terça-feira, 18 de outubro de 2011

Haiti, país ocupado

Outras vozes
Eduardo Galeano

Se perguntar a qualquer enciclopédia qual foi o primeiro país a abolir a escravatura, receberá sempre a mesma resposta: Inglaterra. Mas o primeiro país que aboliu a escravatura não foi a Inglaterra mas o Haiti, que continua ainda a expiar o pecado da sua dignidade.

Consulte qualquer enciclopédia. Pergunte qual foi o primeiro país livre na América. Receberá sempre a mesma resposta: Estados Unidos. Mas os Estados Unidos declararam a sua independência quando eram uma nação com 650 mil escravos, que continuaram a ser escravos durante mais um século, e estabeleceram na sua primeira Constituição que um preto equivalia a três quintas partes de uma pessoa.
E se perguntar a qualquer enciclopédia qual foi o primeiro país a abolir a escravatura, receberá sempre a mesma resposta: Inglaterra. Mas o primeiro país que aboliu a escravatura não foi a Inglaterra mas o Haiti, que continua ainda a expiar o pecado da sua dignidade.
Os escravos negros do Haiti tinham derrotado o exército glorioso de Napoleão Bonaparte e a Europa nunca perdoou essa humilhação. Durante um século e meio, o Haiti pagou à França uma indemnização gigantesca por ser culpado da sua liberdade, mas nem isso chegou. Aquela insolência negra continua a ferir os amos brancos do mundo.
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De tudo isso sabemos pouco ou nada.
O Haiti é um país invisível.
Só se tornou famoso quando o terramoto de 2010 matou mais de 200 mil haitianos.
A tragédia levou o país a ocupar, fugazmente, o primeiro plano dos meios de comunicação. O Haiti não é conhecido pelo talento dos seus artistas, magos da sucata capazes de transformar o lixo em beleza, nem pelas suas façanhas históricas na guerra contra a escravidão e a opressão colonial. Vale a pena repetir uma vez mais, para que os surdos o oiçam: o Haiti foi o país fundador da independência da América e o primeiro país a derrotar a escravidão no mundo.
Merece muito mais que a notoriedade nascida das suas desgraças.
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Actualmente, os exércitos de vários países, incluindo do meu, continuam a ocupar o Haiti. Como se justifica esta invasão militar? Alegando que o Haiti põe em perigo a segurança internacional.
Nada de novo.
Ao longo de todo o século XIX, o exemplo do Haiti constituiu uma ameaça para a segurança dos países que continuavam a praticar a escravatura. Já Thomas Jefferson o dissera: do Haiti provinha a peste da rebelião. Na Carolina do Sul, por exemplo, a lei permitia prender qualquer marinheiro negro enquanto o seu barco estivesse no porto, devido ao risco de contágio da peste antiesclavagista. E no Brasil, essa peste chamava-se «haitianismo».
Já no século XX, o Haiti foi invadido pelos marines, por ser um país «inseguro para os seus credores estrangeiros». Os invasores começaram por se apoderar das alfândegas e entregaram o Banco Nacional ao City Bank de Nova Iorque. E uma vez que já lá estavam, ficaram durante dezanove anos.
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Chama-se «o mau passo» à passagem da fronteira entre a República Dominicana e o Haiti. Talvez o nome seja um sinal de alarme: está a entrar no mundo negro, da magia negra, da bruxaria...
O vodu, a religião que os escravos trouxeram de África e que se nacionalizou no Haiti, não merece chamar-se religião. Do ponto de vista dos donos da civilização, o vodu é coisa de pretos, ignorância, atraso, superstição pura. A Igreja Católica, onde não faltam fiéis capazes de vender unhas dos santos e penas do arcanjo Gabriel, conseguiu que esta superstição fosse oficialmente proibida em 1845, 1860, 1896, 1915 e 1942, sem que o povo se desse por achado.
Mas há já alguns anos que as seitas evangélicas se encarregam da guerra contra a superstição no Haiti. Estas seitas vêm dos Estados Unidos, um país que não tem 13º andar nos seus prédios, nem fila 13 nos seus aviões, habitado por cristãos civilizados que acreditam que Deus criou o mundo numa semana. Nesse país, o pregador evangélico Pat Robertson explicou na televisão o terramoto de 2010. Este pastor de almas revelou que os negros haitianos tinham conquistado a independência à França recorrendo a uma cerimónia vodu, e invocando, do fundo da selva haitiana, a ajuda do Diabo. O Diabo, que lhes deu a liberdade, passou a factura enviando-lhes o terramoto.
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Até quando permanecerão no Haiti os soldados estrangeiros? Eles vieram para estabilizar e ajudar, mas estão há sete anos a desajudar e a desestabilizar este país que não os deseja.
A ocupação militar do Haiti custa às Nações Unidas mais de 800 milhões de dólares por ano.
Se as Nações Unidas destinassem esses fundos à cooperação técnica e à solidariedade social, o Haiti poderia receber um bom impulso para o desenvolvimento da sua energia criadora. E assim se salvariam dos seus salvadores armados, que têm alguma tendência para violar, matar e espalhar doenças fatais.
O Haiti não precisa que venham multiplicar as suas calamidades. Também não precisa da caridade de ninguém. Como diz um antigo provérbio africano, a mão que dá está sempre acima da mão que recebe.
Mas o Haiti precisa de solidariedade, de médicos, de escolas, de hospitais e de uma verdadeira colaboração que torne possível o renascimento da sua soberania alimentar, assassinada pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Mundial e por outras sociedades filantrópicas.
Para nós, latino-americanos, essa solidariedade é um dever de gratidão: seria a melhor maneira de agradecer a esta pequena grande nação que em 1804 nos abriu, com o seu contagioso exemplo, as portas da liberdade.
(Este artigo é dedicado a Guillermo Chifflet, que foi obrigado a demitir-se da Câmara de Deputados quando votou contra o envio de soldados uruguaios para o Haiti.)
Fonte: Esquerda.

Ir às ruas contra a ditadura da mídia


Por Altamiro Borges

Hoje, 18, em várias partes do mundo será comemorado o “Dia Mundial pela Democratização da Mídia”. Segundo relata Naira Rosana, no boletim eletrônico do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), a data foi instituída em 2000, em Toronto (Canadá), “como forma de protesto contra a concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucas pessoas”.

No Brasil, a data passou a ser comemorada a partir de 2003, como base numa proposta da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos). Na sequência, as entidades da sociedade civil optaram por realizar a “Semana pela Democratização da Comunicação”, com várias atividades de formação e mobilização – seminários, debates e protestos de rua.

Ato em SP e “faxina na TV Globo” no RJ

Neste ano estão previstas ações em diversas cidades para marcar a data. Em São Paulo, às 12 horas, haverá um ato na escadaria da TV Gazeta, na Avenida Paulista, organizado pela Frente Paulista pelo Direito à Comunicação e a Liberdade de Expressão (Frentex).

No Rio de Janeiro, ocorrerão dois atos. Amanhã, às 16 horas, no Buraco do Lume, com atividades culturais e políticas em defesa da regulação da mídia. E na quarta-feira, às 13 horas, ocorrerá a “faxina na TV Globo”, em frente a sua sede no Jardim Botânico.

Recrudescimento nos crimes

A realização destes protestos ganha maior relevância num momento em que a mídia hegemônica recrudesce em seus crimes. É só lembrar as três últimas atrocidades da revista Veja: a tentativa de invasão do apartamento do ex-ministro José Dirceu num hotel de Brasília; a propaganda de remédio como milagroso emagrecedor, fato já criticado pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa); e o ataque à honra do ministro Orlando Silva, do Esporte, com o uso de um “bandido”, investigado e preso, como fonte.

No caso das emissoras de TV, que são concessões públicas, os crimes são ainda mais descarados. É só lembrar recente editorial da Band destilando ódio contra os grevistas dos Correios; ou a exibição de cenas de estupro numa afiliada da Record na Paraíba; ou o merchandising em programas infantis da SBT; e até a sabotagem na TV Globo na transmissão dos jogos Pan Americanos.

Não dá mais para aceitar estas ações criminosas. A exemplo de outros países do mundo, inclusive dos EUA, é urgente a discussão e aprovação de um novo marco regulatório das comunicações no Brasil, que enfrente a crescente monopolização no setor e coíba a manipulação da informação e a deformação de valores. Do contrário, o país ficará à mercê da ditadura da mídia.

“Se eu entregasse uma receita de bolo na sessão daria o mesmo efeito”, diz prefeita cassada


"Foi uma injustiça sem tamanho o que fizeram", diz Rita Sanco | Foto: Dolcimar Luiz da Silva/SECOM/PMG

Rachel Duarte no SUL21

Nesta segunda-feira (17), o Sul21 conversou com a prefeita cassada em Gravataí, Rita Sanco (PT). Ainda inconformada com a decisão dos vereadores da oposição, ela se disse confiante na ação da justiça e no retorno à prefeitura. Para a petista, sua cassação ocorreu unicamente porque a oposição tinha maioria na Câmara, as denúncias eram infundadas e sua defesa não foi levada em consideração na sessão. “Se eu entregasse qualquer receita de bolo na sessão daria o mesmo efeito”, diz.

Sul21 – Como a senhora encara a cassação?

Rita Sanco – Entendemos como uma grande injustiça e atrocidade política o que houve. Uma vez que as denúncias são irrelevantes ou inverídicas, cabia à oposição comprovar as acusações. Nós fomos provar que não tinha fundamento os apontamentos feitos contra nossa gestão, mas a nossa defesa não interessava. Afastaram também o vice-prefeito, que normalmente não tem atividade diretamente ligada à do prefeito. Isto foi para poder tomar a prefeitura. Pelo menos espero que seja apenas este o interesse que está por trás desta atitude. São pessoas que não têm como entrar na prefeitura pela porta da frente, nas eleições, então, entram pela porta de trás. Isto foi uma peça jurídica imprestável. Vamos retomar o mandato.

Sul21 – O que a senhora acredita que estaria movendo uma atitude combinada entre os vereadores de oposição ao seu governo?

Rita Sanco – Eu espero que seja apenas uma disputa política.

Sul21 – Mas que outros interesses seriam?

Rita Sanco – Espero que não tenham outros interesses por trás e que não podem ser divulgados.

Sul21 – Qual será o argumento para recorrer da decisão dos vereadores na justiça?

Rita Sanco - Os advogados estão analisando as medidas e vão entrar com ações para rever esta decisão. Eu acredito na justiça porque não têm fundamento estas acusações. Fazer uma cassação de mandato eleito pelo povo só porque se tem maioria conduz a uma lógica de disputar sempre pela maioria legislativa a qualquer preço. Isto seria fazer acordos a qualquer custo na política. Isto é um risco para a democracia. Este decreto é sem consistência. A peça acusatória baseia-se em decreto da ditadura militar, feito por Castello Branco e, mesmo assim, não apresenta uma prova, uma evidência sequer de qualquer ato de corrupção no meu governo.

Sul 21 – A senhora tem recebido apoio?

Rita Sanco - Estamos visitando as entidades e escolas. Informando as pessoas. Os funcionários públicos estão perplexos. Andei muito nas ruas não há quem defenda isso que aconteceu. É realmente um movimento de 10 vereadores que afeta toda uma cidade.

Sul21 – A proximidade com as eleições influenciou diretamente a ação da oposição?

Rita Sanco – É um ano onde muitas coisas estavam para acontecer. Nós íamos anunciar a construção de 14 creches, 5 unidades de saúde e uma Unidade de Pronto Atendimento. Também está prevista a liberação de recursos para pavimentações.

Sul21 – A senhora respondeu a 11 acusações de irregularidades na sua administração. Como foi a sua defesa?

Rita Sanco – Um dos principais apontamentos dos 11 itens contra mim se tratava de várias ações que fiz para negociação da dívida municipal. Tudo que fiz foi com aprovação da Câmara de Vereadores. No caso da acusação do procurador geral, ele não fazia advocacia privada junto ao seu mandato de procurador. Os documentos que acusavam irregularidades na licitação do Hospital Regional que seria construído são infundados. Mas a defesa não interessava para eles. Se eu entregasse qualquer receita de bolo na sessão daria o mesmo efeito.

Sul21 – A senhora imagina conseguir reverter o que a senhora considera injustiça?

Rita Sanco - Temos 30% de aprovação na população. O deputado Daniel Bordignon (PT) tem uma popularidade imbatível. Eles não ganham eleição, por isso tiveram que apelar. Mas sei que a população não quer voltar à estagnação que foi no governo deste grupo. Estávamos equilibrando as finanças e democratizando a gestão. Foi uma injustiça sem tamanho o que fizeram. Uma violência para com a população de Gravataí que o optou pela nossa gestão na eleição. Se fosse vontade do povo, as pessoas poderiam mudar nas urnas e não o fizeram há 14 anos. No meu governo não teve denúncia de desvio de dinheiro ou mesmo uso da máquina. Tudo que até agora foi movido contra mim foi arquivado sem provas. Não tenho uma representação do Ministério Público contra mim. Nenhuma ação correndo na justiça. Criaram peça jurídica contra mim e vamos reverter.