Presidência e ministro Fernando Haddad não descartam que Dilma tenha visto material do Ministério de Saúde, que foi levado por evangélicos ao Planalto na reunião de quarta-feira
Livretos do Ministério da Saúde apresentados por evangélicos à presidenta Dilma Rousseff podem ter levado à suspensão do kit elaborado pelo Ministério da Educação (MEC) para combater a homofobia nas escolas públicas. A hipótese não é descartada pela própria Presidência da República e pelo MEC.
Na quarta-feira (25), após encontro com frentes religiosas, Dilma
determinou que fosse reanalisado o material, constituído por um caderno,
seis boletins, três vídeos e um cartaz. A intenção do MEC era ajudar o
debate em salas de aula do Ensino Médio a respeito da discriminação
contra homossexuais.
Informações recebidas pela Rede Brasil Atual dão
conta de que o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), um dos principais
interlocutores do encontro, mostrou à presidenta um material elaborado
pelo Ministério da Saúde. A assessoria do parlamentar descreveu os
títulos dos materiais apresentados na reunião. “O caderno das coisas importantes”
foi elaborado pelo MEC, mas em parceria com o escritório da Organização
das Nações Unidas para Educação e Cultura (Unesco) e sem qualquer
relação com o kit contra a homofobia. Outro, também em parceria com a agência da ONU, é a história em quadrinhos “A vida como é – e as coisas como são”, lançada em 2010 abordando as relações entre filhos homossexuais e seus pais.
Os demais são de um programa do Ministério da Saúde que visa a
reduzir danos no uso de drogas e ao combate a doenças sexualmente
transmissíveis (DSTs). Ao ser informada por telefone que o material
citado não diz respeito aokit contra a homofobia, a assessoria do deputado afirmou que “chegou a nossas mãos como sendo o kit-gay (sic). De qualquer maneira é pornográfico”.
Uma das ilustrações mostra dois rapazes praticando sexo. O Ministério
da Saúde informou que se trata de um material voltado a um público
absolutamente específico: agentes que trabalham com a prevenção de DSTs e
com viciados em drogas, sem qualquer conexão com o material elaborado
pelo MEC e jamais tendo sido distribuído em escolas.
Origem
A fonte das cartilhas encaminhadas a parlamentares ligados às causas
religiosas é o Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política
(Fenasp). O presidente da entidade, Pastor Wilton Acosta, usou parte do
material do Ministério da Saúde em um debate da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão a respeito dos programas do governo federal sobre diversidade sexual.
As mesmas imagens estão disponíveis na página da Fenasp na internet.
A reportagem tentou, sem sucesso, contato telefônico com Acosta. A
secretária-geral da organização, Damares Alves, afirmou não saber se as
cartilhas foram apresentadas a Dilma Rousseff como parte do kit contra
a homofobia. O mesmo material foi levado por Damares a uma reunião com o
ministro da Educação, Fernando Haddad. “A gente quis mostrar para ele
que é uma prática do governo a produção de material de mau gosto”,
explica.
Ela lamenta que o combate à homofobia tenha se transformado “em
prioridade” para o ministério e avalia que a campanha que seria
difundida pelo kit não ajudaria a combater o problema.
Damares considera que mostrar relações homoafetivas não vai colaborar
em nada para a discussão. “Como dizer que não vivemos a normalidade da
heterossexualidade? Isso pode mudar nas próximas gerações, mas essa
geração ainda entende a normalidade na heterossexualidade”, questiona.
Incertezas
Incertezas
A assessoria de comunicação da Presidência da República afirmou não
haver condições de afirmar se Dilma viu ou não o material correto. A
informação é de que Dilma analisou as cartilhas e os vídeos sem a
presença de assessores ou do ministro da Educação.
Em rápido pronunciamento a jornalistas nesta quinta-feira (26), a
presidenta afirmou não ter visto os filmes, mas considerou o material
inadequado. “Não vai ser permitido a nenhum órgão do governo fazer
propaganda de opções sexuais, nem de nenhuma forma nós não podemos
interferir na vida privada das pessoas”, disse.
O ministro da Educação confirmou que a presidenta não soube precisar se o material a que teve acesso faz parte dokit contra
a homofobia. Haddad lembrou que filmes e textos que circulam pelo
Congresso são de campanhas do Ministério da Saúde, levando à
desinformação de alguns parlamentares e da sociedade. “Houve muita
confusão a respeito. Quando uma discussão deixa de ser técnica e passa a
ser política você tem muita dificuldade de organizar um debate racional
sobre o assunto”, lamentou o ministro, que considera acertada a decisão
de suspender a distribuição das cartilhas em meio a um cenário de
turbulência.
A ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM),
Iriny Lopes, foi outra que ponderou que a decisão não representa um
retrocesso nas políticas governamentais de conquistas de direitos. “O
programa de enfrentamento à homofobia é um programa definitivo. Ele não
sofrerá retrocessos. O governo da presidenta Dilma é pautado pela
questão de direitos, a presidenta tem demonstrado isso em todos os seus
gestos”, disse.
A determinação do Planalto é que qualquer material relativo aos
direitos sociais terá de passar por análise de uma comissão a ser
montada no Palácio do Planalto antes de vir a público.
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