclusão digital

O PNBL é visto por especialistas do setor como o maior incentivo que já se promoveu no Brasil a favor da inclusão digital. Passados mais de 10 anos da privatização da telefonia no país, o acesso à internet rápida ainda é um privilégio.

Uma série de estudos recentes da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios) de 2008, do IBGE, CGI (Comitê Gestor da Internet) e do Sistema de Coleta de Informações (Sici) da Anatel demonstram o alto grau de concentração da internet banda larga nas regiões mais ricas.

O alto custo da banda larga é um dos fatores para o atraso brasileiro. O gasto médio com internet rápida representa 4,58% da renda mensal per capita no Brasil enquanto na Rússia esse índice é menos da metade: 1,68%. Já em relação aos países desenvolvidos, essa mesma relação fica em torno de 0,5%, ou seja, o brasileiro gasta proporcionalmente quase dez vezes mais para ter acesso à internet rápida.

Dos 58 milhões de domicílios existentes no Brasil, 79% não tinham acesso à internet (46 milhões). O acesso à banda larga é extremamente desigual em termos regionais no país: em alguns Estados mais isolados, como Roraima e Amapá, o acesso nos domicílios é praticamente inexistente. Enquanto São Paulo tem 3,8 milhões de domicílios com banda larga (29,4%), Roraima tem apenas 347 (0,3%) e o Amapá, 1.044 (0,6%). Nos estados do Nordeste, os acessos em banda larga não chegam a 15% dos domicílios. Já nos estados do Sul e Sudeste, a penetração varia entre 20% e 30% dos domicílios.

Dos 8,6 milhões de domicílios rurais, apenas 266 mil têm acesso à internet em banda larga (3,1% do total). A faixa dos pequenos municípios concentra mais de 92% da população sem acesso, equivalentes a 39,2 milhões de pessoas.

Ou seja, em pleno século 21, o principal fluxo de informações e conhecimentos à disposição da humanidade está, no Brasil, fora do alcance da grande maioria da população. Daí a importância dos investimentos governamentais no setor, já que está mais do que provado que a iniciativa privada não tem interesse em investir na inclusão digital.

Da redação do sitio Vermelho
com agências

Capitalismo selvagem.....

Boaventura de Souza Santos
bsantos@facstaff.wisc.edu

O Fascismo Financeiro

Há doze anos publiquei, a convite do Dr. Mário Soares, um pequeno texto (Reinventar a Democracia) que, pela sua extrema actualidade, não resisto à tentação de evocar aqui. Nele considero eu que um dos sinais da crise da democracia é a emergência do fascismo social. Não se trata do regresso ao fascismo do século passado. Não se trata de um regime político mas antes de um regime social. Em vez de sacrificar a democracia às exigências do capitalismo, promove uma versão empobrecida de democracia que torna desnecessário e mesmo inconveniente o sacrifício. Trata-se, pois, de um fascismo pluralista e, por isso, de uma forma de fascismo que nunca existiu. Identificava então cinco formas de sociabilidade fascista, uma das quais era o fascismo financeiro. E sobre este dizia o seguinte.
O fascismo financeiro é talvez o mais virulento. Comanda os mercados financeiros de valores e de moedas, a especulação financeira global, um conjunto hoje designado por economia de casino. Esta forma de fascismo social é a mais pluralista na medida em que os movimentos financeiros são o produto de decisões de investidores individuais ou institucionais espalhados por todo o mundo e, aliás, sem nada em comum senão o desejo de rentabilizar os seus valores. Por ser o fascismo mais pluralista é também o mais agressivo porque o seu espaço-tempo é o mais refractário a qualquer intervenção democrática. Significativa, a este respeito, é a resposta do corrector da bolsa de valores quando lhe perguntavam o que era para ele o longo prazo: “longo prazo para mim são os próximos dez minutos”. Este espaço-tempo virtualmente instantâneo e global, combinado com a lógica de lucro especulativa que o sustenta, confere um imenso poder discricionário ao capital financeiro, praticamente incontrolável apesar de suficientemente poderoso para abalar, em segundos, a economia real ou a estabilidade política de qualquer país.
A virulência do fascismo financeiro reside em que ele, sendo de todos o mais internacional, está a servir de modelo a instituições de regulação global crescentemente importantes apesar de pouco conhecidas do público. Entre elas, as empresas de rating, as empresas internacionalmente acreditadas para avaliar a situação financeira dos Estados e os consequentes riscos e oportunidades que eles oferecem aos investidores internacionais. As notas atribuídas – que vão de AAA a D – são determinantes para as condições em que um país ou uma empresa de um país pode aceder ao crédito internacional. Quanto mais alta a nota, melhores as condições. Estas empresas têm um poder extraordinário. Segundo o colunista do New York Times, Thomas Friedman, «o mundo do pós-guerra fria tem duas superpotências, os EUA e a agência Moody’s». Moody’s é – uma dessas agências de rating, ao lado da Standard and Poor’s e Fitch Investors Services. Friedman justifica a sua afirmação acrescentando que «se é verdade que os EUA podem aniquilar um inimigo utilizando o seu arsenal militar, a agência de qualificação financeira Moody’s tem poder para estrangular financeiramente um país, atribuindo-lhe uma má nota».
Num momento em que os devedores públicos e privados entram numa batalha mundial para atrair capitais, uma má nota pode significar o colapso financeiro do país. Os critérios adoptados pelas empresas de rating são em grande medida arbitrários, reforçam as desigualdades no sistema mundial e dão origem a efeitos perversos: o simples rumor de uma próxima desqualificação pode provocar enorme convulsão no mercado de valores de um país. O poder discricionário destas empresas é tanto maior quanto lhes assiste a prerrogativa de atribuírem qualificações não solicitadas pelos países ou devedores visados. A virulência do fascismo financeiro reside no seu potencial de destruição, na sua capacidade para lançar no abismo da exclusão países pobres inteiros.
Escrevia isto a pensar nos países do chamado Terceiro Mundo. Não podia imaginar que o fosse recuperar a pensar em países da União Europeia.