terça-feira, 6 de setembro de 2011

Do protesto social para a mudança política


 
Este comunicado do CC do PC Israel analisa o protesto de massas que se tem verificado em Israel: não se trata de “mais um protesto”, mas de um movimento muito amplo em que convergem as camadas mais pobres da sociedade israelense, profundamente desigual e injusta. E o protesto, na apreciação do PCI, vai mais fundo: é anti-capitalista.


Uma forte onda de protesto social tem surgido em Israel. O protesto, que começou com a organização de um acampamento no Rothschild Boulevard, no centro de Tel Aviv, se espalhou pelo país desde Kiryat Shmona, no norte, até Eliat, no sul. O protesto tem sido participado por grandes e diversificados públicos – a classe média em erosão, trabalhadores com média e baixa rendas, moradores de bairros pobres, mães, estudantes – que, na maioria, trabalham para suas sobrevivências. Os líderes dos protestos são jovens, empregados e educados. Começando como um protesto contra o aumento das rendas, em uma semana se tornou um protesto contra as condições de vida sustentadas pelas políticas do governo neoliberal.
É importante entender que não se trata de “mais um protesto” ou “outra manifestação” com uma forma já conhecida em Israel, mas de um desenvolvimento político importante que requer uma análise profunda e uma rejeição do pensamento convencional.
1. Na essência, o novo movimento de protesto social é anti-capitalista: representa uma resistência às políticas dominantes do neoliberalismo de privatização e desmantelamento dos acordos de bem-estar; representa um apoio aos valores socialistas e uma crença na responsabilidade do estado para com os seus;
2. É nosso papel, no contexto do movimento de protesto, continuar a esclarecer e trazer à tona a natureza ideológica da luta básica – uma luta entre dois caminhos diferentes: um estado que é responsável por todos os seus cidadãos e residentes versus um estado que os abandona às forças do mercado e dos magnatas.
Ao mesmo tempo, devemos elucidar a natureza política da luta – e convencer o público de que Netanyahu prefere os interesses dos magnatas e das oligarquias às necessidades do grande público; ele prefere ocupações e assentamentos à vida diária da sociedade Israelense – e que qualquer mudança real requer a derrota do governo de Netanyahu.
1. O protesto anti-capitalista enfraquece, mas não erradica, as perspectivas nacionalistas e as polaridades políticas em torno da questão da ocupação em andamento dos territórios Palestinos e do acordo de paz;
2. É nosso papel, no contexto do protesto, continuar explicando, paciente e sensivelmente, a conexão entre essas duas questões. Nós temos que relembrar aos nossos ouvintes do alto custo económico e social das políticas de ocupação e assentamentos. Uma paz justa facilitará uma mudança de prioridades e mais investimento em moradias, educação, saúde e bem-estar.
Devemos continuar falando contra as tentativas do governo de erradicar os protestos através de meios que levem a outro conflito militar ou, até mesmo, guerra.
Devemos continuar falando contra as tentativas do governo de “dividir e conquistar” enquanto se aprofunda a discriminação nacionalista contra a população Árabe de Israel. O verdadeiro teste do protesto será sua habilidade de manter solidariedade e ampla unidade frente a todos que foram prejudicados pelas políticas dominantes.
1. A luta pela mudança social em Israel pode obter sucesso somente com uma luta conjunta entre Judeus e Árabes. A adopção de um modo Judaico-Árabe de acção é um teste importante para a maturidade do movimento de protesto. A organização de acampamentos de protesto nas comunidades Árabes e nas cidades, liderada por membros do PC de Israel, é um desenvolvimento importante guiado para consolidar o carácter do protesto Judaico-Árabe.
Até agora, o protesto não assumiu o carácter de uma manifestação de massa entre o público Árabe. Os mecanismos de divisão nacional que existem em Israel criam uma sensação de distância do protesto existente dentre os segmentos do público Árabe.
A população Árabe deve ter um lugar importante nesse protesto. A participação da população Árabe no protesto é importante porque seu público sofre muito mais com a falta de moradia e serviços sociais e com a pobreza dobrada, ou quadruplicada, como resultado das políticas discriminatórias de todos os governos Israelenses contra a minoria nacional. A direita tenta empurrar os cidadãos Árabes para fora do campo da actividade social e política em Israel.
1. O protesto social está se espalhando junto com as importantes lutas dos trabalhadores. Os médicos estão liderando uma luta prolongada não somente em relação às suas condições de trabalho, mas também pelo futuro do sistema público de saúde. Os professores universitários estão lutando por empregos justos. Os trabalhadores químicos de Haifa estão conduzindo uma prolongada greve e os trabalhadores das indústrias alimentícias do norte estão lutando contra demissões. De qualquer maneira, até agora os trabalhadores organizados em sindicatos não se juntaram ao protesto com força total. O líder da Federação Histadrut de Trabalhadores, Ofer Eini, está tentando diluir o protesto focando em alguns “itens de compra”, isto é, progressos limitados e localizados;
2. Na essência, o movimento de protesto social é uma progressiva manifestação de força não somente contra o actual modelo de capitalismo neoliberal, mas, também, contra as correntes fascistas que ameaçam o espaço democrático de Israel. O movimento de protesto é prova clara de que a sociedade Israelense também mantém uma quantidade não desprezível de forças saudáveis, as quais podem produzir mudanças progressivas. Essa é uma resposta formidável e convincente para os sentimentos de desespero que, nos anos recentes, tem caracterizado certos grupos na esquerda e na população Árabe.
O PCI nunca compartilhou a sensação de desespero do público Israelense e da sociedade Israelense. Nossa análise Marxista sempre nos permitiu expor a natureza dialéctica da realidade, com suas contradições inerentes e as possibilidades de mudança, que essas contradições produzem continuamente. No 25° Congresso do partido (2007), nós reiteramos nossa análise da estrutura básica da sociedade de classes Israelense. Argumentamos, incisivamente, contra todas as abordagens que subestimam o poder e a importância das contradições internas da sociedade Israelense e a condição que essas contradições têm de criar uma estrutura real de mudança.
1. Nos últimos anos o PCI tem conduzido, sistematicamente, uma forma de “políticas de massa”, dentro do público Judeu também. “Política de massa” consiste em um ponto de virada para o público com slogans que tem o poder de mobilizar. Ao mesmo tempo, continuamente constrói parcerias na luta, tais como a campanha municipal de Tel Aviv por “Uma cidade para todos”, as acções do Primeiro de Maio, as generalizadas manifestações democráticas contra os perigos fascistas, assim como nossa actividade relacionada ao estabelecimento de um estado Palestino, acabando com as ocupações e alcançando uma paz justa. “Política de massa” não significa um abandono do nosso caminho ou nossos princípios. Subjacente, essa política é a compreensão de que determinar os princípios é somente o começo da acção política e não sua nota final: que os princípios não têm força se não forem traduzidos em bandeiras que o público possa entender. Ser uma vanguarda progressista, de acordo com a formação leninista, é, de fato, caminhar antes das massas, mas numa distância que o público possa acompanhar a liderança.
2. As “políticas de massa” do PCI contribuíram, e ainda contribuem muito no desenvolvimento de uma luta progressista em Israel. De qualquer maneira, será um erro grave achar que essa luta nos fortalecerá politicamente. A história está repleta de exemplos de protesto social que não traduziram a verdadeira mudança.
A mudança acontece, somente, quando o protesto social é traduzido para a acção política e dirigido para o poder político. Para que isso aconteça em Israel, um amplo movimento socialista deve surgir do protesto social e se consolidar – um movimento que irá incluir do nosso lado, inclusive, outros grupos, organizações, movimentos da juventude e organizações sociais. Tal movimento deve integrar valores socialistas, luta democrática e deve ter um carácter Árabe-Judeu. Também deve ser baseado na apreciação da conexão entre a ocupação e os problemas da sociedade.
1. Estamos diante de um desafio urgente, nesse contexto, porque as eleições para a Federação Histadrut de Trabalhadores se aproximam. Na iminência dessas eleições, trabalharemos por uma ampla cooperação Judaico-Árabe e socialista, com o Hadash no centro e apresentando um candidato para liderar o Histadrut – como uma alternativa de esquerda à política de colaboração com o regime político e com o capital, que é o que líder do Histadrut tem feito.
2. Uma profunda análise da luta social e das oportunidades que ela nos abre para mudar a sociedade Israelense vai ficar no centro da nossa preparação para o 26° Congresso do PCI, que ocorrerá no final do ano.
Paralelamente, disponibilizaremos nossas mensagens de consciência de classe na imprensa do partido, no nosso trabalho político no Knesset, nos conselhos locais, no Histadrut (Federação de Trabalhadores em Israel), federação Na’amat de mulheres, sindicatos de professores, conselhos de trabalhadores e na nossa actividade entre as mulheres, os estudantes e a juventude.
O Comité Central do PCI saúda os membros do partido que estão activos no movimento de protesto social.
O Comité Central do PCI chama todas as organizações partidárias e Juventudes Comunistas, e nossos parceiros no Hadash, para continuar a organização de acampamentos nas comunidades e na vizinhança e para consolidar planos práticos de trabalho em cada respectiva área de actividade, no espírito dessas decisões.
 
Website do Partido Comunista de Israel (em Inglês): via ODIARIO
http://maki.org.il/en/index.php
Traduzido por Mariângela Marques.

Para Kasparov, Putin cairá pelas mãos das redes sociais na Rússia


Lenda do xadrez, Kasparov também se dedica à política na Rússia. "Como figura política, não existo, já que o Estado controla os meios de comunicação" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Igor Natusch no Sul21

Garry Kasparov é um nome lendário do xadrez. Ex-campeão mundial, considerado por muitos o maior enxadrista que já existiu, Kasparov veio a Porto Alegre, dentro do ciclo de palestas Fronteiras do Pensamento, para exercitar uma outra faceta de sua personalidade: o ativismo político. Notório opositor de nomes como Vladimir Putin e Dmitri Medvedev, Garry Kasparov é membro fundador do Partido Democrático da Rússia e aproveitou a visita ao Brasil para discutir os desafios globais do século XXI, dentro de uma ótica que toma a situação russa como exemplo maior.
No começo da coletiva de imprensa na tarde desta segunda-feira (5), Garry Kasparov explicou que sua palestra inicialmente trataria das dificuldades que a democracia e os direitos humanos enfrentam na Rússia. Depois de conversar com algumas pessoas de Porto Alegre, o conferencista resolveu incluir tópicos sobre o livro “The Blueprint”, ainda sem título em português, que discute o espaço para pensamentos inovadores no mundo atual. “Acaba sendo uma boa combinação de temas, já que regimes não democráticos acabam alcançando a excelência na imitação, abolindo completamente a criatividade. As palavras ‘Rússia’ e ‘inovação’, por exemplo, não combinam”, afirmou Kasparov.

“Não apareço na TV russa há 5 anos”

O enxadrista russo chegou a se candidatar à presidência do país em 2007. Foi forçado a abandonar a campanha, por não conseguir atender algumas das muitas exigências do sistema eleitoral russo. “O Kremlin decide tudo. Quais partidos podem concorrer, os espaços na mídia, cuida até mesmo da contagem de votos. O processo eleitoral em Moscou, por exemplo, parece mais com o do Zimbábue do que com países de democracia consolidada”, lamentou. Kasparov acentua os resultados das chapas governistas em algumas regiões do cáucaso, que mostram números capazes de “causar inveja” em Muammar Kadafi e Saddam Hussein. “Alcançam mais de 100% dos votos”, ironizou.
"Putin cairá pelas mãos das redes sociais. Elas são a grande maldição dos tiranos modernos" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Na visão de Garry Kasparov, a Rússia está tomada por uma oligarquia da pior espécie. “Afirmações simples, como ‘eleição’, ‘campanha eleitoral’ ou ‘presidente Medvedev’ são enganosas, não refletem a nossa triste realidade”, atacou. “Não apareço na TV russa há 5 anos ou mais, apenas em pequenas matérias sobre xadrez. Como figura política, simplesmente não existo, já que o Estado controla os meios de comunicação de massa.” De acordo com o enxadrista, Putin não tem nenhum compromisso com a democracia e não abandonará o poder pela via eleitoral. “Não temos que perguntar o que será depois de Vladimir Putin, e sim qual o preço que estamos pagando com sua permanência.”
A internet, de acordo com Kasparov, é o único espaço onde a contestação política ao regime é possível. Ainda que sem o mesmo papel decisivo em países árabes como o Egito, as redes sociais auxiliam na mobilização de setores contrários ao governo. “Nossos protestos sempre foram pacíficos, nunca queimamos carros e nem mesmo quebramos janelas. A resistência pacífica está no espírito da oposição contra Putin. A violência vem sempre do estado”, garantiu. “Os números crescem de forma mais lenta do que gostaríamos, mas ainda assim estão a nosso favor. Putin cairá pelas mãos das redes sociais. Elas são a grande maldição dos tiranos modernos.”
“Foi uma agradável surpresa ver como as ideias que defendo sobre educação recebem acolhida calorosa no Brasil” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Fundação usa xadrez como modo de aprendizado

Mesmo que a palestra fique restrita ao aspecto político das atividades de Garry Kasparov, o russo não deixou de comentar sobre xadrez – mais especificamente, sobre os planos de expansão da Fundação Kasparov de Xadrez. O objetivo do projeto é ensinar professores a ministrar xadrez, como forma de estabelecer uma ligação sobre o modelo tradicional de ensino e as tecnologias digitais. Os planos incluem a instalação de sedes em Buenos Aires e São Paulo. “Foi uma agradável surpresa ver como as ideias que defendo sobre educação recebem acolhida calorosa no Brasil”, afirmou Kasparov.
A agenda do enxadrista no país envolveu uma visita a Brasília, para reunião com os ministros Aloízio Mercadante (Ciência e Tecnologia), Fernando Haddad (Educação), Paulo Bernardo (Comunicações) e Orlando Silva (Esporte). Além disso, Kasparov reuniu-se também com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Na manhã de segunda, Kasparov encontrou-se com o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati – reunião que garantiu ter sido muito positiva. “Nossa ideia é, a partir de São Paulo, espalhar o nosso trabalho pelo país todo”, disse Kasparov, que agora busca patrocínios junto à iniciativa privada para financiar o projeto.
De qualquer modo, a terça-feira será dedicada ao xadrez em sua forma mais pura. O ex-campeão mundial enfrentará 20 pessoas simultaneamente, em uma maratona enxadrística no Chalé da Praça XV, em Porto Alegre. Entre os desafiantes, gente como o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, o reitor da UFRGS, Carlos Alexandre Netto, e integrantes do Metrópole Xadrez Clube.
O ciclo de palestras Fronteiras do Pensamento terá, nos próximos meses, a presença de nomes como o escritor Orhan Pamuk, o ativista político Lech Walesa e o escritor suíço Alain de Botton. Pela primeira vez, as palestras estão sendo realizadas também em São Paulo.