terça-feira, 31 de agosto de 2010

Quem perde com a eleição


Mário Augusto Jakobskind no direto da redação

Três de outubro se aproxima e a se confirmarem os resultados das pesquisas indicando uma vitória avassaladora de Dilma Roussef já no primeiro turno, as análises a serem feitas devem transcender o aspecto político partidário propriamente dito e o significado do fenômeno Lula na história brasileira.

O Presidente da República, segundo indicam as pesquisas, em termos de popularidade ultrapassou Getúlio Vargas em sua época. O então líder trabalhista, além de se eleger em 1950 enfrentando os ancestrais do PSDB e Demo, poucos anos antes elegeu quem parecia inelegível, ou seja, o seu ex-ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, que acabou se tornando um dos piores presidentes que o Brasil já teve, comparável a FHC, inclusive traindo compromissos assumidos durante a campanha.

Tais fatos pertencem à história, mas o principal neste momento é analisar a derrota acachapante que vem sofrendo a mídia de mercado tipo Veja, O Globo, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, TV Globo e outros veículos de imprensa que diariamente se opõem a Lula e a sua candidata. Ou seja, apesar disso, Lula está transferindo praticamente cem por cento dos seus votos para Dilma Roussef, o que os analistas de plantão diziam que jamais aconteceria.  

Tanto a mídia de mercado quanto o candidato de oposição de direita, José Serra, esgotaram o estoque de acusações infundadas contra a candidata Dilma Roussef. A aliança PSDB-Dem-PPS desencavou até o emergente da Barra de sobrenome da Costa como vice, para caluniar com base em mentiras. Não satisfeito com as baixarias, encampadas por Serra, da Costa gratuitamente passou a fazer críticas grosseiras a Leonel Brizola, o governador do Estado do Rio de Janeiro por duas vezes, falecido em junho de 2004.

Da Costa e Serra são exemplos típicos da baixa política. Serão julgados pelos mais de 135 milhões de eleitores aptos a votar em 3 de outubro. Da Costa foi indicado para vice por ordem de Cesar Maia, numa estratégia para lançá-lo candidato a Prefeito do Rio de Janeiro em 2012. Para aparecer nas páginas e na TV, o vice de Serra baixou tanto o nível que acabou tirando votos do próprio cabeça de chapa.

O Rio de Janeiro daqui a dois anos terá de dar um novo recado nas urnas para a escolha do Prefeito e o quadro que se apresenta, pelo menos até agora, chega a ser vergonhoso. Da Costa de um lado e Eduardo Paes de outro, cujos projetos, apesar das rivalidades eleitorais, não estão tão distantes assim.

Para se ter uma ideia, basta comparar o que Paes vem fazendo atualmente na área da educação, repetindo o receituário do Prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do Dem. Tendo como titular da pasta a senhora Claudia Costin, egressa do PSDB, e  prestadora de serviços ao governo FHC na reforma administrativa, a atual secretária de Educação do município do Rio de Janeiro tenta  executar um projeto que tem a chancela do Banco Mundial e que terá reflexos negativos não só para os professores, como também para todos os servidores municipais.

Em troca de um empréstimo de  1,9 bilhão de dólares para o Rio, o Banco Mundial exigiu, e Paes está tentando colocar em execução com a ajuda de sua bancada  na Câmara dos Vereadores,  uma reforma da previdência municipal que prevê a quebra da paridade e diminuição nos vencimentos de aposentados e pensionistas. Ou seja, Paes está querendo ir até as últimas consequências com o receituário neoliberal, que sempre defendeu desde os tempos em que militava no PSDB, o mesmo partido que durante muitos anos abrigou o atual governador Sergio Cabral.

Leitores e telespectadores desconhecem também o que vem acontecendo no Rio de Janeiro, como, por exemplo, que a  senhora Costin está tentando incrementar uma formula para os professores do município do Rio idêntico ao existente em São Paulo: a chamada meritocracia em que os trabalhadores no setor de educação serão avaliados por uma comissão que dirá quem vai ganhar mais ou não, graças a vários critérios, inclusive a nota dos alunos. Em função disso, em São Paulo os professores foram divididos em sete categorias. E assim vai, no fundo, o objetivo maior é a competição desenfreada em que a qualidade do ensino propriamente dito é o último a contar, embora Costin diga ao contrário nas páginas da mídia de mercado.  

Em recente entrevista a um jornal de São Paulo, Diane Ravitch,  ex-secretária adjunta de Educação do governo Bill Clinton criticou com veemência  a política de meritocracia, por ela seguida. Segundo Ravitch, o ensino não melhorou e foram detectadas fraudes no processo de avaliação do desempenho dos professores. Quer dizer, Costin copiou um esquema que sabidamente não deu certo nos Estados Unidos e insiste em algo que não resultará em melhora para o ensino, muito pelo contrário.

KEOMA - 1976


Título Original: Keoma
Título em inglês: Django Rides Again
Direção: Enzo G. Castellari
Roteiro: George Eastman, Enzo G. Castellari, Nico Ducci, Mino Roli e Joshua Sinclair (diálogos)
Gênero: Ação/Drama/Faroeste
Origem: Itália
Ano de Lançamento: 1976
Música: Guido de Angelis, Maurizio de Angelis
Fotografia: Aiace Parolin
Créditos da postagem:  acullen, no cine gratuito
http://www.imdb.com/title/tt0074740/ - 7.1/10


Sinopse:
Ao final da Guerra Civil Americana, Keoma, um pistoleiro mestiço, cansado de fazer da morte um meio de vida, retorna para aquilo que um dia costumava ser seu lar. Encontra sua cidade natal totalmente destruída pela peste e sob o comando de um homem chamado Caldwell. Seus meio-irmãos Butch, Sam e Lenny trabalham para Caldwell e Keoma se vê sozinho contra todos.


Informações do Arquivo:

Formato: avi
Qualidade: DVDRip
Áudio: Inglês
Legendas: Português/BR
Duração: 97 min
Cor
Tamanho: 682 MB em 3 partes


DOWNLOAD:
AVI 682MB em 3 partes, legendado PT/BR:

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SENHA PARA DESCOMPACTAR: acullen


TRILHA SONORA ORIGINAL DE 1976
Composer(s): Guido De Angelis e Maurizio De Angelis
Released in: 1976, Italy

Track listing
1. Keoma (instrumental) (04:43)
2. In front of my desperation (02:06) - canta Guy
3. Dusty banjo (part one) (00:42)
4. Keoma (harmonica) (01:38)
5. Piano and beer (01:25)
6. In front of my desperation (instrumental) (03:08)
7. Waiting (instrumental) (01:05)
8. Dusty banjo (part two) (01:25)
9. Keoma (04:45) - canta Sybil & Guy

DOWNLOAD 18 MB
http://www.megaupload.com/?d=QE47AE3N

** não tem senha **


Elenco :
Franco Nero - Keoma
William Berger - William Shannon
Olga Karlatos - Lisa
Orso Maria Guerrini - Butch Shannon
Gabriella Giacobbe - The Witch
Antonio Marsina - Lenny Shannon
Joshua Sinclair - Sam Shannon
Donald O'Brien - Caldwell
Leonardo Scavino - Doctor
Wolfango Soldati - Confederate Soldier
Victoria Zinny - Brothel Owner
Alfio Caltabiano - Member of Caldwell's Gang
Woody Strode - George


Por que me ajuda? Todos temos o direito de nascer.

A guerra? Não sei bem.
Acho que, logo que massacramos aqueles índios, achamos que deveríamos fazer algo generoso. Então demos a liberdade aos negros.
Assim, nos sentíamos bem para voltar a acabar com os índios.

Ele não pode morrer! E sabe por quê? Porque ele é livre.



Keoma é um filme que fala de legalidade, preconceitos, princípios de família e valores, com uma trilha sonora incrível e um elenco de primeira linha. Clássico do "western espaguetti", o filme é de propriedade ímpar: locação, atuação, trilha, etc., excepcionais.
O diretor, Enzo Castellari, saudado por Quentin Tarantino na utilização do título The Inglorious Bastards (1978), e que já levou até personagens shakespearianos para os saloons (Johnny Hamlet, 1968), se superou em Keoma, encabeçado pelo solitário personagem de Franco Nero.






O WESTERN, QUEM DIRIA, JÁ FOI REVOLUCIONÁRIO E CONTESTADOR...
Por Celso Lungaretti, jornalista e escritor
Fonte: http://www.jornalorebate.com.br/site/



Muitos dos que hoje se deslumbram com as estilizações de duelos e a extraordinária trilha musical de “Kill Bill” (Kill Bill: Vol. 1, 2003, e Kill Bill: Vol.2, 2004, d. Quentin Tarantino), ignoram que as primeiras inspiraram-se diretamente nas coreografias dos filmes do diretor Sergio Leone, enquanto várias músicas foram compostas há quatro décadas atrás, por Ennio Morricone, para os bangue-bangues italianos. É que Quentin Tarantino estava prestando um comovido tributo a esses dois mestres, que devem ter-lhe inspirado sonhos e brincadeiras nos seus tempos de menino.

Nascido em meados da década de 1960, o spaghetti-western lavou a alma de todos nós que gostávamos dos bangue-bangues, mas não da caretice dos norte-americanos.

Teve surpreendente sucesso nas bilheterias: "O Dólar Furado" ( Un Dollaro Bucato, 1965, d. Giorgio Ferroni), p. ex., chegou a ficar em cartaz por cerca de um ano num cinema de São Paulo. Isto se deveu não só a ter ocupado um espaço vazio, já que os norte-americanos haviam deixado de fazer westerns, como também a haver trazido um novo enfoque e uma nova moldura para o gênero.

Tirando obras de exceção como "Matar ou Morrer" (High Noon, 1952, d. Fred Zinneman), "Sem Lei e Sem Alma" (Gunfight at O.K. Corral, 1957, d. John Sturges), "O Matador" (The Gunfighter, 1950, d. Henry King), "Estigma da Crueldade" (The Bravados, 1958, d. Henry King) e "Rastros do Ódio" (The Searchers, 1956, d. John Ford), os faroestes made in USA de até então tinham o insuportável defeito de tentarem nos impingir aquela ladainha da luta eterna do Bem contra o Mal -- um tédio!

O mocinho não fumava, não bebia, não praguejava e nem trepava. A mocinha era recatada donzela. O xerife, pachorrento mas digno. Os índios, selvagens bestiais que tinham de ser tirados do caminho para não atrapalharem o progresso. Os mexicanos, beberrões subumanos.

Mesmo no mato, conduzindo boiada, o mocinho tinha a decência de manter-se sempre limpo e escanhoado. Bah!

O western italiano surgiu meio por acaso. A indústria cinematográfica italiana conseguira nos anos anteriores faturar uma boa grana com filmes épicos e mitológicos. Hércules, Maciste, Ursus, Golias, fundação de Roma, guerra de Tróia, etc. O filão, entretanto, estava esgotando-se e a Cinecittà saiu à cata de um novo produto.

Sergio Leone, então com 34 anos, tinha começado a carreira no neo-realismo italiano (como assistente de direção e diretor de segunda unidade), mas não conseguira alçar-se à direção. Era difícil abrir um espaço entre mestres como Vittorio De Sica, Lucchino Visconti, Pier Paolo Pasolini, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, etc.

Então, entre atuar eternamente à sombra dos medalhões do cinema de arte e mostrar seu trabalho no cinema dito comercial, escolheu a segunda opção. Depois de dirigir os épicos “Os Últimos Dias de Pompéia” (Gli Ultimi Giorni di Pompei, 1959, creditado, entretanto, a Mario Bonnard) e “O Colosso de Rodes” (Il Colosso di Rodi, 1961, d. Sergio Leone), teve a sorte de estar no lugar certo, no momento exato, para dar o pontapé de partida num novo ciclo.

Adaptou para o Oeste a história de “Yojimbo” (Yojimbo, 1961), um filme de Akira Kurosawa sobre samurai que açula a discórdia entre dois senhores feudais para prestar-lhes serviço alternadamente, sem que percebam seu jogo duplo. O que Leone fez em “Por Um Punhado de Dólares” ((Per un Pugno di Dollari, 1964), basicamente, foi mudar a ambientação e colocar um pistoleiro caça-prêmios no lugar do samurai.

O protagonista também teve aí seu grande golpe de sorte. Clint Eastwood não emplacara em Hollywood como mocinho, ficando relegado a papéis secundários em séries de TV e a filminhos classe “B” e “C”. Leone percebeu nele um bom anti-herói. Compôs seu personagem (o “Estranho Sem Nome”) com barba rala, chapéu sobre os olhos, charuto na boca, fala arrastada e um poncho. Com isto, acabou alçando-o ao estrelato e fazendo jus à homenagem que depois Eastwood lhe prestaria, ao dedicar-lhe sua obra-prima “Os Imperdoáveis” (Unforgiven, 1992, d. Clint Eastwood).

O que diferenciou o western italiano foi exatamente ter sido feito por cineastas bem diferentes dos tarefeiros hollywoodescos (os ditos “artesãos”, que se limitavam ao feijão-com-arroz artístico que lhes garantisse o dito cujo gastronômico).

Damiano Damiani, Carlo Lizzani e Sergio Corbucci eram outros talentos com a cabeça feita pelo cinema de arte, assim como o superlativo roteirista Sergio Donatti (aliás, até o grande diretor Bernardo Bertolucci chegou a desenvolver uma história para western). Então, não se limitaram a realizar filmes com muita ação e nenhuma vida inteligente; fizeram questão de deixar sua marca, passando mensagens cifradas, dando toques, propondo outra abordagem para o western.

Em vez de um palco em que o Bem vence sempre o Mal, o bangue-bangue italiano mostrou o velho Oeste como uma terra de ninguém, primitiva e selvagem, em que todos perseguem seus objetivos como podem. Evidentemente, há muito mais verossimilhança nesse enfoque do que no norte-americano. O Oeste do século 19 seria algo como o garimpo de Serra Pelada no seu apogeu. Um grotão selvagem e sem lei.

Em vez do herói, o western italiano consagrou o anti-herói: barbudo, desgrenhado, com roupas sinistras, muitas vezes um caça-prêmios, quase sempre um mau-caráter. No fundo, só se diferencia dos bandidos por agir sozinho enquanto os outros atuam em bando.

Lembrem-se: era a década de 1960, quando havia um imenso desencanto com a ordem estabelecida. Rebeldes eram tudo que queríamos ver Não suportávamos mais os heroizinhos c.d.f. de Hollywood. Os Djangos, Sabatas e Sartanas nos cativaram à primeira vista (o único mocinho nos moldes estadunidenses era o bonitão Ringo, de “O Dólar Furado”, interpretado por Giuliano Gemma).

E, enquanto os poderosos viraram vilãos, os índios e os peões mexicanos passaram a ser mostrados como vítimas e heróis. Afinal, vários cineastas italianos tinham inclinações revolucionárias, mas não havia nada revolucionário para destacar nos EUA do século 19. A solução foi transferir a ação para o efervescente México, como em "Quando Explode a Vingança" (Giù la Testa, 1971, d. Sergio Leone), "Gringo" (El Chuncho, Quién Sabe?, 1967, d. Damiano Damiani), "Reze a Deus e Cave Sua Sepultura" (Violenza al Sole, 1968, d. Florestano Vancini), "Réquiem Para Matar" (Requiescant, 1967, d. Carlo Lizzani), "Companheiros" (Vamos a Matar, Compañeros, 1970, d. Sergio Corbucci) e "O Dia da Desforra" (La Resa dei Conti, 1966, d. Sergio Sollima).

Toques esquerdistas, sim, eles podiam inserir em filmes ambientados nos EUA:

o próprio "Django" (Django, 1966, d. Sergio Corbucci), no qual os vilãos são visivelmente inspirados na Ku-Klux-Khan;
"Quando os Brutos Se Defrontam" (Faccia a Faccia, 1967, d. Sergio Sollima), reflexão sobre a gênese de líderes oportunistas;
"O Especialista" (Gli Specialisti, 1969, d. Sergio Corbucci), que coloca jovens rebeldes (referência às barricadas francesas de 1968) em ação no Oeste;
"O Vingador Silencioso" (Il Grande Silenzio, 1968, d. Sergio Corbucci), denunciando o massacre de Johnson Country, quando centenas de imigrantes eslavos foram dizimados pelos barões de gado do Wyoming – o mesmo episódio histórico que foi depois retratado em "O Portal do Paraíso" (Heaven's Gate, 1980, d. Michael Cimino);
e o extraordinário "Três Homens em Conflito" (Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo, 1966, d. Sergio Leone), com algumas das mais marcantes seqüências antibelicistas do cinema.
Uma última característica notável foi libertar a trilha musical da tirania do country. Não mais o que realmente existia nos EUA do século retrasado, como violões, violinos, banjos, gaitas e sanfonas, mas também flauta, saxofone, órgão, sintetizadores, castanholas -- tudo que se harmonizasse com o clima daquela seqüência, pouco importando se tais instrumentos eram encontrados ou não no velho Oeste. Para completar, o uso criativo de sinos, caixas de música, assobios e outros achados. Morricone é, com certeza, o melhor criador de trilhas musicais de todos os tempos.

FILMES INESQUECÍVEIS

"Quando Explode a Vingança" está entre os melhores filmes do Leone. É, na verdade, o segundo da trilogia "era uma vez", que inclui “Era Uma Vez No Oeste” (C'Era Uma Volta il West, 1968, d. Sergio Leone) e “Era Uma Vez Na América” (Once Upon a Time in América, 1984, d. Sergio Leone). Deveria ter-se chamado "Era Uma Vez A Revolução", mas acabou com um título que em italiano significa "abaixe a cabeça" e, nos EUA, "abaixe-se, otário".

Na visão do Leone, os verdadeiros heróis da revolução são os anônimos homens do povo, enquanto os líderes acabam sempre traindo a causa -- seja no México (o médico interpretado por Romolo Valli) ou na Irlanda (o dirigente do IRA que é amigo do John/James Coburn).

Foi feito em 1971, quando os movimentos revolucionários pipocavam na Itália, radicalizando-se progressivamente. Parece expressar o desencanto do Leone com o Partido Comunista Italiano e ser um alerta de que as Brigadas Vermelhas e congêneres teriam destino trágico.

Um lance interessante é mostrar de forma totalmente desumanizada o comandante das forças contra-revolucionárias: ele é visto escovando repulsivamente os dentes, chupando um ovo, olhando pelo binóculo. Leone não lhe concede sequer a dignidade da fala. De sua forma sutil, expressa o desprezo absoluto que tinha pela direita troglodita.

Outra grande sacada do Leone é ressaltar que a História nunca fixa a versão correta dos fatos. A frase que o Irlandês sempre repete, sobre "os grandes e gloriosos heróis da revolução", é um primor de sarcasmo.

* * *

"Três Homens em Conflito" foi, claramente, o divisor de águas na carreira de Sergio Leone, o momento em que ele mostrou ser muito mais do que um (brilhante) artesão.

"Por um Punhado de Dólares" introduziu a figura do anti-herói no centro da trama; a amoralidade básica dos tipos e das situações; a apresentação criativa dos letreiros iniciais, com o uso de animação; a nova concepção musical que Morricone trouxe para os westerns; e um dos personagens mais emblemáticos do bangue-bangue à italiana, o pistoleiro oportunista interpretado por Clint Eastwood.

Em "Por Uns Dólares a Mais" (Per Qualche Dollaro in Più, 1965, d. Sergio Leone), todas essas características foram desenvolvidas e aprimoradas. É um filme muito melhor do que o anterior, mas, paradoxalmente, não apresentou novidades significativas. A única que vale a pena citar é a colocação de dois personagens em destaque, em vez de um. A partir daí, os filmes de Leone trariam sempre essa dupla de anti-heróis ocupando o espaço dos antigos mocinhos. Depois dos personagens interpretados por Clint Eastwood/Lee Van Cleef em “Por Uns Dólares a Mais”, tivemos Charles Bronson/Jason Robards (“Era Uma Vez no Oeste”), Rod Steiger/James Coburn (“Quando Explode a Vingança”) e Robert De Niro/James Woods (“Era Uma Vez na América”).

"Três Homens em Conflito" foi a obra em que Leone definiu e afirmou seu estilo, embutindo no cinema de ação discussões mais profundas, sem prejuízo do entretenimento propriamente dito. É um tipo de obra em camadas. De acordo com sua sensibilidade, o espectador pode se divertir apenas com o básico ou captar os muitos toques subjacentes.

E é grandiosa a crítica que Leone fez ao belicismo, com algumas das seqüências mais comoventes que o cinema já apresentou: o oficial bêbado sem coragem para destruir a ponte, a orquestra do campo de prisioneiros tocando para abafar os ruídos da tortura, o jovem soldado agonizante a quem o Estranho Sem Nome dá seu charuto.

Nos três filmes seguintes ele dissecaria a lenda (vinganças) e a realidade (construção da ferrovia) no Velho Oeste, as verdades e mentiras de uma revolução e a transição da época glamourosa do aventureirismo para a hegemonia insípida das grandes organizações. Foi o cineasta que conseguiu ir mais longe na proposta de mesclar entretenimento e reflexão, saindo-se tão bem nas bilheterias quanto em termos de qualidade cinematográfica.

* * *

“Keoma” (Keoma, 1976, d. Enzo G. Castellari) foi o canto do cisne do western italiano. E encerrou o ciclo com extrema dignidade. Trata-se daquela única obra-prima que, às vezes, um diretor convencional faz na vida, como que para provar que tinha talento para vôos maiores.

O subtexto é riquíssimo:

a briga entre os quatro irmãos remete, evidentemente, a Freud e suas teorias sobre a horda primitiva;
o nascimento da criança num estábulo é um paralelo bíblico, assim como a crucificação do herói;
a presença da velha índia nos momentos culminantes do filme vem da mitologia grega, ela é um tipo de deusa do destino;
o herói errante em busca de um desígnio que justifique sua vida também tem inspiração mitológica;
a peste se constituiu num elemento bíblico e mitológico ao mesmo tempo, além de estabelecer uma ponte com o escritor Albert Camus ("A Peste", "O Estrangeiro"), cujas obras são uma óbvia referência no delineamento do personagem principal;
finalmente, Castellari reverencia seus mitos cinematográficos -- Keoma é filho de Shane, o herói protagonizado por Alan Ladd em "Os Brutos Também Amam" (Shane, 1953, d. George Stevens), enquanto a presença de Woody Strode no elenco constitui uma homenagem a John Ford, de quem o negro era um dos atores prediletos.
E não foi só Castellari quem se superou, atingindo uma qualidade de que ninguém o suporia capaz. A dupla de compositores Guido e Maurizio de Angelis fez uma trilha musical extraordinária, capaz de rivalizar com as melhores de Morricone. O contraste do baixo com a soprano chega a nos arrepiar, as letras se casam maravilhosamente com o filme.

Em suma: trata-se de um clássico ainda não reconhecido.

Revolução mexicana serviu para romper com a Europa e gerar cultura própria, diz historiador mexicano



A Revolução Mexicana, iniciada em 20 de novembro de 1910, foi uma resposta aos mais de 30 anos de governo do general Porfirio Díaz, uma ditadura que suprimia os direitos da maioria dos cidadãos e permitia grandes abismos na sociedade, favorecendo as classes mais abastadas do país – as únicas que gozavam dos benefícios da prosperidade mexicana. A falta de liberdades políticas, a pobreza que atingia grande parte dos mexicanos e as fraudes eleitorais de Díaz foram criando no país uma agitação que levou à irrupção da violência armada.

Em 1917, o ex-presidente Venustiano Carranza promulgou a Constituição, que não só foi o documento decisivo para a organização do Estado pós-revolucionário como também codificou várias das demandas que haviam dado início à revolução, como a inclusão dos direitos humanos, o fim da reeleição do presidente e do vice, a reforma agrária, a divisão do Poder Legislativo e uma maior soberania das entidades federativas, entre outras. 


Rosas: "México não conseguiu erradicar a impunidade,
corrupção e discricionariedade na aplicação da lei"


Cem anos depois da revolução, o historiador e escritor mexicano Alejandro Rosas analisou em entrevista ao Opera Mundi as contribuições do movimento armado, os retrocessos e o futuro político do país, entre outros temas.

Quais são as contribuições mais importantes da Revolução Mexicana para o país?
Ela contribuiu para proporcionar uma série de elementos jurídicos fundamentais. Ou seja, todas as demandas que sustentaram a Revolução Mexicana e não foram reconhecidas pelo ditador Porfírio Diáz terminaram codificadas na Constituição promulgada em 1917. Dentre os exemplos, o direito à greve, à associação e à educação.

Qual a herança positiva da Revolução Mexicana no país?
É o fato de que, apesar de tudo o que os mexicanos enfrentaram – crises econômicas e repressão – melhoramos na cidadania. Se a classe política continua comportando-se com os vícios de antes, se os sindicatos continuam corruptos como no passado, a cidadania se transformou. Hoje, mais de 80% da população sabe ler e escrever, as pessoas sabem exercer seu direito ao voto, criou-se uma consciência social importante. A cidadania já se organiza para se opor contra certos abusos de autoridade, para se posicionar com o governo e partidos políticos. O ponto mais forte é que, apesar de tudo o que aconteceu no século XX, houve a construção de uma sociedade, de uma cidadania que foi se consolidando de maneira firme. E este é o motor que nos permite esperar uma verdadeira mudança na mentalidade do país. 
Leia mais:
Revolução Mexicana começou há 100 anos como rebelião contra ditadura de Porfirio Díaz

O México conseguiu uma revolução, mas quais foram os problemas posteriores?
Depois da Revolução Mexicana, houve uma ruptura do processo de desenvolvimento econômico e político do país. O problema é que, depois do século XX, o que sobra no México é um sistema que melhora os mecanismos do Porfiriato. O sistema político do PRI (Partido Revolucionário Institucional), que nasce em 1929, recupera do Porfiriato a submissão do Poder Legislativo ao Executivo, o controle dos Estados por parte do presidente, o controle e a submissão dos governadores pelo Executivo, da imprensa. Não vivemos sob uma ditadura, mas vivemos sob um regime autoritário durante 70 anos, um regime que construiu uma série de redes e interesses por sob a mesa, com impunidade, com privilégios, com certos compromissos com os grupos importantes do país, fossem legais ou não. 
Segob (Secretaría de Gobernación de México)

Forças de Emiliano Zapata - líder histórico da revolução mexicana - em 1914

E é exatamente por causa dessa rede que a transição nos dá tanto trabalho hoje. Durante 70 anos, os mexicanos viveram sob um regime de impunidade, no qual todos cresceram de algum modo. Assim, a corrupção continua presente por causa desses anos de construção de um sistema que permitia a corrupção e a simulação. Era um sistema que dizia ser democrata, mas tolerava fraudes eleitorais; que dizia apoiar o campo, mas usava o controle político e social dos camponeses; que dizia respeitar o direito à greve, mas tinha centrais operárias totalmente corruptas.

Pela dimensão da Revolução Mexicana (um milhão de pessoas mobilizadas, vítimas, a diminuição da população e grandes batalhas), o país que nos resta está realmente muito abaixo das próprias expectativas em torno do movimento. Pode-se dizer, por exemplo, que a revolução trouxe segurança social, mas hoje o sistema previdenciário está à beira da bancarrota. O que temos hoje como país é o mínimo que o sistema poderia ter oferecido como produto da Revolução Mexicana. Hoje temos 40 milhões de pobres e só chegamos a um suposto regime democrático 70 anos depois.

Quais avanços a Revolução Mexicana permitiu em relação aos demais países da América Latina?
Em termos políticos, o México é um dos países mais vanguardistas em legislação até 1920. Todas as demandas, como o direito à greve, jornada de trabalho de oito horas, educação gratuita, recuperação da terra, são demandas que quase nenhum país havia atendido até aquele momento, e o México as codificou na Constituição de 1917.

Em termos culturais, há uma descoberta importantíssima sobre o que é a “mexicanidade”, pois a partir da revolução começamos a enxergar nós mesmos. Ocorreu um importante processo educativo e cultural nos anos 1920, com os muralistas, o surgimento da música mexicana e das letras. A revolução serviu para parir o México, pois o Porfiriato era um afrancesamento e uma europeização que se manifestavam em todos os âmbitos da cultura. Com a revolução surgiu uma cultura mexicana que se colocou à vanguarda dos países europeus.

Que retrocessos ocorreram no México depois da revolução?
Ainda não conseguimos estabelecer um estado de direito. A lei continua sendo aplicada de um modo discricionário em alguns casos. Setores que já deveriam ter sido sanados, como a segurança pública, vivem seu pior momento. Agora que supostamente já avançamos na transição rumo à democracia, temos os piores momentos na segurança pública, com a corrupção ainda reinando nas esferas do poder. Mais que retroceder, não conseguimos vencer certas etapas que já deveriam ter sido superadas, como a impunidade, a corrupção e a discricionariedade na aplicação da lei.

Qual o futuro da sociedade do México?
A classe política atual ficou abaixo das expectativas no que diz respeito às necessidades do país para consolidar essa transição política à democracia, pois não vivíamos em um regime democrático. Diante de uma ausência de poder e de um projeto nacional, o papel da sociedade é continuar exercendo essa responsabilidade e ampliá-la. É na sociedade civil que está a solução para que o país avance e encontre uma renovação geracional nas estruturas políticas, uma maior participação e uma maneira de enfrentar os problemas. Se não retomarmos a ideia defendida por Francisco I. Madero, a do cidadão livre independente, livre e comprometido com seu país, não poderemos dar o próximo passo.

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Uma análise do poder midiático na Argentina


O discurso que Cristina Fernández de Kirchner fez em 24 de agosto foi mais além do que tinham ido todos os discursos dos presidentes argentinos até hoje. Ninguém – nem sequer o primeiro Perón ou Evita – fizeram tal desconstrução da estrutura do poder na Argentina. De quê ela estava falando? Do poder nas sombras, do poder detrás do trono, do verdadeiro poder. Qual é? É o poder midiático. A direita não tem pensadores, tem jornalistas audazes, agressivos. E a mentira ou a deformação pura e plena de toda notícia é sua metodologia. O artigo é de José Pablo Feinmann.

A filosofia ocidental dos últimos 45 anos se equivocou gravemente. Para sair de Marx e entrar em Heidegger (como crítico excelente da modernidade, mas a partir de outro lado, que não o de Marx) se viu obrigada a eliminar o sujeito, tal como Heidegger o havia feito com inegável brilho no seu texto A época da imagem do mundo. Também Foucault deu o homem por morto. Barthes, o autor. Ao estilo. Deleuze, a partir de Nietzsche, a negatividade, ou seja: o conflito na história. E a academia norte-americana sistematizou tudo isso incorporando com fervor os heróis da French Theory. O fracasso é terrível e até patético. Enquanto os pós-modernos postulam a morte da totalidade, o Departamento de Estado postula a globalização. Enquanto propõem a morte do sujeito, o império monta brilhantemente o mais poderoso sujeito da filosofia e da história humana: o sujeito comunicacional. E esta – há anos que sustento esta tese que na Europa causa inesperado assombro quando a desenvolvo – é a revolução de nosso tempo.

O sujeito comunicacional é um sujeito centrado e não descentrado, logocêntrico, fonocêntrico, alheio a toda possível disseminação, informático, bélico, mascarador, submetedor de consciências, sujeitador de sujeitos, criador de realidades virtuais, criador de versões interessadas da realidade, da agenda que determina o que se fala nos países, capaz de derrubar governos, encobrir guerras, de criar a realidade, essa realidade que esse sujeito quer que seja, quer que todos acreditem que é, que se submetam a ela e que, submetendo-se, submetam-se a ele, porque aquilo em que o sujeito comunicacional acredita é a verdade, uma verdade na qual todos acabarão crendo e que não é a verdade, mas a verdade que o poder absoluto comunicacional quer que todos aceitem. Em suma, sua verdade.

Impor sua verdade como verdade para todos é o triunfo do sujeito comunicacional. Para isso, deve formar os grupos, os monopólios. Deve apoderar-se do mercado da informação para que só a sua voz seja escutada. Para que só os jornalistas que lhe são fiéis falem. Uma vez se consiga isso, o triunfo é seguro. A arma mais poderosa da supraposmodernidade do século XXI radica no domínio maior possível dos meios de informação. Que já não informam. Que transmitem à população os interesses das empresas que formam o monopólio. Interesses nos quais todas coincidem.

Assombrosamente, nenhum filósofo importante advertiu essa revolução. Foucault passou a vida inteira analisando o poder. Mas não o comunicacional. É claro! Se tinha negado o sujeito como iria analisar os esforços do poder para constituí-lo de acordo com seus interesses?

Ninguém viu – ademais, e isso para mim é imperdoável – o novo monstruoso sujeito que se havia consolidado. Superior ao sujeito absoluto de Hegel. Algo observado por Cornelius Castoriadis. Mas pouco. Relacionou as campanhas eleitorais com as empresas que as financiam. Mas – insisto – aqui o essencial é que o tema do sujeito voltou ao primeiro plano. Colonizemo-nos o sujeito, façamos-lhe crer no que nós cremos, e o poder será nosso. O poder começa pela conquista da subjetividade. Começa pela construção de algo a que darei o nome de sujeito-Outro.

Formulemos – como ponto de partida desta temática essencial – a pergunta obrigatória: o que é o sujeito-Outro? É o Outro do sujeito. Escrevo Outro com esse "O" maiúsculo enorme para marcar o caráter alheio que o Poder consegue instaurar entre o sujeito e o Outro de si. Heidegger transitou bem esta temática. O que eu chamo sujeito-Outro é esse sujeito que – segundo Heidegger – caiu “sob o senhorio dos outros” (Ser e Tempo, parágrafo 27). Ele fez aí uma observação brilhante e precisa: o senhorio dos outros. Heidegger amplia o conceito: quem cai sob esse senhorio (o dos Outros) “não é ele mesmo, os outros lhe hão arrebatado o ser”. “O Poder, ao submeter a subjetividade, elimina meus projetos, meu futuro mais próprio, o que houvera querido fazer com minha vida. Minhas posibilidades (...) são as do Outro; são as do Poder, as que me vêm de fora. Já não sou quem decide, sou decidido” (JPF, La historia desbocada, Capital Intelectual, Buenos Aires, 2009, p. 128). Heidegger, no entanto se remete à esfera ontológica: o que se perde é o ser.

Não creio que devamos pôr o acento nisso; o que se perde é a subjetividade, a consciência, a autonomia de pensar por nós mesmos, pois pensamos o que nos fazem pensar, dizemos o que nos fazem dizer e nos convertemos em patéticos, bobos, manipulados defensores de causas alheias.

CFK manejou a temática com precisão e com uma audácia que – eu, ao menos, e já tenho meus anos vivendo sempre neste país – não vi em presidente algum. Quando retoma a frase da capa do Clarín e a da contra-capa é onde revela o que é o Poder. O Clarín tem a manchete: “O Governo avança na Papel Prensa para controlar a palavra impressa”. Por detrás desta frase está toda a campanha “desgastante” (para usar um conceito do revolucionário popular agrário Buzzi, fiel a suas bases até a morte, até a matar a FA, submetendo-a aos interesses da Sociedade Rural, controlada hoje pelo “Tanto” Biolcati, descendente da “chusma ultramarina” que Cané desdenhava e não por Martinez de Hoz ou pelo elegante senhor Miguens) da oposição.

Quer dizer, o governo é autoritário, doente pelo poder e sempre empenhado em silenciar a todos. CFK dá razão ao Clarín:

“O Clarín pensa que quem controla a Papel Prensa controla a palavra impressa. Quero nisto coincidir com o Clarín. Claro, quem controla a Papel Prensa controla a palavra impressa. Por que? Porque a Papel Prensa Sociedad Anónima é a única empresa que produz pasta de celulose para fabricar papel jornal no país; ela fabrica o papel jornal, o distribui e o comercializa no que se conhece em termos econômicos e jurídicos como uma empresa monopólica integrada verticalmente. Por que? Porque vai da matéria prima até o insumo básico, mas não somente produz esse insumo básico como determina a quem vende, por quanto vende e a que preço vende. Por isso coincido com o Clarín em que quem controla a Papel Prensa controla a palavra impressa na República Argentina”.

O Poder – em cada país – tem de formar monopólios para ter unidade de ação. Não se tem todo o poder se se tem só a Papel Prensa, que implica, é verdade, o controle da palavra impressa. Mas há que ter outros controles. Sobretudo – hoje, no século XXI, nesta supraposmodernidade manejada pela imagem – o poder da imagem. E o da voz do rádio, sempre penetrante, omnipresente ao longo do dia. Trata-se da metralhadora midiática. Não deve parar. Por que este governo se complica nesta luta com gigantes sagrados, intocáveis? Ou o faz ou perece a qualquer momento.

Desde a campanha do senhor Blumberg se advertiu que os meios de comunicação podiam armar uma manifestação popular em poucas horas. Toda a cambada de Buenos Aires saiu com sua guarda atrás do engenheiro e impulsionada por Haddad e a ideologia-tacho que – então – era uma criação da Rádio 10. A ideologia-tacho é uma invenção puramente argentina. Como o ônibus, o doce de leite e Maradona. Alguém toma um táxi em qualquer parte do mundo e o taxista não o agride com suas opiniões políticas. Deixa-o viajar tranquilo. Sigamos: o segundo, terrível sinal de alarme foi durante as jornadas “destituintes” e “desgastantes” do “campo”.

Sem o apoio imoderado dos “meios de comunicação” teria sido um problema menor. Mas a fúria midiática chegou aos seus pontos mais estridentes. A “oposição”, não essa essa galeria patética de ambiciosos, torpes e imprestáveis políticos que peleiam melhor entre si do que com seus adversários, são os meios de comunicação. A direita não tem pensadores, tem jornalistas audazes, agressivos. E a mentira ou a deformação pura e plena de toda notícia é sua metodologia.

A análise de CFK foi excessivamente rica para uma só nota. Até aqui temos: Videla convocou La Nación, Clarín e La Razón e os entregou a Papel Prensa. Ao ser o Estado desaparecedor o sócio da sociedade que se formou, esses jornais não só apoiaram ou colaboraram com um regime abominável como foram seus sócios. Para quê? CFK o disse assim:

“Durante esses anos se escutava muito o tema da defesa de nosso estilo de vida. Nunca pude entender exatamente a que se referiam quando se falava de defender nosso estilo de vida. Eu não creio que a desaparição, a tortura, a censura, a falta de liberdade, a supressão da divisão dos poderes possam ter formado em algum momento parte do estilo de vida dos argentinos”.

Sim, no momento em que se constitui a Papel Prensa e Videla pede aos grandes jornais que – agora sim, a morte – defendam a luta em que estão empenhados, o estilo de vida argentino, para ser defendido, requeria os horrores da ESMA. Há um livro de Miguel Angel Cárcano: El estilo de vida argentino. Em suas páginas se traça uma imagem idílica, campestre, cotidiana e senhorial do general Roca. Esse é - para Cárcano– um herói de nosso estilo de vida. É o deles, o da oligarquia que fez este país a sangue quente e a sangue e a fogo sempre o defendeu sempre que se sentiu atacada.

Os herdeiros de Cárcano e Roca ainda o defendem. Se lhes deixa o poder de “formar a opinião pública” como sempre o fizeram, voltaremos ao país que desejam: o do neoliberalismo, o dos gloriosos noventa. Conservarão o poder. Farão o que CFK desenhou assim: “Se há um poder na República Argentina, é um poder que está por sobre quem exerce a Primeira Magistratura, neste caso a Presidenta; também está por sobre o Poder Legislativo e, seja como for, também por sobre o Poder Judiciário (...) é invisível aos olhos”. É o poder que tão impecavelmente um outrora misterioso personagem definiu: “Presidente? Este é um posto menor”.

(*) José Pablo Feinmann é professor de Filosofia, ensaísta, escritor e roteirista.

Tradução: Katarina Peixoto