segunda-feira, 10 de março de 2008

Tim Maia & os cariocas - amigo do rei


Créditos:SomBarato


1.Ter Você É Ter Razão
2.Essa Tal Felicidade
3.Ela É Carioca
4.Lindeza
5.Amigo Do Rei
6.Não Quero Dinheiro, Só Quero Amar
7.Telefone
8.Samba Do Avião
9.Azul Da Cor Do Mar
10.Valsa De Uma Cidade

*contribuição de Paulo Eduardo

"Mate 100 turcos, e descanse…"

Uri Avnery**

Lembrei-me, esta semana, daquela velha história de uma mãe judia, separando-se do filho convocado para servir o exército do czar contra os turcos.

“Não exija demais de você mesmo”, aconselhava ela ao filho. “Mate um turco, e descanse. Mate outro turco, e descanse outra vez…”

“Mas, mamãe”, diz o filho, “E se o turco me matar?”

“Matar você?”, ela grita, indignada. “Por quê? Que mal você fez a ele?!”

Não é piada (e esta não é semana para piadas). Aí está uma lição de psicologia. Lembrei-me dela, ao ler que Ehud Olmert declarou que o que mais o enfureceu foi a explosão de alegria em Gaza, depois do ataque em Jerusalém, no qual foram mortos oito estudantes yeshiva.

Antes disto, semana passada, o exército de Israel matara 120 palestinos na Faixa de Gaza, metade dos quais civis, além de dúzias de crianças. Não foi “mate um turco, e descanse”. Foi “mate 120 turcos, e descanse”. Isto, Olmert não entende.

A GUERRA DOS CINCO DIAS em Gaza (como disse o líder do Hamás) foi mais um curto capítulo da luta entre israelenses e palestinos. Este monstro sanguinário nunca está satisfeito. Quanto mais come, mais sente fome.

Este capítulo começou com o “assassinato seletivo” de cinco altos militantes, dentro da Faixa de Gaza. A “resposta” foi uma chuva de foguetes e, desta vez, não só sobre Sderot, mas também sobre Ashkelon e Netivot. A “resposta” à “resposta” foi a incursão pelo exército de Israel e a matança.

O objetivo declarado foi, como sempre, fazer parar os foguetes. O meio: matar o maior número possível de palestinos, para dar-lhes uma lição. A decisão baseou-se num tradicional conceito vigente entre os israelenses: mate civis, mate e mate, até que os líderes caiam. Cem vezes Israel já tentou esta “solução”; cem vezes fracassou.

Como se faltasse algum exemplo da loucura dos que divulgam este conceito, lá estava, na televisão, o ex-general Matan Vilnai, para “declarar” que os palestinos “trazem a Shoah para eles mesmos”.

A palavra Shoah, em hebraico, só significa uma coisa, em todo o mundo, e só uma: é o holocausto dos judeus, pelos nazistas. A fala de Vilnai incendiou o mundo árabe e provocou uma onda de choque. Também eu recebi dúzias de telefonemas e mensagens de e-mail, de todo o mundo. Como convencer as pessoas de que, no hebraico coloquial, na fala diária, Shoah significa “apenas” uma catástrofe, um grande desastre, e que o General Vilnai, que já foi candidato a presidente, nunca foi o mais inteligente dos homens?

Há alguns anos, o presidente Bush convocou uma “Cruzada” contra o terrorismo. Não sabia que, para centenas de milhões de árabes, a palavra “cruzada” evoca um dos maiores crimes jamais perpetrados na história humana, o horrendo massacre de muçulmanos (e judeus) pelos primeiros “cruzados”, nas vielas de Jerusalém. Um concurso de inteligência, entre Bush e Vilnai, provavelmente, acabaria empatado.

VILNAI NÃO ENTENDE o que significa a palavra “Shoah”, para os diferentes dele; e Olmert não entende por que houve júbilo em Gaza depois do ataque à escola yeshiva, em Jerusalém. Sábios como estes dois dirigem o Estado, o governo e o exército. Sábios como estes dois controlam a opinião pública, porque controlam a mídia. O que há de comum entre todos estes sábios: a mesma insensibilidade, a mesma cegueira, que os impede de ver o que sentem os não-judeus, os não-israelenses. Desta cegueira nasce a incapacidade para entender a psicologia do outro lado; e, depois, tampouco entendem as conseqüências de suas palavras e atos.

A mesma cegueira explica a incapacidade para entender por que o Hamás declarou-se vitorioso na Guerra dos Cinco Dias. Que vitória? Feitas as contas, morreram só dois soldados e um civil israelenses, e foram mortos 120 palestinos, combatentes e civis.

Mas a batalha travou-se entre um dos mais poderosos exércitos do mundo, equipado com o armamento mais moderno que há no planeta, contra umas poucas centenas de combatentes de milícias, com armamento primitivo. A retirada – e este tipo de combate sempre termina em retirada – sempre é uma vitória para o lado mais fraco. Aconteceu na Segunda Guerra do Líbano e aconteceu na Guerra de Gaza.

(Binyamin Netanyahu é autor de uma das “declarações” mais estúpidas da semana; exigiu que o exército de Israel “esqueça os movimentos de atrito e decida o combate”. Numa luta como esta, não há como decidir coisa alguma.)

O resultado real deste tipo de operação não se manifesta em números, em quantidades: tantos mortos, tantos feridos, tais e tais prédios destruídos. O resultado, aí, só tem expressão psicológica, resultados que não podem ser medidos e, portanto, são incompreensíveis para cabeças de generais: quanto ódio acrescentou-se ao ódio existente, quantos novos homens-bomba surgiram, quantos mais juraram vingança e converteram-se em bombas vivas – como o jovem de Jerusalém que acordou uma manhã, esta semana, arranjou uma arma, andou até a escola Mercaz Harav yeshiva, aquele ninho de onde nascem todas as colônias e “assentamentos”, e matou a maior quantidade de israelenses que conseguiu matar.

Agora, as lideranças políticas e militares de Israel reúnem-se para discutir o que fazer, como “responder”. Não tiveram nem terão qualquer idéia nova, porque políticos e generais são incompetentes para gerar idéias novas. Só sabem repetir as idéias de sempre, o que já fizeram centenas de vezes, e fracassaram centenas de vezes e fracassarão sempre.

O PRIMEIRO PASSO para sair deste círculo de loucura é começar a questionar os conceitos e métodos que Israel tem usado nos últimos 60 anos. E recomeçar a pensar, do começo, desde o início.

Isto sempre é muito difícil. E é ainda mais difícil para Israel, porque as lideranças em Israel não têm liberdade para pensar – o pensamento, em Israel, está sempre amarrado ao que pensem os líderes norte-americanos.

Esta semana, foi publicado um documento chocante: o artigo de David Rose em Vanity Fair. Ali está contado como, nos últimos anos, funcionários dos EUA têm ditado cada passo de lideranças palestinas, nos mínimos detalhes. Embora o artigo não toque nas relações EUA-Israel (uma omissão que, de fato, é surpreendente) sabe-se, mesmo que não se leia, que a ação norte-americana, nos mínimos detalhes, é coordenada com o governo de Israel.

Por que chocante? Em termos gerais, não há novidades, no artigo: (a) os norte-americanos mandaram que Mahmoud Abbas mantivesse as eleições parlamentares, para que Bush aparecesse como aquele que levou a democracia ao Oriente Médio. (b) O Hamás foi eleito – o que não se esperava que acontecesse. (c) Os americanos impuseram um boicote aos palestinos, para ‘desconstruir’ o resultado das eleições. (d) Abbas afastou-se um passo da política que lhe foi ordenada, sob auspícios (e pressão) da Arábia Saudita; e fez um acordo como o Hamás. (e) Os americanos cortaram-lhe as asas e obrigaram Abbas a entregar todos os serviços de segurança a Muhammad Dahlan, escolhido pelos norte-americanos para o papel de homem-forte na Palestina. (f) Os americanos deram armas e dinheiro a Dahlan, treinaram seus homens e ordenaram que criasse um golpe militar contra o Hamás na Faixa de Gaza. (g) O governo eleito do Hamás abortou o movimento e respondeu, o próprio Hamás, com um contra-golpe armado.

Até aí não há novidades. Tudo isto já era sabido. A novidade é que esta mistura de noticiário, boatos e apostas inteligentes apareça condensada em relatório bem-informado, formulado a partir de documentos oficiais dos EUA. É prova da abissal ignorância dos EUA, só comparável à abissal ignorância de Israel, quanto aos processos internos da Palestina.

George Bush, Condoleezza Rice, o neoconservador sionista Elliott Abrams e os generais norte-americanos, que nada sabem sobre coisa alguma, competem com Ehud Olmert, Tzipi Livni, Ehud Barak e com os generais israelenses, que sabem, sobre a Palestina, o que caiba do fundo à ponta dos canhões de seus tanques.

Os norte-americanos, enquanto isto, já destruíram Dahlan porque o expuseram como seu agente, na linha do “é um filho-de-puta, mas é o nosso filho-de-puta”. Esta semana, além do mais, Condoleezza detonou um golpe mortal contra Abbas. Ele anunciou, de manhã cedo, que estava suspendendo as negociações (tempo perdido) de paz com Israel – o mínimo que podia fazer, depois das atrocidades que o exército de Israel cometeu em Gaza. Rice, que soube disto quando tomava café da manhã na estimulante companhia de Livni, imediatamente convocou Abbas e ordenou que desdissesse o que acabava de dizer. Abbas obedeceu e expôs-se, ele mesmo, nu em pêlo, ao seu próprio povo.


A LÓGICA não foi dada ao povo de Israel no Monte Sinai. Mas, sim, foi dada no Monte Olimpo, aos antigos gregos. Apesar desta dificuldade local, tentemos aplicar aqui, alguma lógica.

O que o governo de Israel está tentando conseguir, em Gaza? Quer derrubar o Hamás (e, marginalmente, também quer que parem os foguetes e morteiros contra Israel).

Israel já tentou obter o que quer mediante um bloqueio total contra a população palestina, na esperança de que, assim, a população levantar-se-ia contra o Hamás. O plano falhou. O “plano B” seria reocupar toda a Faixa de Gaza. Mas isto custará um alto preço em vidas de soldados, preço mais alto, talvez, do que a opinião pública em Israel está disposta a pagar. Além disto, de nada adiantará, porque o Hamás reaparecerá no momento em que as tropas de Israel se retirarem. (Mao Tse Tung ensinava, como primeira lição na guerra de guerrilhas: “Se o inimigo avança, retrocede. Se o inimigo retrocede, avança.")

O único resultado da Guerra dos Cinco Dias foi o fortalecimento do Hamás e o aumento do apoio que recebe do povo palestino – não só na Faixa de Gaza, mas na Cisjordânia e também em Jerusalém. O Hamás tinha, sim, o que celebrar, naquela festa da vitória. Os foguetes não pararam. E aumentaram a capacidade de fogo e o alcance.

Mas suponhamos que a política de Israel tivesse dado certo e que o Hamás tivesse sido derrotado. E daí? Abbas e Dahlan não podem voltar sobre a cabine dos tanques israelenses como sublocatários da ocupação. Nenhuma empresa de seguros de vida os aceitará como segurados. E, se não voltarem, será o caos, do qual emergirão forças tão extremistas que, hoje, ainda nem as podemos imaginar.

Conclusão: o Hamás está lá. Não pode ser ignorado. Temos de construir um cessar-fogo com o Hamás. Não a partir de uma oferta ridícula, do tipo “se eles pararem primeiro, nós paramos depois”. Cessar-fogo, como o tango, precisa de dois. É preciso que haja um acordo prévio e detalhado que inclua a cessação de todas as hostilidades, armadas e outras, em todos os territórios.

Nenhum cessar-fogo será efetivo se não houver negociações, conversações, que têm de começar logo, e que levem a um armistício de longo prazo (a “hudna”) e à paz. Estas negociações não podem acontecer com o Fatah, e sem o Hamás; nem com o Hamás, e sem o Fatah. Portanto, é preciso que se construa um governo palestino em que se reúnam os dois movimentos. É preciso convocar personalidades que gozam da confiança de todo o povo palestino; Marwan Barghouti, por exemplo.

Não há uma única voz, nem entre as lideranças em Israel nem entre as lideranças nos EUA que se atreva a declará-lo abertamente. Mas esta política é precisamente o avesso, o contrário, da política em curso, pensada por EUA-Israel, e que proíbe até que Abbas converse com o Hamás. Portanto, continuaremos a ver o que temos visto.

Mataremos 100 turcos, e descansaremos. E, vez ou outra, algum turco nos matará, alguns de nós.

Por quê, pelo amor de deus?! Que mal Israel fez a eles?!


**Uri Avnery,85 anos, é membro fundador do Gush Shalom (Bloco da Paz israelense). Adolescente, Avnery foi combatente no Irgun e mais tarde soldado no exército israelita. Foi três vezes deputado no Knesset (parlamento). Foi o primeiro israelense a estabelecer contato com a liderança da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 1974. Foi durante quarenta anos editor-chefe da revista noticiosa Ha'olam Haze. É autor de numerosos livros sobre a ocupação israelense da Palestina, incluindo My Friend, the Enemy (Meu amigo, o inimigo) e Two People, Two States (Dois povos, dois Estados).


* URI AVNERY, 8/3/2008, "Kill a hundred Turks and rest…", na página de Gush Shalom [Grupo da Paz], em http://zope.gush-shalom.org/home/en/channels/avnery/1205012429/

Brasil, 1968 (2): o assalto ao Céu, a descida ao Inferno

Mário Maestri - CorreioDaCidadania




A cultura é do povo



A explosão de criatividade invadiu as artes, sobretudo a música, o teatro, o cinema, a produção editorial nacionais. Uma estética radical de raízes tupiniquins garantia momentos de glória ao cinema nacional. Nélson Pereira dos Santos filmara o clássico "Vidas Secas", em 1963, e Anselmo Duarte conquistara Cannes com o "Pagador de Promessas", de 1962. O quase menino Glauber Rocha dirigira "Terra em Transe", em 1967, e concluiria, em 1969, "O dragão da maldade contra o santo guerreiro". Filmaria a grande mobilização carioca de 1968 para projeto cinematográfico jamais concretizado. Bertolt Brecht era uma constante nos teatros nacionais com "Os fuzis da senhora Carrar", "Galileu Galilei", "A ópera dos três vinténs", "Mãe coragem e seus filhos". A dramaturgia nacional plantava raízes próprias com "Liberdade, liberdade" e "Arena conta Zumbi", de 1965; "Arena conta Tiradentes", de 1967; e com encenações explosivas como "Roda-viva", de 1968, objeto de ataques de grupos paramilitares direitistas.



Em um país de poucos leitores, com a televisão ainda engatinhando, o combate cultural enfuriava quando se tratava da música popular. Apenas parcialmente inconscientes do papel que cumpriam, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Vanderléia e a turma da "Jovem Guarda" pregavam a despolitização e só pediam "que você me aqueça nesse inverno e que tudo mais vá para o inferno". A esquerda dominava totalmente o campo, com uma seleção que só aceitava craques: Caetano, Chico, Elis Regina, Jair Rodrigues, Gilberto Gil, Geraldo Vandré, Vinícius de Morais etc. Quando dos festivais da canção, a disputa politizada transformava-se em uma quase batalha campal.



Através da música, debatiam-se os projetos para o futuro do país. Em uma época sem cerimônias, iconoclasta, o público levantava-se contra os monstros sagrados que construía caso ousassem sair da linha, ou do que se pensava que fosse a linha. Em 28 de março de 1968, três dias antes do quarto aniversário do golpe, as polícias militares do Exército e da Aeronáutica invadem o restaurante do Calabouço, no Rio de Janeiro, e disparam à queima-roupa contra os estudantes, matando Édison Luís de Lima Souto, de 18 anos. No dia seguinte, sexta-feira, a antiga capital da República pára para que sessenta mil populares acompanhem a despedida ao secundarista. A resposta é violenta. Por diversos dias, a cidade tornou-se campo de acirrada batalha. De um lado, estudantes e populares. Do outro, polícia e exército. Universitários, secundaristas e populares são mortos. Ao deslocarem-se pelas ruas do Centro, os soldados protegem-se debaixo das marquises dos objetos atirados desde os edifícios. Um policial militar, a cavalo, morre ao receber na cabeça um pesado balde, ainda carregando cimento fresco, lançado desde um edifício em construção.



Cem mil contra a ditadura



A agitação estudantil alastra-se pelo Brasil, com manifestações nas principais capitais. Na quarta-feira, 26 de junho, o movimento alcança seu ápice. No Rio de Janeiro, cem mil manifestantes concentram-se na Cinelândia e desfilam pelo Centro, em uma demonstração permitida pelo governo. Cinqüenta mil pessoas protestam nas ruas de Recife. As grandes manifestações alcançam efeito inesperado. Dias mais tarde, uma comissão da "Passeata dos Cem Mil", do Rio de Janeiro, é recebida em Brasília pelo ditador Costa e Silva. Entre os membros da delegação, encontra-se um representante da UNE, entidade colocada na ilegalidade imediatamente após o golpe. Entretanto, o encontro não tem conseqüências.



A mobilização operária levara a oposição sindical a planejar um amplo movimento grevista para o fim do ano, quando da data-base de importantes categorias. A explosão das manifestações de junho aceleraria a greve. Em 16 de julho, José Ibrahim, presidente do sindicato dos metalúrgicos de Osasco, de 20 anos, ligado à organização militarista VPR, põe-se à frente de uma paralisação da COBRASMA, com ocupação da empresa e aprisionamento dos funcionários graduados, à qual aderem dez mil trabalhadores de outras indústrias. O movimento exige reajuste de 35%, reposição salarial cada três meses e outras reivindicações. A ditadura militar responde violentamente. Centenas de trabalhadores são presos e despedidos. A COBRASMA é invadida. José Ibrahim mergulhou na clandestinidade, de onde partiria mais tarde para o Chile e a seguir para a Bélgica. Zequinha, dirigente operário da COBRASMA, é preso e torturado. Após cinco dias, a greve quebrava-se. Uma segunda paralisação, em Contagem (MG), em outubro, é reprimida com facilidade. A greve geral do fim do ano jamais seria tentada.



No país, decresce a mobilização. Em 12 de outubro, o movimento estudantil, espinha dorsal da oposição, recebe forte golpe. Subestimando a repressão, a direção da UNE reúne, para seu 30° Congresso em um sítio em Ibiúna, cidadezinha do interior de São Paulo, milhares de delegados de todo o país. A prisão dos participantes permite a detenção das direções e o mapeamento das lideranças estudantis do norte ao sul da nação. No mesmo dia em que caía o congresso de Ibiúna, era varado pelas balas de um comando militar da VPR, diante de sua residência em São Paulo, o capitão estadunidense Charles Chandler, funcionário da CIA, ‘estudando’ Sociologia no Brasil.



Os dois acontecimentos ilustravam a orientação que viveria a resistência nos anos seguintes. Ações armadas de grupos de corajosos jovens militantes, isolados socialmente, pretendendo substituir o movimento de massas em refluxo. Em 2 de outubro, na capital mexicana, na Praça das Três Culturas, de duzentos a trezentos estudantes e populares foram massacrados pelo exército e policiais durante concentração, dez dias antes do início dos Jogos Olímpicos, que se realizaram sem quaisquer pruridos morais.



Sobretudo de 1969 a 1973, organizações de esquerda militaristas, inspiradas no foquismo guevarista, lançariam ações espetaculares - assaltos a bancos, seqüestros de embaixadores e de aviões, execuções de torturadores, guerrilhas rurais etc. - sem que os trabalhadores urbanos e rurais aderissem à proposta de luta armada imediata, milhões de anos-luz longe de suas consciências, necessidades e capacidade de organização na época. Isoladas, as organizações seriam dizimadas, uma após a outra, pela repressão, que se estenderia igualmente aos militantes voltados para a organização dos trabalhadores e classes populares. Por esses anos, automóveis da nova classe média ascendente invadiam as ruas, portando o autocolante "Brasil: ame-o ou deixe-o", distribuído pela repressão, simples tradução da consigna direitista estadunidense "America love it or leave it".



Para ler o primeiro artigo da série, clique aqui. Ou acesse via http://www.correiocidadania.com.br/content/view/1497/47/



Mário Maestri édoutor em História pela UCL, Bélgica. É professor do curso e do programa de pós-Graduação em História da UPF. Esteve preso, em 1968, quando estudante, e viveu, como refugiado, no Chile e na Bélgica, de 1971 a 1977. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email