sábado, 9 de outubro de 2010

Bolívia consolida descolonização com novas leis


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Com duas novas leis, promulgadas pelo governo boliviano nesta semana, consolida-se o processo de descolonização, segundo Palacio Quemado.

  Ao apresentar à nação a norma que permite julgar e sancionar todas as autoridades e a lei contra o racismo, o presidente Evo Morales precisou que foi necessário esperar 184 anos para que o Estado Plurinacional e as organizações sociais impulsionassem e ratificassem essas antigas reivindicações.

Morales explicou que com a Lei de Julgamento ao Presidente ou Vice-presidente, autoridades do poder judicial e legislativo, põe-se fim à impunidade no país.

A respeito da Lei contra o Racismo e Todo Tipo de Discriminação, de cinco capítulos e 24 artigos, Morales considerou que não atinge somente aos meios de comunicação, alguns dos quais se recusam a aceitá-la por verem nela uma mordaça à liberdade de expressão e a democracia.

Liberdade de expressão não é expressão de racismo, comentou o estadista ao assinalar exemplos de comunicadores que estimulam os abusos e as ofensas a setores indígenas e camponeses.

Nesse sentido considerou como irreversível e como caminho sem volta as atuais transformações que identificam a Revolução democrática e cultural iniciada em 2006.

Nesta semana, escutou-se um novo chamado à unidade na região altiplânica de Oruro que celebrou 200 anos de Independência do domínio colonial espanhol.

Durante esses festejos, aos quais assistiu o presidente Morales, o

secretário geral de governo do departamiento, Édgar Sánchez, assinalou que agora pode-se falar também da unidade de todas as orurenhas e orurenhos como quando começou a luta pela libertação.

Sánchez alentou a ratificar o compromisso com o desenvolvimento, a unidade e a convivência em paz, aludindo à vocação produtiva dos orurenhos.

Também nesta semana, Bolívia e Venezuela realizaram na cidade de La Paz a primeira transação financeira de venda a Caracas de cinco mil toneladas de azeite de soja, com o uso do Sistema Único de Compensação Regional (SUCRE), como moeda de mudança.

Na cerimônia produziu-se uma teleconferência com a participação de Morales e seu par venezuelano, Hugo Chávez, na qual ambos ratificaram a importância desse mecanismo para libertar do dólar estadunidense e do Fundo Monetário Internacional.

De outra parte, representantes de diferentes nações da América Latina também recordaram o 43 aniversário do assassinato de Ernesto Che Guevara com um percurso por lugares históricos de Vallegrande e La Higuera (Santa Cruz).

Cubanos, venezuelanos, bolivianos, argentinos, chilenos, equatorianos e brasileiros, entre outros participantes em um foro internacional percorrerão lugares históricos do lugar, entre eles a réplica da escolinha onde os assassinos de Che Guevara o imortalizaram a 9 de outubro de 1967.

Na homenagem participarão também os integrantes das missões diplomática, médica, educativa e de trabalhadores sociais de Cuba e Venezuela que colaboram com o processo de mudança que entranha a Revolução democrática e cultural, encabeçada pelo presidente boliviano, Evo Morales.

Fonte: PrensaLatina




Eleição, aborto e a infantilização da religião




Jung Mo Sung * Adital
 

Por que bispos, padres e grupo religiosos que sempre defenderam a separação radical entre a religião e política, que sempre criticaram a discussão política no âmbito da Igreja ou até mesmo a relação "fé e política", estão fazendo, até mesmo nas missas, campanha aberta contra Dilma?
Uma primeira resposta poderia ser: hipocrisia. Respostas moralistas podem satisfazer o "juiz moralista" que todos nós carregamos no mais profundo do nosso ser, mas não são boas para nos ajudar a entender o que está acontecendo.
Esta campanha contra a candidatura da Dilma, e com isso o apoio explícito ou implícito à candidatura do Serra, está sendo feita de várias formas, mas com um elemento comum: os católicos e os "crentes" não devem votar nela porque ela seria a favor do aborto e, por isso, contra a vida. Alguns agregam também a acusação de que, se ela for eleita, as TVs católicas e evangélicas seriam proibidas de veicular os programas religiosos ou obrigadas a diminuir o seu tempo de duração. É a velha acusação de que "comunistas" são contra a religião.
Essas duas acusações são expressas e justificadas através de lógicas religiosas, e não a partir da "racionalidade leiga" que deve caracterizar a discussão sobre a política hoje. Esses grupos não admitem a distinção entre a religião e a política, ou melhor, não admitem a "autonomia relativa" do campo político e de outros campos -como o econômico- que se emanciparam da esfera religiosa no mundo moderno. Por isso, eram e são contra "fé e política" ou o debate sobre a política no campo religioso, pois esses debates são feitos normalmente a partir do princípio da autonomia relativa da política. Isto é, a discussão sobre questões políticas são feitas com argumentos de racionalidade sócio-política e não submetidos ao discurso meramente religioso.
Para esses grupos (é preciso reconhecer que ocorre também em outros grupos político-religiosos), os valores religiosos (do seu grupo) devem ser aplicados diretamente a todos os campos da vida pessoal e social. E, em casos graves como aborto, ser impostos sobre toda a sociedade através das leis do Estado. Nesses casos, não seria misturar a religião com a política, mas seria a "defesa" dos mandamentos e valores religiosos; ou colocar a política a serviço dos valores religiosos (nessa discussão apresentados como "a serviço da vida"). Pois, nada estaria acima dos "mandamentos de Deus". Desta forma não se reconhece a autonomia relativa do campo político, a dificuldade de se passar do princípio ético abstrato (do tipo "defenda a vida") para as políticas sociais concretas, e muito menos se aceita a pluralidade de religiões com valores diversos e propostas de ação divergentes e conflitantes.
Esta é a razão pela qual esses grupos não entendem e nem aceitam a resposta dada por Dilma de que ela, pessoalmente, é contra o aborto, mas que ela vai tratar esse tema como um problema de saúde pública. Para ouvidos daqueles que crêem que não há ou não deve haver separação entre a saúde pública (o campo da política social) e a opção religiosa pessoal do governante, a resposta da Dilma soa como eu não sou contra o aborto, que logo é traduzido na sua mente como "eu sou a favor do aborto".
E se ela é a favor do aborto, ela é contra a vida e, portanto, ela é do "mal". Enquanto que, por oposição, o outro candidato seria do "bem".
Reduzir toda a complexidade da "defesa da vida" -a que um/a presidente deve estar comprometido/a- à manutenção da criminalização do aborto (que é o que está discutido de fato neste debate sobre ser a favor ou contra o aborto) é uma simplificação mais do que exagerada. Simplificação que deixa fora do debate, por ex., toda a discussão sobre políticas econômicas e sociais que afetam a vida e a morte de milhões de pessoas. Mas é compreensível quando os cristãos têm muita dificuldade em perceber quais são os caminhos concretos e possíveis para viver a sua fé na sociedade, perceber em que a sua fé pode fazer diferença na vida social. Diante de tanta complexidade, a tentação mais fácil é simplificar o máximo para separar "os do bem" de "os do mal".
Essa simplificação me lembra a pergunta que os meus filhos, quando muito pequenos, me faziam ao assistir um filme: "pai, ele é do bem?" Se sim, eles torciam por aquele que "é do bem" contra o "do mal". Essa necessidade de separar os do bem e os do mal faz parte da condição mais primária do ser humano. O problema é que reduzir toda a complexidade da luta em favor da vida ao tema de ser favor ou contra a manutenção da criminalização do aborto é infantilizar a discussão política e, o que é pior, é infantilizar a própria religião que professa.
[Autor, em co-autoria com Hugo Assmann, de "Deus em nós: o reinado que acontece na luta em favor dos pobres"].

* Coord. Pós-Graduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo