quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Fórum de Mídia Livre articula lutas nas redes e nas ruas


Debates realizados em Porto Alegre apontaram para uma grande mobilização comum em torno desta agenda no mês de maio. Terceira edição do FML reafirmou a comunicação como direito e a importância de políticas públicas e da apropriação tecnológica pelos cidadãos para efetivá-lo. Em junho, durante a Cúpula dos Povos na Rio+20, acontecerá o II Fórum Mundial de Mídia Livre.

Porto Alegre - A agenda das lutas em torno da comunicação tem crescido significativamente no Brasil desde 2008, quando aconteceu, no Rio de Janeiro, o I Fórum de Mídia Livre (FML). De lá pra cá, inúmeros coletivos, iniciativas e redes, principalmente na internet, surgiram em torno da defesa e da prática do midialivrismo; ao mesmo tempo em que as reivindicações por transformações na estrutura do sistema midiático brasileiro também avançaram, sobretudo com o impulso de diferentes movimentos sociais na I Conferência Nacional de Comunicação, em 2009. Aproximar essas duas frentes de luta foi um dos desafios do III FML, que aconteceu em Porto Alegre, no bojo do processo do Fórum Social Temático. A percepção ao longo de dois dias de debates foi comum: era preciso ir além das reivindicações e construir ações em conjunto para, de fato, consolidar esses laços.

Foi aprovado um calendário de mobilizações nas redes e nas ruas, tendo o mês de maio como central. No dia 12, em vários países, um ano depois de terem ocupado as praças da Europa, os movimentos ligados à bandeira da “Democracia Real Já” voltarão às ruas. Inspirados na articulação online/offline desses coletivos, organizações que participam do movimento midialivrista no Brasil pretendem usar a data – ou um dia próximo a ela – para defender transformações na comunicação brasileira. 

“Na Espanha havia uma grande manifestação na internet. Nossa estratégica coletiva foi usar todos os meios de comunicação para colocar o debate na rua. Fazer a transmissão das reuniões que aconteciam, por exemplo, foi fundamental para as pessoas se envolverem de fato. E tentamos mobilizar não só os movimentos sociais, mas a sociedade como um todo”, contou Javier Toret, do movimento 15M. “O próprio streaming das ocupações se transformou numa forma de defender o caráter pacífico do movimento e o direito de estarmos nas ruas”, relatou.

“A politização desse debate passa por um trabalho que está se desenvolvendo no online e que tem resultado nas ruas. Precisamos ampliar os debates de âmbito mais macro da democratização da comunicação, e o campo do online é uma possibilidade para fazer essa tradução, ajudar a luta a tomar corpo e ganhar as ruas”, acrescentou Vitor Guerra, do Fora do Eixo.

Aqui como lá, a crença é a de que, sozinhos, os meios livres, populares e alternativos não terão força suficiente para mudar o cenário midiático. “É fundamental então abrir um diálogo entre o que são as experiências históricas de redes de meios; as novas expressões de comunicação – sobretudo as digitais; os movimentos sociais e as novas experiências de luta e resistência social. Porque sem isso será muito difícil mudar o sistema de comunicação concentrado e monopólico”, avaliou Sally Burch, da Agência Latinoamericana de Informação (ALAI). 

Para Ivana Bentes, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e do Pontão de Cultura da ECO/UFRJ, é fundamental que os movimentos brasileiros superem a discussão da mídia apenas como ferramenta e pensem na potência mobilizadora e de organização política da comunicação. “É preciso pensar mídia como estruturante do capitalismo cognitivo. A comunicação hoje serve de luta e é vital para mudar a visibilidade de todas as lutas das comunidades”, disse. 

Políticas públicas e apropriação tecnológica

Partindo da defesa da comunicação como um direito, o III FML foi mais um espaço de afirmação e cobrança do papel do Estado brasileiro para sua garantia. Neste sentido, uma das bandeiras centrais dos movimentos para este ano segue sendo a luta pela universalização do acesso à banda larga de qualidade no país, com a construção de pontos populares de livre acesso e formação para os cidadãos e cidadãs e a oferta de infraestrutura em todas as regiões do país.

Os participantes do Fórum também cobraram a retomada pelo governo federal da política dos Pontos de Mídia Livre, cuja idéia nasceu nos primeiros debates do FML. O programa, assumido e antes coordenado pelo Ministério da Cultura, foi descontinuado no governo Dilma. “Devemos resgatar essa proposta, porque este é um projeto estratégico, que distribui recursos na ponta. Muitos grupos aumentaram sua capacidade de produção, construindo outro patamar de políticas públicas nesta área”, lembrou Renato Rovai, da Revista Fórum. 

Ao mesmo tempo, acreditam, é preciso barrar iniciativas de cerceamento das liberdades na internet, como o projeto do então senador Eduardo Azeredo, batizado de “AI-5 Digital”, que tramita no Congresso. Ameaças da mesma sorte pipocam mundo afora, como o SOPA (Stop Online Piracy Act) e o PIPA (Protect IP Act), em discussão no Congresso dos Estados Unidos. Os projetos, que cerceiam o livre compartilhamento de conhecimento e cultura na rede, foram alvo de protestos no Fórum de Mídia Livre, explicitando que esta é uma luta que se delineia a partir de questões globais.

“É uma luta transnacional, que passa pelo cenário brasileiro – onde a Oi, por exemplo, quer desconstruir os parâmetros de qualidade para a internet aprovados pela Anatel –, mas que também requer que olhemos para o que acontece nos outros país. Temos que combinar estratégias de afirmação de políticas públicas e de regulação que garantam liberdade de expressão com o combate a outras leis e políticas que restrinjam essa liberdade”, explicou João Brant, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. 

Neste sentido, foi dado em Porto Alegre o pontapé inicial para a construção internacional de protocolos livres para as redes sociais, cada vez mais centrais para articuluções e mobilizações contra hegemônicas em todo o mundo, mas ainda sob o controle de corporações privadas como a Google e a Microsoft. A idéia em torno da construção desses protocolos é pactuar política e tecnologicamente, entre movimentos e ativistas digitais, as ações, métodos, tecnologias e semânticas que possibilitem construir essas redes de forma livre e autônoma. Na mesma toada, foi reforçada a importância do uso de tecnologias livres - portanto, não proprietárias - pelas prórpias mídias livres.

O III Fórum de Mídia Livre ainda apontou para o fortalecimento da luta por um novo marco regulatório das comunicações no país, que garanta o acesso, a pluralidade e o financiamento das mídias livres. “A política pública tem que ser um processo que fortaleça os atores sociais. Mas garantir a comunicação como política pública requer vontade política e mobilização. Isso ainda é incipiente no Brasil”, avaliou Rosane Bertotti, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). 

Nos próximos meses, em diálogo com os mais diferentes movimentos e iniciativas, o FNDC deve lançar uma grande campanha por um novo marco regulatório das comunicações no Brasil. “O debate que une os defensores do midialivrismo e da democratização da mídia não é um debate corporativo, mas uma luta feita por todos que querem mudanças na comunicação brasileira”, acrescentou Rita Freire, da Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada.

Mídia livre na Rio+20

Respondendo a dois desafios da conjuntura - unir a luta das redes com a das ruas e articular internacionalmente o enfrentamento às ameaças da mídia livre - o III FML terminou com um grande chamado à construção do II Fórum Mundial de Mídia Livre (FMML). O encontro acontece entre os dias 16 e 18 de junho, como parte das atividades da Cúpula dos Povos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, evento da sociedade civil paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável.

A proposta do II FMML nasceu no Fórum Social Mundial 2011 em Dakar, no Senegal, e ganhou seu grupo organizador local agora em Porto Alegre. Participarão da mobilização local no Brasil entidades como Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária), Amarc (Associação Mundial de Rádios Comunitárias), Ciranda, Intervozes, Fora do Eixo, Pontão de Cultura da ECO/UFRJ e Revista Fórum. Internacionalmente, participam do processo entidades como a Cáritas, a WSFTV - portal de memória audiovisual do Fórum Social Mundial - e E-joussour, uma agência de notícias colaborativa do norte da África, que está à frente da organização de um Fórum de Mídia Livre naquela região. Midialivristas do Marrocos e da Palestina estiveram em Porto Alegre no III FML, ampliando a articulação com os ativistas do país que receberá em junho o Fórum Mundial de Mídia Livre. 

Depois do sul, o Rio de Janeiro deve ser o novo palco de mais uma batalha internacional em defesa da comunicação como um direito e também um bem comum. As organizações prometem muita discussão política, mas também muita ação, nas redes e nas ruas.



Fotos: Bia Barbosa 

Presidenta Dilma concede entrevista coletiva em Havana

Governo mexicano ratifica compromisso com grandes corporações e ameaça soberania alimentar



Natasha Pitts
Jornalista da Adital

A Campanha Nacional Sin Maíz No Hay País denuncia em seu site que novamente durante o Fórum Econômico Mundial, realizado de 25 a 30 de janeiro, em Davos, Suíça, o Governo mexicano de Felipe Calderón reiterou seu compromisso com as grandes corporações e com seus aliados nacionais, que o levaram ao poder, para continuar facilitando-lhes "o crescimento sustentável dos negócios agrícolas no México”.
Criticam que a presença de Francisco Javier Mayorga, secretário da Agricultura, longe de preocupar-se com a fome que cresce e ameaça o México, foi à Suíça para firmar compromisso – que beneficiará o próximo governo – com as empresas conhecidas por causar boa parte da crise de alimentos e climática.
Nestlé, Coca Cola, Pepsi, Monsanto, Wal-Mart e Unilever são as principais corporações culpadas por acumular a produção de alimentos, desde as sementes até a distribuição. Sin Maíz No Hay País afirma que estas são também as marcas culpadas por provocar a má alimentação e a obesidade.
Além destas, as empresas nacionais também têm sua participação. As 10 irmãs do campo mexicano: Bimbo, Maseca, Grupo Sigma, Bachoco, Su Karne, Herdez, Lala, Criadores de Gado Produtores de Leite Puro, Grupo Modelo e FEMSA (companhia líder de bebidas e a maior da América Latina) "controlam, acumulam, comercializam, revendem e obtêm ganâncias milionárias com os alimentos de consumo geral. Não é só isso: informação oficial revela que recebem anualmente milionários subsídios do governo federal. Quantidades muito longes do que se dá aos campesinos e organizações agropecuárias do México”, denunciam.
Em Davos, Mayorga se referiu a estas empresas falando de "originalidade”, mas a Campanha Nacional Sin Maíz No Hay País rebate e recorda que nos últimos 25 anos este modelo de produção e acúmulo criou o pior cenário que os mexicanos enfrentaram. Além do crescimento da fome, México está em primeiro lugar nas cifras de obesidade infantil.
Apontam que o governo mexicano está longe de atender queles que mantiveram a base alimentar do país, quem segue aportando boa parte dos alimentos consumidos ainda sem contar com subsídios, aqueles que foram condenados a migrar em busca de oportunidade e quem, apesar de tudo, segue mandando suas remessas.
"Hoje é urgente atender a situação nacional de falta de alimentos e não serão estes comerciantes de nossa fome quem atenderão a gravidade da situação. Não será na Suíça onde se resolverá esta situação; urgem medidas imediatas que se tomem de comum acordo com quem segue alimentando e mantendo com orgulho o campo mexicano”, apelam.

Estudo do Ipea analisa situação social do Rio Grande do Sul


Marcio Pochmann apresentou relatório na Fundação de Economia e Estatística (FEE) em Porto Alegre | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Vivian Virissimo no SUL21
O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann apresentou na tarde desta terça-feira (31), na Fundação de Economia e Estatística (FEE), em Porto Alegre, o relatório Situação Social: o caso do Rio Grande do Sul. Os números fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD/IBGE), com período de referência de 2001 a 2009.
“Não são informações inéditas, mas a nossa intenção ao apresentar os dados por estado e também por município é contribuir com uma visão mais holística para romper com o ciclo de aprofundamento e manutenção do quadro de desigualdade e para elevar o padrão de forma mais homogênea no país”, afirmou Pochmann. A pesquisa aborda áreas de interesse das políticas sociais: demografia, previdência social, pobreza e desigualdade, saúde, seguridade, trabalho e renda, educação, cultura, saneamento e habitação.
Esmiuçando os dados de cada área e comparando com o panorama nacional e regional, Pochmann destacou quatro aspectos relevantes para compreender as mudanças ocorridas na primeira década do século no Rio Grande do Sul. O primeiro deles colocou a diminuição da taxa de fecundidade como um dos principais fatores que irão alterar a elaboração de políticas públicas. “Teremos uma mudança demográfica de grande magnitude. Num cenário de falta de crianças será mais importante financiar transporte escolar de qualidade do que construir mais escolas”, exemplificou.
Clique na imagem para ampliar | Foto: Reprodução
O segundo ponto analisado por Porchmann indica que a taxa de crescimento da renda não gerou impacto apenas na redução dos índices de pobreza, mas principalmente nos padrões que medem a desigualdade social. Este crescimento na renda foi detectado sobretudo no meio rural. “Os dados mostram uma profunda transformações do perfil da população do campo. No Rio Grande do Sul, as desigualdades de renda média diminuíram um pouco, uma vez que a renda domiciliar  per capita na zona rural teve crescimento de 68,3%, superior ao observado na urbana (18,3%), passando de R$ 332,8 em 2001 para R$ 560,0 em 2009”, disse
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Pochmann também ressaltou as estatísticas do Rio Grande do Sul que apontam uma quase universalização nos serviços de saneamento básico, água e energia, tanto no campo quanto na cidade como fatores relevantes para compreender o cenário atual. “O aumento foi particularmente considerável no contexto rural, cuja cobertura de água encanada cresce de 88,2% para 95,8%, superando a população urbana. Com relação à energia elétrica, o Rio Grande do Sul encontra-se em melhor situação do que a média brasileira. Este serviço está praticamente universalizado, inclusive na área rural do estado, onde 98,9% da população estavam cobertas”.
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O quarto ponto destacado pelo pesquisador é o crescimento da taxa de homicídios masculina no Estado, na contramão do que ocorre no Brasil. “A violência no Rio Grande do Sul não é tão explosiva quanto em estados como Pernambuco e Espírito Santo, mas cresceu está acima da média nacional. No caso do Brasil, a taxa caiu de 101,4 em 2001 para 94,3 em 2007, um decréscimo de 7%. O Rio Grande do Sul apresentou aumento de 20,5% nesse indicador,contra 41,8% da região como um todo”, indicou. De acordo com o pesquisador, de cada 100 homicídios no Rio Grande do Sul, 5 ocorrem por motivos ligados ao crime, 15 pela polícia e 80 são mortes que resultam das relações sociais. “Violência não pode ser tratada apenas como um problema de caráter, de detenção. Talvez a repressão pouco possa ajudar nesses casos”, comentou.
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Na ocasião o presidente do IPEA e o presidente da FEE, Adalmir Marquetti assinaram um acordo de cooperação técnica para estimular pesquisa aplicada no Rio Grande do Sul. “O IPEA presta informações para o Executivo, Legislativo e Judiciário. Agora queremos produzir conhecimentos para assessorar entidades da sociedade civil e a parceria com a FEE poderá fazer essa aproximação com a realidade gaúcha”, disse Pochmann.