Júnia Gouvêa e Jorge Luís Martins no CORREIO DA CIDADANIA |
Abril de 2012 corre o risco de ficar na memória como o momento de um
revés importante para a classe trabalhadora brasileira. Realizaram-se no
Rio de Janeiro e em Sumaré (São Paulo), na segunda quinzena do mês
passado, dois encontros de diferentes dimensões, composição e grau de
unidade, mas com o mesmo e trágico significado: a consolidação da
divisão do movimento sindical combativo brasileiro em duas organizações
diferentes.
No Rio de Janeiro, entre 20 e 22 de abril, sob a justa bandeira da
luta contra a criminalização dos movimentos sociais, encontraram-se
cerca de 500 lutadores da atual Intersindical, das correntes MTL e MES,
TLS (Trabalhadores na Luta Socialista) e Unidos para Lutar do PSOL, além
de MAS (Movimento Avançando Sindical). Ao fim da reunião, além de
votarem um calendário indicativo de lutas e um programa para a ação,
resolveram criar “uma mesa de diálogo permanente” entre as correntes que
“não estão em nenhuma central”.
Em São Paulo, entre 28 e 30 de abril, a CSP-Conlutas, na qual têm
folgada maioria os sindicatos e oposições dirigidos ou influenciados
diretamente pelo PSTU, reuniu em seu 1º Congresso Nacional 1.800
delegados, de diversos sindicatos, movimento popular e estudantil. Além
de separados, nenhum dos dois encontros deu sinal, nenhum tímido sinal,
de lamentar a divisão de 2010 e ensaiar algum gesto de reaproximação,
ainda que cuidadosa.
É indiscutível que ambos os encontros, pelo simples fato de reunirem
dirigentes e lutadores e permitirem pautas comuns e um mínimo de
articulação entre estados e categorias, tiveram resultados pontuais
positivos para alguns setores. Afinal, alguma articulação é melhor do
que nenhuma. O Congresso da CSP-Conlutas e o Encontro dos Lutadores
realizado no Rio de Janeiro, por certo, sem entrar no mérito, aprovaram
resoluções importantes. Mas é preciso fazer uma avaliação política do
significado da divisão (comparando-se os dois encontros com um encontro
unitário, se tivesse ocorrido), diante da força do sindicalismo oficial
cooptado pelos governos Lula-Dilma.
A CSP-Conlutas se consolida também como um importante setor do
movimento combativo. Mas sua maioria, do PSTU, foi a principal
responsável pelo episódio que impôs a divisão no Conclat de Santos, há
dois anos. O congresso de Sumaré teve, agora, a oportunidade de esboçar
um gesto pela unidade, quando a representante do Andes-SN propôs que se
rediscutisse a questão do nome da central – o lamentável mote da divisão
em Santos – e a direção da CSP-Conlutas; no entanto, negou-se a dar
este passo e sequer chegou a esboçar um balanço do Conclat, como se este
simplesmente jamais tivesse acontecido. O mesmo se deu na reunião do
Rio de Janeiro. Nenhuma referência ao Conclat, nenhum balanço, nenhuma
resolução sinalizando sequer a necessidade genérica da unidade do
sindicalismo combativo. Assim, lamentavelmente, começa a se cristalizar
entre os lutadores desses dois setores históricos da resistência
combativa a lógica da divisão como algo inevitável.
Assim, os dirigentes da esquerda socialista, sejam do PSTU, sejam das
correntes do PSOL, sejam do PCB, sem falar evidentemente da ASS – todos
do mesmo e importantíssimo campo político nesse debate de recomposição
necessária –, levam para o terreno do movimento sindical a experiência
de divisão, que já estão implementando há algum tempo no âmbito da
participação eleitoral. Ou seja, também no terreno das lutas, deixam a
bandeira socialista pulverizada em várias alternativas e enfraquecida
aos olhos dos trabalhadores e do povo. Pois não é verdade que dá na
mesma estarmos divididos ou não. Todos os que militam no cotidiano dos
movimentos sabem bem que a divisão é um obstáculo real, que, dividido, o
movimento perde amplitude e potencialidade. Basta ver o último 1º de
maio, onde, depois de mais de uma década em que a esquerda socialista
esteve unificada, se dividiu em duas manifestações, o que é mais um
desastre e vitória da fragmentação em curso.
Há, no entanto, algo mais grave quando a divisão acontece na
organização sindical dos trabalhadores. Não somente porque se torna um
obstáculo a mais, além do patronal e seus ataques, às vitórias da
classe. Quem está ignorando ou menosprezando a divisão da classe, e mais
ainda investindo nela, está fazendo exatamente o planejado pelos
governos patronais desde FHC, passando por Lula e agora Dilma – cuja
política é uma central para cada partido. Está, portanto, adaptando-se à
“institucionalidade sindical” desejada por governos e patrões,
iniciando um amoldamento ao regime do movimento sindical combativo.
O retrocesso, de 2010 para cá, no caminho da unidade dos socialistas e
ativistas combativos numa mesma organização sindical é tão mais grave
quanto mais se é consciente das lutas que podem vir por aí. Afinal, quem
garante, diante do atual quadro internacional, que o crescimento e
estabilidade de hoje se manterão? Quem garante que, no primeiro sinal de
desequilíbrio nas contas e lucros, dona Dilma, banqueiros, industriais
etc. não venham mais uma vez descontar nos nossos empregos, salários,
pensões, aposentadorias, orçamentos da educação e saúde? Prestemos
atenção na Europa...
Nesse quadro particularmente difícil, cabe aos militantes e dirigentes sindicais conscientes desse fracionamento nocivo se negarem a cristalizar a divisão.
É necessária uma intensa batalha de convencimento político de todos os
setores combativos para tentar reverter essa situação. Primeiro
incentivando as lutas e sua unificação, independentemente da força da
esquerda socialista que conduza cada conflito. E também defendendo ou
voltando a defender, em todos os espaços em que nossas entidades
participem, a construção de uma central sindical antigovernamental e
unitária, compreendendo que as organizações atuais do movimento sindical
e popular são todas insuficientes para o enfrentamento necessário ao
capital e seus governos (razão pela qual devem ter todas um caráter
transitório). Importante lembrar que várias categorias profissionais já
aprovaram resoluções neste sentido no último período, o que ainda não
tem sido capaz de sensibilizar a cúpula sindical das organizações.
Não é de forma alguma impossível reverter a divisão. Não é nada
impossível retomar desde já a luta pela unidade da classe, pela base,
nas mobilizações já em curso, e com uma plataforma política comum.
Afinal, grande parte das resoluções do encontro do Rio coincide com a
maior parte das resoluções do Congresso da CSP-Conlutas. Um movimento
nacional pela base, pela unidade, com essa plataforma comum, pode ser um
forte pólo de atração para uma nova geração de trabalhadores que estão
começando a se mobilizar.
A natureza e o perfil das grandes mobilizações ocorridas na Europa e
no mundo árabe mostram o quanto o capitalismo é questionado e quanto é
possível um novo mundo – socialista quem sabe. Mas, para que esse novo
mundo se construa, a classe trabalhadora precisa se constituir em si, na
luta unitária, e para si, na consciência da sua força independente. É
esse o sentido histórico da luta pela unidade.
Júnia Gouvêa é trabalhadora da previdência social; Jorge Luís Martins é advogado trabalhista.
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quarta-feira, 23 de maio de 2012
Movimento sindical dá um passo à frente e dois para trás
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