segunda-feira, 9 de junho de 2008

Feijó desmente Yeda e diz que Lair Ferst captou recursos para a campanha


O vice-governador Paulo Feijó (DEM) desmentiu hoje a governadora Yeda Crusius (PSDB) e confirmou que o empresário e lobista tucano Lair Ferst captou recursos na campanha eleitoral de 2006. Indagado sobre esse tema, Feijó respondeu que assim como ele ajudou a captar recursos junto a amigos para a campanha de Yeda, Lair Ferst também fez o mesmo junto “a pessoas do networking dele”. "Ele freqüentava quase que diariamente o comitê de campanha", acrescentou.

É a primeira vez que um integrante do núcleo do governo confirma a participação de Ferst na parte financeira da campanha. A governadora Yeda Crusius já negou várias vezes essa participação, garantindo que Lair atuou apenas como militante da campanha. Na entrevista coletiva que concedeu sábado, Yeda Crusius reafirmou essa tese, dizendo que o lobista foi apenas mais um militante. “Esteve perto, segurou bandeira”.

Na entrevista coletiva, Feijó acusou o ex-chefe da Casa Civil, Cézar Busatto, de tentativa de cooptação em troca de vantagens. “Este mesmo senhor já tinha me feito outras propostas escusas, propondo que eu abrisse mão de posições minhas em trocas de cargos. Gravei a conversa para me proteger de mais uma tentativa de cooptação. Eu sabia que ele vinha com aquela conversa de novo. É importante que não se perca o foco nos acontecimentos. Na conversa fica claro quem é Busatto, diz uma coisa para a população e quando tem o poder faz outra”.

Além disso, acusou Busatto de integrar um submundo adepto de práticas mafiosas e defendeu sua decisão de fazer a gravação: “De que outra forma este submundo seria posto às claras. Não posso aceitar mafiosas. Já foi feito um bem em não ter essa pessoa no governo.

Créditos:
Do mundo virtual ao espiritual




Frei Betto

Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos em paz em seus mantos cor de açafrão. Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: "Qual dos dois modelos produz felicidade?"

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: "Não foi à aula?" Ela respondeu: "Não, tenho aula à tarde". Comemorei: "Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde". "Não", retrucou ela, "tenho tanta coisa de manhã..." "Que tanta coisa?", perguntei. "Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina", e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: "Que pena, a Daniela não disse "tenho aula de meditação"!

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados. Por isso, as empresas consideram agora que, mais importante que o QI, é a IE, a Inteligência Emocional. Não adianta ser um super-executivo se não consegue se relacionar com as pessoas. Ora, como seria importante os currículos escolares incluírem aulas de meditação!

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: "Como estava o defunto"? "Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite"! Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade, inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo virtual pela internet: não se pega Aids, não há envolvimento emocional, controla-se no mouse. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra!

Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos os valores, não há compromisso com o real! É muito grave esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos: somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também eticamente virtuais.

A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e honrosas exceções - é um problema: a cada semana que passa temos a sensação de que ficamos um pouco menos cultos. A palavra hoje é ‘entretenimento’; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: "Se tomar este refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!" O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede, desenvolve de tal maneira o desejo que acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos seus pacientes. Colocá-los aonde? Eu, que não sou da área, posso me dar o direito de apresentar uma sugestão. Acho que só há uma saída: virar o desejo para dentro. Porque para fora ele não tem aonde ir! O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo, começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a catedral é o sinal de que ela tem história. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shopping centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do McDonald’s…

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: "Estou apenas fazendo um passeio socrático." Diante de seus olhares espantados, explico: "Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: "Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz".

Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Luis Fernando Veríssimo e outros, de "O desafio ético" (Garamond), entre outros livros.