sexta-feira, 16 de maio de 2008

POBRE COLOMBIA....

Alvaro Uribe Narco Paramilitar. Su Pasado y Presente.

O renascimento do Che



Eu tive um irmão
Não nos vimos nunca
mas não importava.
(Julio Cortázar)



Ele faria hoje(14/05/2008) 80 anos e mais do que uma lenda, precisa ser recordado apenas como um homem. Um homem que honrou o sentido mais recôndito do significado de ser “humano”. Porque não é certo que todo ser humano é naturalmente humano. Um ser humano pode se tornar ‘humano” ao longo de uma vida. Mas “nem todo mundo chega lá”, como nos lembra um sábio do povo, chamado pelos europeus e seus sucessores, de índio.
Eu tive um irmão
que andava na selva
enquanto eu dormia.
Che Guevara não era um humanitarista, esses que, a serviço do sistema, são premiados por tentar fazer, desse horror de mundo, um mundo apenas “melhor”. O Che era um revolucionário humanista, um fazedor de mundos, um criador de idéias, um pensador político. Um homem que até os detratores de qualquer revolução ou revolucionário têm dificuldade em macular. Che Guevara, um homem, que com seu amor desmedido pelo gênero humano, pela vida, carregava o sonho de ver emergir, numa sociedade renovada, o homem novo. “A revolução se faz através do homem, mas o homem deve forjar dia-a-dia seu espírito revolucionário”, ele dizia. E acreditava ser necessário que se desenvolvesse uma consciência na qual os valores adquirissem categorias novas.”A sociedade em seu conjunto deve transformar-se em uma gigantesca escola”.
O amei ao meu modo,
Lhe tomei a voz
livre como a água,
caminhei às vezes
perto de sua sombra.
meu irmão desperto
enquanto eu dormia.
O Che também sabia que o caminho é largo e, em parte, desconhecido. Mas não se deixava amedrontar pelo que estaria por vir: “Conhecemos nossas limitações. Faremos o homem do século XXI: nós mesmos. Nos forjaremos na ação quotidiana, criando um homem novo com uma nova técnica". E o sentido de amor desmesurado que o transformara em um guerrilheiro nascera nas primícias da sua meninice, quando abrigava em casa meninos e meninas pobres, que ali se alimentavam, na mesa com sua família, e encontravam um ninho de terno acolhimento. Nada de filantropia nem de caridade. O mais essencial amor era o que já movia os passos do pequeno Ernesto, que um dia se tornaria o Che, apenas um homem.
Nesses 40 anos que se somam desde seu assassinato, bem que o mercado quis se apropriar de sua imagem doce-amarga, que guarda no olhar uma dignidade invencível. O sistema que tudo torna descartável – na indústria do usa e joga - quis vender sua figura de guerrilheiro heróico em produtos que só visam o lucro. Mas não é a força do mercado que leva uma multidão de humanos, estradas adentro, a abrigar, no peito, nas mãos, nas cabeças, o seu vulto misterioso e ao mesmo tempo translúcido. O seu mistério, nesse mundo que se despedaça em misérias e se maquia em falsidades, é exatamente a transparência. A sua absoluta convicção,cristalina e confessada, de que só há um rumo para a humanidade: o da revolução transformadora, aquela à qual entregou a sua vida completamente, até os 39 anos roubados, dia 9 de outubro de 1967, por mercenários carniceiros em La Higuera, na Bolívia.
Assim, neste maio de 2008 que assinala os seus 80 anos não alcançados em vida, se tornam desprezíveis as tentativas de mistificar ou de mitificar a vida e a história do Che como o mártir de revoluções derrotadas e o símbolo de revolucionários vencidos. Nessas oito décadas de uma história que se escreve sobre os passos do Che, o que é preciso elevar e trazer à luz é a sua profunda reverência pela vida. E a sua incomensurável ternura, nunca perdida em meio à dureza de um mundo cruel e de uma luta desigual e impiedosa.
Meu irmão mostrando-me
por detrás da noite
a sua estrela eleita.
Júlio Cortazar, com o mágico poder que os escritores e poetas sabem colher das palavras, em um comovente texto, escrito quando de seu assassinato em La Higuera, pediu que fosse o próprio Che a conduzir sua mão no momento da dolorosa despedida. “Sei que é absurdo e que é impossível, e por isso mesmo creio que ele escreve isto comigo, porque ninguém soube melhor até que ponto o absurdo e o impossível serão um dia a realidade dos homens”.
E é por tudo que sua vida representa, por ter sonhado o impossível como sendo possível, que os quiseram e o querem “morto” pagam o preço de ver esse homem, médico e lutador argentino-cubano renascer, a cada dia, em meio às lutas do povo, que se levanta em todo canto mundo, a despeito do massacre, do terror, da dor e do desencanto. Ele renasce a cada ano porque o Che, nos diz Eduardo Galeano, é o mais renascedor de todos os seres.
O nascedor
Por que será que o Che
Tem este perigoso costume
De seguir sempre renascendo?
Quanto mais o insultam,
O manipulam
O atraiçoam
Mais ele renasce.
Ele é o mais renascedor de todos!
Não será por que Che
Dizia o que pensava e fazia o que
dizia?
Não será por isso que segue sendo
tão extraordinário,
Num mundo onde palavras
e atos tão raramente se encontram?
E quando se encontram
raramente se saúdam
Por que não se reconhecem?
(Eduardo Galeano)
*Os versos em destaque no texto são de Julio Cortázar.

Janis Joplin - Discografía 2

In Concert - 1972

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Live At Winterland - 1968
Parte1 - Parte2

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Janis Joplin's Greatest Hits - 1973



Créditos:LooLoBLog

Crise alimentar, mercado e debate ideológico


Pedro A. Ribeiro de Oliveira -
Adital


De repente, fomos surpreendidos por notícias sobre a falta de alimentos no mundo. Após trinta anos de relativa estabilidade nos preços, uma súbita elevação gera protestos de populações esfomeadas no Haiti, Indonésia e vários países da África. Quando tudo parecia estar se ajustando no panorama do comércio mundial - onde a China é a fábrica, a Índia o escritório, e o Brasil a fazenda - assistimos a uma crise alimentar que, segundo o Banco Mundial, custará 500 milhões de dólares em ajuda emergencial aos famintos. De fato, os preços subiram enormemente nos dois últimos anos, e os analistas apontam diversos fatores que se somaram para gerar esse aumento. Dois são de ordem física: o crescimento econômico da Ásia, cujas populações se urbanizam, diversificam sua dieta e aumentam a demanda, e a utilização de grãos para a produção de agrocombustíveis. Outros dois são de ordem financeira: o aumento de preço dos fertilizantes e a entrada maciça dos fundos de investimento no mercado futuro de alimentos, para se protegerem contra as perdas financeiras do mercado imobiliário dos EUA. Embora agravada por fatores climáticos localizados, trata-se indiscutivelmente de uma crise provocada pelo mercado e não por más condições do clima, guerras ou doenças, que sempre foram as grandes causadoras da fome em grande escala.

Essa novidade de uma penúria alimentar causada pelos próprios mecanismos do mercado deveria provocar uma reflexão mais alentada do que a reação dos economistas afirmando que a crise será superada pelo próprio mercado auto-regulado. Para eles, a elevação do nível de preços incentivará a produção e trará um novo equilíbrio entre oferta e demanda. Isso implicará também maior exploração da terra (desmatamento) e das águas (irrigação), e portanto o agravamento dos problemas ecológicos - mas este não é um problema de economistas, para quem o mercado ser a instituição reguladora da economia é tão natural quanto ser a família a instituição reguladora da sexualidade.

Para quem se atreve a olhar um pouco mais longe, porém, numa perspectiva histórica e crítica, a crise atual pode ser uma rica fonte de ensinamentos sobre a realidade atual. É o que desejo mostrar neste pequeno artigo, inspirado num estudo clássico de história social e econômica.

E. Thompson fez um pormenorizado estudo das revoltas populares contra o preço do trigo, na Inglaterra do século XVIII. Nesse estudo, o autor mostra como a doutrina do "justo preço" foi sendo substituída pela doutrina do "livre-mercado" que é a base do capitalismo moderno, num longo processo que vai desde o século XVI até o início do século XIX. No sistema tradicional, a compra e venda de cereais e outros gêneros alimentícios, nas cidades inglesas era regulada pelo costume cujo símbolo era o toque dos sinos. Os produtores (camponeses) chegavam cedo à praça do mercado, mas só podiam iniciar as operações de venda após o toque do sino, quando os moradores da cidade adquiriam o necessário para seu consumo. Atendidos os moradores, tocava novamente o sino e os comerciantes, donos de moinho e padeiros locais entravam no mercado como compradores. Só mais tarde, após o novo toque dos sinos, comerciantes de fora podiam comprar as mercadorias que tivessem sobrado. Ficava assim assegurado o abastecimento da população local só sendo exportados os excedentes.

Os grandes negociantes, porém, ganharam peso político cada vez maior e isso resultou em decretos reais suprimindo os empecilhos legais à sua participação nas operações de compra e venda. Mas a oposição de movimentos sociais dos trabalhadores pobres, apoiados na tradição local, impede - inclusive pela força física - que tais decretos sejam aplicados. Aí se dá um longo e acalorado debate ideológico entre os defensores do "paternalismo" na economia e os "liberais", entre os quais se destaca Adam Smith, que com sua obra A riqueza das nações (1776) inaugura a moderna economia política. Ao iniciar-se o século XIX, as guerras na Europa contra Napoleão dão ao governo as razões que ele precisava para abolir toda regulação do mercado, consagrando então a vitória ideológica do liberalismo e assegurando o funcionamento do mercado auto-regulado. Daí em diante, a história é conhecida: o mercado se expande continuamente, incorporando novos contingentes da população, até sua completa mundialização no final do século 20.
A atual crise de alimentos pode então trazer muitos ensinamentos sobre o funcionamento do mercado, que nos dois últimos séculos tem sido a instituição fundamental das sociedades modernas e pós-modernas (que não por acaso se auto-intitulam "sociedades de mercado").

É evidente que o mercado incentiva - como nenhum outro sistema até hoje inventado - a produção e o consumo de bens e serviços. O PIB mundial, hoje estimado em US$45 trilhões, é o melhor indicador dessa capacidade de produzir riqueza. (Se fosse dividido pela população mundial, cada família de quatro pessoas teria hoje uma renda bruta mensal de R$3.750). Mas é também evidente que o mercado, por fundar-se na competição, beneficia os fortes e prejudica os fracos. A menos que se submeta a um poder maior que o controle, ele tende a agravar as desigualdades sociais. Isto já foi percebido no século XIX, resultando, no século XX, em políticas de intervenção do Estado: o socialismo e o Estado de bem-estar dos países de capitalismo avançado. O fim da guerra-fria, porém, favoreceu a vitória ideológica do neoliberalismo e, com ele, a desregulamentação externa do mercado. No caso dos alimentos, essa vitória se deu quando a Organização Mundial do Comércio - e não a FAO (organismo da ONU para a regular a Agricultura e os Alimentos) - é incumbida de regular sua distribuição em escala mundial. Tratados como uma mercadoria entre outras, os alimentos tornam-se objeto de transações de compra e venda regidas pela expectativa de lucros. O Estado renuncia assim a seu poder regulador, e limita-se a prestar socorro a pessoas desvalidas, incapazes de assegurar a própria sobrevivência alimentar - são os programas de tipo "Bolsa Família" e "cestas básicas".

Outra deficiência congênita do mercado, percebida em meados do século 20 e agora cada vez mais clara, é sua índole produtivista. O mercado só alcança o desejado equilíbrio entre oferta e procura, aumentando a produção que, por sua vez, gera novas demandas e o avanço sobre os recursos naturais da Terra que sabemos serem limitados. Aqui está uma barreira aparentemente insuperável ao crescimento econômico: a menos que a tecnologia chegue a formas inteiramente novas de produção, estamos nos aproximando perigosamente da exaustão dos recursos naturais. A atual crise do preço dos alimentos é reveladora desse limite. Basta pensar, por exemplo, no consumo de carnes e o desgaste que ele provoca ao transformar florestas e vegetação do cerrado em pastagens, e por exigir enormes plantações de soja e milho (que entre outros danos ecológicos consomem grande quantidade de água na irrigação) para alimentar animais e aves criados em regime de reclusão. Como, na lógica do mercado, só se reduz a demanda pela elevação dos preços - e não pela mudança de hábitos alimentares, como uma dieta menos devastadora dos recursos naturais - sua única saída é aumentar a produção, ainda que isso implique antecipar a crise ecológica que já esta no horizonte.

Visto isso, chega-se a conclusão que a atual crise de preços de alimentos está pedindo às pessoas de boa-vontade uma séria e alentada reflexão sobre o sistema de produção e consumo baseado no mercado. O pensamento liberal conquistou a vitória no debate ideológico do século XVIII, derrotando o "paternalismo" abençoado pela tradição cristã, e recuperou-se do revés sofrido no século XX (quando os êxitos do Estado de bem-estar e do planejamento socialista o ofuscaram), mas hoje ele encontra-se sem argumentos convincentes diante da crise ecológica e da desigualdade social por ele agravadas. Neste contexto, faz-se necessário um pensamento rigoroso e crítico, que não se contente em propor correções ao sistema de mercado, mas busque alternativas econômicas viáveis para uma população mundial que poderá chegar a dez bilhões de pessoas. Este é um belo desafio aos cristãos e cristãs que não já não temos mais como modelo o "paternalismo" tradicional, aprendemos as lições do socialismo do século XX, e acreditamos que um novo mundo é possível - porque Jesus ressuscitou.


* Membro da equipe de ISER-Assessoria e da Coordenação Nacional do Movimento Fé & Política